domingo, 25 de janeiro de 2015

56 A - Divagações suscitadas por uma amostra de minério de tungsténio - 5.º parte

      

         XXXIII-Ministros insultam técnicos superiores da DGGM, para readmitirem, na função pública, em cargo dirigente, Geólogo fraudulento, ignorante nas matérias em que se afirmava perito.

         A progressiva degradação, que eu observava, no SFM, originada pelo abuso das liberdades conquistadas pela Revolução de 25 de Abril de 1974, causava-me profunda preocupação.
          Numerosos foram, por isso, os meus apelos aos sucessivos Governos e até ao Presidente da República, para que fossem adoptadas as medidas correctivas que se impunham.
         Ingenuamente, acreditava que, a nível governamental, o interesse do País se sobreporia a outros interesses e que Ministro era, obviamente, personagem honesta.
         Estava, porém, profundamente equivocado!
         Houve Governos capazes de pactuar, ostensivamente, com elementos perversos que estavam a destruir o SFM!!!
         Vários Ministros, sem escrúpulos, não tiveram pejo em subscrever despacho, insultando funcionários detentores de valiosíssimo currículo, com abundantes provas de competência técnica e dedicação à causa mineira.
         Com esse aviltante insulto, pretenderam justificar o recrutamento, para alto cargo directivo, de Geólogo ignorante em prospecção mineira, o qual teve a desfaçatez de declarar, no currículo que apresentou para publicação no Diário da República, a autoria de trabalho por outros produzido!!!
         Enorme foi, pois, a minha estupefacção, quando deparei, a páginas 2638 da I Série do Diário da República de 28-8-1984, com a portaria que, a seguir, transcrevo: (a passagem realçada é de minha iniciativa)
           “PRESIDÊNCIA DO CONSELHO DE MINISTROS E MINISTÉRIO DA INDÚSTRIA E ENERGIA" - Portaria N.º 649/84 de 28 de Agosto
 
          A prossecução dos novos objectivos da Direcção – Geral de Geologia e Minas, na sequência da aprovação do Decreto Regulamentar n.º 46/83 de 8 de Junho, não se compadece com soluções de continuidade na gestão de um dos seus serviços operativos – a Direcção de Serviços de Prospecção.          A especificidade de competências a esta cometidas decorrentes do artigo 13.º da lei orgânica exige que para o cargo de director de serviços seja recrutado um técnico de elevado nível e comprovada experiência profissional nos domínios da definição de áreas geologicamente favoráveis à ocorrência de minerais com interesse económico, prospecção e pesquisa de recursos de minérios metálicos e não metálicos, gestão do sector empresarial extractivo, direcção de pessoal e bem assim da função pública.
         Dada a inexistência de indivíduos na função pública com o perfil adequado para exercer o cargo pela via do recrutamento normal previsto pelo artigo 2.º n.º 2 alínea a), do Decreto –lei N.º 191-F/79 de 26 de Junho, e considerando o disposto no n.º 4 do mesmo artigo e diploma e o n.º 3, alínea b) do Decreto Normativo n.º 66/82 de 30 de Abril:
        Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro da Indústria e Energia e pelo Secretário de Estado da Administração Pública, o seguinte:
         1.º É alargada a área de recrutamento para o provimento do lugar de director de Serviços de Prospecção a indivíduo não vinculado à função pública, licenciado em Ciências Geológicas, de elevado nível técnico e comprovada experiência profissional no domínio das competências legalmente cometidas aos serviços.
         2.º O despacho de nomeação deve ser acompanhado, para publicação do currículo do candidato.

         Presidência do Conselho de Ministros e Ministério da Indústria e Energia. 
Assinada em 2 de Agosto de 1984, pelo Ministro da Indústria e Energia, Joaquim Leitão da Rocha Cabral, Secretário de Estado da Energia – O Secretário de Estado da Administração Pública, José Manuel San-Bento de Menezes. 

         Na sequência deste despacho, surgiu, na II Série do Diário da República de 12-9-1984, o documento de que faço parcial transcrição:

         “Secretaria de Estado da Energia Direcção Geral de Geologia e Minas
         Por despacho de 29 de Agosto de 1984, do Secretário de Estado da Energia, foi nomeado, em comissão de serviço, director dos Serviços de Prospecção do quadro da Direcção-Geral de Geologia e Minas, por urgente conveniência de serviço, com efeitos, a partir de 29 de Agosto de 1984 “Vítor Manuel Correia Pereira”   
          Este novo despacho é acompanhado de extenso currículo, apresentado pelo candidato, sem validação por entidade idónea, cujos elementos mais salientes são:
1965 a 1972 – Geólogo do SFM, em cuja qualidade, declara as seguintes actividades:
    a) ter constituído, com os colegas António Ribeiro e Nabais Conde, o grupo de trabalho, para o estudo dos jazigos de scheelite em Portugal;
    b) ter acompanhado permanentemente os Geólogos checos Prof Janecka e Jiri Strnad, durante os meses em que aqueles Geólogos estiveram em Portugal a estudar a Região mineira de volframite e scheelite de Covas, Valdarcas, Cerdeirunha e Lapa Grande (Vila Nova de Cerveira)
    c) ter feito o estudo geológico das Minas de Covas (Vila Nova de Cerveira) para inclusão no Livro-Guia da Excursão N.º 7 do 1.º Congresso Hispano-Luso-Americano de Geologia Económica.

         Sobre o chamado “Grupo dos Scheeliteiros”, o Director-Geral, que o orientou, reconheceu a sua completa ineficácia, conforme já tive ensejo de descrever.
        Quanto ao acompanhamento permanente dos Geólogos checos e aos estudos nas Minas de Covas, é tudo inteiramente falso.
         Com os checos, foi-lhe concedido o privilégio de fazer estágio de aprendizagem, por mim sugerido, com o objectivo de o SFM ir tomando iniciativas no sentido de melhorar a preparação dos seus Geólogos, evitando acções inúteis como foi o caso da lamentável incompetência demonstrada por anterior Geólogo, que tinha sido destacado para a Região.
         Vítor Pereira não se revelou, porém, bom discípulo, pois foram fugazes as suas presenças no campo.
          E, como já referi, fui eu quem lhe forneceu, a seu pedido, o levantamento geológico da Região, elaborado pelos Geólogos checos, para poder fazê-lo figurar na Livro Guia da Excursão do CHILAGE!
         Em 1972, rescindiu o seu contrato com o SFM, passando a dedicar-se à indústria privada, essencialmente no sector de “Não Metálicos”.
         Não deve ter tido sucesso, pois, em 1984, diligenciou acolher-se, de novo, na função pública, tirando partido das relações políticas e comerciais, que tinha adquirido.
         Era óbvio que não se atreveria a orientar trabalhos de Prospecção Mineira pois era ignorante, em tal matéria, como, aliás, acontecia com todos os Geólogos recém-diplomados pela Universidade de Coimbra, pois a disciplina não constava do Curso.
         Mas iria ter nova oportunidade de evidenciar o seu carácter.
         É simplesmente inacreditável como foi possível acontecerem tão aberrantes despachos.

         De facto, simultaneamente com nomeações para cargos directivos instituídos pelo Decreto-lei N.º 548/77, sem a intenção de os nomeados desempenharem as funções correspondentes às suas categorias, continuava em vigor a Orgânica instituída em 1963, pelo então Director do SFM, Múrias de Queiroz.
         Era assim que, afinal, se conseguia manter ainda alguma actividade útil!!

          Segundo essa Orgânica, eu era Chefe do 1.º Serviço, cabendo-me numerosas funções, que concentrei sob a designação de Serviço de Prospecção Mineira do SFM, dando à Prospecção, pela primeira vez, um âmbito vasto, que incluía fases sucessivas, desde a documentação até à definição de reservas minerais.
         No desempenho dessas funções, foi às minhas exclusivas iniciativas que se ficou devendo a introdução, no SFM, das técnicas geológicas, geofísicas e geoquímicas, adequadas aos objectivos em vista.
         Foi através de sistemática e rigorosa aplicação dessas técnicas, que se registaram os maiores êxitos, de todos os tempos, em prospecção mineira, com destaque para o gigantesco jazigo de Neves-Corvo, por cuja descoberta sou o principal responsável, após árdua luta, que se prolongou por 30 anos, durante os quais tive que enfrentar incríveis dificuldades criadas por dirigentes incompetentes e malévolos.
         Além disso, fui também o introdutor de disciplina de Prospecção Mineira, no Curso de Geologia da Faculdade de Ciências do Porto, na qualidade de Professor Convidado, correspondendo a pedido que não podia recusar, apesar da minha escassa disponibilidades de tempo, porquanto as minhas funções no SFM eram realmente absorventes.
         Esta regência iria prolongar-se por 20 anos.
         Pelo sucesso que alcançou, induziu outros estabelecimentos de ensino superior e médio de Porto, Aveiro e Braga a solicitarem também a minha colaboração.
         Ao convite da Faculdade de Engenharia, correspondi, regendo a disciplina, durante dois anos, sem remuneração (não era permitida segunda acumulação), comprometendo-me ainda a prestar colaboração a futuro Engenheiro, que tendo frequentado as minhas aulas, tivesse demonstrado aptidão para se encarregar do ensino da matéria que aprendera.
         Ao Instituto Superior de Engenharia do Porto, facultei aulas de campo, aos seus alunos, na Região de Caminha.
         Extraordinário foi o interesse manifestado por Engenheiros recém-licenciados, em frequentarem as minhas aulas na Faculdade de Ciências do Porto.
         Não se contentaram com um ano. Estiveram presentes, durante dois anos e foram depois bons colaboradores, em aulas de campo, na Região de Caminha, para as quais traziam os seus alunos, na sua nova qualidade de docentes da Universidade de Aveiro.
         À Universidade de Braga, iria, já aposentado, prestar colaboração em Curso de Mestrado.
         Muitas mais referências poderia fazer sobre as minhas actividades em prospecção mineira.
         A realidade era que a DGGM, sempre que pretendia demonstrar, a nível externo, a sua capacidade técnica, era a mim que convocava, para esse efeito.
         Foi assim, por exemplo, que representei Portugal, em reuniões, de um Grupo “ad hoc” constituído para promover a aplicação de métodos modernos de prospecção, no âmbito da OECE (depois evoluída para OCDE).

         Nestas reuniões, realizadas em Paris, em 1961, participaram 18 países e, na sua sequência eu apresentei projecto de prospecção aérea no Alentejo, que teve boa aceitação.
         Foi também assim que fui designado para dar conta de actividades de prospecção a meu cargo em representação da DGGM, proferindo várias palestras, no Laboratório Nacional de Engenharia Civil.
         Vale ainda a pena citar a minha participação nas Jornadas de Engenharia de Moçambique, em 1965, às quais apresentei comunicação sobre recentes êxitos da aplicação de técnicas geofísicas e geoquímicas à prospecção mineira, que foi muito apreciada e foi publicada pela Sociedade de Estudos.

         É, consequentemente, um gravíssimo insulto à minha dignidade profissional o despacho que Rocha Cabral subscreveu e induziu outros Ministros a seguirem-lhe o exemplo.
         Em circunstâncias normais, isto teria justificado procedimento criminal.
         Não era, porém, caso único. Outros crimes foram cometidos impunemente, os quais, sem dúvida, deram a sua contribuição para a crise que o Pais actualmente atravessa.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

56 A - Divagações suscitadas por uma amostra de minério de tungsténio - 4.º parte -



XXIX - O meu parecer sobre a actividade de Union Carbide (UC)

Em 22-6-1979, Union Carbide requereu a prorrogação do seu contrato de prospecção mineira, com o Estado Português.

Deste requerimento foi-me enviada cópia com carimbos de entrada em vários departamentos da DGM, e com os seguintes despachos:

    a) SFM para se pronunciar sobre o mérito do seu trabalho, em relação aos contratos 12-7-79 (a) F. Soares Carneiro, na qualidade de Director-Geral de Minas
     b) Envie-se fotocópia ao Eng.º Rocha Gomes, para a Amieira, para cumprimento do despacho do DG 20-7-79 (a) Jorge Gouveia, na qualidade de novo Director do SFM.

Dando cumprimento a este último despacho, entreguei, em 28-8-1979, o meu parecer, francamente favorável à continuação da actividade de UC, pois acompanhava sistematicamente os seus trabalhos e até colaborava na respectiva execução.

Este parecer constou de documento de 68 páginas dactilografadas e uma peça desenhada.
No longo texto, manifestei estranheza, por me ser pedido que me pronunciasse acerca do mérito de uma actividade que decorrera nos termos de um contrato celebrado, sem me ter sido dado conhecimento, respeitante à zona que era objecto dos meus estudos.

Foi apenas através dos meus contactos com UC que tomei conhecimento de documentação, que a Direcção da DGM se “esquecera” de me enviar.

Perante a persistente obstrução dos dirigentes da DGGM à realização de trabalho útil, aproveitei a oportunidade para repetir sugestões feitas, em vários outros documentos, no sentido de serem tomadas providências para se atingirem os objectivos de fomento da indústria mineira nacional, consignados no Decreto-lei N.º 29 725 de 28 de Junho de 1939.

Um Instituto de Investigação dos Recursos Minerais de Portugal, independente da actual DGGM, seria a solução racional.
Tal Instituto teria, obviamente, de ficar sob a orientação de dirigentes aptos a bem desempenharem a sua nobre missão.
Impunha-se também sindicância à DGGM, para responsabilização dos autores dos gravíssimos prejuízos para a economia nacional.

Não obtive qualquer reacção ao meu Parecer, de que conservo cópia. Provavelmente terá sido destruído.
Fiel ao princípio de que “quem teima, vence” ou de que “água mole em pedra dura, tanto dá até que fura”, continuei a insistir e alguns resultados acabaram por aparecer.

Já tinha chegado a vez de Múrias de Queiroz sair de cena. Estava para breve a vez de Soares Carneiro.


XXX - A documentação técnica entregue pela Union Carbide, quando rescindiu os seus contratos de prospecção mineira,


Quando tive conhecimento da decisão da Union Carbide (UC) rescindir os seus contratos de prospecção mineira com o Estado Português e com empresas concessionárias, apressei-me a convidar os dirigentes da equipa local de UC a proceder à entrega dos documentos técnicos, que sabia terem sido elaborados, mas que não tinham dado entrada na DGGM, como seria normal, em cumprimento da Lei de Minas e das cláusulas contratuais.
Solicitei também a entrega dos testemunhos das numerosas sondagens efectuadas pela Empresa.

UC acolheu favoravelmente este convite e até se propôs promover o transporte dos testemunhos das sondagens para as instalações do SFM, em S. Mamede de Infesta.

O Geólogo Bronkorst que chefiava o projecto de UC, informou-me que formalizaria a entrega da documentação, nas instalações da DGM, em Lisboa.

Embora esperasse ser eu o natural destinatário, não ousei sugerir tal alternativa, confiante de que a documentação rapidamente me seria remetida.
Surpreendentemente, não foi isto que aconteceu.
Alguém iria parasitar os estudos de UC, para simular trabalho que não estava apto a produzir!


XXXI - Os testemunhos das sondagens de Union Carbide.

Em ofício que enderecei ao novo Director do SFM, Jorge Gouveia, que sucedera a Múrias de Queiroz, dei conhecimento da intenção de UC colocar os testemunhos das suas sondagens, nas instalações do SFM, em S. Mamede de Infesta, se o local de arrumação lhe fosse comunicado, até data ainda distante, que indicou.

Aconteceu que tendo-me ausentado do País, em gozo de licença graciosa, quando regressei, constatei que aquela data tinha sido ultrapassada, sem que comunicação alguma tivesse sido feita a UC e esta Companhia até já tinha terminado todas as actividades na Região.

Jorge Gouveia deu, então, ordem para que um Agente Técnico de Engenharia tomasse a seu cargo o transporte a arrumação dos testemunhos.

Isto foi feito, em numerosas viagens, usando uma pequena camionete e um jeep, durante tempo suficiente para justificar ajudas de custo a diverso pessoal, em período em que constantemente se proclamava a necessidade de reduzir despesas!
Os testemunhos foram arrumados atabalhoadamente, junto a uma parede, ao ar livre, sem cuidado em preservar as indicações da sua proveniência.
No decurso do tempo, foram-se espalhando, tornando-se quase inúteis, conforme se constatou quando se começou a organizar uma caroteca.



XXXII – Consequências nas investigações mineiras, em curso, na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima, por mudanças ocorridas nas principais chefias da DGGM

Apesar da ignorância em matérias relacionadas com o aproveitamento dos nossos recursos minerais, revelada pelos Ministros da Economia ou da Indústria, dos sucessivos Governos constituídos após a Revolução de 25 de Abril de 1974, os desmandos de Soares Carneiro eram tão evidentes, que se tornou imperioso destituí-lo do cargo de Director-Geral de Minas.

Foi, por isso, publicado no Diário da República de 17 de Março de 1980, despacho ministerial exonerando-o dessas funções.

Não foram, todavia, explicadas as razões da exoneração, nem foi praticada a sindicância à DGGM que era essencial, porquanto Soares Carneiro teve seguidores da sua acção destrutiva.

Dentre esses seguidores, Jorge Gouveia, acabou por ter efémera presença na qualidade de Director do SFM, pois foi também exonerado.

Não foram, porém, felizes as nomeações para os cargos que ficaram vagos.

Alcides Rodrigues Pereira, Geólogo, sem currículo técnico, mas conhecedor da burocracia no ambiente ministerial, por ter sido Assessor de um Ministro, foi ocupar o cargo de Director-Geral. Um desastre, que era facilmente previsível.

O Engenheiro Fernando da Silva Daniel, que vinha da indústria privada, com fama de ter realizado bom trabalho nas Minas de Aljustrel, veio ocupar o cargo de dirigente do SFM.
As atitudes que, desde o início, assumiu para comigo, fizeram-me duvidar da sua sanidade mental.
Sem respeito pelo meu currículo, que ostensivamente ignorou, teve a ousadia de dar-me instruções, quanto a procedimentos a adoptar em prospecção mineira, isto é, relativamente a matéria de que viria a revelar-se grande ignorante.
Quando denunciava as barbaridades que proferia, não tinha pejo em afirmar: “Disso nada sei e até tenho raiva a quem sabe!”

 Sem se preocupar em conhecer os estudos que decorriam nos diversos núcleos do SFM, nomeadamente no sector que eu dirigia, logo me destinou zona de investigação, como se o SFM começasse, então, a sua actividade e não tivesse realizado imensa obra, nos 40 anos anteriores!!

Destinava-me a zona de Góis – Panasqueira!

Reagindo a esta precipitada decisão, recomendei-lhe que procurasse conhecer o SFM actual, que era essencial que visitasse os diversos locais de trabalho e consultasse a documentação arquivada.
Respondeu que “não viera para o SFM para trabalhar. Para isso, havia gente mais nova!!!”

Informei-o de que a zona de Góis – Panasqueira tinha muito interesse e que constava dos Planos de Trabalho que apresentava anualmente na minha qualidade de Chefe do Serviço de Prospecção Mineira.

Estava, porém, ainda em fase muito atrasada, exigindo estudos geológicos, por pessoal qualificado, antes que passasse a fase de prospecção, por outras técnicas.
Já tinha indigitado o Professor Décio Tadeu, ao concessionário da Mina de Góis, quando este pedira o meu auxílio.
O Professor Décio, que tinha participado no corpo de técnicos das Minas da Panasqueira, aceitou realizar tal tarefa. Desconheço a sequência.

Quanto a mim, respondi não estar em idade de iniciar estudos nessa zona, nem ser minha opinião suspender as investigações em curso na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima.
Daniel teve, então, reacção, própria da inconsciência que vinha demonstrando, nas suas decisões:
         “Então, quero tudo acabado em 1984”!!!”

Conseguindo manter a minha calma, aconselhei-o a visitar a área que estava em estudo e a tomar conhecimento dos meios que estavam à minha disposição para realizar esses estudos, antes de tomar novas decisões apressadas.
Concordou, mas tardou a concretizar a sua visita e, quando tal aconteceu, fez-se acompanhar do Engenheiro Rui Reynaud, que tinha conseguido a categoria de Director de Serviço (!!!), recentemente criada, e pertencia ao grupo de técnicos sediado em Lisboa, nas antigas instalações da extinta Direcção-Geral dos Serviços de Prospecção e Exploração da Junta de Energia Nuclear.

Esta visita permitiu-me tirar duas conclusões:
a) Daniel pouco ou nada percebeu das explicações que lhe dei sobre os estudos em curso, as quais apoiei em peças desenhadas, com resultados das várias técnicas geofísicas e geoquímicas que tinham sido aplicadas.
b) A presença de Rui Reynaud justificava-se porque, em funções que lhe foram atribuídas, estava parasitando os documentos que UC entregara, sendo esta a razão porque não tinham chegado à minha mão. Reynaud usava os dados dos logs das sondagens de UC para recalcular as reservas, que UC considerara como passíveis de exploração e até já tinha feito publicação, sobre esta matéria!!!

 Estranhando tão grande reviravolta na atitude de Daniel, chamei-lhe a atenção para zonas do País, incluídas nos meus Planos de Trabalhos, anualmente apresentados, a necessitarem de estudo, parecendo-me inútil a concentração que estava a verificar-se na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima, sem efectiva participação na actividade local, pois até tinha notado que um Engenheiro de nome Gonzalez, também sediado em Lisboa, surgia clandestinamente em S. Mamede de Infesta a recolher fragmentos das sondagens do SFM, provavelmente para simular, igualmente, trabalho que não estava apto a executar.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

56 A - Divagações suscitadas por uma amostra de minério de tungsténio - 3.º parte



XXIII – O “dogma” instituído por Soares Carneiro, de não se justificar a prospecção de minérios de tungsténio.

Durante os 20 anos que precederam a minha nomeação para chefiar o Serviço de Prospecção Mineira, com âmbito de acção extensivo a todo o território metropolitano nacional, Soares Carneiro tinha instituído o dogma de a prospecção do volfrâmio ter ficado concluída, “com as botas”, devido á sua intensa procura, durante a 2,ª Guerra Mundial.
Não era, consequentemente, de esperar a descoberta de novos jazigos!!


XXIV - O Grupo de Trabalho do Tungsténio “Os scheeliteiros”

Soares Carneiro, ficou perplexo, quando se apercebeu de que, além dos método magnético, eléctricos e geoquímicos, eu aproveitava, na procura de jazigos de tungsténio, a fluorescência da scheelite, sob determinada radiação ultra-violeta.
Por incrível que pareça, ele e os outros técnicos que fizeram investigações mineiras, no Norte do Pais, ignoravam esta propriedade da scheelite, durante os 20 anos que precederam a minha nomeação como Chefe do Serviço de Prospecção Mineira.
Esta tardia descoberta fez-lhe considerar que, afinal, teriam escapado à “prospecção com as botas” jazigos de scheelite, dada a fácil confusão deste mineral com minerais sem valor económico.
Passou, pois, a admitir ao seu dogma, mais uma excepção: a prospecção de scheelites.
Com auxílio do mineralight, julgava possível encontrar, rapidamente, grandes jazigos deste mineral, que permaneciam escondidos, os quais, pelas suas prováveis dimensões, classificava de “Torres dos Clérigos”!
Ele-próprio se encarregaria de orientar campanha, com vista à sua detecção.
Com o seu beneplácito, o subserviente Director do SFM, Múrias de Queiroz, fez Ordem de Serviço, criando o Grupo de Trabalho do Tungsténio.
Este Grupo passou a ser, designado pelos “Scheeliteiros”


XXV– A constituição do “Grupo dos Scheeliteiros”

Este Grupo foi instituído, em 1975, após a Revolução da Abril de 1974, com total desrespeito pela Orgânica do SFM.
Sem o mínimo escrúpulo, Soares Carneiro e Múrias de Queiroz deram assim mais uma contribuição para a indisciplina na actividade do SFM.
À margem dos vários Serviços criados pela Orgânica posta em vigor em 1964, decidiram promover, para seus mais directos colaboradores, funcionários que dessem garantias de subserviência, independentemente da sua competência.
Esperavam deste modo, manter-se nos cargos que ocupavam, não por competência técnica, mas por fidelidade à política do regime que tinha sido deposto.
Soares Carneiro, que auxiliara o Professor Cotelo Neiva, em levantamentos geológicos, na província de Trás-os-Montes, quase se considerava Geólogo.
Assumia-se, pois, como competente para orientar, directamente, Geólogos recém-diplomados, que tinham sido integrados no SFM e que se apresentavam como detentores de uma excelente preparação académica.
O Grupo dos Scheeliteiros ficou constituído, não só por 3 desses “excelentes” Geólogos, mas também por numeroso pessoal dos diversos serviços da sede em S. Mamede de Infesta e ainda por pessoal operário a recrutar nos locais de trabalho.
Os Geólogos, todos oriundos da Universidade de Coimbra não tinham, “de facto” a preparação de que se vangloriavam.
Eram, afinal, completamente ignorantes em prospecção mineira, pois esta matéria não constava do elenco do Curso que frequentaram.
A realidade era que o Director do Departamento de Geologia da Universidade de Coimbra, o Professor Cotelo Neiva, tinha igual ignorância, como tive ocasião de constatar directamente, quando, na sua qualidade de Colaborador do SFM, me censurou por aplicar, no Sul, técnicas geofísicas.
O pessoal auxiliar, sem qualquer preparação académica ou de outra natureza, deslocado da sede em S. Mamede de Infesta, era afectado ao Grupo, para o aliciar, proporcionando-lhe auferir ajudas de custo.


XXVI – O programa do “Grupo dos Scheeliteiros

Este Grupo de Trabalho escolheu como zona principal de actuação, uma vasta área abrangendo os concelhos de Mogadouro, Alfândega da Fé. Almendra e Figueira de Castelo Rodrigo.
Seleccionara para determinação do valor económico, com vista a futura exploração uma ocorrência, que designou como “jazigo de Cravezes”.

 
XXVII – As intenções dos “Scheeliteiros”, relativamente à Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha - Ponte de Lima.

Era intenção do “Grupo dos Scheeliteiros” apropriar-se da zona de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima, deixando eu de dirigir os estudos, que lá iniciara há vários anos.
Foi Farinha Ramos o Geólogo encarregado de me exigir a entrega da documentação respeitante aos estudos efectuados na Região até àquela data.
Apresentava-se a cumprir Ordem de uma “Comissão de Direcção do SFM”.
Esta Comissão, instituída após a Revolução de Abril de 1974, tinha sido o expediente que Múrias de Queiroz encontrara, para se manter no poder de que desfrutara, no regime político anterior, apesar da sua notória incompetência, simulando agora a comparticipação, na Direcção, de funcionários de categorias inferiores, convenientemente eleitos.
Declarando ilegal esta Comissão, por não respeitar a Orgânica do SFM, que se mantinha em vigor,
recusei, cumprir tão exorbitante Ordem.
Curiosíssima a atitude de Farinha Ramos, quando lhe perguntei se percebia das técnicas de prospecção que eu estava a aplicar. Respondeu que não percebia, mas que estava ali apenas a cumprir uma Ordem!
Não fui, portanto, impedido de continuar a orientar os estudos na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha - Ponte de Lima.


XXVIII – O fiasco da actuação dos Scheeliteiros”

Os Scheeliteiros lograram descobrir, na região de Mogadouro, a existência de scheelite, em rochas, que classificaram de calcossilicatadas, e logo “embandeiraram em arco”.
Durante anos, realizaram sanjas e sondagens, nesta ocorrência, que denominaram de “jazigo de Cravezes”.
Em artigo publicado em Revista da Universidade de Coimbra, um desses Geólogos, embora declarando que o “jazigo” se encontrava ainda em início de estudo, apressou-se a dar notícia da “sensacional”descoberta.
Revelou terem sido feitas amostragens das rochas mineralizadas, para análise de WO3, Sn, Pb e Ag, em 14 sanjas, mas, perante os baixos teores de”WO3 detectados, explicou que a operação de amostragem tinha sido efectuada por pessoal não especializado!!!!
Para darem a conhecer os seus “brilhantes” êxitos, os Scheeliteiros fizeram exposições no Salão Nobre do edifício de S. Mamede de Infesta.
Tive, casualmente, conhecimento de uma dessas exposições quando ela já decorria e fui assistir.
Estava, então, Farinha Ramos no uso da palavra, encontrando-se exposto um diapositivo com foto de um campo onde apenas se percebia a existência de restolho de seara já ceifada.
Este diapositivo manteve-se, com a Sala em semi-obscuridade, durante toda a sessão!!
Os Geólogos Santos Oliveira e Luís Francisco Viegas intervieram seguidamente, sobretudo para realçar o espírito de equipa que norteou as investigações.
“Não era como noutros casos, em que havia um sábio que tudo descobria”!
O Director do SFM, Múrias de Queiroz estava eufórico! Tinha visitado a área em estudo e ficara deslumbrado com a quantidade de scheelite que vira … até nos muros!  Ignorava que musgos e outros materiais também brilham quando sobre eles incide radiação ultra-violeta!!!
Na “selecta” assistência, encontrava-se a maior parte do pessoal do chamado núcleo de S. Mamede de Infesta, incluindo funcionários da Secretaria, da Sala de Desenho, das Oficinas, da Cantina, mulheres da limpeza, etc., tudo pessoal que pouco ou nada entendia do que se dizia, até porque o palavreado não foi tornado acessível.
Para demonstração dos sucessos, uma amostra de rocha com mineralização de scheelite ia passando, de mão em mão, por todo este pessoal, que obviamente não conseguia detectar a presença do mineral de tungsténio, pois ele só se torna visível a observador não experimentado, usando radiação ultra-violeta de determinado comprimento de onda, em completa escuridão.
A finalizar, insistiu-se em realçar o espírito de equipa, que desejariam servisse de exemplo a outros departamentos do SFM.
A esta euforia, sucedeu um marasmo gradual, pois os resultados não correspondiam às expectativas optimistas que tinham sido geradas em pessoal impreparado para a realização de trabalhos de prospecção mineira.
Sei que foram realizadas numerosas sondagens, não apenas na região de Mogadouro, mas também noutras áreas, como foi o caso da Fonte Santa, em Lagoaça.
Sei, também, que na maior parte delas, se obteve escassa recuperação de testemunhos.
Constou-me que, quando O SFM começou a organizar uma “caroteca”, em novo edifício, construído na sua sede em de S. Mamede de Infesta, não foram encontrados os testemunhos destas sondagens.
Sei que se procurou interessar no “jazigo de Cravezes” a Companhia americana Union Carbide.
Em conversa que tive com o Geólogo americano responsável pelo cumprimento de contratos na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha - Ponte de Lima, soube que Cravezes não lhe despertou o mínimo interesse, porquanto os seus teores de WO3 eram inferiores aos do estéril das minas que estavam em exploração na zona de Covas.
As “Torres dos Clérigos” que Soares Carneiro esperava encontrar afinal ... não apareceram!!!!

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

56 A - Divagações suscitadas por uma amostra de minério de tungsténio. 2.º parte


XVI - A publicação do CHILAGE sobre prospecção de tungsténio, na Região de Caminha

Em 1971, apresentei ao Congresso Hispano – Luso – Americano de Geologia Económica (CHILAGE), que decorreu, em Espanha e em Portugal, a seguinte comunicação: “Prospecção de jazigos de tungsténio, na região de Caminha, pelo método magnético”.Com base nos dados das investigações magnéticas, nos resultados de sondagens e com apoio em carta geológica da autoria dos Geólogos checos, inseri diversas peças desenhadas representativas do jazigo, destacando, dentre elas, um esboço interpretativo da topografia do nível mineralizado e uma planta das zonas com potencialidade para a ocorrência do minério.


XVII – O livro Guia da Excursão N.7 do CHILAGE

Perante a importância que a zona mineira de Covas assumiu, no contexto nacional, foi decidido seleccioná-la, para visita guiada, no âmbito das actividades do CHILAGE.
O Geólogo Vítor Pereira, que fizera curto estágio de aprendizagem nesta zona mineira, foi incumbido de redigir o texto a ela respeitante, no Livro – Guia da Excursão
Como tivera escassa presença em Covas, não dispunha do levantamento efectuado pelos checos, que lho não haviam fornecido.
Pediu-me cópia e eu não tive dúvidas em lha facultar, convicto de que faria a devida referência aos autores, seguindo o meu exemplo, na comunicação que eu apresentara ao CHILAGE.
Tal referência foi, porém, omitida!
 
 
XVIII – O interesse do BRGM em efectuar prospecção mineira, em Portugal

O “Bureau de Recherches Géologiques et Minières” (BRGM), prestigiado Organismo estatal francês, equivalente ao Serviço de Fomento Mineiro (SFM), conhecedor das facilidades concedidas a entidades estrangeiras, para a realização de trabalhos de prospecção mineira, com vista à futura exploração dos jazigos descobertos, fez deslocar a Portugal o seu Geólogo Bonnici, para analisar as reais possibilidades, relativamente às matérias-primas previsíveis, nos diversos ambientes geológicos.
A scheelite foi o mineral que chamou a sua atenção prioritária.
Para sua detecção vinha já preparado com mineralight e com bateia, para produção de concentrados.
Morais Cerveira, Director Técnico da Geomina, sabendo dos meus frequentes contactos com Bonnici, solicitou a minha intervenção no sentido de esse Geólogo lhe trazer de França um mineralight, assim demonstrando também ignorar ou não ter, até então, aproveitado a propriedade da fluorescência da scheelite.


XIX – Nova procura intensa de volfrâmio, originada pelas Guerras da Coreia e do Vietnam

Embora a “febre do volfrâmio” originada pela 2.ª Grande Guerra tivesse terminado, o tungsténio voltou a adquirir elevadas cotações, devido às Guerras da Coreia e do Vietnam.


XX - A intervenção da Empresa americana “Union Carbide”, suscitada pela minha publicação no CHILAGE

A Empresa norte-americana UNION CARBIDE (UC) surgiu, em Portugal, em 1974, interessada em explorar jazigos de tungsténio, que pudessem abastecer a indústria de armamento dos Estados Unidos, para a qual o tungsténio é essencial.
Esta Empresa contactou os principais concessionários, para com eles firmar contratos, visando os seus objectivos.
Foram os jazigos da zona de Covas que mereceram a sua preferência, não só pela qualidade dos estudos, evidenciada pela minha Comunicação ao CHILAGE, mas também por novos dados que lhe forneci, resultantes de estudos posteriores àquela Comunicação.
UC começou por firmar contratos com “Geomina Lda.” e com “Gaudêncio, Valente e Faria”.
Posteriormente, por contrato com o Estado, ampliou a sua actividade a áreas potenciais, que tinham sido reservadas para os estudos do SFM.
A sua actividade decorreu de 1974 a 1979 e consistiu praticamente na execução de elevado número de sondagens, nos núcleos de mineralização detectados pelo SFM, para definição de reservas certas e para ensaios mineralúrgicos, a fim de avaliar da sua explorabilidade, em termos económicos.
Durante a sua presença, eram constantes os meus contactos com os seus técnicos, os quais não raramente recorriam aos meus conselhos, tendo chegado até a propor ao Director-Geral e Minas a minha nomeação como seu consultor, à semelhança do procedimento anteriormente adoptado relativamente aos contratos celebrados em parcelas da Faixa Piritosa Alentejana.
Todavia, esta proposta não teve resposta.
A Empresa chegara à conclusão de que, para o jazigo ser economicamente explorável, eram necessárias reservas mínimas de 1 milhão de toneladas, com o teor médio de 0,8% de WO3.
E quase chegou a este valor.
Mas, baixa acentuada da cotação do tungsténio, provocada por exportações da China, a preços que, em muitos países, eram inferiores ao custo da produção, originou o encerramento de numerosas minas deste metal, no resto de Mundo.
A UC rescindiu todos os seus contratos, em Portugal.
Nesta data, eu ainda ignorava as disposições legais impeditivas da atribuição de concessões mineiras a estrangeiros.
Estava até convencido de que a contribuição dos investimentos estrangeiros na exploração dos nossos recursos minerais era, não só legítima, como superiormente muito desejada.
Por esse motivo, sempre auxiliei à actuação das empresas estrangeiras.
Tenho motivos para acreditar que, se tivesse sido dado seguimento à proposta de UC de eu ser nomeado seu colaborador, talvez a decisão tivesse sido diferente.

 
XXI – A transferência da actividade do SFM da Região de Vila Nova de Cerveira, para fora da zona mineira de Covas

O contrato celebrado por UC com o Estado, sem que eu tivesse sido consultado, relativamente a áreas não abrangidas por concessões mineiras, nas quais o SFM estava realizando investigações, com assinaláveis êxitos, não conduziu ao esvaziamento dos objectivos do núcleo do SFM instituído na região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima, pelo facto de terem sido previamente feitos itinerários geológicos em outras zonas, com descobertas de mineralizações justificativas da aplicação de adequadas técnicas de prospecção.
Uma dessas zonas foi a do Serro, em Argela

 
XXII –  O Interesse da Companhia COMINCO, pela zona do Serro

Aproveitando a circunstância de eu exercer funções de professor auxiliar convidado, na Faculdade de Ciências do Porto, os organizadores de uma Reunião de Geólogos do Oeste Peninsular consideraram a Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima, onde eu dirigia trabalhos de prospecção mineira, com interesse para constar do programa das excursões, no âmbito da Reunião.
Por essa razão, foi solicitada a minha colaboração para concretizar tal objectivo.
A fim de preparar a excursão, acompanhei, previamente, os professores que dela iriam encarregar-se, aos locais a visitar e descrevi os estudos realizados, fornecendo elementos para a elaboração do respectivo Livro – Guia.
Chamei, a atenção para as dificuldades de acesso a veículos longos, até aos locais de maior interesse, que eram às Minas de Valdarcas, Lapa Grande e Cerdeirinha.
A excursão realizou-se, em 19-7-1979, iniciando-se pela zona do Sopo, onde eu fiz descrição panorâmica da estrutura mineralizada que se encontrava em investigação.
Em seguida, na Mina da Fervença, ao Geólogo Bronkhorst de Union Carbide, foi dada a honra de fazer exposição mais detalhada sobre a estrutura geológica da região e eu apresentei os perfis geológicos e magnéticos que revelaram as concentrações de minério, já em grande parte exploradas, por Geomina.
Por minha indicação, os motoristas dos dois autocarros, fizeram rápida inspecção do terreno, concluindo que não conseguiriam manobrar os seus veículos nas curvas do caminho, para chegar às outras Minas.
Teve, pois que se desistir de visitar: Valdarcas, Lapa Grande e Cerdeirinha.
Sugeri-lhes então visitar a zona do Serro (Argela) onde, pouco tempo antes, eu tinha descoberto afloramentos de skarn mineralizado, que facilmente poderiam ter passado despercebidos, por não ostentarem as suas típicas características.
Nessa época, eu concentrava aí os estudos, por ter sido adjudicada a Union Carbide, a área onde estivera a cumprir programa de sondagens.
Mostrei xistos grafitosos responsáveis por fortes anomalias de polarização espontânea, um filão aplítico com mineralização de cassiterite e skarn alterado e inalterado.
Exibi perfis magnéticos, de resistividade eléctrica, de polarização espontânea e fiz especial referência a concentrados de eluvião e à contagem de pontos de scheelite, para substituir as análises geoquímicas que o Laboratório do SFM tinha recusado efectuar.
O experiente Geólogo, Dr. Serpa Magalhães, que nessa data pertencia ao quadro técnico da Companhia canadiana Cominco, comentou ter sido o melhor que tinham visto em toda a excursão.
Entusiasmado com o que observou, propôs à Cominco que celebrasse contrato com o Estado Português, para esta área da Argela, o que viria a concretizar-se.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

56 A – Divagações suscitadas por uma amostra de minério de tungsténio. 1.ª parte


             Curiosum nobis natura ingenium dedit

Uma amostra de minério de tungsténio da Mina de Valdarcas, que eu tinha colocado, sobre um móvel, em minha casa, despertou curiosidade a pessoa, que se mostrou interessada na sua proveniência.

Correspondendo a esse interesse, aí vão as divagações que a amostra me suscitou.


I – As explorações de volfrâmio, durante a 2.ª Guerra Mundial

A região se Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima não ficou imune à chamada “febre do ouro negro”, ocorrida durante a 2.ª Guerra Mundial.
Houve, em vários locais, explorações de volframite, legais e ilegais, como bem assinala a Doutora Raquel Alves, da Universidade do Minho, na recente publicação do GEPPAV, denominada “Minas e mineiros de Vilar de Mouros”, da qual é a principal autora.
 

II – Nova descoberta de volframite, em 1954

Valdarcas faz parte de um conjunto de Minas, cujas concessões foram outorgadas, no início da década de 50 do passado século, portanto após o termo da 2.ª Guerra Mundial.
É a concessão N.º 2944, outorgada em 29-7-1954, conforme consta da publicação; “Minas concedidas no Continente, desde Agosto de 1836 a Dezembro de 1962”
O jazigo que deu origem àquele conjunto de Minas, foi descoberto por um indivíduo que detectou volframite em afloramentos ferruginosos que tinham chamado a sua atenção,
Sem condições financeiras para se candidatar à exploração deste material ferruginoso, a que chamou “jorra”, vendeu a descoberta a Empresa que, então foi constituída – a GEOMINA, L.da, cujos sócios eram: o Eng.º Técnico Russo Belo; o Presidente da Câmara de Vila Nova de Cerveira, de nome Pimenta e o Conservador de Registo Predial Dr. Pedreira.
Outras Empresas se estabeleceram, também, na Região, para explorar núcleos mineralizados, entretanto descobertos.
 As principais concessões outorgadas foram:
          A “Geomina”: Valdarcas, Fraga, Fervença;
          A “Gaudêncio, Valente & Faria”: Lapa Grande e Cerdeirinha

 
III – A “jorra”, resultante da alteração de pirrotite

O Professor Catedrático da Faculdade de Engenharia - Alberto Morais Cerveira, que foi o Director Técnico das concessões de Geomina L.da, identificou no minério, além de volframite, (tungstato de ferro e manganés), ferberite (tungstato de ferro), scheelite (tungstato de cálcio) e pirrotite, da qual tinha derivado a ”jorra”.
A pirrotite é um sulfureto de ferro, com propriedades magnéticas, idênticas às da magnetite.  


IV – As boas relações entre Morais Cerveira e Soares Carneiro

O Eng.º Morais Cerveira era grande amigo do Eng.º Soares Carneiro, que exerceu cargos de chefia na Direcção-Geral de Minas, chegando a Director-Geral.
Constava que eram sócios, por intermédio de um familiar de Carneiro.
Tinham residências geminadas, na Rua do Engenheiro Carlos Amarante do Porto.


V – A aplicação do método magnético, para detecção de pirrotite oculta.

Sabedor da existência da Brigada de Prospecção Geofísica (BPG) do Serviço de Fomento Mineiro (SFM), que estava a aplicar, no Alentejo, o método magnético, para detecção de jazigos de minério magnetítico, Morais Cerveira solicitou que esta Brigada viesse aplicar a técnica magnética nas concessões de Valdarcas, Fraga e Fervença, a fim de localizar as concentrações de pirrotite, às quais estariam, provavelmente, associadas a volframite e a scheelite.
O pedido foi aceite e a BPG fez deslocar, àquelas Minas, uma equipa chefiada por um recém-licenciado Engenheiro, confiante de que o trabalho seria bem executado.
Esse Engenheiro deparou, porém, com um terreno acidentado, muito diferente daquele em que actuava no Alentejo.
Ainda sem experiência, não teve o necessário rigor, no trabalho topográfico para implantação dos pontos a observar com o magnetómetro, daí resultando a impossibilidade de localizar correctamente as expressivas anomalias que se registaram.
Mas Cerveira ficou consciente da plena eficácia do método e quis saber exactamente onde se situavam aquelas anomalias, para as investigar, por sondagens.

 
VI – A minha intervenção em nova campanha de prospecção magnética.

Aconteceu que, por aquela data, eu fui nomeado Chefe do Serviço de Prospecção Mineira do SFM, com âmbito de actuação extensivo a todo o território metropolitano nacional.
O problema foi-me então apresentado.
Tive que mandar repetir o levantamento magnético, agora sob a orientação de um Engenheiro, ao qual eu tinha prestado os primeiros ensinamentos do método magnético e proporcionado, depois, os meios para se tornar um especialista, nesta técnica.
Com a colaboração de um Geólogo sénior, foi então possível elaborar um projecto de sondagens.


VII – A execução de sondagens, com base em resultados da prospecção magnética

Uma vez mais, Cerveira solicitou a colaboração do SFM para a execução dessas sondagens, que se localizavam na Mina da Fervença, junto à foz da Ribeira de Arga, na confluência com a Ribeira de Coura, onde a “jorra” até tem conspícuo afloramento junto a um dos pilares da ponte.
As sondagens foram realizadas e tiveram pleno êxito.
Interceptaram minério rico em volframite e scheelite, em associação com a pirrotite magnética.

 
VIII– A detecção de scheelite, usando um mineralight

A volframite e a ferberite eram facilmente identificáveis pela sua cor preta e pelo brilho metálico.
A scheelite, branca e sem brilho, não era detectável por observador normal, pois se confundia facilmente com minerais do estéril. Revelou-se, no processo de concentração hidrogravítica, devido à sua elevada densidade.
Não me foi difícil detectar a presença abundante de scheelite, pois fiz uso de um equipamento de produção de radiação ultra-violeta, denominado “mineralight”, que trouxera do Alentejo, e pude observar a sua característica fluorescência, quando sobre ela incidia, na obscuridade, radiação de comprimento de onda apropriado (2537 angstroms).


IX – O início de uma campanha de prospecção, extensiva a vasta área da Região

Tendo verificado, no desempenho das minhas novas funções, estar em presença de importante formação mineralizada, resolvi iniciar uma campanha de prospecção, visando a detecção de concentrações de minério magnético, neste jazigo e noutros que, na região, pudessem existir.
Nesta campanha, assumiu primordial importância o aproveitamento da fluorescência da scheelite, sob radiação ultra-violeta, produzida por aparelhos portáteis, que eu tinha conseguido adquirir, baseado em informação colhida em Revistas mineiras que habitualmente consultava.
Além da aplicação do método magnético, visando a detecção da pirrotite e da magnetite associadas ao minério, eram sistematicamente observados com o mineralight, concentrados de bateia de sedimentos de linhas de água e fragmentos extraídos de formações suspeitas de conterem scheelite.
Os bons resultados não se fizeram esperar. Novas concentrações foram encontradas, sendo bem expressivas as detectadas na Mina da Cerdeirinha, concedida a “Gaudêncio, Valente & Faria”.

 
X – O levantamento geológico da Região

Tornava-se essencial um estudo geológico da área.
O Geólogo do SFM, encarregado de proceder a este estudo, ainda muito inexperiente, entregou-me um mapa à escala de 1:25000, com informação de reduzido interesse para os objectivos em vista, e até pouco fidedigna.
Recusara os mapas à escala 1:5000 que eu lhe tinha fornecido, com o argumento de não serem rigorosos, por terem sido obtidos por ampliação de mapas à escala de 1:25000 dos Serviços Cartográficos do Exército (SCE), sendo certo que eu tinha constatado a excelente qualidade dos mapas elaborados pelos SCE.


XI –A tese do Geólogo alemão Bayer sobre o jazigo de Covas

Por casualidade, surgiu na sede do SFM, em S. Mamede de Infesta, o Geólogo alemão Bayer, que o Dr. Orlando Gaspar, do SFM, tinha conhecido quando fez, na Alemanha, a sua especialização no estudo de superfícies polidas.
Bayer mostrou interesse em fazer, em Portugal, a sua tese de doutoramento.
Foi-lhe sugerido este jazigo da freguesia de Covas de Vila Nova de Cerveira.
Na tese que Bayer apresentou, foi pela primeira vez revelado que a mineralização ocorre em formação estratificada, denominada skarn (derivada de um calcário, por metamorfismo, que lhe introduziu os sulfuretos, a volframite e outros minerais) e não em filões, como tinham concluído Cerveira e outros técnicos.
Por a tese ter sido redigida na língua alemã, passou despercebida esta importante conclusão.

 
XII –Os estudos dos Geólogos checos Yanecka e Strnad

Algum tempo mais tarde, a outra Empresa concessionária “Gaudêncio Valente e Faria”, que tinha ligações comerciais com a antiga Checoslováquia, conseguiu que os Geólogos checos, Yanecka e Strnad, viessem a Portugal prestar colaboração nos seus estudos, nas Minas de Lapa Grande e Cerdeirinha.
Estes Geólogos compareceram na sede do SFM, em S. Mamede de Infesta, a prestar informação sobre os estudos que tencionavam realizar.
O Director Múrias de Queiroz, convocou-me para o auxiliar, durante a conversa com os técnicos checos, que se exprimiam em francês, sendo que Strnad também entendia português, por ter estado no Brasil.

 
XIII – O estágio de Vítor Manuel Correia Pereira, sob a orientação dos Geólogos checos

Logo me apercebi de que Yanecka era Geólogo altamente competente e que até seria útil aproveitar a sua presença, para proporcionar estágio a um Geólogo do SFM recém-licenciado.
Foi então indigitado Vítor Manuel Correia Pereira que, pouco tempo antes, havia ingressado no SFM.
Esta proposta obteve a concordância de António Ribeiro, que era então o Geólogo mais competente da DGM.


XIV – A minha boa colaboração com os Geólogos checos

Estabeleci estreita colaboração com os Geólogos checos, fornecendo-lhes mapas à escala de 1:5000 (topográficos e magnéticos), pois constatara que eles estavam fazendo o levantamento topográfico, à bússola e á fita métrica, assim produzindo mapas muito menos rigorosos que os anteriormente rejeitados pelo Geólogo do SFM.
Agradecidos, foi nestes mapas que implantaram, entre outras formações, o afloramento do skarn hospedeiro da mineralização de tungsténio, em toda a extensão da estrutura que estava em investigação, confirmando as conclusões a que Bayer tinha chegado, na parcela sobre a qual tinha incidido a sua tese.

 
XV – As aulas de campo a estudantes universitários, na região onde ocorrem as Minas de Covas

No período de 1970 a 1990, prestei colaboração às Faculdades de Ciências e de Engenharia da Universidade do Porto, à Universidade de Aveiro e à Universidade de Braga, em Prospecção Mineira, quer em aulas teóricas no gabinete, quer em aulas práticas no campo.
Aproveitei a campanha na região de Vila Nova de Cerveira,- Caminha – Ponte de Lima, para os alunos praticarem as técnicas que estavam a ser aplicadas.

A amostra de minério da Mina de Valdarcas, que guardei em minha casa, era-lhes apresentada como representativa do objectivo principal da campanha.