terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

56 A – 7.ª parte


            XXXVI – A minha decisão de elaborar o Relatório “circunstanciado”
 
Quando fui impedido de fazer trabalho de campo, a Secção de Caminha, apesar dos escassos meios de que dispunha, era o único núcleo do SFM que conseguia manter, no terreno, investigações com elevado nível de qualidade.

Isto acontecia, devido não só a insensatas ordens emitidas por indivíduos que tinham tomado de assalto os cargos dirigentes recentemente criados, mas também ao facto de os mais categorizados técnicos da 1.ª Brigada de Prospecção terem desertado para outras paragens.

No período de presença de Múrias de Queiroz no cargo de Director do SFM, o sector de “Trabalhos Mineiros”, para cujo desenvolvimento eu dera importante contributo, no desempenho das funções de Chefe da Brigada do Sul, tinha entrado em franco declínio, chegando à extinção!!

A Prospecção Mineira que, nesse período, me foi confiada, apesar de lhe terem sido atribuídas mais amplas funções, excluía a fase de “Trabalhos Mineiros”, não obstante eu ter declarado poder manter, facilmente, essa fase, no meu âmbito de actuação.

Eu conhecia bem a competência técnica do indivíduo indigitado para me substituir, pois era meu subordinado, na Brigada do Sul.

Apesar do auxílio que sempre tive de lhe prestar, para ficar apto a executar as tarefas de que o encarregava, muito pouco consegui que aprendesse, mas consegui a sua ingratidão e até conivência nos obstáculos à minha actuação, em que o Director do SFM era fértil.

Receava, por isso, que o fundamental sector dos Trabalhos Mineiros entrasse em degradação e viesse a extinguir-se, como sucedeu.

Soares Carneiro, usando o seu tradicional poder discricionário, em vez de procurar solução para a crise que se acentuava naquele sector, optou por tirar proveito da situação, dando forte impulso para o deplorável fim, que eu previa.

Dava-se, então, a circunstância de ser na mina de cobre de Aparis, no concelho de Barrancos, que se concentrava a maior actividade, no terreno, de toda a DGGM.

E tinha sido, sob minha orientação, que se iniciara e mantinha em curso o reconhecimento do jazigo.

Estavam já identificadas reservas certas e prováveis, que permitiriam a exploração do jazigo, em termos económicos.

Dentre os projectos que, oportunamente, submeti a apreciação superior, para continuar as investigações relacionadas com o aproveitamento dos recursos do jazigo, destaco os seguintes:

   a) a instituição de novo piso a 210 m de profundidade (já tinham sido efectuados trabalhos de algum vulto no piso 150):
 
    b) a exploração das bolsadas menos importantes que tinham sido identificadas, não só para adquirir experiência nesta fase, mas também para permitir colher os elementos essenciais a uma correcta avaliação, e ainda para compensar as avultadas despesas com o reconhecimento;

    c) o uso da Mina como Mina–Escola para formação pós-graduada de técnicos recém –licenciados, pois era preocupante a deficiente preparação dos técnicos que ingressavam no SFM, pelo facto de os estabelecimentos de ensino superior e médio não proporcionarem formação adequada à execução das tarefas exigidas.

   d) o tratamento metalúrgico do minério, nos fornos eléctricos recebidos ao abrigo do Plano Marshall, que tinham sido instalados no amplo recinto da sede do SFM, em S. Mamede de Infesta, com o respectivo posto de transformação e linha de alta tensão.
 
Nenhum destes projectos teve o ambicionado seguimento.

A exploração, que nunca me fora autorizada, pelo Conselho Superior de Minas, obteve surpreendente aprovação, quando fui obrigado a deixar o sector de Trabalhos Mineiros.

Mas, como era previsível, o indivíduo que me substituiu nem sequer soube extrair os elementos essenciais para a correcta avaliação do jazigo.

Perante tal incapacidade, Soares Carneiro foi progressivamente apresentando esta Mina como um sério problema de que a DGGM deveria libertar-se, quando o normal seria que os trabalhos realizados, durante a minha chefia, que até tinham suscitado rasgados elogios a categorizados técnicos estrangeiros que a visitaram, servissem de exemplo para o reconhecimento de jazigos similares,

Como consequência desta desvalorização, a Mina acabou por ser praticamente “doada” a Companhia constituída “ad hoc”, por um Professor Catedrático, amigo de Soares Carneiro e por outro Professor, também da Faculdade de Engenharia do Porto.

E esta Companhia iria praticar “lavra ambiciosa”, proibida por lei, que ambos Professores tanto condenavam nas suas aulas, tendo ficado por explorar valiosas parcelas do jazigo, cuja recuperação será agora anti-económica.

E assim findaram, ingloriamente, os Trabalhos Mineiros no SFM!

A 1.ª Brigada de Prospecção, que eu laboriosamente organizara, no Alentejo, tinha entrado em desagregação, com a fuga para outros departamentos, dos principais autores do hediondo documento, que tinha conduzido à minha demissão da chefia daquela Brigada, nas criminosas circunstâncias a que tenho feito frequente alusão.

Lembro que eu tinha proporcionado a esses personagens, excepcionais condições para se tornarem reais especialistas nas técnicas mais adequadas ao cumprimento dos objectivos do SFM.

Mas, renegando tudo isso, os “dedicados servidores”, que tanto empenho manifestaram em corrigir “as deficiências no planeamento, execução e controle das vastas e delicadas tarefas a cargo desta Brigada” (sic), das quais passaram a considerar-me responsável, não hesitaram em abandonar a Brigada, para ocuparem cargos, noutros departamentos da DGGM, com melhor remuneração e muito menor exigência de trabalho.

Jorge Gouveia, em desabafo para comigo, comentou, em termos depreciativos que, por lá, andavam a “inventar trabalho”, para manter ocupado o seu numeroso pessoal, por cuja admissão me responsabilizava.

Reagindo a esta leviana acusação, esclareci que, quando dirigi aquela Brigada, nunca se conseguiam realizar todos os trabalhos que eu projectava e eram, muitas vezes, empresas estrangeiras a efectuá-los, mediante contratos que requeriam ao Estado, não desdenhando, depois, o recurso à colaboração da Brigada.

Jorge Gouveia quisera ainda, deixar bem assinalada a sua efémera passagem pela direcção do SFM, ao ordenar a suspensão das investigações na Faixa Metalífera da Beira Litoral, com uma pueril justificação.

E, naquela data, não existia, no terreno, outra actividade de prospecção, digna de tal designação.

Eu estava consciente de que o ignorante Alcides não tinha a veleidade de se considerar apto a reprogramar a actividade em Caminha.

E não vislumbrava para que pretenderia ele mais um relatório, com a exigência de ser circunstanciado, se nem ele nem os seus apaniguados, tinham demonstrado o mínimo interesse na leitura dos relatórios que eu já tinha apresentado.

Quem pretenderia, então, encarregar da reprogramação?

Daniel não era, com certeza, pois até já o tinha desconsiderado, ao emitir ordem que a este competiria, se a entendesse justificável, sem lhe dar qualquer satisfação.

E Daniel já havia declarado, alto e bom som, que não viera para o SFM para trabalhar!

Seria Reynaud, o parasita que para se manter ocupado, simulando trabalhar, recalculava reservas, apoiado em dados de quem tinha projectado e executado o trabalho no terreno e fizera, com base nos seus resultados, estimativas muito mais fiáveis?

Pretenderia agora Reynaud parasitar o meu trabalho?

O facto real era que nenhum técnico da DGGM teria capacidade para uma séria reprogramação, sabido que, em prospecção mineira, o que de positivo se fizera no SFM, tinha sido com a minha activa participação, no cumprimento de projectos por mim apresentados e superiormente aprovados.

Após alguma reflexão, durante a qual cheguei a ponderar a hipótese de requerer a passagem à aposentação, decidi ultrapassar mais esta afronta, confiante de que, em nova diligência, junto de um Ministro da tutela, menos ignorante e mais consciente dos seus deveres, que surgisse, em futura remodelação governamental, a situação que me tinha sido criada fosse objecto da necessária análise e consequente punição dos malfeitores que tanto prejuízo estavam a causar à economia do País.          

Do Relatório “circunstanciado”, que decidi elaborar, iriam constar:

            a) um longo texto, com cerca de 50 temas organizados em capítulos, alíneas, etc.

            b) 246 peças desenhadas.
           

            XXXVII – A intervenção do Ministro Veiga Simão

A nomeação de Veiga Simão, para a pasta da Indústria, em remodelação governamental que tinha ocorrido, aumentou a esperança, que eu vinha acalentando, de as minhas exposições serem, finalmente analisadas, como mereciam.

De facto, ao contrário de outros Ministros e Secretários de Estado, que haviam sido nomeados sem base em análise curricular, Veiga Simão era bem conhecido, por iniciativas, nas quais evidenciou grande competência, no desempenho de elevados cargos, antes e depois da Revolução de 25 de Abril de 1974.

Logo que concluí o 1.º Capítulo denominado “Informação introdutória circunstanciada”, com 46 páginas dactilografadas a um espaço, enviei-o a este Ministro, acompanhado de ofício a solicitar as urgentes correcções dos desmandos, que nesse Capítulo denunciava e as consequentes punições.

Estava, porém, a ficar decepcionado com a falta de reacção, quando amigos meus providenciaram no sentido de o Ministro me conceder uma audiência.

Veiga Simão recebeu-me, no dia 19-6-1984, no seu gabinete, em edifício da Rua da Horta Seca, indo eu acompanhado de um destes amigos, que era pessoa muito prestigiada, pelo seu saber.

 Este amigo fez a minha apresentação, salientando:
            a) os êxitos do SFM, graças à minha actividade, com destaque para a descoberta de Neves – Corvo,
            b) o meu sucesso como docente da Universidade.

Quando tive a oportunidade de usar da palavra, comecei por entregar ao Ministro cópias dos ofícios que lhe tinha endereçado, perguntando se deles tivera conhecimento.

O Ministro fez rápida leitura, carregou o semblante e disse que a documentação respeitante a Minas era sempre remetida directamente para o Secretário de Estado Rocha Cabral e nem chegava às suas mãos.

Acrescentou julgar que, nas Minas, “tudo corria bem”.

Reagi dizendo que a realidade é que tudo corre muito mal, a exigir urgentes medidas correctivas.

O Ministro prometeu investigar.

Só passados dois meses e meio, me foram enviados alguns dos documentos que esta investigação originou.

Fiquei sem conhecer, por exemplo, o despacho inicial de Veiga Simão e o papel que terá assumido Rocha Cabral, o personagem que tivera o despudor de subscrever despacho insultuoso, concebido para poder contratar, para a função pública, o geólogo Vítor Pereira, que se apresentara como detentor de um currículo claramente falso.

Mas os documentos que recebi foram suficientemente esclarecedores da desorientação que se apoderou de Alcides para justificar a afronta que me tinha feito.

Tendo desconsiderado o Director do SFM, ao proibir-me de realizar trabalho de campo e ao exigir um relatório circunstanciado da minha actividade em Caminha, foi para ele que endossou, agora, o despacho do Ministro!!

Daniel, com a sua habitual cobardia, usou expediente que o libertaria da responsabilidade pelas ordens estranhas que eu recebera.

Mentindo descaradamente, declarou que a minha actividade na Região de Caminha estava subordinada à chefia de Reynaud e, perante tal circunstância, endossou para este personagem, o despacho que havia recebido.

Este “jogo de empurra” terminou em Reynaud, que revelou, então, o seu verdadeiro carácter.

Reynaud esqueceu-se de me ter dito ignorar a convocatória de Daniel para comparecer em Lisboa, com documentação de Caminha, lamentando a “súbita doença”, que o impediu de me receber.

Esqueceu-se também de ter submetido à minha apreciação exercício académico, a comportar-se como aluno que apresenta trabalho ao seu professor.

Esqueceu-se, ainda, de se ter mostrado profundamente consternado com o incrível “despacho” de Alcides e com as consequências que dele pudessem advir.

Colaborando nas mentiras de Daniel, acrescentou muitas outras, para justificar o “despacho” de Alcides e permitiu-se até fazer apreciações desfavoráveis sobre o meu currículo, que demonstrou não conhecer.

O despacho sintético de Veiga Simão, recomendando ao Director-Geral de Minas que aproveitasse a minha capacidade técnica, no cumprimento dos programas superiormente aprovados, demonstra que o Ministro percebeu o estado a que a DGGM havia chegado.

A sua recomendação era clara. O Director-Geral deveria ocupar-se, essencialmente, em promover que trabalho útil fosse produzido por quem tivesse a indispensável competência e não em assumir arrogantes demonstrações de autoridade, desprovidas daquele fundamental suporte.

Eu esperava um despacho muito mais enérgico, mas constatei que o Ministro enfrentava também problemas delicados, no Governo, em que participava.

Talvez um desses problemas derivasse da presença de um Secretário de Estado, que em vez de ser um honesto colaborador da confiança do Ministro, se mostrou conivente com os desmandos na DGGM.

Após o seu despacho, Veiga Simão pouco tempo, mais se manteve nesse Governo.

Alcides e seus comparsas puderam, assim, continuar, impunemente, a praticar atentados contra à indústria mineira nacional.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

56 A - Divagações suscitadas por uma amostra de minério de tungsténio - 6.º parte


XXXIV –A prospecção de tungsténio na Região de Vila Nova de Cerveira–Caminha–Ponte de Lima e a importância, que simulava atribuir–lhe, um Geólogo, que havia sido nomeado Director–Geral de Minas, em muito estranhas circunstâncias.

As minhas persistentes diligências, no sentido de travar a degradação que observava no SFM, estavam a incomodar certos funcionários, que demonstravam muito maior preocupação com os seus interesses pessoais do que com os do País, que tinham jurado servir, com lealdade.

Isso acontecia, principalmente com dirigentes introduzidos na DGGM, para substituírem os que, pelos seus nefastos procedimentos, tornavam excessivamente escandalosa a sua permanência, em elevados cargos.Porém, esses novos dirigentes, não só mantiveram os vícios herdados, mas até os ampliaram, acrescentando ainda outros, bem maiores.
Com tão incríveis atitudes, estavam a conduzir à destruição do SFM, isto é, do Organismo instituído para promover o racional aproveitamento dos nossos recursos minerais.

Já referi que, em Outubro de 1983, uma das primeiras decisões de Fernando da Silva Daniel, quando conquistou o cargo de Director do SFM, foi ordenar que a prospecção do tungsténio, no núcleo de Caminha, ficasse concluída em 1984.
Todavia, com a mesma ligeireza com que deu esta insensata ordem, assim a anulou e nem ficou pela simples anulação.

Resolveu que dois Engenheiros sediados em Lisboa (Rui Reynaud e Gonzalez), passassem a parasitar as actividades que decorriam ou tinham decorrido, na Região.

Na tentativa de evitar que Daniel viesse a repetir insensatas decisões, eu tinha-o aconselhado a consultar os numerosos relatórios de minha autoria, respeitantes à actividade do SFM na Região, um dos quais fora objecto de publicação. 
Não consegui, porém, que atendesse ao meu conselho, porque isso lhe dava trabalho e ele já tinha declarado, oralmente, perante vasto auditório, não ter vindo para o SFM para trabalhar!
Pensando que, em visitas às zonas em estudo, poderia, sem grande esforço físico e mental, ficar esclarecido sobre o projecto que eu tinha em execução e sobre os escassos meios de que dispunha para seu cumprimento, ousei fazer-lhe sugestão nesse sentido.

Concordou, mas demorou a concretizar a minha sugestão.

Surpreendeu-me que se fizesse acompanhar de Rui Reynaud e do Eng.º Quesado, da Circunscrição Mineira do Norte.
Mas, o facto é que, mesmo após aquelas visitas, não se considerou cabalmente elucidado! 

Por tal motivo, convocou-me para comparecer em Lisboa, com toda a documentação técnica respeitante à Região, a fim de a analisar, em pormenor.Embora isto me tivesse causado profunda estranheza, não tive dúvidas em me deslocar a Lisboa, às instalações do SFM, na Rua de Diogo Couto, carregado com volumoso embrulho, contendo vasta documentação, por mim produzida, durante muitos anos.
Estava, porém, longe de imaginar a armadilha que me estava preparada, pelo conjunto de malfeitores, que tinha conseguido albergar-se, na sede da DGGM.Fernando Daniel, um desses malfeitores, decidira simular súbita doença, para se esquivar à reunião, para a qual me convocara. 
Ausente era, também, Reynaud, um dos parasitas que Daniel tinha associado ao projecto de Caminha.
Acreditando, ingenuamente, na fictícia doença, resolvi ficar em Lisboa, confiante de que os males de Daniel fossem passageiros e ele pudesse ainda aparecer.Mas tal não aconteceu.
No dia seguinte, surgiu, em seu lugar, Reynaud, que aproveitou a oportunidade para submeter à minha apreciação, estudo, de que parecia ufanar-se, baseado nos documentos entregues por Union Carbide.Ele tinha procedido à reavaliação das reservas de uma pequena parcela do jazigo tungstífero de Covas!!!
Manifestei-lhe o meu parecer de que a sua reavaliação era um mero exercício de aplicação de normas instituídas para definir as várias classes de reservas.
Não era legítimo desvalorizar as estimativas da entidade que tinha o conhecimento directo do jazigo e era autora dos documentos em que ele se apoiara.

Como Daniel continuava ausente, já eu me preparava para regressar ao Porto, quando surge telefonema de Alcides Rodrigues Pereira, a solicitar a minha presença, nas instalações da DGGM, na Rua de António Enes, sem informar a agenda de trabalho.

O que se passou, na sede da DGGM, foi do mais patético que se possa imaginar!

Após longa espera, a ponto de perder o comboio, para o qual já tinha adquirido bilhete, fui recebido num gabinete, onde se encontravam, Alcides Rodrigues Pereira e Vítor Borralho, ambos sentados a uma das cabeceiras de longa mesa
Alcides indicou-me a outra cabeceira, à qual me devia sentar.
A presença de Borralho, detentor de um passado criminoso, não foi de bom augúrio!

Com rude ar de censura, Alcides pergunta-me se conheço as ordens de serviço que têm sido emitidas, respeitantes aos deveres dos funcionários para com os novos dirigentes, nomeadamente se sabia que, na ausência do Director do SFM, quem o substitui é Vítor Borralho, na sua qualidade de Director de Serviço.
Perplexo, manifesto a minha ignorância, esclarecendo que não é costume serem-me remetidas as ordens de serviço, pois se terminara com o antigo procedimento de fazer essa distribuição, a nível individual.

Empurra, então, com grosseria, na minha direcção, cópia dessa ordem, para que a assine, a confirmar dela ter tomado conhecimento.
Seguidamente, incrimina-me, asperamente por duas razões:
a) Por não me ter apresentado a Vítor Borralho, quando soube da ausência de Daniel.
b) Por ter andado a passear pela cidade, usando viatura e motorista da DGGM, durante o dia em que cheguei a Lisboa e no dia seguinte.

Conseguindo manter-me calmo, perante tamanho ultraje, só comparável a comportamento de garoto malcriado e irreverente, comecei por explicar que o facto de Vítor Borralho ser a pessoa designada para substituir o Director do SFM, era irrelevante para os objectivos da minha vinda Lisboa.

Eu tinha sido convocado, com a expressa finalidade de dar conta pormenorizada das actividades a meu cargo, na zona tungstífera de Caminha e Vítor Borralho nada tinha a ver com estas acções.
Quanto ao uso da viatura, informei que Daniel a tinha colocado à minha disposição, para as minhas deslocações em serviço, relacionadas com a sua convocatória, conforme me dera conhecimento o respectivo motorista. Usei-a exclusivamente para me deslocar a casa de familiar onde me iria instalar, quando decidi ficar em Lisboa, e também para, a partir da casa desse meu familiar, me deslocar, no dia seguinte, a Diogo Couto.
Em nova manifestação da sua extrema grosseria, Alcides ousou desmentir-me!!! Eu tinha, na sua certeza, andado mesmo a passear pela cidade!!!

Mas isto era apenas a introdução para a armadilha que os malfeitores, bem instalados nos seus gabinetes, em Lisboa me tinham preparado.

Alcides Rodrigues Pereira, em nova atitude grosseira, empurra, na minha direcção, documento, que li, verdadeiramente atónito       
Era o seguinte o que nele estava escrito:

DESPACHO N.º 5/100/83
A fim de programar convenientemente as actividades da DGGM, determino que o Sr. Eng. Rocha Gomes elabore um relatório circunstanciado sobre os trabalhos que vem desenvolvendo em Caminha, expondo os resultados já obtidos e anexando a respectiva documentação, e, eventualmente, apresente sugestões para o prosseguimento de tais trabalhos.
Até à conclusão e despacho sobre tal relatório, ficará suspensa toda a sua actividade de campo.

Conhecimento ao Senhor Subdirector-Geral, Eng. Fernando Daniel e Direcção de Serviços de Gestão.

Lisboa, 7 de Fevereiro de 1984
                     O Director Geral
 a) assinatura ilegível de Alcides Rodrigues Pereira 

Acrescentou, ainda, oralmente, de modo acintoso:

“E não faz ajudas de custo!!”

Vítor Borralho, que vim a saber ter sido um dos promotores desta vergonhosa reunião, manteve-se discretamente calado.

Vale a pena recordar que, depois do calunioso documento que subscreveu, em conjunto com outros 24 traidores, que o devia ter levado a Tribunal, o qual esteve na origem da destruição da 1.ª Brigada de Prospecção, por mim laboriosamente organizada, resolveu, enveredar pela política, chegando a pretender o cargo de Governador Civil de Beja.
Como tal pretensão não teve êxito, candidatou-se a Administrador de Minas de Aljustrel.

Conseguiu realmente o cargo, mas não foi longa a sua presença nas Minas, acabando por ser exonerado.

Em tais circunstâncias, refugiou-se, de novo, no SFM e, facto curiosíssimo, veio preencher a vaga de Director de Serviço que o anterior Director do SFM, Jorge Gouveia, me tinha oferecido “com a condição de eu não fazer trabalho da campo”!!!!

Considerei esta oferta ofensiva e mais uma das manifestações de senilidade em que Jorge Gouveia se revelava fértil, as quais acabariam por conduzir ao seu afastamento do cargo de Director do SFM.

Era óbvio, para quem conhecia o meu passado, que eu jamais prescindiria de tentar que o SFM cumprisse a sua missão e recuperasse o prestígio que tinha alcançado, graças à actuação de trabalhadores por mim preparados, sobretudo dos mais baixos escalões hierárquicos.

Eu continuava a realizar trabalho de campo, porque isso era essencial não só para manter activo o SFM, com trabalho de investigação cientificamente organizado, mas também para poder dar aulas de campo aos meus alunos da Universidade de Porto e também para prestar auxílio à Universidade de Aveiro.

Agora, era Borralho, que pelo seu passado criminoso, surgia como meu superior hierárquico, ao qual eu devia prestar contas!!
O despacho de Alcides foi mais um grave insulto à minha dignidade profissional, praticado por indivíduo que eu sabia ter ascendido ao cargo de Director-geral, também com base em procedimento criminoso.

Abstenho-me, por agora, de mais comentários a tão indecoroso despacho, talvez inédito, na Função Pública.

Finda aquela incrível reunião, dirigi-me às Instalações do SFM, na Rua de Diogo Couto, para trazer os documentos que lá deixara e que não tinham, afinal, sido necessários!!
Apesar da hora tardia, ainda lá se encontrava Reynaud, que se mostrou muito consternado quando lhe dei conhecimento do despacho de Alcides.

E eu até acreditei.

Revelarei, oportunamente, quão grande era a sua hipocrisia.

XXXV – A meteórica promoção de Alcides Rodrigues Pereira a elevado cargo dirigente na DGGM

Quem era, afinal, a insolente criatura, que tivera o arrojo de ultrajar o técnico que mais contribuíra, com o seu saber e a sua sistemática actuação, durante 40 anos, para os maiores êxitos, de todos os tempos, da indústria mineira nacional e até internacional?

Qual o currículo desta criatura, a sua competência técnica?

Que critério terá sido seguido para a sua colocação no cargo de Director-Geral de Minas?

Sem disso me ter apercebido, eu tinha sido, afinal, o principal responsável por uma das maiores catástrofes que atingiram a DGGM.

Conforme já referi, eu não me conformava com os graves erros que estavam a ser cometidos no SFM, com a conivência do Director-Geral.

E como não obtinha resposta aos ofícios que endereçava ao Ministro da tutela, tomei a iniciativa de me dirigir, pessoalmente, ao Ministério, na esperança de conseguir audiência.

Não tendo, porém, o Ministro disponibilidade, na sua agenda, encarregou um dos seus Assessores de me receber e ouvir o que eu pretendia dizer.

Mas este Assessor, que era licenciado em Direito, embora tivesse manifestado grande interesse pelas matérias de que eu o ia informando, parecendo até manifestar o desejo de ver corrigidos os clamorosos erros que lhe revelava, teve a hombridade de declarar que, tratando-se de assuntos da especialidade do outro Assessor do Ministro, entendia dever ser ele a apreciar os casos, por mim apresentados, como justificativos da sindicância que insistentemente reclamava.

Como esse Assessor se encontrava ausente, em férias, sugeriu que se aguardasse o seu regresso e se marcasse, então, nova audiência.

Tratando-se de indivíduo licenciado em Geologia, eu até fiquei satisfeito, por acreditar que ele poderia, de facto, entender melhor as razões que me tinham induzido a solicitar a sindicância.

Eu não o conhecia, mas na minha ingenuidade, tomara como axiomáticas, a honestidade e a competência do indivíduo que o Ministro tinha decidido contratar, para o auxiliar em temas das Ciências da Terra.

Não apresentei, consequentemente, qualquer objecção, em aceitá-lo como representante do Ministro, na nova reunião que me foi sugerida e até acrescentei que também desejaria a presença de Soares Carneiro e Múrias de Queiroz, os quais eu tinha denunciado como os principais responsáveis por enormes prejuízos á economia nacional, no domínio dos nossos recursos minerais.

Afinal, mais uma vez, eu me enganara rotundamente, como só tardiamente viria a perceber.

O Geólogo Alcides Rodrigues Pereira estivera colocado na antiga província ultramarina portuguesa de Angola e regressara à Metrópole, após a Revolução de Abril de 1974.

Em Angola, especializara-se em burocracias relacionadas com contratos de investigação de petróleo, por empresas estrangeiras.

Do seu currículo não constava exercício da profissão de Geólogo, em trabalhos, no campo ou no gabinete.

Um Ministro dera-lhe emprego, talvez acreditando, como eu, ser competente na profissão em que se licenciara.

A reunião foi marcada para o dia 10 de Agosto de 1977, tendo comparecido, de facto, ambos os dirigentes que eu indicara.
Muito estranho me pareceu, porém, o atraso no seu início, originado por longo tempo em que aqueles dirigentes se mantiveram em conferência com Alcides.

No decurso da reunião, fui progressivamente notando que algo se passara, naquela conferência, susceptível de influenciar negativamente o seu resultado final.

Alcides não atingia, ou recusava perceber, a real importância dos casos de que lhe ia dando conhecimento, nomeadamente a minha sistemática actividade, aplicando as mais modernas técnicas de prospecção mineira, durante cerca de 30 anos, na Faixa Piritosa Alentejana, da qual resultou a descoberta do gigantesco jazigo de Neves-Corvo.

Ficou completamente indiferente, quando revelei que Soares Carneiro, sem me consultar, resolveu adjudicar a Consórcio em que predominavam entidades estrangeiras, vasta área que englobava a zona onde o SFM detectara a anomalia gravimétrica, que era a assinatura do jazigo, impedindo assim o SFM de concretizar o êxito, que tão laboriosamente tinha preparado, com enormíssimo prejuízo para a economia nacional.

Durante a reunião, descrevi os factos justificativos da sindicância e entreguei-lhe, a título devolutivo (que afinal, não respeitou, apesar de lhe ter dito que alguns documentos eram originais) abundante documentação comprovativa de tais factos, para que a pudesse analisar mais calmamente.

Constatando que Alcides realmente não se comportava como técnico, mas apenas como burocrata, que realmente era, tive mesmo de lhe chamar a atenção para o facto de eu ter concordado com a sua presença, em representação do Ministro, por ele ser licenciado em ser Geologia!

Resultou óbvio que na longa conferência com Soares Carneiro e Múrias de Queiroz, Alcides ficara ciente da atitude que lhe conviria assumir, para seu proveito pessoal.

“O País que se lixasse!”, como diria um governante dos tempos actuais!

Da reunião acabaria por resultar, apenas, o extraordinário imprevisto, a que aludi: a nomeação de Alcides Rodrigues Pereira para o cargo de Subdirector-geral!!!!.

Soares Carneiro, velha raposa, ciente da facilidade com que muitas pessoas se deixam subornar, teve a habilidade de, uma vez mais, usar do seu poder absoluto, oferecendo a Alcides um dos lugares de Subdirector-geral, recentemente criados na DGGM, para compensar a atitude, a que Alcides se comprometesse, de não dar qualquer seguimento à sindicância à DGGM.