domingo, 4 de novembro de 2012

207 – O regresso ao tema do “Novo Plano Mineiro Nacional”


Após oportuna interrupção, retomo a minha análise crítica à Resolução de um Conselho de Ministros que exigia a apresentação, em 1984, de um “Novo Plano Mineiro Nacional”
Conforme já revelei, não obstante terem sido numerosos os técnicos distraídos das suas funções normais, para produzirem o Plano, este não apareceu.

Repetiu-se o “fiasco” de 1975, quando um membro do Governo dessa data, que de minas nada entendia, também se propunha promover a “dinamização da indústria mineira” (Ver post N.º 79).
Mais uma vez “A montanha nem um rato pariu”!
Não era de surpreender que tais Planos abortassem, pois da sua elaboração tinham sido encarregados, sobretudo, os principais responsáveis pela crise que se pretendia combater.

É elucidativo que, na DGGM, em ambos os Planos, tenha sido dispensada a minha participação, não obstante eu manter, em conformidade com Orgânica em vigor, a responsabilidade pelas actividades de prospecção mineira do SFM, em todo o território metropolitano nacional

Dentre as 22 monografias que aqueles distinguidos funcionários produziram, para a preparação do Plano, teve a honra de publicação, no Boletim de Minas, a que tem por título “A prospecção mineira em Portugal”, da autoria do Geólogo José Goinhas.

É desta monografia que tenho vindo a ocupar-me, desde o post N.º 178.

Vale a pena analisar melhor quem era o autor deste documento, qual o seu passado em prospecção mineira, que o tenha creditado para escrever sobre o tema.

José Goinhas tinha sido incorporado, em 1967, na 1.ª Brigada de Prospecção do SFM, para participar nas investigações, que estavam em curso, sob minha direcção, na Faixa Magnetítica e Zincífera Alentejana.

A Geologia Mineira era, então, uma área em que os Geólogos da DGGM demonstravam grande ignorância.

São bem elucidativos os casos, que citei, de Guadramil, Três Minas, Talhadas, Barbadalhos e muitos outros no Norte do País; e os casos das minas de ferro de Montemor-o-Novo, da Faixa Magnetítica, da Região de Cercal – Odemira, da Faixa Piritosa, na zona Sul.

Quando o sector da Geologia ficou sob a minha responsabilidade, um dos principais problemas que tive de enfrentar, foi providenciar no sentido de os Geólogos passarem a dar cumprimento, de modo eficaz, às tarefas que lhes competiam, no âmbito das investigações mineiras.

José Goinhas beneficiou, para esse efeito, da prolongada presença, que lhe proporcionei, ao serviço de empresa mineira especializada em prospecção e exploração de jazigos de zinco, e também de bolsa de estudo em Universidade dos Estados Unidos. (Ver posts N.ºs 27 e 188)

Todavia, em vez de aplicar, no terreno, com afinco e brio profissional, os conhecimentos de Geologia Mineira que era suposto ter adquirido, preferiu manter-se sentado à secretária, no seu gabinete, pouco se deslocando ao campo e, consequentemente, pouco progresso introduzindo nas investigações que estavam em curso.

Desrespeitando as minhas instruções, não efectuou o exame mais completo das sondagens que tinham sido efectuadas na área de Algares de Portel, de modo a possibilitar melhor definição da estrutura geológica onde se encaixa a formação mineralizada.

Era norma instituída, nos departamentos que dirigi, submeter a apreciação superior relatórios sobre as fases de prospecção, quando estas se considerassem concluídas, ou suficientemente avançadas, para que se tornasse conveniente prestar informação mais completa, que a contida nos relatórios periódicos.

Estes relatórios, mais pormenorizados, eram preparados para publicação, visando, deste modo, prestar contas ao País das verbas despendidas nos estudos realizados.

Tinha sido em obediência a esta disciplina que eu próprio apresentara, entre vários outros, os relatórios sobre “Prospecção de pirites no Baixo Alentejo” sobre os “Jazigos ferro-manganíferos de Cercal – Odemira”, sobre o “jazigo de cobre, chumbo e zinco do Torgal” sobre as “Formações zincíferas da Serra da Preguiça”, sobre a “Mina de cobre da Crugeira”, sobre a “Mina de ferro da Preguiça N.º 6”.

Enquanto actuou na minha directa dependência, Goinhas foi sucessivamente protelando a contribuição que lhe competia, para poderem ser concluídos os relatórios sobre avançadas fases de estudo, nas zonas de Vale de Vargo, Algares de Portel e Vale de Pães da Faixa Magnetítica e Zincífera.

Acabou por conseguir libertar-se deste encargo, em 1975, quando deixou de me estar hierarquicamente subordinado, após o êxito de documento traiçoeiro, que subscreveu, desejado ou até aconselhado por dirigentes que sabia serem corruptos e incompetentes, no qual era exigido o meu afastamento da 1.ª Brigada de Prospecção, que era uma obra de minha exclusiva autoria, em cuja criação eu muito me havia empenhado. (Ver posts N.ºs 81 a 91).

No maior escândalo ocorrido na DGGM, que foi o “tsunami de assaltos” para ocupação das categorias directivas instituídas pelo Decreto-lei N.º 548/77, em que currículos negativos foram preferidos aos positivos. José Goinhas conseguiu ser nomeado Director de Serviço, sem funções definidas, tal como acontecera na maioria das outras nomeações.

É clandestinamente que surge como detentor do pelouro da Prospecção, porquanto não chegou ao meu conhecimento Ordem de Serviço a tal respeito.

A realidade é que a Orgânica de 1964, se mantinha em pleno vigor e eu continuava a exercer a chefia efectiva da 2.ª Brigada de Prospecção do Serviço de Fomento Mineiro e das suas Secções de Caminha e Talhadas, e me mantinha “provisoriamente” afastado da 1.ª Brigada de Prospecção, aguardando inquérito demonstrativo das monstruosas acusações de que tinha sido alvo, o qual foi deliberadamente adiado até cair no esquecimento.

Dava-se, assim, a curiosa circunstância de a Prospecção Mineira ter dois Chefes!!:
Um, real, que era eu;
Outro, fictício, que era José Goinhas, assim denominado, apenas para justificar a confortável remuneração, que passou a auferir.

A 1.ª Brigada de Prospecção, não terá colocado obstáculo a esta simbólica chefia, pois se encontrava já em processo de desagregação.
De facto, Delfim de Carvalho tinha sido destacado para Lisboa, como Subdirector-Geral (!), para dirigir os Serviços Geológicos (!).
Vítor Borralho, tinha sido nomeado ou estava em vias de nomeação para Administrador de Minas de Aljustrel, com base nas suas oportunistas ideias políticas revolucionárias.
O núcleo fantasma de Coimbra, praticamente sem actividade, onde o perverso José Viegas tinha conseguido ser nomeado Chefe de Divisão, também não se terá oposto a essa chefia, que até lhe agradaria.

Goinhas não teve, porém, coragem para se apresentar como meu superior hierárquico, não ousando interferir nos estudos que eu orientava, apesar de saber que teria o apoio do Director Jorge Gouveia.
Tinha conseguido melhor remuneração e isso era o que verdadeiramente lhe interessava. As “vastas e delicadas tarefas da 1.ª Brigada de Prospecção”, as quais, no seu entendimento eu muito prejudicara, deixaram de o preocupar.
Preparava-se até, para mais altos voos. Esteve indigitado para vice-governador civil de Beja e até para Director-Geral de Minas (!!).
Não conseguiu, porém, qualquer destes cargos.
Como Vítor Borralho, após reunião com Ministro, fora rejeitado para Governador - Civil, José Goinhas, que o acompanharia, perdeu igualmente a esperada benesse.

E Alcides Pereira reunia melhores condições, em matéria de ignorância no âmbito mineiro, para lhe ser dada preferência, quando o cargo de Director-Geral de Minas ficou vago.
Mas Goinhas acabaria por não lhe ficar atrás. Conseguiria melhor cargo. Viria a ser nomeado Director-Geral dos Serviços de Prospecção e Exploração de Petróleo, pois além de reunir as ideais condições de elevada ignorância em matéria de petróleos, tratava-se de um departamento com actividade praticamente nula (Ver posts N.ºs 88 e 118).
Goinhas tinha plena consciência de não vir a ser incomodado a prestar a contribuição que lhe competia e que continuava em falta, para os relatórios que mencionei serem submetidos a apreciação superior.

Os novos dirigentes nem sequer se apercebiam desta quebra de disciplina, tão ocupados se encontravam com problemas de ”lana caprina”!

Foi assim que Goinhas apareceu com o encargo de preparar a monografia sobre “A prospecção mineira em Portugal”, que tenho vindo a comentar.

É óbvio que, José Goinhas, se nem das tarefas que lhe tinham sido distribuídas conseguiu desembaraçar-se, quando a 1.ª Brigada de Prospecção ainda actuava disciplinadamente, apesar das condições extraordinárias que lhe foram generosamente oferecidas, não seria de esperar que se desembaraçasse de matéria que lhe era estranha, pois de técnicas de mineralometria, geofísica, geoquímica e trabalhos mineiros muito escassos eram os seus conhecimentos.
É certo que tinha estado presente nas reuniões periódicas, sob minha direcção, nas quais se discutiam os programas a cumprir pela 1.ª Brigada de Prospecção, mas pelo que só tardiamente me apercebi, pouco assimilou das lições que eu nelas prodigalizava, pois cometeu erros gravíssimos, desde que deixou de me estar subordinado.

A Comissão Editorial do Boletim de Minas tornou-se sua cúmplice, por não ter evitado induzir em mais erros os incautos leitores de publicação oficial.
Analisando, porém, a composição desta Comissão, noto que os seus elementos constitutivos inspiravam confiança idêntica à que merecia Goinhas, pois tinham ascendido aos cargos em que se instalaram, no mesmo “tsunami de assaltos”, a que me referi.

Do seu documento sobre a Prospecção Mineira, exclusivamente apoiado em documentação, uma primeira conclusão que se extrai, é a defeituosa selecção dos artigos mencionados em extensa bibliografia, pois, na sua maioria, são descabidos para o objectivo em vista, tendo sido omitidos quase todos os que seriam fundamentais.
Deduz-se também que não leu ou, se leu, interpretou erradamente os raros que realmente tinham interesse.

Em Portugal, não é possível abordar, com seriedade, o tema da prospecção mineira, sem realçar o papel importantíssimo do Serviço de Fomento Mineiro (SFM), no inventário dos recursos minerais do País.

A instituição, no âmbito do Estado, de um Organismo com aquela finalidade, foi até salientada, a nível internacional.
Isso consta, por exemplo, da publicação da OCDE, “La prospeccion minerale en Europe”, da autoria de James Nc Divitt, editada em 1961.

Dela destaco a seguinte passagem:
“L’Espagne, la France, la Grèce, la Norvège, le Portugal, la Suède et la Turquie possèdent des services oficels qui s´occupent directement de prospection et dont les activités semblent augmentar, plutôt que diminuir”

“L’interêt qui portent les gouvernements à la mise en valeur des richesses minerals est loin d’être un fait nouveau; dans bien des pays européens, cést un phénomene déjà ancien`; mais il semble qu’à l’époque moderne, il se confirme et s’étende, pour des raisons d’ailleurs actuelles.”

Antes da criação do SFM, algumas empresas privadas estrangeiras, tinham realizado, sobretudo na Faixa Piritosa Alentejana, estudos nesse âmbito, os quais porém, se restringiam, a pequenas áreas que não excediam ou pouco excediam as áreas das respectivas concessões.

Foi o SFM que passou a proceder à investigação sistemática da riqueza mineira do País.

No seu período inicial, esta investigação não foi isenta de erros, por vezes graves, que eram devidos à deficiente preparação académica dos técnicos que dela foram encarregados.
Todavia, no decurso do tempo, alguns sectores do SFM foram progressivamente criando experiência nas diversas técnicas de prospecção, conseguindo notáveis êxitos.

O SFM, tornou-se, então, uma verdadeira Escola de Prospecção Mineira, onde até vinham estagiar técnicos, sobretudo contratados pelo Ministério do Ultramar.

Nenhuma das Universidades do País dedicava à Prospecção Mineira, a devida atenção, até porque não havia docentes habilitados a reger a cadeira.

Lembro que em 1961 (Ver post N.º 4), quando acompanhei o Professor Robert Woodtly da Universidade de Lausanne à Junta de Energia Nuclear em Lisboa, ao Instituto Superior Técnico, à Faculdade de Engenharia do Porto e à Direcção do SFM do Porto, para conhecer o interesse dos Organismos portugueses onde se ensinava ou praticava a prospecção mineira, em aproveitar a oferta de colaboração da OCDE na aplicação de métodos modernos de prospecção, só encontrei franca receptividade na Direcção-Geral dos Serviços de Prospecção da Junta de Energia Nuclear.

Surpreendentemente, até o Engenheiro Guimarães dos Santos que, nessa data, ocupava o cargo de Director do SFM, declarou não haver, no Norte do País, matéria justificativa da aplicação desses métodos!!! (Ver post N.º 4)

Foi só a partir de 1970, que uma Universidade do País passou a inserir no elenco do Curso de Geologia, uma disciplina de Prospecção Mineira.

Nessa data, como referi, já um sector bem definido do SFM tinha conseguido introduzir, para uso corrente, as variadas técnicas de Prospecção Geológica, Geofísica e Geoquímica, e tinha obtido, através da sua criteriosa aplicação, alguns notáveis sucessos.

Apercebendo-se deste facto, o Professor Miguel Montenegro de Andrade, que então dirigia o Departamento de Geologia da Faculdade de Ciências do Porto, fez-me convite para reger cadeira sobre aquela matéria.

Nessa época, o Director-Geral, Soares Carneiro encontrava-se ainda na sua fase positiva.
Não só não criou qualquer obstáculo à colaboração que era solicitada, como considerou justificadas facilidades, quanto a horários, para que de tão honroso convite, resultasse uma boa preparação dos futuros Geólogos, em matéria de tanto interesse para o desenvolvimento da nossa indústria mineira. (Ver post N.º 160).
Alguns anos mais tarde, a Faculdade de Engenharia seguiu o exemplo, convidando-me também para lá reger idêntica cadeira.
Consegui prestar o auxílio que me fora pedido, juntando os alunos de Ciências e de Engenharia, nas mesmas aulas. (Ver post N:º1)

Ocupava, então, o cargo de Director-Geral, o Geólogo Alcides Pereira.

Este novo Director - Geral, tendo sido informado de que eu acumulava funções de professor, em dois estabelecimentos de ensino superior, ficou preocupadíssimo com as remunerações excessivas que eu estaria auferindo.
Não consentiria que tamanha ilegalidade se praticasse na DGGM, que era um “poço de virtudes”, de que ele era o exemplo mais representativo!
Logo decidiu certificar-se se era real essa irregularidade, enviando ofício ao Reitor da Universidade do Porto.

O Reitor, ficou deveras surpreendido, pois até tinha conhecimento de que, em data anterior, Alcides Pereira declarara publicamente o seu firme propósito de prestar toda a colaboração às Universidades, para que estas produzissem os bons técnicos de que o País necessitava. (Ver post N.º 160)
Alcides deve ter ficado profundamente decepcionado quando recebeu a informação de que a minha colaboração à Faculdade de Engenharia era prestada sem remuneração alguma e, acrescento agora, até com despesas não despiciendas.

Ao sucesso da introdução da disciplina de “Prospecção Mineira” nos Cursos de Geologia e de Engenharia de Minas da Universidade do Porto se ficou devendo a preferência das empresas mineiras que cumpriam contratos de prospecção, em áreas do País, em contratar os técnicos licenciados por esta Universidade. (Ver post N.º 135).

É, pois, indesculpável o intencional apagamento, no texto de José Goinhas, da acção do Serviço de Fomento Mineiro no âmbito da prospecção.

Goinhas nem sequer menciona o fundamental Decreto-lei de criação do Serviço de Fomento Mineiro, nem refere o facto de este Serviço, no cumprimento das suas atribuições, submeter anualmente, a aprovação ministerial, os seus Planos de Trabalho.

No documento são feitas numerosas citações de artigos de “cronistas”, entre os quais se contam Delfim de Carvalho e ele-próprio, mas omitem-se os verdadeiros autores dos estudos que foram copiados para as suas “crónicas.
Foram usados, sobretudo, os habitualmente denominados “relatórios internos”, não publicados, geralmente sem menção dos seus autores.

Mas Goinhas não se lembrou de consultar os relatórios anuais do SFM, que eram publicados em “Estudos Notas e Trabalhos de SFM”, e que deixaram de ser, quando Múrias de Queiroz foi nomeado Director deste Organismo

Embora tenha sido este Organismo de Estado que o acolheu, nele depositando grandes esperanças no aperfeiçoamento de estudos que há muitos anos se encontravam em curso, com insuficiente apoio geológico, Goinhas não foi capaz de perceber o alcance que teria para a economia nacional um Serviço devidamente estruturado para fazer o correcto inventário dos recursos minerais do País e para promover o seu racional aproveitamento.

Só timidamente menciona o Serviço de Fomento Mineiro.
Prefere atribuir genericamente à DGGM a organização que levou à constituição de um valioso arquivo técnico, que não só serviu de base aos êxitos conseguidos, mas também suscitou o interesse de empresas privadas para dar continuidade aos estudos da DGGM.

A realidade, que ele tinha obrigação de conhecer, visto que participava nas reuniões de trabalho periodicamente realizadas, na 1.ª Brigada de Prospecção, em Beja, sob a minha direcção, onde todos os temas de prospecção eram abertamente discutidos, era, porém, bem diferente do que ele apresentava.
Devia ter plena consciência de que “a experiência no campo da prospecção mineira” tinha sido adquirida no SFM e não em quaisquer outro departamento da DGGM e que a constituição de “um património notável de informação e conhecimento da problemática dos recursos minerais do Pais” era obra excusivamente minha.

Continua …