segunda-feira, 15 de agosto de 2011

184 - Nova discussão sobre Plano Mineiro Nacional. Continuação 8


Nos últimos posts, tenho vindo a analisar um documento que o Geólogo José Goinhas apresentou, com a intenção de contribuir para a elaboração de um “Plano Mineiro Nacional” anunciado pelo Governo, para solucionar graves problemas com que se debatia a nossa indústria mineira.

Este documento, a que Goinhas deu o título de “A prospecção mineira em Portugal - Áreas potenciais de aplicação de projectos” teve honras de ser seleccionado para publicação no Boletim de Minas.

Todavia, como venho demonstrando, a sua versão da história que se propôs narrar, está eivada de lapsos, que desvalorizam as actividades dos sectores produtivos do Serviço de Fomento Mineiro, responsáveis pelos maiores sucessos na indústria mineira do País.

Goinhas, que não teve participação alguma, na maior parte das matérias constantes das suas descrições, também não teve o elementar cuidado de usar apenas fontes de informação credíveis, rejeitando as fontes tendenciosas, que tinha obrigação de saber caracterizar.
Nem se deu ao trabalho de consultar a documentação adequada, que facilmente encontraria nos arquivos da Brigada do Sul e do 1.º Serviço de Prospecção, alguma até publicada!

Sobre a descoberta de Neves – Corvo, cujos antecedentes, referidos no post anterior, foram ignorados na narrativa de Goinhas, intencionalmente ou não, vou agora descrever os factos ocorridos, durante a vigência do contrato com a Associação, repetindo algo do que já consta dos posts N.º 37 a 43.
Nos termos contratuais, foi facultada à Associação constituída pela Sociedade Mineira de Santiago, pelo BRGM (Bureau de Recherches Géologiques et Minières, o equivalente francês do SFM) e pela Sociedade Mineira e Metalúrgica de Peñarroya Portuguesa Limitada, toda a vasta documentação, respeitante à área de 4 000 km2 que lhe tinha sido outorgada, constante dos arquivos do SFM e resultante não só e sobretudo das investigações do SFM, mas também dos estudos de empresas privadas.

Embora tenha chamado a atenção da Associação para a anomalia gravimétrica que estava a evidenciar-se vigorosamente, em zona que eu havia classificado como especialmente favorável à ocorrência de mineralizações cupríferas (Ver post anterior), na realidade isso era perfeitamente dispensável.
De facto, além de não fazermos segredo dos resultados que íamos conseguindo, era com satisfação que os dávamos a conhecer aos técnicos de qualquer das empresas envolvidas em estudos da mesma natureza.
Considerávamos benéficas, para ambas as partes, as discussões técnicas que daí advinham.
O facto de todas as nossas áreas de actuação estarem, nos termos legais, devidamente protegidas, através da sua prévia cativação para o Estado, era garantia de que tais resultados não seriam alvo de ilegítima apropriação.

A Associação estava, pois, bem ao corrente da revelação dessa anomalia e terá sido tal conhecimento que desencadeou as suas diligências para obter os direitos de prospecção, com a provável conivência do representante da DGGM junto da Sociedade Mineira de Santiago.

O facto de participar, na composição da Associação, um Organismo estatal francês altamente prestigiado (o BRGM, equivalente ao SFM português) fez-me esperar que daí adviriam consideráveis progressos nos estudos da Faixa Piritosa Alentejana.

A Associação, na posse da documentação a que acima aludi, passou, de imediato, á aplicação da técnica gravimétrica, usando os seus próprios meios e rapidamente acabou a definição da anomalia, que o SFM tinha evidenciado, já em grande parte da sua extensão.

Sem perda de tempo, deu início à sondagem N.º 1, que seria a primeira de uma série destinada a definir as dimensões e demais características do jazigo que era suposto ser a causa da anomalia.

Todavia, aconteceu o inesperado! A sondagem atingira a profundidade de 200 m e tinha já ultrapassando, na série estratigráfica, o nível onde o jazigo deveria ser encontrado.

Surpreendentemente, a Associação desistiu de continuar a investigar a causa de tão extraordinária e bem saliente anomalia, que atingia a amplitude de 1,4 mgal !!!

Era sabido que anomalias podem ser originadas por causas diferentes de jazigos minerais. Rochas básicas têm densidades suficientemente contrastantes com outras rochas ocorrentes no mesmo ambiente geológico, para provocarem anomalias semelhantes às ocasionadas por jazigos de minérios densos.

Todavia, teria sido elementar detectar contraste que explicasse a anomalia que começara a ser investigada pela sondagem N.º 1.
Mas isso não foi feito!

Eu ainda perguntei se a Associação considerava explicada a anomalia. Foi-me respondido que, efectivamente, não tinha sido detectada a sua causa ... mas que, tendo sido ultrapassado o horizonte onde o jazigo poderia ter sido encontrado, a anomalia teria outra origem!!!

É oportuno aqui registar que, se a área não tivesse sido adjudicada, continuando portanto em investigação pelo SFM, os procedimentos teriam sido diferentes.

Encontrar explicação para a anomalia teria sido considerado fundamental.

Desde a data em que me foi confiada a direcção do departamento de Prospecção Mineira do SFM, era rotina estabelecida a determinação sistemática das densidades dos testemunhos das sondagens, quando estas se baseavam em dados da gravimetria ou das susceptibilidades magnéticas, quando se baseavam em anomalias magnéticas.

Os testemunhos teriam, obrigatoriamente, que revelar contrastes daqueles parâmetros, suficientemente expressivos para justificarem as anomalias em investigação.
No caso de não revelarem tal contraste, seriam reanalisados todos os trabalhos que haviam conduzido à definição dessas anomalias, a fim de se detectar onde se tinham cometido erros.

Posso citar 4 casos, em que houve que proceder a tais reanálises.

O primeiro aconteceu, quando a sondagem N.º 14, na zona de Algares de Portel, baseada em anomalia gravimétrica, não atravessou formação geológica com densidade que justificasse a anomalia. Reanalisadas as correcções às observações no terreno, foram detectados erros que mostraram ser espúria a anomalia.

O segundo ocorreu, quando se investigava ténue anomalia gravimétrica, que acabou por se revelar como a assinatura do jazigo da Estação, em Aljustrel.
Sondagem prevista para encontrar, à profundidade de 350 metros, a massa de pirite responsável pela anomalia, deparou com grandes dificuldades no seu avanço, talvez devido a alguma inexperiência do pessoal sondador, acontecendo que, tendo atingido, a profundidade de 328 metros, em vez de avançar, ia recuando, durante sucessivos meses, devido a constantes desmoronamentos.
Do Director-Geral, por intermédio do seu adjunto, recebi fortes pressões no sentido de dar o furo por terminado, perante as despesas que estava a ocasionar, as quais classificava de injustificadas, pois punha em dúvida a existência de jazigo, a tão grande profundidade.
A minha reacção foi no sentido de confiar a execução do furo a entidade que conseguisse cumprir o projecto, caso a Brigada de Sondagens do SFM não fosse capaz de superar a dificuldade, uma vez que ainda não tinha sido detectada a causa da anomalia gravimétrica.
As densidades dos testemunhos, que sistematicamente íamos determinando, com uso de equipamento que concebi para esse efeito, não permitiam explicar a anomalia.
Felizmente a minha posição nesta matéria foi respeitada e a Brigada de Sondagens conseguiu finalmente fazer avançar o furo.
Após três meses de avanços e recuos, a sondagem penetrou em massa de pirite complexa aos 350,3 m e nela continuou, na extensão de 75 m.

O terceiro caso aconteceu na região de Cuba – Vidigueira. Uma sondagem baseada em forte anomalia magnética não atravessou, até à profundidade calculada, formação que justificasse tal anomalia. Neste caso, tinha havido erro de implantação da sondagem!

O quarto caso aconteceu na Região de Cercal – Odemira, onde uma sondagem baseada em discreta anomalia gravimétrica, assinalada em local considerado favorável à ocorrência de concentrações de sulfuretos idênticas as da Faixa Piritosa, atingiu a profundidade de 573 m, que era o limite da capacidade da sonda disponível, sem ter encontrado formação densa que justificasse a anomalia.
Este caso continua, portanto, por esclarecer.
Mineralização cuprífera disseminada, que foi encontrada a grande profundidade, não contribui suficientemente para o contraste densitário necessário para explicar a anomalia.

Era, pois, evidente que, se a campanha de prospecção do SFM, na zona de 100 km2 seleccionada para investigação, na Região de Castro Verde – Panóias, não tivesse sido interrompida, por arbitrária decisão do Director – Geral, contrariando disposições repetidamente inseridas em diplomas legais, a descoberta do jazigo de Neves – Corvo teria ocorrido, no ano de 1972, como consequência natural da metodologia adoptada pelo SFM.

A Associação, adoptando metodologia diferente, em que as suas interpretações geológicas constituíam o principal suporte para a passagem à fase de sondagens e os dados fornecidos pelas técnicas geofísicas eram pouco valorizados, andou, durante cerca de 5 anos “perdida” sobretudo na região de Mértola, sem quaisquer resultados positivos.

Entretanto, tinha ocorrido a Revolução de 25 Abril de 1974 e, como já revelei, alguns oportunistas, entre os quais se destacava o Geólogo Goinhas, usando no pior sentido as liberdades conquistadas, conseguiram afastar-me da direcção dos estudos no Sul do País.

Deixei, portanto, de poder acompanhar, de perto, as actividades da Associação.

Mas tive, casualmente conhecimento, em 5 de Abril de 1977, por curta conversa com o Geólogo Xavier Leca do BRGM, que encontrara na Universidade de Aveiro, quando ambos ali nos deslocamos para assistir a palestras sobre tectónica de placas, que a Associação decidira regressar à zona da anomalia gravimétrica, tendo já em curso a sondagem N.º 2.
De imediato lhe dei os parabéns, acrescentando que, se a área regressasse para estudo pelo SFM, uma vez que a validade do contrato estava prestes a expirar, e eu ainda estivesse nas funções de Chefe da 1.ª Brigada de Prospecção, era para essa zona que eu voltaria imediatamente”.

Em fins de Maio de 1977, recebi telefonemas dos Geólogos Nabais Conde e Xavier Leca, do Quadro de Técnicos da Associação, informando que a sondagem N.º 2 tinha penetrado em jazigo de pirite complexa, estando nessa data já com 20 metros em minério rico em calcopirite.

Às felicitações que a ambos dirigi, correspondeu Leca realçando o mérito da minha contribuição e lembrando a conversa havida em Aveiro. Classificou-me, então como “pai do jazigo”.

Nabais Conde mostrava particular interesse em conhecer qual a intervenção dos Geólogos do SFM na selecção da zona de 100 km2, para investigação por gravimetria, fazendo-me suspeitar de que eles (Delfim de Carvalho, José Goinhas e Vítor Oliveira) estariam a apresentar-se como os grandes decisores em tal matéria, quando a triste realidade era não só não terem tido aí a mínima intervenção, mas terem-se até tornado os principais responsáveis pela grande decadência por que o SFM então passava.

Conclusão: Os “ESFORÇOS” da Associação, que Goinhas tanto realça, por “complementarem” os que o SFM foi obrigado a suspender, eram bem dispensáveis, porque afinal eles se traduziram em atraso de 5 anos na concretização da descoberta!!

Continua …


sexta-feira, 12 de agosto de 2011

183 - Nova discussão sobre Plano Mineiro Nacional. Continuação 7


Continuo a analisar a grotesca versão da história da “Prospecção Mineira em Portugal” apresentada pelo Geólogo José Goinhas, com a qual pretendia contribuir para um ambicioso “Plano Mineiro Nacional” anunciado pelo IX Governo Constitucional.

Ainda a respeito do tema 5, sobre a aplicação de técnicas geofísicas e geoquímicas à prospecção mineira, impõe-se completo esclarecimento das circunstâncias em que ocorreu a descoberta do jazigo de Neves – Corvo.

Goinhas, referindo-se a esta descoberta, começa por apresentá-la como exemplo da “complementaridade de esforços, no domínio da prospecção mineira, entre os serviços oficiais e as empresas”, mas acaba por considerá-la um êxito conseguido em 1977, pela Associação, que se constituíra, em 1972, entre a Sociedade Mineira de Santiago e as instituições francesas, “Bureau de Recherches Géologiques et Minières” e “Société Minière et Métalurgique de Penarroya”.

Algumas das circunstâncias, em que a descoberta ocorreu, estão descritas nos posts N.º 37 a 43.

Agora, quero chamar a atenção para a flagrante semelhança dos acontecimentos que culminaram com as descobertas dos jazigos de Gavião e Neves – Corvo, a qual não é assinalada pelo “historiador”.

Se Goinhas não fosse personagem ingrato e traiçoeiro, teria concluído, ao chegar a este ponto da sua narrativa, que o Plano Mineiro anunciado pelo Governo, além de injustificado, representava grave desconsideração pelos técnicos do SFM, aos quais o País ficou devendo um notabilíssimo sucesso científico, que causou admiração, nas instâncias mineiras nacionais e internacionais.

Goinhas que, por minha proposta, conseguira ingressar no SFM, tinha funções bem definidas, enquadradas em Planos de Trabalhos, anualmente submetidos, a apreciação do Governo, que sempre tinham merecido aprovação.

Se, naquela época, se notava declínio na indústria mineira nacional, Goinhas ao fazer a sua investigação histórica, teria obviamente que chegar à conclusão de que tamanho declínio não tinha origem na falta de Plano, pois, com os Planos normais do SFM, se tinha obtido uma das maiores descobertas, de todos os tempos, na nossa indústria mineira.

Goinhas, que tinha começado por restringir a sua história ao quinquénio 1980-84, acabou por dar maior relevo aos progressos em períodos anteriores, para atenuar a apreciação negativa originada pelos insucessos naquele quinquénio.

Mas não aprofundou as investigações sobre as causas de tais progressos, para não ter que reconhecer as suas grandes responsabilidades no declínio nos períodos seguintes, que levara o Governo a tentar combatê-lo, através de novo Plano.

As suas curtas referências a Neves – Corvo só como puro eufemismo podem ser interpretadas.

De facto, a “complementaridade de esforços” entre os “serviços oficiais” e as empresas privadas é uma ultrajante maneira de desvalorizar o “esforço” de um serviço oficial que tinha nome e se chamava SERVIÇO DE FOMENTO MINEIRO.

Da parte das empresas privadas, não só não houve “esforço”, pois a descoberta estava praticamente concretizada pelo SFM, como houve muito deficiente continuidade do real “esforço” do SFM, com o consequente atraso de 5 anos (!) na descoberta.

A ser verdade o que o “cronista” Delfim de Carvalho descreve, no seu artigo publicado pela “Economic Geology”, terá sido até por um golpe de sorte que a Associação encontrou o jazigo!!!

De facto, conforme ficou registado no meu post N.º 41, escreveu Delfim de Carvalho:
“On the evening before the mineralisation was encountered, the geologist at the drill site, in despair, nearly decided to terminate the drill hole”.

E, no comentário que enviei para a “Economic Geology”, que não chegou a ser publicado, escrevi eu:

“From the history narrated by Delfim de Carvalho, one could thus arrive at the conclusion that the discovery of Neves – Corvo deposit was accidental, and that if the Association had not achieved it, the deposit would still remain untouched”

A adjudicação de vasta área à Associação a que acima me referi, para prospecção mineira, na qual veio a ser encontrado o jazigo de Neves – Corvo, resultou de factos ainda mais graves do que aqueles que descrevi, relativamente à descoberta do jazigo do Gavião.

Naquela área, de cerca de 4 000 km2, que abrangia as grandes manchas de rochas vulcânicas de Castro Verde – Almodôvar, anteriormente evidenciadas pelos levantamentos geológicos do SFM (Ver post N.º 7), a Companhia canadiana “Mining Explorations (International)” (MEI) tinha realizado, por contrato com o Estado, celebrado em 1966, diversos trabalhos, visando a descoberta de jazigos de pirites complexas.

MEI privilegiava a investigação por sondagens, com base nos seus estudos geológicos e em alguma gravimetria.
Muitas vezes aconselhei a Companhia, a fazer mais amplo uso da gravimetria, antes de passar à execução de sondagens (Ver post N.º 32).
Chamei, por exemplo, a atenção para a escassa aplicação desta promissora técnica, naquela vasta mancha de rochas vulcânicas de Castro Verde – Panoias, que tem uma extensão superior a 30 km e uma largura que atinge 10 km.
A Companhia não se mostrou, porém, sensível aos meus conselhos e lamentavelmente, deixou terminar, em 1971, o prazo de validade do contrato, sem ter conseguido qualquer êxito.

No post N.º 33, revelei que, após MEI ter abandonado a área que lhe esteve adjudicada, o Serviço de Prospecção do SFM, sob minha direcção, deu início a prospecção gravimétrica de uma parcela de cerca de 100 km2, abrangendo a Mina do Cerro do Algaré e outras ocorrências cupríferas que tinham originado pequenas explorações mineiras, em épocas passadas.

Quando esta campanha se encontrava em curso e já estava revelada grande parte da anomalia que viria a dar origem à descoberta do jazigo de Neves – Corvo, fui novamente surpreendido pela celebração de contrato adjudicando a totalidade da área anteriormente atribuída a MEI, à Associação a que acima me referi.

De facto, afigurou-se-me muito estranho que, dispondo a Sociedade Mineira de Santiago de duas áreas, uma das quais já com os jazigos de Estação e Gavião a exigirem trabalhos para definição de reservas, a Sociedade pretendesse aumentar a sua área de estudo.
Também muito estranho me parecia que fosse procurar colaboração de entidades estrangeiras, para a realização de estudos perfeitamente ao alcance dos seus técnicos e dos técnicos do SFM, aos quais habitualmente recorria, quando pretendia a aplicação de métodos geofísicos, com realce para a gravimetria, aproveitando a grande experiência que o SFM tinha já adquirido em tal matéria.

Neste caso, o Director-Geral, que costumava ridicularizar os “vectores” com que eu me entretinha, nem esperou pela completa definição da anomalia que estava a evidenciar-se vigorosamente, na zona que eu já tinha assinalado no meu relatório “Prospecção de pirites no Baixo Alentejo”, publicado em 1955, como parecendo constituir uma região cuprífera digna de atenção. (Ver post N.º 11).

Uma vez que o SFM já se tinha desenvolvido na aplicação de variadas técnicas de prospecção, considerava muito insensato continuar a entregar a estrangeiros as nossas riquezas minerais.

Estranhava que o Director-Geral não desse a mínima atenção às minhas recomendações na publicação do SFM a que acima fiz referência, as quais julgo oportuno aqui reproduzir:

“Somos de opinião que o prosseguimento da campanha de prospecção de pirites, para ter a eficácia pretendida, deverá contar com a cooperação efectiva de especialistas em geologia aplicada e prospecção geofísica, integrados na equipa de estudo”

“Todos os estudos a que nos vimos referindo podem e devem, em nosso entender, estar a cargo de técnicos portugueses que hajam, para o efeito, adquirido a necessária especialização, conforme prevê o Decreto-lei de criação do Serviço”.

“A favor deste modo de proceder falam, não só a economia como o próprio interesse no assunto, que não poderá esperar-se de outros superior ao dos nacionais”

Conforme escrevi no post N.º 124, vinham à minha memória os versos de Camões, na última estância do Canto X dos Lusíadas, dirigindo-se ao Rei, a quem dedicava o poema:

“Fazei, Senhor, que nunca os admirados
Alemães, Galos, Ítalos e Ingleses
Possam dizer que são para mandados
Mais que para mandar os Portugueses”


Pareceu-me, pois, muito estranha a precipitação na entrega desta enorme parcela a uma Associação com forte participação de entidades estrangeiras.

A orientação da minha actividade sempre teve em vista respeitar os preceitos consignados nas disposições do Decreto-lei de criação do SFM.

Os técnicos portugueses deveriam, pois, vir progressivamente a encarregar-se, não apenas da prospecção, mas também da exploração dos novos jazigos que viessem a ser revelados e dos procedimentos para o aproveitamento integral dos seus minérios.

A Escola de Aparis seria o local apropriado para a preparação desses técnicos. (Ver post N.º 124)

Continua…

terça-feira, 2 de agosto de 2011

182 - Nova discussão sobre Plano Mineiro Nacional. Continuação 6

Continuo a denunciar os clamorosos erros do Geólogo José Goinhas, na sua narrativa histórica, a que deu a designação de “A prospecção mineira em Portugal. Áreas potenciais de aplicação de projectos” e que apresentou com o objectivo de contribuir para um ambicioso Plano Mineiro Nacional, mas que se revelou não só inútil, como até prejudicial.
Inútil, porque tal Plano, que se não justificava, como já demonstrei, nunca chegou a ser concluído; prejudicial, por ter sido publicada e induzir em erro os leitores do Boletim de Minas

Retomando o tema 5, respeitante á aplicação de métodos geofísicos e geoquímicos à prospecção mineira, vou corrigir a história da descoberta do jazigo do Gavião, que Goinhas atribui à Sociedade Mineira de Santiago.

No post N. 36, tive já oportunidade de revelar que, contrariamente ao afirmado por Goinhas, esta descoberta foi mais um importante êxito do SFM.
A este êxito, me tinha referido, em relatório datado de Março de 1968, nos seguintes termos:

“Na região de Aljustrel, a sul de Rio de Moinhos, já dentro da Bacia Terciária do Sado, registaram-se anomalias gravimétricas que, embora pouco pronunciadas, se revestem de bastante interesse, pelo facto de se localizarem exactamente no prolongamento dos horizontes mineralizados de Feitais - Estação e Moinho – S. João, após a rejeição pela falha de Messejana.”

Recuando no tempo, é justo reconhecer que os técnicos da empresa concessionária das Minas de Aljustrel estavam plenamente conscientes da existência de uma importante falha, de encontro à qual terminava a massa de S, João do Deserto e admitiam, com forte probabilidade, a existência de uma parte rejeitada do jazigo, e que esta hipótese deveria ser investigada, se se tornasse necessário aumentar reservas.

Quando o SFM, surgiu, na região, em 1944, com o seu programa de investigação de toda a Faixa Piritosa Alentejana, a empresa ignorava ainda a grandeza da rejeição horizontal e vertical desta falha, pois a parte rejeitada estava oculta pelos terrenos da denominada Bacia Terciária do Sado.

Foi ao SFM que ficou a dever-se a definição da exacta grandeza da componente horizontal da rejeição provocada por esta falha, cuja real importância foi também evidenciada, em consequência da sua actividade de prospecção.
Quero, no entanto, assinalar que foi em resultado da colaboração dos Serviços Geológicos, por mim solicitada, para estudo dos terrenos da Bacia Terciária do Sado, tendo em vista determinar a profundidade da bacia, que se identificou, pela primeira vez, o filão dolerítico, instalado na grande fractura.
Foi a equipa constituída pelo Geólogo Georges Zbyszewski e Veiga Ferreira que fez esta identificação.
A hipótese de este filão dolerítico se identificar com formação que deu origem a blocos arredondados ocorrentes em Portel e em Odemira foi-me sugerida pelo Professor Mariano Feio que, sendo Engenheiro Geógrafo, era investigador de vasta e diversificada cultura.
A este ilustre Professor, com quem tive frequentes e muito úteis conversas, se ficaram devendo valiosas contribuições para o conhecimento da geologia do Sul do País.
A identificação da falha, na região de Vila Viçosa, onde se manifesta pela rejeição do Silúrico em Ciladas e em Ferreira do Alentejo, onde é assinalada pela rejeição do Devónico em Mombeja, é de minha exclusiva autoria.
A tudo isto é feita referência, no meu artigo sobre “Prospecção de pirites no Baixo Alentejo” publicado em 1955, na Revista do SFM.
Constou-me ter havido quem, posteriormente, tenha reivindicado esta descoberta, ignorando o artigo que citei.

No post N.º 36, mencionei diversos factos muito estranhos, relacionados com a anomalia gravimétrica que é a assinatura do jazigo do Gavião.

O primeiro foi o rápido desaparecimento da parede da Sala das Sessões da DGGM, do mapa que eu lá tinha colocado, durante a sessão da Comissão de Fomento realizada em 27 de Maio de 1968, para pôr em evidência, perante um público seleccionado, um êxito que devia ser considerado muito honroso para a DGGM, na qual o SFM continuava integrado.
Nesse mapa, à escala 1:5000, eu tinha colocado, no alinhamento dos jazigos conhecidos em Aljustrel a anomalia gravimétrica, tendo para esse efeito, cortado com uma tesoura o mapa segundo a falha, com um deslocamento de 3 km, que era exactamente a rejeição confirmada pela gravimetria.

O segundo foi a adjudicação à Sociedade Mineira de Santiago, em 2 de Outubro de 1969, de área envolvente das Minas de Aljustrel que incluía a anomalia do Gavião, a qual se mantinha reservada, para estudo pelo SFM.
Esta adjudicação feita apressadamente, sem meu prévio conhecimento e sem concurso público, como a lei exigia, foi deveras surpreendente, sobretudo tendo em consideração a provável intervenção do Engenheiro adjunto do Director-Geral, J. Costa Almeida, que era o representante da DGGM, nomeado para acompanhar os estudos daquela Sociedade, na Bacia Terciária do Sado e prestar eventualmente colaboração técnica.
Mas, mais estranho ainda, foi o indecoroso comportamento dos técnicos superiores da Sociedade Mineira de Santiago, que corresponderam de modo insultuoso ao honroso convite que lhes foi feito de participarem na redacção de Livro-Guia de Excursão integrada no CHILAGE (Congresso Hispano – Luso Americano de Geologia Económica), que teve lugar em 1971, em Portugal e Espanha.

Neste Livro-Guia, de que só tomei conhecimento após a sua publicação, tive a surpresa de ler que os levantamentos gravimétricos e magnéticos executados pelo Serviço de Fomento Mineiro não trouxeram grande achega para o conhecimento do rejeito dos jazigos de Aljustrel.
O despudor destes técnicos, com os quais, aliás, sempre tinha mantido as melhores relações, foi ao ponto de declararem improvável a descoberta do jazigo do Gavião pela aplicação de métodos geofísicos e geoquímicos.
Custa a acreditar que técnicos, de reconhecida competência, tenham perdido a dignidade, ao afirmarem que, somente a aplicação dos conhecimentos de estratigrafia e da estrutura geológica de Aljustrel poderia ter conduzido à descoberta do jazigo do Gavião, julgando, com esta traiçoeira atitude, aumentar o seu prestigio.
Não cheguei a perguntar-lhes porque localizaram as sondagens que efectuaram, precisamente no local da anomalia gravimétrica, até porque as relações pessoais, que eram francas e cordiais, passaram ser formais e apenas as indispensáveis.
O Eng.º Costa Almeida ainda tentou falar comigo a este respeito, parecendo-me ter reconhecido a deslealdade dos técnicos da Sociedade Mineira de Santiago.
Mas eu, que já não estava a apreciar comportamentos pouco recomendáveis, que passou a adoptar este colega, de quem fora amigo durante mais de 30 anos, desde os bancos do Liceu, e não lhe dei essa oportunidade.

Continua …