sábado, 26 de março de 2011

163 – Exposição a Ministro solicitando correcção de desmandos da DGGM e primeiras consequências. Continuação (2)

O Anexo N.º 3 à exposição que enviei ao Ministro Veiga Simão, em 27-3-84, é o 1.º capítulo do Relatório “circunstanciado” que me foi exigido pelo Director-Geral de Minas.
Nas suas 46 páginas, dactilografadas a um espaço, descrevo pormenorizadamente as “circunstâncias” em que decorreu a actividade por mim dirigida, na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima, com o objectivo de inventariar principalmente as reservas de minérios de tungsténio.
Muito do que se contem nesse capítulo consta já de posts anteriores.
A leitura das 4 primeiras páginas seria suficiente para o Ministro tomar consciência da urgente necessidade de rigoroso inquérito aos factos graves que denuncio, os quais impunham medidas correctivas e punitivas, de modo a restabelecer a normalidade do importante Organismo de criação de riqueza, que era o Serviço de Fomento Mineiro.
A seguir, transcrevo o conteúdo dessas páginas

“A indústria mineira nacional, se exceptuarmos curtos períodos de euforia, mais ou menos coincidentes com os grandes conflitos mundiais ou com preparativos para a sua possível eclosão, jamais teve peso significativo na economia nacional.
Com o objectivo de modificar esta situação, foi publicado, em 1939, o Decreto-lei N.º 29 725, que conduziu à existência real de um Organismo denominado SERVIÇO DE FOMENTO MINEIRO, a cujo encargo ficou “o estudo sistemático da riqueza mineira do País, para o seu melhor aproveitamento, conforme os superiores interesses da economia nacional.”
Infelizmente a actividade global deste Organismo não obedeceu, até hoje, a programas cientificamente elaborados e metódica e disciplinadamente postos em prática.
Tentativas que, no decurso dos anos e no exercício responsável das funções que me estiveram distribuídas – chefia de departamento de Prospecção Mineira que efectivamente desempenhei, durante 12 anos, com a qualificação interna de Chefe do 1.º Serviço – fui fazendo para conferir aos programas aquelas características, depararam constantemente com obstáculos artificialmente criados.
Embora denunciados em relatórios mensais, trimestrais e anuais, em relatórios específicos e, em numerosos outros documentos, não foi ainda possível remover todos esses obstáculos. Subsistem muitos deles e entretanto, outros foram sendo acrescentados.
Absorvido pelo trabalho autêntico, esqueço-me, por vezes, de que os incapazes de algo de útil produzirem não desarmam nas suas lutas mesquinhas pela conquista dos bons lugares, de onde poderão destruir as obras de outros ou delas se apropriar, mostrando-se depois incompetentes para lhes dar adequado seguimento.
Apesar de o País viver em democracia e de se incentivarem os cidadãos a uma activa participação na resolução dos problemas nacionais, a instabilidade política dos dez últimos anos não tem permitido aos sucessivos Governos dar a devida atenção às informações que lhes têm chegado e, portanto, fazer uma análise profunda do que se tem passado no sector mineiro nacional
A realidade triste é que a indústria mineira nacional se tem mantido num estado de crise crónica.
Poucas são as unidades em laboração e, muito raras, as de dimensão desejável, trabalhando em condições tecnicamente aceitáveis.
Ainda recentemente (V. Jornal de Notícias de 30-10-82), um ex-Ministro da pasta que abrange o sector mineiro declarou publicamente que o País apresenta “uma grande pobreza mineira”, revelando que “ o valor global da produção de salsichas e enchidos é superior ao valor global de toda a extracção mineira”.
Em data mais próxima (16-12-83), porém, o actual Ministro da Indústria, após exposição que ouviu do Director-Geral de Geologia e Minas, foi menos pessimista, diagnosticando bastante mais correctamente a situação, ao declarar (V. Jornal de Notícias de 17-12-83:
“Costuma dizer-se que somos um País pobre de recursos. No entanto,·depois da exposição que aqui foi feita, chego à conclusão que não somos tão pobres como dizem. O que somos é pobres em tomar decisões e iniciativas rápidas. Nisso somos pobres ou quase nulos”
O País não tem, pois, que se remeter a um fatalismo doentio de pobreza.
Confia-se que a situação venha a alterar-se, de modo notável, com a entrada em exploração do recentemente descoberto jazigo de Neves-Corvo.
Através de recente publicação do B.R.G.M. de França, fiquei a saber que:
a) Em 1982, as reservas do jazigo atingiam cerca de 2 milhões de toneladas de cobre metal, em minério com teor geológico próximo de 7%;
b) Estas características levam a classificar o jazigo de Corvo em posição excepcional e fazer dele o jazigo de envergadura mundial mais interessante a pôr em produção, nos próximos anos;
c) Se previa a decisão final de investimentos, para fins de 1983 ou princípios de 1984.
Verifico, com surpresa e, como português, com grande mágoa, que, na mesma publicação, o B.R.G.M., através do seu Presidente Jean Audibert atribui aos seus prospectores a descoberta de tão importante jazigo!!!
Porque vem isto a propósito?
Porque a definição da potencialidade da área onde se situa o jazigo é de minha exclusiva autoria;
Porque a decisão de fazer prospectar, por métodos adequados, essa área, é de minha exclusiva responsabilidade;
Porque a criação no Serviço de Fomento Mineiro dos meios apropriados (materiais e humanos), para que tal prospecção fosse exequível, é de minha exclusiva iniciativa, após luta árdua, durante mais de uma década, removendo muitos dos tais obstáculos artificiais;
Porque, tendo o Serviço de Fomento Mineiro, por intermédio da equipa técnica organizada por minha exclusiva iniciativa e sob minha directa orientação, chegado à definição das anomalias gravimétricas que expressivamente traduzem a presença do importante jazigo de Neves-Corvo, não lhe foi consentido finalizar o êxito !!!;
Porque, sem consulta prévia ao chefe desta equipa e com total independência dos resultados que estavam sendo obtidos, se decidiu negociar a área, tendo-se corrido assim, inconscientemente, o risco de alienar importante parcela do património nacional.
Os factos demonstraram que se não ficou apenas pelo risco. Há mesmo alienação e não pequena!
Nem todos os portugueses se têm, portanto, revelado pobres em tomar decisões e iniciativas, como o afirmou o Senhor Ministro!
Assim as decisões e as iniciativas correctas que têm sido tomadas, tivessem sido sempre devidamente aproveitadas e acarinhadas e não combatidas, como infelizmente tem acontecido, com frequência!!
Os resultados a que havíamos chegado, na região de Almodôvar, eram apenas anomalias do campo da gravidade.
Várias causas poderiam explicá-las.
Se a prospecção fora efectuada para encontrar jazigos minerais e se estes são susceptíveis de gerar anomalias gravimétricas, natural seria que esta hipótese tivesse sido encarada, embora outras não fossem de excluir.
Natural foi, portanto, que à Associação constituída, então, pela Sociedade Mineira de Santiago, pelo B.R.G.M. de França e pela Sociedade Mineira e Metalúrgica de Penarroya Portuguesa, L.da, à qual vasta área do Alentejo fora adjudicada, para prospecção mineira, tivéssemos logo chamado a atenção para essas anomalias que acabávamos de revelar, logo após o abandono da mesma área pela Mining Explorations (International), que anteriormente tivera idênticos direitos sobre a mesma área e que, não obstante as nossas recomendações, se desinteressara totalmente pela zona de Almodôvar!
Já me pareceu menos natural que a Associação, após uma primeira sondagem considerada negativa, tivesse dado maior peso a modelos geológicos construídos com base nos estudos até então realizados, do que às próprias anomalias gravimétricas.
Estas anomalias mantiveram-se, pois, inexplicadas durante vários anos, sem que a Associação com isso se tivesse preocupado, não obstante eu ter chamado a atenção de alguns desses técnicos para essa lacuna.
Ocorre, então, perguntar porque foi possível ao Serviço de Fomento Mineiro, no Sul do País, quase chegar à descoberta do jazigo de Neves-Corvo, quase chegar à descoberta do jazigo do Gavião, chegar mesmo à descoberta do jazigo da Estação; porque se descobriram potencialidades para grandes jazigos de sulfuretos, nas regiões de Cercal - Odemira e Alcácer do Sal, anteriormente excluídas da Faixa Piritosa; porque se evidenciou a Faixa Zincífera Alentejana, com as suas zonas de Portel e Moura já bastante valorizadas; porque se reconheceu o jazigo de cobre de Aparis, até ao ponto de poder entrar em exploração por empresa privada; porque se promoveu o estudo do jazigo de cobre de Miguel Vacas, actualmente em exploração; porque se reconheceram os jazigos de ferro e manganés da Região de Cercal – Odemira, de modo a permitir a sua entrada em exploração; porque se fizeram tantos e tantos outros estudos, que embora não tendo permitido chegar a jazigos minerais, constituem preciosos elementos de consulta, que se encontram devidamente documentados, de modo a poderem ser utilizados, quando a oportunidade surgir e tratados à luz de novas interpretações e, eventualmente, conduzir a novas descobertas.
A resposta é simples.
Tudo isto foi possível porque, durante anos, me foi consentido programar, em moldes científicos, embora com as limitações já sumariamente referidas, mas amplamente descritas em variados documentos, os trabalhos de prospecção, em áreas do Sul do País.
Foi também possível, longe de centros altamente influenciados por formalismos e burocracias, ter uma actividade dinâmica orientada essencialmente para a resolução dos problemas técnicos.
Tentei, como já referi, no desempenho das minhas funções, lançar no Norte do País campanhas de prospecção em moldes idênticos às do Alentejo
Foi assim que lancei as campanhas de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima e da Faixa Metalífera da Beira Litoral.
Outras estavam previstas, tais como a da Região aurífera de Jales – Três Minas e a da Região de Moncorvo, visando esta sobretudo a investigação da existência de minérios de chumbo e zinco.
Cedo, porém, me apercebi de que não conseguiria contrariar a obstrução da Direcção do Serviço de Fomento Mineiro, a qual passou, a partir de certa data, a ser superiormente incentivada.
Por isso, decidi concentrar a maior parte dos meus esforços em áreas do Sul do País, aproveitando a experiência que aí adquirira, durante 20 anos de efectiva presença, na maioria dos locais onde os trabalhos decorriam.
No Norte do País, tendo desistido de criar novos núcleos, procurei manter, a todo o custo, as campanhas de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima e da Faixa Metalífera da Beira Litoral., na esperança de que as muito faladas reestruturações da Direcção-Geral de Minas, com as inerentes substituições das principais chefias, viessem a ter efeitos benéficos na programação geral da prospecção mineira do País.
Tal não tem, porém, acontecido.
A actividade na Faixa Metalífera da Beira Litoral, onde já havíamos chegado a resultados de muito interesse, foi mandada suspender por ofício de 14-1-1980, sem prévia análise daqueles resultados, que se encontram amplamente descritos, não só em relatórios anuais e trimestrais, mas também em relatório especialmente apresentado em 31-12-72, quando a potencialidade da Faixa posta em dúvida, sem quaisquer argumentos válidos.
O pessoal ali destacado, que por mim havia sido mandado admitir e que havia sido directa ou indirectamente preparado, sob minha orientação, foi transferido para outro núcleo, onde não está sendo aproveitado na sua real capacidade.
A actividade na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima tem sido perturbada por uma série de dificuldades, cuja principal consequência tem sido o protelamento das previsíveis descobertas de concentrações minerais susceptíveis de exploração remuneradora.
A muitas delas, me tenho referido em relatórios mensais, trimestrais e anuais.
Uma descrição circunstanciada da situação que se me deparava, em Agosto de 1979, encontra-se no “Parecer sobre a actividade de Union Carbide Geotécnica Portuguesa – Assistência Mineira L.da, na região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima.”, que então elaborei, em cumprimento de despacho superior.


Nas páginas seguintes, faço a descrição pormenorizada das atitudes negligentes e obstrucionistas, intencionalmente assumidas pelos principais dirigentes da DGGM relativamente aos trabalhos a meu cargo, as quais classifico de criminosas, não só para comigo, mas sobretudo para a economia nacional.
Saliento que, apesar dessas obstruções, tenho conseguido, apenas com o auxílio de uma equipa de 4 a 5 trabalhadores recrutados com instrução primária, resultados de excepcional interesse, que estão na base das explorações em curso por empresa detentora das principais concessões mineiras da Região.

A terminar o capítulo, faço alguns comentários ao “despacho” que me exige o relatório e suspende a minha actividade no campo.

A seguir, transcrevo esses comentários, que completariam o esclarecimento do Ministro:

“O teor do despacho e o modo rude como dele me foi dado conhecimento podem induzir à conclusão de que eu me encontrava em falta, perante ordens ou instruções superiores que me tivessem sido transmitidas.
Já vimos que não era esse o caso.
Quem cometeu falta não pequena foram os superiores hierárquicos que, deliberadamente prejudicaram a condução dos estudos que eu continuava dirigindo na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima, protelando, consequentemente, a possível descoberta de novas riquezas minerais, ao manterem-me sem acesso a documentos entregues na Direcção-Geral de Minas, há mais de 4 anos, que sempre considerei essenciais à correcta planificação desses estudos.
Grave falta cometeu quem nada fez para aproveitar a oferta de Union Carbide de colocar nas instalações do Serviço de Fomento Mineiro, em S. Mamede de Infesta, a expensas suas, precioso material de estudo (testemunhos de sondagens, no valor de várias de3zenas de milhares de contos) e mandou, depois, efectuar o transporte, à custa do Serviço, dando um mau exemplo do uso de dinheiros públicos, em época de crise, em que constantemente se recomenda a maior parcimónia nos gastos; quem consentiu que o transporte e a subsequente arrumação se fizessem em deficientíssimas condições, prejudicando a sua utilização futura; quem consentiu que, desde 1980, este material tenha estado em quase completo abandono, a ponto de se ter tornado, talvez, já irrecuperável.
Grave falta cometeu, também, quem nada fez para facilitar a actividade da Secção de Caminha e, pelo contrário, lhe originou constantes problemas, ao mesmo tempo que não regateava meios materiais e humanos a outros núcleos, cuja acção se nos tem afigurado de mui discutível utilidade para o País.
E não há que argumentar com desconhecimento dos factos, pois eles, como vimos nas abundantes transcrições aqui feitas, foram, em devido tempo, relatados e foram também objecto de exposições orais, sempre que a oportunidade se me ofereceu.
Lembro, por exemplo, as gravíssimas afirmações que fiz perante o actual Director-Geral de Minas, quando então exercia as funções de Assessor na Secretaria de Estado, e perante várias pessoas, em reunião havida na Secretaria de Estado, em 10-8-1977, para justificar o meu pedido de sindicância à Direcção-Geral de Minas.
Se há desconhecimento do que escrevi, conclui-se que os relatórios não são lidos (pude já verificar que, em vários casos, tal aconteceu e que até com isso se vangloriam os novos chefes, porque “ o que lá vai, lá vai” e eles não tiveram culpas …, embora se estejam a aproveitar) e é então caso para perguntar se o mesmo não sucederá com este que estou elaborando.
Tenho consciência das minhas responsabilidades neste complexo domínio da prospecção mineira, ao qual tenho dedicado toda a vida. Tenho um passado a respeitar.
A elaboração de um plano global para a Região de Vila Noiva de Cerveira – Caminha - Ponte de Lima, nas condições que se me deparavam, estava tecnicamente errada.
Confiei que as condições correctas seriam criadas e isso, que nada tinha de difícil, foi prometido.
Não foi todavia, cumprido e agora exige-se-me, não um plano, mas um relatório circunstanciado da actividade passada, consentindo-me apenas que apresente eventualmente sugestões para a continuação dos trabalhos.

Do que ficou exposto, fácil é concluir que se está a tornar insustentável a minha permanência na Direcção-Geral de Minas.
É certo – e isso vem constantemente ao meu espírito – que a Direcção-Geral não é pertença dos dirigentes que, por circunstâncias fortuitas, ocupam actualmente os principais cargos directivos, nem eu estou trabalhando para eles.
Mas é certo, também, que a situação já vem de longe e é este um sector onde o Governo tem tido certa dificuldade em penetrar a sério, dadas as suas características próprias.
Perdida, pois, a ténue esperança gerada em 9-9-83, encaro, com forte probabilidade, apresentar o meu pedido de passagem à aposentação, uma vez terminado este relatório.
Mas aqui deixo claramente expresso que tomo a decisão convicto de que muito poderia ainda contribuir, dentro da Direcção-Geral de Minas, para a criação de riqueza tão necessária ao País, se outro fosse o ambiente existente, ou, pelo menos, previsível, neste Organismo.”

Esta nova diligência em defesa do Serviço de Fomento Mineiro começou por ter resultados nulos.
A minha exposição transitou do Ministro para o Secretário de Estado e deste para o Director-Geral de Minas, apenas “para conhecimento”.
Por sua vez, o Director-Geral de Minas despachou para eu ficar a saber que todas aquelas entidades tinham tomado conhecimento!
Não foram, portanto, tomadas as medidas que eu urgentemente reclamava para tentar travar a marcha do SFM para a sua completa destruição.
Mas eu, consciente da nobreza dos motivos das minhas acções, não desisti da luta!
Lembrando-me do comentário do Ministro Veiga Simão relativamente à falta de iniciativas para aproveitamento dos nossos recursos minerais (Ver post N.º 155) decidi fazer diligência directa junto do Ministro.
A essa diligência e seus resultados encorajadores me referirei no próximo post.

sexta-feira, 18 de março de 2011

162 - Exposição a Ministro, solicitando correcção de desmandos da DGGM e primeiras consequências - Continuação (1)

A seguir, transcrevo o teor do meu ofício de 14 de Maio de 1980, dirigido ao Ministro Álvaro Barreto, que constitui o Anexo N.º 1 à minha exposição de 27-3-84, ao Ministro Veiga Simão, referida no post anterior:

“Ex.mo Senhor
Ministro da Indústria e Energia:
Há muito tempo venho solicitando insistentemente medidas adequadas para travar o curso que o Serviço de Fomento Mineiro vem seguindo, o qual fatalmente conduzirá à sua total ineficácia.
Nunca este Serviço foi muito eficiente, por manifesta incapacidade dos dirigentes a quem foi confiado.
No entanto, a alguns níveis, chegou a realizar-se obra de certo mérito, apesar da oposição desses dirigentes.
Presentemente, torna-se ja muito difícil realizar trabalho sério, porque funcionários dos mais incompetentes e de mais duvidoso carácter se apossaram de posições-chave.
A obstrução a quem quer produzir é permanente!
Para demonstrar o que afirmo junto cópias dos meus relatórios trimestrais de 1979 e 1980
Uma rápida passagem pelos capítulos “Principais dificuldades” e “Diversos” , sobretudo no Relatório do 1.º trimestre de 1980, dará a V. Ex.ª uma primeira percepção do que actualmente se passa no Serviço de Fomento Mineiro.
Mas se V. Ex.ª desejar mais amplo conhecimento, encontrará no arquivo do Ministério copiosa documentação que tenho enviado.
Já V. Ex.ª tomou consciência da necessidade de intervir na Direcção-Geral de Minas, com medidas enérgicas. A exoneração do eng.º Soares Carneiro do cargo de Director-Geral era, sem dúvida, uma medida urgente que se impunha.
Não pode, todavia, ficar-se por aqui, se se pretender dignificar o sector mineiro oficial.
Por diversas vezes, requeri sindicância à Direcção-Geral de Minas, com especial incidência no Serviço de Fomento Mineiro.
Os meus apelos não foram ouvidos e os resultados estão bem à vista.
Nada venho pedir para mim, apesar de verificar que, não raro à custa do meu trabalho no Serviço, diversos funcionários incompetentes e de mau carácter me ultrapassaram na escala hierárquica, porque adoptaram procedimentos indignos, passíveis de sanções legais, se a sindicância vier a concretizar-se.
Como cidadão português e como funcionário responsável, com um longo passado de luta pela dignificação do Organismo em que sempre estive integrado, julgo-me no direito de solicitar uma acção vigorosa no sentido de acabar de vez com a política de obstrução ao trabalho sério que, presentemente, caracteriza o Serviço de Fomento Mineiro
Estou à disposição de V. Ex.ª para esclarecimentos, de viva voz, se os entender convenientes.
Apresento a V. Ex.ª os meus cumprimentos.
O Engenheiro Chefe do 1.º Serviço de Fomento Mineiro
(a) Albertino Adélio Rocha Gomes
Assessor Técnico”

Continua ...

segunda-feira, 14 de março de 2011

161 – Exposição a Ministro, solicitando correcção de desmandos da DGGM e primeiras consequências

Apesar de reconhecer a insensatez da ordem de apresentação de um relatório “circunstanciado” da actividade que eu vinha dirigindo, há mais de 20 anos, na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima, resolvi dar-lhe rigoroso cumprimento, resistindo à evidente provocação para eu me aposentar, como natural reacção ao afrontoso desrespeito pelo meu passado de 40 anos de dedicação à causa do Fomento Mineiro, consubstanciado nos maiores êxitos deste Organismo, em toda a sua existência.

Quando terminei o 1.º capítulo, intitulado “Informação introdutória circunstanciada” e dactilografei, a um espaço, as suas 46 páginas, ocorreu-me que o Ministro Veiga Simão talvez tivesse interesse na sua leitura, considerando que, na reunião de 16-12-83 (Ver post N.º 155), já havia comentado a falta de iniciativas para o aproveitamento das potencialidades do País em valiosos recursos minerais. Foi nesta convicção que lhe enviei, em 27-3-84, o ofício que a seguir transcrevo:

“Em Maio de 1980, enderecei a um dos antecessores de V. Ex.ª o ofício de que junto cópia (Anexo N.º 1).
Solicitei, então, uma acção vigorosa no sentido de acabar com a política de obstrução ao trabalho sério que caracterizava a direcção do Serviço de Fomento Mineiro.
Tal como acontecera relativamente a exposições anteriores, manteve-se a passividade superior nesta matéria, apesar de ter havido substituições de alguns dos dirigentes responsáveis pela referida obstrução.
O Serviço de Fomento mineiro é potencialmente criador de riqueza e alguma tem originado, nos seus 45 anos de existência.
Posso orgulhar-me de ter sido um dos principais obreiros das mais importantes descobertas de reservas minerais úteis evidenciadas por este Serviço, quer através da minha acção directa, quer através da colaboração de técnicos, a todos os níveis, que preparei ou ajudei a formar.
Consciente de que a competência técnica é requisito fundamental para o trabalho de verdadeira investigação científica exigido para se chegar ao inventário e à valorização dos recursos mineiros nacionais, não me tenho limitado, na formação de técnicos, ao ambiente interno do Serviço de Fomento Mineiro.
Desde 1970, venho prestando colaboração à Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, na formação de geólogos e, desde data mais recente, também à Faculdade de Engenharia do Porto na formação de engenheiros de minas e ao Departamento de Geociências da Universidade de Aveiro, na formação de docentes e de futuros engenheiros-geólogos.
V. Ex.ª encontrará no meu curriculum, que constitui o Anexo N.º 2, informação mais completa do que tem sido a minha acção no sector mineiro nacional.
Poderia pensar-se que, com tal curriculum, a minha experiência estaria a ser aproveitada, na Direcção-Geral de Minas e o ambiente me seria propício para continuar na obra de criação de riqueza, à qual, apesar de já lhe ter dedicado 40 anos, estaria ainda disposto a dedicar alguns anos mais, pois ainda me considero em pleno vigor físico e intelectual.
Nada disso!
Como V. Ex.ª pode verificar, pelo documento que constitui o Anexo N.º 3 (1.º capítulo – Informação introdutória circunstanciada – do “Relatório circunstanciado dos trabalhos de prospecção mineira efectuados até 29-2-84, na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha - Ponte de Lima; Sugestões para continuação dos trabalhos”, que me foi exigido, por despacho de 7-2-84, a obstrução ao trabalho sério não tem abrandado; muito ao contrário:
Chegou-se agora ao cúmulo de suspender a minha actividade no campo, assim se prejudicando o trabalho autêntico que ali se produz (é no campo que se descobrem os jazigos, não no gabinete!) e prejudicando a formação de técnicos de vários estabelecimentos de ensino superior, que eu ali estava promovendo !!!
E tudo isto, para quê?
Para que eu faça um relatório provavelmente destinado ao mesmo fim de numerosos outros documentos que tenho produzido, os quais nunca foram lidos ou o foram muito imperfeitamente.
Estou fazendo este relatório de que acabei o 1.º capítulo, e esta será, talvez, a minha última tarefa, dentro do Organismo que servi dedicadamente, durante 40 anos, pois encaro, com muito forte probabilidade, a minha passagem à aposentação.
Não serei, de resto, o primeiro funcionário a tomar esta atitude, exclusivamente por o ambiente interno da Direcção-Geral de Minas se estar a tornar insuportável para quem tenha dignidade e real sentido das suas responsabilidades.
Apresento a V. Ex.ª os meus cumprimentos
(a) A. Rocha Gomes”

Continua ...

sexta-feira, 11 de março de 2011

160 – Director-Geral de Minas desrespeita seu compromisso de colaboração com as Universidades

Quando, em 1970, o Professor Miguel Montenegro de Andrade me convidou para reger a disciplina de Prospecção Geológica, Geofísica e Geoquímica, que passou a ser incluída no Curso de Geologia da Faculdade de Ciências do Porto, eu não me sentia motivado a aceitar tão honroso convite, porque a actividade como Chefe do Serviço de Prospecção do SFM já preenchia todo o meu tempo.

Além disso, estava convencido de que o Director-Geral de Minas não autorizaria tal acumulação de funções, pois tinha recusado, pouco tempo antes, idêntica acumulação ao Agente Técnico de Engenharia Raul da Silva Dionísio, quando este se propunha ensinar matéria da sua especialidade, em Escola Técnica de Montemor-o-Novo.

Todavia, Soares Carneiro, não só concedeu a autorização solicitada pelo Departamento de Mineralogia e Geologia da Faculdade de Ciências do Porto, como deu todas as facilidades para eu poder bem desempenhar o cargo.

Por exemplo, quando contactado sobre horários de aulas, enviou, ao Director da Faculdade, o ofício N.º 824 de 6-5-1970, do seguinte teor:

Respondendo à solicitação de V. Ex.ª, tenho a honra de informar que o trabalho do Engenheiro de Minas de 1ª Classe do Serviço de Fomento Mineiro, desta Direcção-Geral, Albertino Adélio Rocha Gomes, pela natureza da sua especialização, não requer a exigência de um horário rígido, sendo portanto sempre possível conciliar a sua actividade no Serviço de Fomento Mineiro com as exigências do horário que lhe venha a ser fixado para a regência da cadeira de Prospecção Geológica, Geofísica e Geoquímica.
Apresento a V. Ex.ª os meus cumprimentos.
A bem da Nação
O Director-Geral
(a) Fernando Soares Carneiro”

Perante estas facilidades, eu não tinha o direito de recusar a colaboração pedida, até porque o Professor Montenegro me declarou que, no caso de eu não aceitar o convite, os alunos ficariam privados do ensino das matérias de prospecção mineira.

Eu estava longe de imaginar o sucesso que iria conseguir, nas minhas funções docentes!

Para esse sucesso, muito contribuíram os meus primeiros alunos.
Eram apenas quatro e rapidamente se comportaram como bons companheiros de trabalho, tal o entusiasmo com que participaram nas aulas.

Isto deu-me muito ânimo e, em anos seguintes, o ambiente saudável de 1970-71, teve continuidade, embora menos exuberantemente, quando aumentou muito o número de alunos, com introdução de elementos recusados em cursos da sua preferência, devido à introdução do “numerus clausus”.

Os alunos apreciavam a ligação do ensino teórico à aplicação directa no terreno, dos métodos que lhes descrevia, tirando partido dos trabalhos do SFM que eu dirigia, no Norte e no Sul do País.
Lembro-me, por exemplo, da expressiva admiração de um aluno, quando eu ia começar a explicar o cálculo da massa, em toneladas, de um jazigo mineral através da sua assinatura gravimétrica.
As descobertas que revelava de novos jazigos minerais, davam-lhes a certeza da grande utilidade da cadeira, para a sua vida prática.

Além disso, a fuga da cidade para o ar puro do campo, o exercício físico proporcionado pelos percursos ao longo dos perfis em estudo e o facto de saberem que o seu trabalho seria aproveitado, eram outros factores a despertar o seu interesse.
Era agradável notar a satisfação deles, quando no campo, usando os aparelhos que lhes disponibilizava, após prévia instrução no seu manejo, observavam variações dos parâmetros que mediam, a assinalar causa perturbadora dos valores normais, que poderia corresponder a concentração dos minerais úteis que se procuravam, no ambiente geológico antecipadamente definido como favorável a essa concentração.

Dava-me também grande satisfação tomar conhecimento de que os Geólogos licenciados pela Universidade do Porto eram preferidos pelas Empresas que cumpriam contratos de prospecção mineira com o Estado, pois a Prospecção Mineira não constava dos cursos de Geologia e de Engenharia de Minas das outras Universidades do País.

Já me referi, em posts anteriores, ao facto de Engenheiros recém-formados terem mostrado interesse em frequentarem as aulas que eu ministrava na Faculdade de Ciências do Porto, pois sentiam essa grave lacuna na sua licenciatura.

Referi-me também, aos convites da Universidade de Aveiro e do Instituto Superior de Engenharia do Porto.

O apreço pelo meu desempenho levou até o Professor Montenegro a emitir o parecer de que eu deveria ser equiparado a catedrático e não à categoria de professor auxiliar com que estava contratado.
Idêntico parecer emitiu relativamente ao Dr. Orlando da Cruz Gaspar, Geólogo do SFM, que também estava prestando boa colaboração à Universidade, porém na área de Mineralogia, em que adquirira especialização, em Universidade alemã, sob a orientação do eminente Professor Ramdohr.
A sugestão não teve, porém, aceitação, por nenhum de nós ter, então, grau de doutor.

Quando Soares Carneiro foi afastado das funções de Director-Geral, nem me passou pela cabeça que o novo detentor do cargo pudesse alterar a boa colaboração existente entre a DGGM e as Universidades.

O novo Director-Geral, Alcides Pereira, até pareceu empenhado em seguir a orientação do seu antecessor, em tal matéria.
De facto, em intervenção que fez, em 15-2-1980, numa das sessões de Congresso de Geoquímica, para cuja presidência fora convidado, recomendou que as Universidades produzissem bons técnicos, prometendo, para esse efeito, toda a colaboração do Organismo que lhe estava confiado (Ver post N.º 140).

Apesar de Alcides já ter evidenciado malévolo carácter, nos contactos que eu com ele tivera, nunca esperaria que se atrevesse a tomar atitudes que também o desacreditassem, fora do âmbito da DGGM.

Tão confiante estava, que até pedi, com a maior naturalidade, a Daniel, em 28-10-83, que me avisasse, quando pretendesse ir comigo ao campo, para não ter que alterar os meus programas.
Informei, então, que costumava fazer trabalho de campo às terças e sextas-feiras, se as condições meteorológicas o permitissem e que às quintas, de manhã, dava aulas de Prospecção, na Faculdade de Ciências (Ver post N.º 140).
Às quintas, não queria faltar, pois a boa preparação dos alunos era até de interesse para o SFM. Não podia transferir aulas, porque juntava alunos dos Cursos de Geologia e de Engenharia.
Às sextas, iam, muitas vezes, dois docentes da Universidade de Aveiro, que eu ajudava e que até poderiam ingressar no SFM, se lhes fosse garantido que comigo trabalhariam. (Ver post N.º 154)

Suponho que Alcides terá sido informado, por Daniel, das minhas aulas aos alunos de duas Faculdades (Ciências e Engenharia) e Alcides terá considerado que eu seria remunerado por ambas. Na realidade, como já acentuei, eu nunca fui remunerado pelas aulas a alunos de Engenharia, as quais até me originaram despesas (Ver, por exemplo, post N.º 141).

Por tudo quanto acabo de relatar e era do conhecimento geral, foi grande a perplexidade da Reitoria da Universidade do Porto e do Departamento de Mineralogia e Geologia da Faculdade de Ciências, quando tomaram conhecimento de ofício de Alcides Pereira, com data de 15-2-84, com uma série de perguntas a respeito de um dos seus mais categorizados funcionários, fazendo suspeitar ilegalidades nas minhas funções docentes e nos horários praticados.

Na resposta que a Reitoria deu, com todos os elementos justificativos da legalidade das minhas funções e com referências ao bom desempenho e à premente necessidade da minha colaboração, foi, por sugestão minha, alterado para os sábados o dia de aulas, para evitar que possíveis dificuldades pudessem ser apresentadas, não obstante a autorização de Soares Carneiro nunca ter sido revogada.
Com esta alteração, alguns alunos foram prejudicados, pois tinham actividades desportivas, nesse dia, e, ou faltavam às aulas ou a essas actividades.
Mas a realidade era que, mesmo aos sábados tinha a sala cheia e eu não marcava faltas. Ninguém era obrigado a estar presente. O seu saber seria avaliado nos exames.

Outro prejuízo originado pela suspensão da minha actividade no campo, foi a maior dificuldade nas aulas práticas no campo, nas quais costumava aproveitar a participação dos alunos, nos trabalhos em curso. Também se impossibilitava continuar a colaboração com a Universidade de Aveiro, que era muito apreciada por professores e alunos desta Universidade.

Assim Alcides faltava, despudoradamente, ao seu compromisso público de dar toda a colaboração às Universidade para que produzissem bons técnicos.

Não resisto a comentar mais esta atitude do “Chico-esperto” Alcides.
De modestíssimo funcionário, com atribuições meramente administrativas num “Gabinete para a Prospecção, Pesquisa e Exploração de Petróleo”, cuja instituição se não justificava, uma vez que nem prospectava, nem pesquisava, nem explorava petróleo (!) (Ver post N.º 118), apesar do seu magríssimo currículo, ultrapassando as disposições legais que impunham competência para o exercício de cargos de chefia, conseguiu chegar a Director-Geral de Minas.
Alcides que assim chegara, na mais flagrante das ilegalidades ao mais alto cargo na DGGM e que, para ser nomeado, tivera que se recorrer á esfarrapada justificação de “urgente conveniência de serviço”, mostrava-se agora diligente em saber se a minha nomeação para funções docentes na Universidade estava devidamente legalizada.
Ao contrário da sua nomeação, a minha baseava-se em análise curricular e estava consolidada por renovações anuais e até por louvor publicado em Diário da República; não em “conveniência urgente de serviço”, conveniência mais dele do que da DGGM!
Mais uma vez se comprovava o velho ditado: “Se queres ver o vilão, põe-lhe a varinha na mão!”

Mas nem Alcides nem a DGGM saíram prestigiados desta indelicada intromissão na Universidade do Porto.
Era evidente que eu não estaria a exercer funções docentes na Universidade, “clandestinamente”, isto é, sem as devidas autorizações legais.
Não se aceitava que Alcides não tivesse consultado o meu processo individual ou me não tivesse contactado directamente, antes de tomar a decisão de se dirigir à Reitoria da Universidade.
No meu processo individual, deveria ter ficado arquivada toda a informação que Alcides pretendia, a não ser que os serviços burocráticos da DGGM estivessem desorganizados.
E se este último caso se verificasse, a Alcides competia promover a devida correcção, até porque era em matéria burocrática que teria adquirido formação, já que em geologia e minas se tinha revelado uma nulidade absoluta.
Tudo isto não abonava em favor de um Organismo que já estava muito desacreditado exteriormente, pelas informações que muitos dos seus elementos,
iam prestando e pela falta de resultados.

De notar que este ofício foi recebido apenas 13 dias após a Ordem de Serviço que me proibia de realizar trabalho de campo!
Sintomático era também o facto de, em simultaneidade com este ofício de Alcides ao Reitor da Universidade do Porto, o Director do SFM, Fernando Daniel, me tenha ameaçado com “processo por incompetência, com efeito nas minhas funções docentes”, por atraso na entrega de um relatório anual.
Esta fanfarronada, como muitas outras a que Daniel me habituara, não era obviamente para levar a sério.
Tratava-se, de mais uma investida dos intrusos, Alcides, Daniel e Reynaud, que sem passado no SFM, se tinham apoderado deste Organismo, que deveria criar riqueza, mas que eles iam progressivamente destruindo, com insensatas resoluções.

segunda-feira, 7 de março de 2011

159 – A eficiência da secretaria e da sala de desenho da sede do SFM

No post anterior, revelei não poder contar com a secretaria da sede do SFM para a dactilografia do relatório exigido por Ordem de Serviço de 7-2-84 do Director-Geral de Minas.

Na realidade, desde que, em 1964, na minha nova qualidade de Chefe do Serviço de Prospecção Mineira, passei a exercer funções, a partir da sede do SFM, em S. Mamede de Infesta, eu tomara consciência de graves deficiências, no funcionamento da sua secretaria.

Eu vinha do Sul do País, onde durante 20 anos (1944 a 1964) dirigira as mais importantes Brigadas do SFM (Brigada de Prospecção Eléctrica, Brigada do Sul) e mantivera até 1975, a chefia da 1.ª Brigada de Prospecção, sediada em Beja, cumulativamente com a chefia do 1.º Serviço.

Em todas estas Brigadas, recrutei, localmente, pessoal habilitado ou capaz de se habilitar a realizar, com eficácia, as tarefas normais de uma secretaria: dactilografia de ofícios, relatórios, informações, etc. registo de correspondência recebida e emitida, arquivo de variado tipo de documentos, em pastas apropriadas, de modo a permitir a sua fácil e rápida consulta, aquisições de materiais e subsequentes formalidades para seu pagamento, etc. etc.

Tive, além disso, a preocupação de dar ou proporcionar formação, em diversas outras áreas, também a pessoal localmente recrutado.

De assinalar, foi o facto de o SFM, no Sul do País, ter funcionado como escola, onde trabalhadores adquiriam formação em dactilografia, topografia, prospecção nas suas variadas técnicas e tinham depois facilidade em encontrar emprego melhor remunerado, em empresas privadas e até em outros organismos públicos, ocasionando constantemente problemas com a sua substituição, já que as tabelas salariais em vigor, no SFM, não permitiam recompensá-los devidamente e os dirigentes se não mostravam dispostos a alterá-las.

Nos posts N.ºs 24, 84, 90, 145 e 146, faço referências às minhas constantes preocupações em tal domínio.

Dentre as outras áreas contempladas nas acções de formação, destaco a de Desenho, pois era permanente a necessidade de registar, convenientemente, os resultados dos trabalhos que se iam realizando, qualquer que fosse a sua natureza (mapas topográficos, geológicos, geofísicos, geoquímicos; perfis geológicos, geofísicos, geoquímicos, plantas e perfis longitudinais e transversais de trabalhos mineiros; logs de sondagens; gráficos, etc.)

Foi através destas acções que se tornou possível apresentar, dentro de prazos normais, relatórios extensos, com numerosas peças desenhadas, algumas de grandes dimensões, contendo abundante informação.

Como elucidativos exemplos, cito os seguintes:

1 - O relatório, intitulado “Jazigos ferro - manganíferos de Cercal – Odemira”, apresentado em 4 espessos volumes, com 338 páginas dactilografadas, 86 desenhos e 45 fotografias e ainda um pormenorizado mapa de avanços e despesas. Foram enviadas 4 cópias em Outubro de 1957, poucos meses após a decisão superior de dar por terminados os estudos que eu vinha dirigindo na Região de Cercal – Odemira. (Ver post N.º 16)

2 - O relatório sobre trabalhos de pesquisa e reconhecimento, no jazigo de cobre de Aparis, realizados desde 1-1-1956 até 31-12-1958. Tem 86 páginas, 39 desenhos, 4 gráficos, 11 fotografias e um pormenorizado mapa de avanços e despesas. Foram enviadas 4 cópias em 13 de Maio de 1959 (Ver post N.º 21)

3 - O último relatório anual que elaborei na qualidade de Chefe da Brigada do Sul, referente ao ano de 1962. Tem 177 páginas e um pormenorizado mapa de avanços e despesas de todos os trabalhos e dele foram enviados 4 exemplares, em 29-1-63.

4 – Um relatório que tinha em preparação sobre ocorrências minerais na Região de Montemor-o-Novo, de que constavam 108 peças desenhadas, que não me foi permitido concluir, por ter sido nomeado para novas e absorventes funções, no âmbito da prospecção mineira, ao mesmo tempo que me eram cerceados meios para lhes dar cabal cumprimento.

5 - O último relatório trimestral da 1.ª Serviço (nessa data ainda incluía a 1.ª Brigada de Prospecção), referente ao 4.º trimestre de 1974. Tem 225 páginas, onde se incluem os relatórios de todos os departamentos do 1.º Serviço, com numerosas peças desenhadas e projectos de sondagens.

6 - A constituição de um arquivo de que já constavam muitos milhares de mapas (topográficos, geológicos, geofísicos, geoquímicos, a diversas escalas, com predomínio da escala de 1:5000). (Ver post N.º 27)

Foi, pois, com surpresa que constatei a incapacidade da secretaria da sede do SFM de cumprir as suas naturais funções, nas amplas instalações de que dispunha.
Um simples ofício, que nem uma página exigiria, demorava a aparecer dactilografado!

Para remover esta incompreensível deficiência, adquiri máquina de escrever portátil que frequentemente passei a usar no SFM.

Mas outra deficiência ainda mais grave se me deparou. Documento que eu pretendesse consultar, para dar sequência a matéria que tivesse em estudo, ou não aparecia, ou aparecia tardiamente e eu não estava habituado a tais atrasos, perturbadores da minha actividade.

A importância que atribuía à documentação, levou-me a fazer propostas concretas visando a sua eficaz organização e protecção. (Ver post N.º 29).
O Director, desprezando as minhas recomendações, decidiu assumir directamente a gestão de departamento que um dedicado funcionário tinha começado a organizar. Afastou até, do SFM, este funcionário, logo se fazendo sentir as nefastas consequências de tão insensata decisão.
A primeira consequência foi ter deixado de se publicar o relatório anual da actividade do SFM, ficando assim a indústria mineira nacional privada de importante informação que poderia suscitar investimentos em áreas cuja potencialidade ia sendo revelada.
Outra consequência foi a perda de relatórios técnicos que eram retirados, com facilidade, dos arquivos e não eram lá repostos.

Um elucidativo exemplo, que referi no meu post N.º 30, foi o caso da documentação respeitante às Minas de ferro de Vila Cova do Marão.
O SFM tinha feito realizar, no princípio da década de 40, uma campanha de prospecção magnética, por contrato com a Companhia sueca ABEM.
Em anos mais recentes, tinha dado cumprimento a um projecto de sondagens.
Em reuniões promovidas pelo Director, quando em 1964 assumi as funções de Chefe do 1.º Serviço, tomei conhecimento de divergências grandes entre resultados dos estudos do concessionário e os do SFM.
Impunha-se uma análise cuidada de toda a documentação respeitante a este jazigo, pois se considerava a hipótese de novas sondagens deverem ser projectadas.
O Director encarregou-se de encontrar, não só os relatórios, como os logs, plantas e perfis pelas sondagens e os testemunhos destas sondagens.
Em reuniões seguintes, este caso de Vila Cova voltou a ser por mim abordado. Todavia, o Director começou a ficar embaraçado, pois nem relatórios, nem desenhos, nem testemunhos se encontravam. Deste embaraço resultou que não mais se realizaram reuniões!

Posso também citar o caso de um relatório de minha autoria que um representante de Empresa privada pretendia consultar e que o Director não conseguiu encontrar. Na minha ausência, foi ao meu gabinete e lá conseguiu encontrar a cópia que, de direito, me pertencia como seu autor.

Correram rumores de que alguns dos relatórios desviados da secretaria foram objecto de negociações ilícitas.

Para resolver esta nova e inesperada dificuldade, resolvi arquivar, no meu gabinete, cópias dos documentos de que necessitasse, à medida que fossem produzidos. E para evitar novas intromissões abusivas, as pastas deixaram de ter indicação do que lá se continha, confiando eu na minha memória para as consultar.

Se a secretaria funcionava mal, também a sala de desenho enfermava de graves deficiências.
Quando abordei o Arquitecto Linhares, sobre o apoio que poderia esperar, para o relatório “circunstanciado”, fui informado de que dos três únicos desenhadores de que dispunha, um estava destacado para prestar colaboração aos Serviços Geológicos, outro andava a trabalhar no campo (!) e o terceiro era praticamente ineficaz.
Além disso, havia uma “feira” em preparação, na qual a DGGM iria participar, exigindo actuação prioritária. Só poderia contar com apoio para cópias e pintura de desenhos!

É digno de realce o confronto com o que acontecia, em matéria de desenho, na sede da 1.ª Brigada de Prospecção, em Beja e nas suas Secções de Vila Viçosa, Évora, Ferreira do Alentejo e Castro Verde.
Nesses núcleos, tinham sido preparados para desenhar, com eficácia, mais de uma dezena de trabalhadores, localmente recrutados,
Só assim se tornou possível constituir o arquivo de muitos milhares de mapas, ao qual fiz referência, e que causava a admiração de estrangeiros.
O ex-Director Gouveia comentou que eu nem me apercebera do valor desse arquivo, que lhe havia permitido vender mapas a empresa interessada em firmar contrato de prospecção mineira com o Estado.
De tal capacidade, para a qual pouco ou nada tinham contribuído, estavam a aproveitar-se sobretudo os Geólogos, que haviam subscrito o calunioso documento que conduziu ao meu afastamento da chefia da Brigada (Ver post N.º 81)

Na Secção de Talhadas da 2.ª Brigada de Prospecção, graças à dedicação e ao dinamismo do Colector Silvestre Vilar, que teve o mérito de se tornar excelente prospector, também se conseguiu preparar pessoal para desenhar os mapas respeitantes à actividade da Secção.
A capacidade deste pessoal foi posta à prova, quando em 1-7-74, o Director do SFM pôs em causa a existência da Secção, dispondo-se a extingui-la, pois no seu entender, “não estava a dar nada”.
Foi então possível apresentar, no curto prazo de mês e meio, um relatório em 2 Volumes, com 42 páginas dactilografadas e 25 peças desenhadas, a demonstrar o contrário do que o Director afirmava. (Ver post N.º 62)
O número de desenhos elaborados nesta Secção ultrapassava já um milhar, quando Jorge Gouveia, na sua fugaz presença como Director do SFM, entre outros malefícios a que se dedicou, consciente da impunidade de mais um abuso de autoridade, resolveu suspender os estudos na Faixa Metalífera da Beira Litoral e transferir o pessoal da Secção de Talhadas para a Secção de Coimbra, onde era patente completa desorientação. (Ver post N.º 138).

O Colector Silvestre Vilar, com notável dedicação, que ia muito para além do que seria exigível a um funcionário da sua categoria, ainda me auxiliava, por vezes, na dactilografia de relatórios do 1.º Serviço, mas a sua transferência para o núcleo de Coimbra tornou impossível a continuação desta importante colaboração.

Eu que sempre tivera a preocupação de promover a formação de auxiliares em tarefas secundárias, de modo a libertar-me delas, para poder concentrar-me nas que competiam à minha profissão e que outros não poderiam desempenhar, encontrei-me, na incrível situação de ter que desempenhar funções de dactilógrafo e de desenhador!

O Director-Geral de Minas nem fazia ideia do trabalho que me era exigido, para dar cumprimento às suas insensatas exigências, ele que provavelmente nunca teria elaborado relatório de actividade real, que tivesse desempenhado, no âmbito da profissão de Geólogo.

Mas isto não era tudo! Em vez de serem tomadas providências no sentido de facilitar a execução do relatório que tanta falta estaria a fazer para “programar convenientemente as actividades da DGGM”, ainda me foram criados novos obstáculos.
Até a aquisição de papel vegetal e de papel ozalid, para cópias, me foi dificultada!
Tive que requisitar este material ao Director do SFM, pois a secretaria se recusara a proceder à sua aquisição, como era hábito.
O Director do SFM chegou à mesquinhez de apenas autorizar a compra de papel para um único exemplar dos desenhos do relatório, pondo em dúvida que se justificasse fazer cópias.
Queria primeiro avaliar o conteúdo, ele que me declarara nada perceber de técnicas de prospecção e até ter raiva a quem percebia!

Por estas e por outras razões, que indicarei, em próximos posts, o famigerado relatório “circunstanciado” ia sofrendo constantes atrasos, da exclusiva responsabilidade de dirigentes que, em contradição com a sua actuação, pretendiam que tal relatório fosse rapidamente concluído.