terça-feira, 28 de junho de 2011

175 – Carta para Ministro Almeida Santos acerca de projecto de nova lei de Minas

A seguir, transcrevo a carta que enderecei ao Ministro de Estado, Dr. Almeida Santos, em 12-3-84, reflectindo a minha grande preocupação, perante a iminência de aprovação, na Assembleia da República, de um projecto de nova Lei de Minas, que tinha suscitado generalizada reprovação, em sessões realizadas em várias delegações da Ordem dos Engenheiros, numa das quais eu tive numerosa intervenções, conforme relatei no post anterior:

“Dizer que atravessamos tempos difíceis é já um lugar comum. Muitos de nós bem o sentimos!

A crise internacional e a nossa pobreza intrínseca são constantemente invocadas para justificar a situação.

Mas que se tem feito para modificar esta triste realidade? Estamos nós a aproveitar bem os recursos de que dispomos? Está mesmo feito um inventário sério desses recursos?

Não estaremos nós a desper4diçar energias, como, Ex.ª há pouco disse, “a discutir as Índias, enquanto o barco se afunda”, em vez de procurarmos remediar-nos com o quer temos e não envergonhar-nos a pedir aos vizinhos?

Quem lhe escreve, Senhor Ministro, é alguém que tem passado a sua vida profissional, já longa de 40 anos, esforçando-se por contribuir para criar riqueza tão necessária à sobrevivência do País.

E escrevo-lhe porque, casualmente vi, em jornal do Porto, há pouco mais de 15 dias, o anúncio de uma reunião que iria ter lugar na Ordem dos Engenheiros, para apreciação de nova LEI DE MINAS.

Como técnico com sentido de responsabilidade no sector mineiro nacional, estive presente nessa reunião e, perante o que me foi dado ouvir, fui naturalmente impelido a ter diversas intervenções.
Tomo a liberdade de enviar a V. Ex.ª o resumo que entreguei, em devido tempo, na Ordem dos Engenheiros.

Decidi-me a escrever estas linhas, porque sendo V. Ex.ª bem conhecido como distinto jurista, me causou estranheza que aquele projecto de lei tivesse resistido à sua cuidadosa análise.
Talvez as múltiplas e complexas matérias a que V. Ex.ª tem de dedicar atenção lhe não tenham permitido dispor do tempo necessário para uma análise profunda. Ou talvez tenha confiado que ela tivesse sido feita nos departamentos especializados, por onde terá transitado.

Eu apenas quero chamar a atenção de V. Ex.ª para o que, a seguir, vou dizer.

Em 1939, o Governo teve a feliz imaginação de criar um Organismo oficial com o objectivo de proceder ao inventário da riqueza mineira do País, visando o seu subsequente aproveitamento, em benefício da economia nacional.

Este Organismo, a que foi dado o nome de SERVIÇO DE FOMENTO MINEIRO, teve sempre vida atribulada, porque sempre foi mal dirigido. Todos sabemos como eram escolhidos os principais chefes, no regime anterior a 25-4-74.

No entanto, alguns entusiastas da profissão, entre os quais eu me honro de contar, algo conseguiram produzir.

E se hoje é possível falar no já célebre jazigo de NEVES-CORVO e incluir em numerosos artigos de revistas (mais estrangeiras que nacionais) referências a essa descoberta mineira, quiçá a mais importante deste século na Europa Ocidental, isso só se tornou possível porque eu tomei iniciativas, em circunstâncias difíceis, que permitiram quase encontrar o jazigo! E se não me foi consentido chegar mesmo à descoberta, isso é uma história que talvez venha a contar, se o julgar útil.

Por agora, quero apenas alertar V. Ex.ª para o facto de que esta e outras descobertas que promovi, ou que consegui mesmo, só foram possíveis por existir um SERVIÇO DE FOMENTO MINEIRO que, ao longo dos anos, foi, apesar de tudo, criando alguma tradição nas complexas técnicas da prospecção mineira.

Está prevista, na nova LEI DE MINAS, que o Governo já aprovou e fez seguir para discussão na Assembleia da República, a revogação do Decreto-lei N.º 29 725 de 1939, que atribui ao Estado um papel fundamental no reconhecimento mineiro do País.
Parece confiar-se que tal reconhecimento seja possível, através da acção de empresas privadas, assumindo o Estado um papel secundário.

Afigura-se-nos ser este um erro grave, como salientei nas minhas intervenções na Ordem dos Engenheiros.

Para ele tomo a liberdade de chamar a atenção de V. Ex.ª, e faço-o apenas como português, que sempre se dedicou de alma e coração a estes assuntos, como V. Ex.ª poderá compreender, se mandar passar em rápida revista o meu currículo, que junto envio.

Em tempos, preocupado com o rumo que as coisas levavam, inundei o Governo com documentos comprovativos de que uma sindicância à Direcção-Geral de Minas era indispensável. Porque a não fizeram, não sei.
Mas verifiquei que os principais responsáveis pelos graves erros cometidos, com alguma corrupção envolvida, foram sendo transferidos para outros cargos, sem punição, quiçá passando até a desfrutar de maiores regalias.

Outros vieram ocupar os cargos vagos e alguns mais, entretanto criados.

Como foi feita a escolha para essa ocupação?

Absorvido com a minha actividade técnica, até confiei que a escolha tivesse sido criteriosa, como seria normal. Mas o tempo se tem encarregado de demonstrar que, se as coisas iam mal, passaram a andar muito pior.

A LEI DE MINAS, que está na Assembleia da República, é disso uma demonstração.
O navio a afundar-se e discutem-se as Índias!

Será que não há remédio para estes males?

Julgo que muito poderá fazer-se, mas há que ter a coragem de não continuar a proteger incompetentes, inexperientes e falhos de carácter, apenas por terem a conveniente filiação partidária, ou beneficiarem de outro género de compadrio, afinal ainda presente, não obstante ter havido uma Revolução.

Nada venho pedir para mim. Encaro até, com forte grau de probabilidade, o meu pedido de passagem à aposentação. Espero apenas terminar um relatório que me foi exigido.

Não deveria ser eu a sair e tenho a consciência de que muito ainda poderia contribuir para a criação de riqueza, neste País.

Mas não posso evidentemente esperar - nem mesmo o desejo que o Governo faça sair os muitos que talvez nem devessem ter entrado num Organismo instituído para fomentar o desenvolvimento da indústria mineira nacional e não para travar esse desenvolvimento, como eles parecem julgar.

Apresento a V. Ex.ª os melhores cumprimentos

(a) A. Rocha Gomes

Anexos:
1 – Meu currículo
2 – Resumo das intervenções de A. Rocha Gomes, na reunião que teve lugar, em 23 de Fevereiro de 1984, na Delegação do Norte da Ordem dos Engenheiros, para discussão do projecto de Lei de Minas, Águas Minerais e Recursos Geotérmicos, já apresentado na Assembleia da República.

Conforme referi no post anterior, o projecto não foi aprovado, permanecendo consequentemente em vigor os bem concebidos Decretos Nº 18 713 e 29 725, respectivamente de 1930 e 1939.

domingo, 26 de junho de 2011

174 – A discussão de nova Lei de Minas, na Ordem dos Engenheiros

No post 158, referi o meu grande empenhamento na elaboração de um relatório, que me foi exigido pelo Director-Geral de Minas.

Entre outras razões para tal empenhamento, eu considerava que se me oferecia excelente oportunidade para exemplificar como se conduz uma campanha de prospecção mineira e como se dá conta dos seus resultados,

Esforçava-me por encurtar o prazo de dois anos, que tinha previsto para sua elaboração, trabalhando muito para além do horário normal.
Todavia, em vez de serem tomadas decisões para facilitar as tarefas em que me ocupava, foram deliberadamente provocados incidentes que teriam como natural consequência protelar a sua conclusão.

Além disso, ocorreram, externamente, factos respeitantes à minha actividade passada e ao futuro do Serviço de Fomento Mineiro, que punham em risco a continuidade da existência deste Organismo, aos quais eu não poderia ficar indiferente, já que nenhum outro funcionário do SFM se apresentava a fazer a sua defesa.

Um acontecimento ao qual eu não pude deixar de dar atenção foi a discussão, na Secção Regional do Norte da Ordem dos Engenheiros, de novo projecto da Lei de Minas.

Durante o mandato de Soares Carneiro como Director-Geral de Minas, em reuniões da chamada Comissão de Fomento, foi frequentemente referida a necessidade de actualizar algumas disposições do Decreto-lei N.º 18 713 de 1930, que regulava toda a indústria mineira.
Chegaram a ser introduzidas pequenas correcções, porém nem sempre felizes.

Mas a realidade era que os principais problemas com que se debatia a indústria mineira nacional não resultavam da carência de leis ou da sua desactualização, mas sim de tolerância perante o seu incumprimento.

Alcides Pereira, com o seu característico atrevimento, decidiu mostrar que era capaz de apresentar projecto de nova lei de Minas, Águas Minerais e Recursos Geotérmicos, para substituir legislação obsoleta.
Não conhecia a apólogo de Apeles: “Ne sutor ultra crepidam”

Na sessão realizada, em 23-2-84, na Secção Regional do Norte da Ordem dos Engenheiros, sob a presidência dos Professores Catedráticos da Faculdade de Engenharia, Alberto Cerveira e Simões Cortês e do Engenheiro Azevedo Coutinho, que representava os industriais de Minas, a discussão iniciou-se, sem que tivessem sido distribuídas cópias do projecto.

O Engenheiro Azevedo Coutinho, que se encarregou da apresentação do projecto, declarou que este já tinha sido aprovado em Conselho de Ministros, já se encontrava na Assembleia da República e que só seriam permitidas pequenas melhorias.

À medida que tomava conhecimento do clausulado, fui fazendo intervenções a manifestar a minha preocupação quanto às consequências da aprovação de uma lei que me parecia feita com leviandade, por alguém que desconhecia os reais problemas da indústria mineira nacional.

Quando me foi facultada rápida consulta ao projecto, no intervalo dos dois períodos em que se processou a discussão, aumentou a minha preocupação.
Tendo, então, exprimido ao Professor Cerveira, o parecer de que o projecto teria sido feito sobre o joelho, Cerveira manifesta o seu inteiro acordo, salientando a gravidade do facto.
Considera tal texto produzido por quem nada percebe do assunto, por quem se aproveita da ignorância do Governo e dos deputados para fazer aprovar estas coisas!

Na segunda parte da sessão, continuei as minhas intervenções, com muito mais veemência.
Os Engenheiros que tinham assumido a presidência consideraram, então útil que eu apresentasse um relato escrito dessas intervenções, para ser enviado à Assembleia da República, juntamente com outras exposições também discordantes do projecto.

A seguir, transcrevo o resumo que entreguei, em 27-2-84:

“Não é por falta de legislação que a indústria mineira tem pouco significado na economia portuguesa.

O Decreto-lei base, datado de 1930, está naturalmente desactualizado e seria, portanto, útil que nova lei fosse elaborada. É justo, no entanto, reconhecer que, tendo resistido durante 34 anos, isso reflecte o cuidado que houve na sua redacção.

Outro tanto não pode dizer-se da lei agora submetida a apreciação. Muitas são as falhas que podem apontar-se e nós perfilhamos as críticas de que foi dado conhecimento na exposição do representante da Associação dos Industriais de Minas.

Afigura-se-nos, pois, que o estudo deste assunto não está suficientemente avançado para que se justifique já uma nova lei.

Parece-nos mais prudente manter ainda a antiga, aproveitando todas as suas virtualidades e introduzindo correcções pontuais, onde for caso disso.

A presente conjuntura nacional aconselha a que se concentrem mais os esforços na criação de riqueza.

Na realidade, nem sequer sabemos ainda o que temos, no que respeita a jazigos minerais!

O País ficou surpreendido com a descoberta do jazigo de NEVES-CORVO. Não sabia, porém, que tal descoberta tinha atrás de si cerca de 30 anos de trabalho, que foi possível realizar, com base em leis vigentes.

No Norte do País, quase tudo está por fazer! Quantos Neves-Corvos estarão por descobrir?

É nesse sentido que devem convergir os esforços.

Mas as descobertas não se fazem sem técnicos devidamente preparados. Aí terão as Universidades um importante papel.

Disse o Senhor Ministro da Indústria, recentemente, em reunião efectuada no Serviço de Fomento Mineiro, em S. Mamede de Infesta, que “afinal não somos tão pobres como dizem; o que somos, é pobres em tomar decisões e iniciativas rápidas; nisso somos pobres ou quase nulos”.

Há anos, houve a iniciativa de constituir uma Comissão Instaladora de um Instituto de Geologia, Minas e Metalurgia. A metalurgia estaria a mais, a nosso ver. As actividades nos domínios da geologia e das minas são já suficientemente vastas e absorventes.

Talvez fosse a ocasião de retomar a ideia, mas em bases mais sérias.

Uma colaboração Instituto – Universidades seria, sem dúvida, o processo normal de dar aos complexos estudos geológico – mineiros, um verdadeiro carácter científico, que até hoje tem faltado, em muitos casos, e daí a razão de muitos insucessos.

É fora de dúvida que ao Estado compete o principal papel, nesta matéria.

Seria trágico que o Estado abdicasse dessa sua responsabilidade e procurasse transferir para o sector privado o inventário da riqueza mineira nacional.

As actividades de prospecção e pesquisa envolvem elevadíssimo risco e não são atractivas para as empresas privadas, a não ser para as de muito grande dimensão, na sua maior parte estrangeiras.

O Governo teve, em 1939, a inspiração de publicar o Decreto-lei N.º 29 725, que atribui ao Estado “o estudo sistemático da riqueza mineira do País, para o seu melhor aproveitamento, conforme os superiores interesses da economia nacional”.

Foi, então, criado o Serviço de Fomento Mineiro, que algo produziu, nos seus já quase 45 anos de existência, embora muito mais pudesse e devesse ter feito.

Em poucos países do Mundo, havia, então, Organismo com idênticos objectivos.

No entanto, posteriormente, eles foram sendo instituídos e é hoje muito frequente a sua existência, com maior ou menor âmbito.

Seria, pois, muito lamentável que viesse a perder-se essa posição e alguma tradição e experiência, em tão delicada matéria.

Será utópico esperar que empresas nacionais ou estrangeiras procedam a estudos com o carácter científico que, cada vez mais se impõe. A sua filosofia é, em regra, diferente da de um Organismo oficial.

Elas estão muito mais viradas para objectivos a curto ou a médio prazo e é hoje mundialmente aceite que a prospecção mineira é um empreendimento a longo prazo, ao qual nenhum país poderá furtar-se, se quiser realmente utilizar os seus recursos minerais.

O Organismo oficial, quando convenientemente dirigido, pode orientar-se muito mais até ao âmago das questões. A experiência de muitos anos ligados a estas matérias no-lo indica.

No que respeita às críticas aqui feitas contra a lei em vigor,
1.º porque não salvaguarda, do melhor modo, o interesse nacional, ao manter no regime de pedreiras determinadas substâncias, tais como certas argilas valiosas;
2.º porque as concessões mineiras, sendo atribuídas por áreas e não por jazigo, originam a fragmentação das explorações, podendo torná-las anti-económicas;
é minha opinião que se trata de um análise imperfeita da lei

Na realidade, o § único do artigo 4.º do Decreto-lei N.º 18 713 admite que outras substâncias, além das expressamente mencionadas no art,º 3.º do mesmo Decreto, possam ser concessíveis, desde que o Ministro competente, ouvido o Conselho Superior de Minas, assim o decida.

Se até os sienitos nefelínicos são já concessíveis, outras substâncias, nomeadamente as argilas, o poderão ser.

Em matéria de áreas, julgo haver confusão entre concessões de direitos de prospecção e pesquisa e concessões de direitos de exploração.

As concessões para prospecção e pesquisa dizem respeito a áreas suficientemente vastas para nelas poderem incluir-se inteiramente os possíveis jazigos minerais. Na sua atribuição, devem respeitar-se escrupulosamente os interesses nacionais e isso infelizmente nem sempre tem acontecido, pois têm sido feitas adjudicações sem ter na devida conta os resultados dos estudos efectuados nessas áreas.

As concessões de exploração, embora usualmente assumam a forma de um rectângulo de 50 ha, ou de um quadrado de 100 ha, conforme se trata de um jazigo de 1.ª ou 2,ª classe, podem ter outras configurações e diferente área.

E há sempre a possibilidade do seu agrupamento, em couto mineiro, se pertencerem ao mesmo concessionário.

Tratando-se de concessionários diferentes, há sempre a possibilidade de procurar o seu agrupamento num único consórcio explorador, em conformidade com o disposto mo Decreto-lei N.º 48 823 de 2-1-1969. É certo, porém, que esta disposição legal se tem revelado de mui difícil aplicação.

Ainda relativamente a outros problemas levantados na reunião, chamei a atenção para o facto de eles resultarem mais de não cumprimento das leis em vigor do que de falta delas.

Todos sabemos que as leis senão têm cumprido.

Isso já era reconhecido no preâmbulo do Decreto-lei N.º 29725, quando se afirma que “o objectivo do desenvolvimento diversificado da produção depende mais de iniciativas que faltam do que de disposições de lei” e que se tornava, portanto, necessário”tomar medidas tendentes a tornar mais eficientes preceitos já estabelecidos na lei vigente.”

Posteriormente, isto mesmo tem sido dito e redito, das mais diversas formas e nos mais variados lugares, por entidades responsáveis.

É então caso para perguntar se valerá a pena fazer novas leis e que garantias
há de que passem agora a ser cumpridas

Relativamente à intervenção da Mesa, já no final da sessão, quanto à inutilidade da nossa implícita sugestão de se rejeitar a proposta de lei, tal como foi apresentada na Assembleia da República, porque a lei, tendo passado em Conselho de Ministro, irá mesmo ser aprovada na Assembleia da República, embora consentindo alterações, conquanto não tivéssemos então comentado essa intervenção, ocorre-nos agora dizer que apenas as leis naturais são imutáveis.
Se é possível alterar as leis actualmente em vigor e isso foi o motivo da nossa presença na reunião, não percebemos razão que obste a que se mande aperfeiçoar o texto presente à Assembleia da República, de modo a evitar que se provoque à indústria mineira uma crise ainda maior do que aquela com que já se debate.

Porto, 25 de Fevereiro de 1984
(a) A. Rocha Gomes
Membro da Ordem N.º 2 066-Mi”

Dada a grande importância deste assunto, tomei ainda a decisão de o apresentar à consideração do Ministro de Estado, Dr. Almeida Santos.
A carta que lhe escrevi será transcrita no próximo post.
Permito-me, desde já, revelar que a lei não foi publicada.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

173 - A minha interpretação do despacho final do Ministro Veiga Simão

Veiga Simão deve ter-se sentido embaraçado, quando recebeu o volumoso “processo burocrático”, em que o Director-Geral de Minas, para dar cumprimento ao seu despacho de 27-4-84, procurou explicar os factos irregulares, de sua responsabilidade, que tinham sido por mim denunciados.

E tinha razão para isso!

Ao Secretário de Estado de Energia e Minas, na qualidade de imediato superior hierárquico do Director-Geral e com provável melhor preparação em assuntos mineiros, incumbiria apreciar o processo e emitir parecer, que facilitasse ao Ministro o seu despacho final, sem necessidade de percorrer as 80 ou mais páginas que o processo continha.

Mas, pelo que chegou ao meu conhecimento, o Secretário de Estado, mesmo com a ajuda dos seus assessores, entre os quais se contaria talvez um Geólogo ou um Engenheiro de Minas, não quis dedicar-se à difícil tarefa de desenvencilhar a enorme trapalhada que Alcides conseguiu produzir, após dois meses e meio de penosa gestação.

Não mostrou empenho em disciplinar um departamento que lhe estava subordinado, no qual ocorriam comportamentos desprestigiantes para a função pública, constituindo péssimos exemplos.

Se tivesse feito a análise cuidada que lhe competia, teria certamente sido compelido a propor ao Ministro severas punições aos três perniciosos elementos que estavam a prejudicar o cumprimento dos programas de investigação mineira do SFM: Alcides Pereira, Fernando Daniel e Rui Reynaud.

Teria, também, ordenado rigoroso inquérito aos actos fraudulentos praticados pelos técnicos da 1.ª Brigada de Prospecção e teria ordenado que estes técnicos fizessem a concretização dos prejuízos a essa Brigada, de que me acusaram.
Mas o Secretário de Estado não quis envolver-se em tarefas trabalhosas. Preferiu agir como Pilatos: Dali lavou as suas mãos!

Optou por escrever, em 6-8-84, sobre ofício, em que Delfim de Carvalho, assinando como substituto (!!!) do Director-Geral, remete o processo para o seu Chefe de Gabinete, o seguinte despacho: “Ao conhecimento do Sr. Ministro da Indústria e Energia”.

A incapacidade e consequente passividade alastraram-se, da Secretaria de Estado ao próprio Gabinete do Ministro, pois não consta que deste tenha saído auxílio para desenvencilhar a trapalhada de Alcides.

A realidade é que até eu tive dificuldade em seguir os falaciosos argumentos da tão desorganizada exposição.

O Ministro deve ter-se apercebido dessa desorganização, na rápida análise, que a administração do seu tempo lhe consentira.

Reparou, seguramente, na total ausência de explicação para os factos concretos que eu tinha exposto. Referi alguns no post anterior.
Deve ter notado as múltiplas incoerências relativas a formalismos, apesar de constatar que toda a argumentação estava construída sobre formalismos que eu teria desrespeitado!

Tudo isto o levou a considerar-se suficientemente elucidado sobre o ambiente de indisciplina dominante na DGGM e sobre a dificuldade de corrigir as irregularidades que eu tinha denunciado.

O Ministro, prudentemente, terá pretendido evitar incorrer nos erros cometidos pelos seus antecessores.
De facto, estes, se tiveram a coragem de demitir dirigentes incompetentes e corruptos, não foram felizes nas substituições que fizeram. Os novos dirigentes revelaram características ainda piores, confirmando a famosa lei de Murphy.

Além disso, problemas não faltavam ao Ministro, em época em que os Governos não conseguiam manter-se, senão por curtos períodos. A instabilidade governativa era uma característica da época que se vivia.

No seu despacho final, o Ministro ter-se-á baseado essencialmente nas informações fidedignas, a meu respeito, do seu amigo de infância, Professor Vasco Rodrigues, cuja integridade de carácter bem conhecia e também no que eu pessoalmente lhe transmiti.

Isso o levou a “recomendar ao Director-Geral de Minas que aproveitasse a minha capacidade técnica, no cumprimento dos programas superiormente aprovados”.

O Ministro, reconhecendo a impossibilidade de agir, como provavelmente desejaria, apelou à “boa vontade” do Director-Geral.

Era óbvio que o Director-Geral não iria respeitar a recomendação do Ministro, nem se terá apercebido da implícita reprimenda nela contida.

Veremos, em próximos posts, que a acção nefasta do triunvirato Alcides – Daniel – Reynaud continuaria, ostensivamente, a fazer-se sentir.

sábado, 18 de junho de 2011

172– Audiência concedida pelo Ministro Veiga Simão e suas consequências. Continuação 8

Continuo a análise do “Parecer” de Alcides Pereira, sobre a “Informação” apresentada por Reynaud, em obediência a instruções que recebera, no sentido de dar cumprimento a despacho ministerial que exigia explicação para irregularidades praticadas na DGGM, as quais haviam sido por mim denunciadas.

O modo como é feita referência ao 1.º capítulo do Relatório da prospecção mineira realizada, sob minha orientação, na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima, deixa-me perplexo.
Eu anexara este Capítulo, intitulado “Informação introdutória circunstanciada” à minha exposição.
Nele, descrevia os obstáculos criados por dirigentes incompetentes e desonestos, sobretudo após a Revolução de Abril de 1974, a impedir a concretização de êxitos que laboriosamente vinha preparando.

Deduzi que Alcides Pereira não terá conseguido ler as 46 compactas páginas desse “Capítulo”, porquanto nelas teria encontrado motivo, não para salientar que finalmente eu tinha apresentado “relatório”, em cumprimento da sua despropositada ordem, mas para explicar os factos nelas relatados.

Dentre esses factos, destaco os que foram pormenorizadamente descritos, em reunião por mim provocada, na Secretaria de Estado da Indústria, em 10-8-1977, para justificar pedido de sindicância à Direcção-Geral de Minas, perante o actual Director-Geral de Minas, que então era Assessor do Secretário de Estado e me recebera, em representação deste membro do Governo. (ver post N.º 112).

Ao acentuar o meu “bom trabalho anteriormente à sua nomeação para o cargo de Director-Geral”, de que disse ter tomado conhecimento através da consulta ao meu processo individual, Alcides está a contradizer os técnicos da 1.ª Brigada de Prospecção, que me acusaram de ter “ocasionado graves prejuízos ao País com deficiências de planeamento, etc …” (Ver post. N.º 83)
Não justifica como consegue concordar com os elogios prodigalizados por Reynaud, a esses técnicos.

Também não demonstra a mínima intenção de promover o inquérito reiteradamente por mim reclamado, para que aqueles técnicos, autores do ignóbil documento, que esteve na base do meu afastamento, “a título provisório” da chefia da 1.ª Brigada de Prospecção, comprovassem as suas acusações.
Este inquérito deveria ser considerado fundamental para sanear o ambiente deletério dominante no SFM e instaurar a disciplina essencial à produção de trabalho útil.

Acerca das minhas divergências com estes e outros técnicos do SFM, Alcides apresentou “vária documentação”, incluída nos seus Anexos N.º 8 e 9.

Do Anexo 8, especialmente referido, constava exposição e informação do anterior Director do SFM, Eng.º Jorge Gouveia, ao Secretário de Estado, sobre matéria que me dizia respeito.
É pena que estes Anexos não tenham constado do processo burocrático que Daniel me enviou, pois talvez neles se encontrasse explicação não só para o meu impossível bom relacionamento com indivíduos de mau carácter, mas também para o facto de o Secretário de Estado não ter dado andamento à exposição de Jorge Gouveia e ter preferido demitir este Engenheiro do cargo de Director do SFM, no mesmo ano da sua exposição.

Alcides nem uma palavra disse sobre a sua passividade relativamente às fraudes com ajudas de custo, que continuavam a ser praticadas, em plena impunidade, na 1.ª Brigada de Prospecção.
Ele sabia que os técnicos residentes em Beja raramente se deslocavam ao campo e que os seus boletins itinerários, mencionando deslocações diárias, eram, consequentemente, fraudulentos.
Mas não teve pejo de insinuar, quando me proibiu de fazer trabalho de campo, que as minhas reais e frequentes deslocações teriam como objectivo “fazer ajudas de custo”.
A realidade era que a minha presença assídua era indispensável, para o progresso das investigações em que me empenhava, as quais estavam a ser descritas “circunstanciadamente”, no Relatório, que tinha em elaboração.

Nada sobre a desagregação da 1.ª Brigada de Prospecção, que estava conduzindo aceleradamente à sua quase total ineficácia.

Nada sobre a retoma dos estudos na Faixa Metalífera da Beira Litoral, que o ex-Director do SFM, Jorge Gouveia, suspendera com o ridículo argumento de não terem sido incluídos no Plano de Trabalhos submetido a aprovação ministerial!

Nenhuma justificação para a sonegação dos relatórios de Union Carbide, que eu pretendia integrar na documentação respeitante à Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima.
Esta documentação era basilar para o aperfeiçoamento da planificação das actividades de prospecção, que eu continuava a dirigir nesta Região.

Alcides Pereira alude a um “diploma orgânico” da DGGM, publicado em 8-6-83, mas não menciona o Decreto que o contém.
Esta grave lacuna é muito estranha, verificando-se que Alcides é muito concreto relativamente a outros documentos, sendo disso exemplo esta Informação da qual não esqueceu mencionar o N.º 142/350/84 e despachos muito menos importantes, aos quais deu os N.º 5/100/84, 10/100/84 e 16/100/84.

Eu já me tenho referido, por diversas vezes, à inexistência do diploma orgânico previsto pelo Decreto-lei N.º 548/77, ao qual deveria obedecer toda a actividade da DGGM.
Sem aguardar a sua publicação, o Ministro confiou que seriam respeitadas as exigências de competência, nas nomeações para os cargos directivos que, inadvertidamente, se apressou a instituir, naquele Decreto.
Já vimos que tal exigência foi escandalosamente desrespeitada.

É deveras estranho que Reynaud não tenha invocado esse diploma orgânico, para justificar as atitudes dos novos dirigentes para comigo e se tenha referido apenas a “estruturas” – também para mim desconhecidas - nas quais eu não me “enquadrava”.
É também muito estranho, que Alcides não tenha baseado no mesmo diploma, toda a sua argumentação sobre “formalismos” que eu teria desrespeitado.
É óbvio que tal diploma não tinha sido publicado. É mais uma das invenções de Alcides. Afigurou-se-lhe conveniente invocá-lo, para justificar a exoneração de dois Subdirectores-Gerais.

A realidade é que eu continuava a assumir as funções de Chefe do 1.º Serviço, isto é do Serviço de Prospecção Mineira, instituído pela “Orgânica” estabelecida em fins de 1963, que se mantinha em vigor. (Ver post N.º 26),
A permanência da Secção de Caminha e da 1.ª Brigada de Prospecção, com as suas Secções, tal como tinham sido criadas pela Orgânica de 1963, é disso demonstração.

Nas referências a Planos de Trabalhos, Alcides atinge o máximo da desorientação.
Sou censurado por “dar continuidade a acções que eu próprio planeava”, as quais tinham tido início 16 anos antes do seu ingresso ma DGGM.
Ao mesmo tempo, sou criticado por não apresentar planos de trabalhos!

Sou também surpreendido com duas extraordinárias revelações.

A primeira é de que tinha sido feita uma redefinição de todo o programa de actividades dos Serviços de Fomento Mineiro.

A segunda é de que se procurara ensaiar um entrelaçamento dos Serviços da Direcção-Geral, em áreas mineiras particularmente favoráveis em que eu podia dar uma “continuação” positiva, considerando a região de Caminha propícia a constituir o “embrião” de uma nova política mineira.

Nada disto me tinha sido comunicado, nem eu aceitaria alterações da autoria de indivíduos sem a mínima experiência em actividades mineiras, aos Planos que eu vinha cumprindo, com pleno êxito, desde 1964, apenas porque tais indivíduos tinham sido investidos em cargos directivos, desrespeitando as exigências impostas pelas leis quanto a qualificação para o exercício desses cargos.

É uma refinadíssima mentira que tivesse sido acordada a constituição de qualquer equipa de projecto, onde eu ficasse integrado, e que tivessem sido realizadas quaisquer reuniões no Porto para esse efeito.

Eu nem sequer aceitaria, como já tinha informado (Ver post N.º 166) a intromissão de Reynaud, ou outros técnicos sem preparação, para dar cumprimento ao projecto de Caminha.
Os 4 auxiliares que comigo colaboravam e que eu tinha instruído eram muito mais importantes que inexperientes técnicos, embora com cursos superiores, que se propunham parasitar os trabalhos que outros faziam.

A extraordinária prosápia de pretender introduzir “o embrião de uma nova política mineira”, que consistiria no “entrelaçamento dos Serviços da DGGM” e na “redefinição das estruturas empresariais existentes” é de um ridículo impressionante, sobretudo tendo em consideração a sua inexperiência em actividades mineiras.

Efectivamente, desde 1939 que vinha acontecendo estreita e eficaz colaboração com empresas mineiras, com base nas oportunas disposições instituídas no Decreto-lei de criação do Serviço de Fomento Mineiro.

Os estudos realizados na Faixa Carbonífera do Douro, na Faixa Piritosa Alentejana, na Região de Cercal – Odemira, na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima são disso exemplos bem significativos.
Os resultados conseguidos, dos quais os concessionários foram os principais beneficiários, demonstram não ser necessário inventar novas políticas mineiras, mas apenas aproveitar devidamente as virtualidades das disposições legais há muito tempo em vigor.

Antes de terminar esta análise do documento de Alcides Pereira, não posso deixar de mencionar mais alguns casos, em que esse técnico de papel selado, como lhe teria chamado Castro e Solla, desrespeita formalismos tradicionais, demonstrando ser ele e não eu, responsável por “clara e inequívoca insubordinação às mais elementares regras de funcionalismo”:

1 - É inadmissível a apresentação das explicações requeridas pelo Ministro sob a forma de Parecer sobre informação confiada a funcionário subalterno;
2 - É incompreensível que tenha sido o Subdirector-geral, a cujo cargo estavam os “Serviços Geológicos”, a dar seguimento a este “Parecer”;
3 – É incorrecto que o “Parecer” tenha sido remetido para o Chefe de Gabinete do Secretário de Estado da Indústria e não directamente para este membro do Governo.

Também se me afigura muito estranho não encontrar qualquer referência a exame que tenha sido feito pelo Secretário de Estado, sobre a documentação que lhe terá passado pela mão, o que não abona em seu favor. Penso que teria obrigação de emitir opinião que facilitasse o despacho final do Ministro.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

171 – Audiência concedida pelo Ministro Veiga Simão e suas consequências. Continuação 7

Em posts anteriores, descrevi o surpreendente “jogo do empurra” e o “sacudir de água do capote” de vários dirigentes, aos quais competia dar a explicação requerida pelo despacho do Ministro Veiga Simão, sobre a exposição que eu lhe entregara, a solicitar urgente correcção dos desmandos que, impunemente, ocorriam na DGGM.

Fiz já a análise da “Informação” de que fora encarregado o Engenheiro Reynaud, arvorado em advogado de defesa dos seus superiores e de outros técnicos igualmente implicados em acções destrutivas do SFM.
Analisei também o curto, “despacho”, com que o Director do SFM, Fernando Daniel, autor da maioria dos factos graves que denunciei, procurou libertar-se das suas responsabilidades.

Vou agora analisar o documento elaborado pelo Director-Geral de Minas, Alcides Pereira, com a curiosa designação de “Parecer” sobre a “Informação” de Reynaud.

Em 10 dias de gestação, Alcides Pereira conseguiu produzir “Parecer” de 6 páginas dactilografadas que, com 9 Anexos, constituiu volumoso processo burocrático de mais de 80 páginas.

Deste processo, foram-me deliberadamente ocultados documentos essenciais para completo esclarecimento da argumentação utilizada para justificar os comportamentos ofensivos da minha dignidade pessoal e profissional, que estiveram na base da exposição que enviei ao Ministro.

Mas o que chegou ao meu conhecimento é suficiente para caracterizar Alcides Pereira como um expressivo exemplo de como é possível, neste País, indivíduo perverso e medíocre ser nomeado para o alto cargo de Director-Geral.

Constou que tal Chico esperto até aspirou desempenhar funções governativas.
Quando conseguiu chegar a Chefe de Gabinete de membro do Governo, ter-se-ia apercebido da escassa exigência de qualidades para tal desempenho.
E tinha alguma razão! Eu já tive oportunidade de assinalar que um Secretário de Estado, em curtíssimo despacho, foi capaz de fazer uma afirmação e a sua contrária. (Ver post N.º 99)

Deste “Parecer” de Alcides, pródigo em futilidades e descaradas mentiras, nada se aproveita.

Apesar de ignorar o teor do despacho ministerial, é para mim evidente que o Ministro não pretenderia tão volumoso quão atabalhoado processo.
Obviamente, esperaria sucinta e objectiva clarificação dos factos de que tomara conhecimento e não “parecer”, com “esfarrapadas desculpas de mau pagador” apoiadas em “Informação” de funcionário subalterno, “ad hoc” investido em advogado de defesa.

Incapaz dessa clarificação, Alcides Pereira refugiou-se em “formalismos”, que eu teria desrespeitado, repetindo o que constava da “Informação” de Reynaud e insistindo nas falsidades em que esta se apoiava.

Todos esses formalismos se fundamentavam nas situações ilegalmente constituídas, através dos assaltos aos cargos de chefia, a que me tenho referido, em numerosos posts.

Mas até em matéria de formalismos, Alcides manifestava as suas incoerências.

De facto, ele já tinha desrespeitado normas tradicionalmente estabelecidas, ao encarregar a sua secretária de me transmitir “recado” para me apresentar em Lisboa, no seu gabinete, em determinada data, sem sequer informar qual a agenda de trabalho. (Ver post N.º 150).

Voltara a desrespeitar formalismos tradicionais, ao considerar normal que Daniel tivesse encarregado a sua secretária de me mandar apresentar ao Eng.º Vítor Borralho, ou ao Eng.º Luís Costa ou ainda ao Dr. Rui Rodrigues.

Também não falou directamente comigo, quando ordenou a minha presença, no seu gabinete, em 7-2-84. A convocatória foi feita através de telefonema para Reynaud!

Antes de Alcides Pereira ter sido colocado no cargo de Director-Geral, isto é, nos 37 anos que eu já contava de funcionário público, nenhum dos meus superiores, me transmitiu ordens por interpostas pessoas!

Toda a sua desconexa e incoerente argumentação incide sobre o meu “enquadramento” que afirma ter sido tentado, sem sucesso, em “estruturas” (!) onde também se enquadrassem os dirigentes recentemente introduzidos na DGGM, sem base legal.

Porém, não reparou que, ao declarar ter ficado acordado o meu “enquadramento” na “dependência directa do Subdirector-Geral, funcionando como seu assessor, num projecto definido”, estava a desmentir a afirmação do Director do SFM de eu ter sido colocado na dependência de Reynaud e, consequentemente, a retirar toda a credibilidade à “Informação”, em que baseava o seu “Parecer”!

A pesporrência de Alcides atingiu o auge, no final do seu “Parecer”.
Declarando não abdicar das suas responsabilidades, considerava impensável e inadmissível continuar a ter contemplação com o meu desrespeito permanente por todos os funcionários e chefes da DGGM, numa clara e inequívoca insubordinação às mais elementares regras do funcionalismo.

Alcides, de facto, não tinha consciência das responsabilidades de um Director-Geral de Minas.
A sua principal responsabilidade seria fazer cumprir a legislação vigente, com o objectivo essencial de promover o racional aproveitamento dos recursos minerais do País, em benefício da economia nacional.
Mas isso não despertava o seu interesse! A sua grande preocupação centrava-se na destruição dos raros núcleos do SFM, onde ainda se conseguia manter alguma actividade produtiva.

È incompreensível que não se tenha apercebido da imperiosa necessidade de diligenciar no sentido de as Circunscrições Mineiras serem reintroduzidas, no âmbito da DGGM, pois a sua saída tinha sido mais um dos calamitosos erros de Soares Carneiro.
As Circunscrições desempenhavam ou deveriam desempenhar um dos principais papéis da DGGM.

Mas muitas outras acções deveriam merecer a ocupação do seu tempo profissional.

Deveria, por exemplo, estar atento ao que se estava passando relativamente à entrada em exploração do jazigo de Neves-Corvo, de cuja descoberta sou o principal responsável e procurar que se não adicionassem mais erros aos praticados pelo seu antecessor, que conduziram à alienação em proveito de estrangeiros, de uma riqueza que deveria reverter essencialmente em benefício dos portugueses, tal como eu já preconizava, no artigo “Prospecção de pirites no Baixo Alentejo”, publicado em 1955. (ver post N.º 11)

Porém, Alcides, sem capacidade para se ocupar dos reais problemas a que a sua elevada categoria obrigava, preferiu entreter-se a inventar ordens superiores às quais eu teria desobedecido.

Não concretizou, porém, a que ordens se referia, nem o poderia fazer porque tais ordens nunca existiram.

Durante o mandato de Alcides, as únicas ordens que recebi até à data do Parecer que estou a analisar, foram as seguintes:
1 – Ordem transmitida por telefone, pela sua secretária para me apresentar em Lisboa, no gabinete de Alcides, em 9-9-83, sem agenda de trabalhos; (Ver post N.º 150);
2 – Ordem telefónica de Daniel para me apresentar no seu gabinete em Lisboa, em 6-2-84, com “papéis” para se conversar sobre o projecto de Caminha; (Ver post N.º 156)
3 – Despacho de Alcides, com data de 7-2-84, para apresentar relatório circunstanciado sobre a minha actividade, na região de Caminha, na qual era também determinada a minha proibição de realizar trabalho de campo, até à conclusão desse relatório; (Ver post N.º156)
4 – Despacho de Alcides Pereira, que me foi comunicado por Fernando Daniel, em 27-7-84, para eu indicar, no prazo de 10 dias, quando terminaria o relatório. (Ver post N.º 158)

A todas essas ordens, dei ou estava dando rigoroso cumprimento.

Considerando a extensão do “circunstanciado” relatório de uma actividade q ue se tinha desenvolvido durante 20 anos e o elevado número de peças desenhadas, de cuja elaboração fui compelido a encarrega-me, praticamente sem apoios, eu tinha previsto concluir esse relatório em Maio de 1985.
Nele me estava ocupando, não só no horário normal, mas também em muitas horas extraordinárias, mesmo em sábados e domingos, sem qualquer remuneração (!), para tentar encurtar o prazo de dois anos que indicara.
Esperava, como já disse, que tão dilatado tempo provocasse intervenção no sentido de diminuir o nível das exigências formuladas na Ordem de Serviço de 7-2-84.
Como não houve essa intervenção, nem diligências no sentido de facilitar as tarefas em que me ocupava (pelo contrário, até foram introduzidos obstáculos), considerei que a data tinha sido considerada aceitável.

Afinal, agora Alcides censura o “atraso” na entrega do relatório, salientando que só recebera o 1.º capítulo!!

Tem a desfaçatez de lamentar o esforço que lhe originei, durante os 10 dias (!!) de que necessitou, para elaborar o “Parecer”, que ele próprio classifica de improdutivo e também o dispêndio em papel e fotocópias!!!

Não repara que ele e os seus comparsas, com todas as facilidades de que dispunham, demoraram dois meses e meio, para produzir explicações que, no máximo de dois ou três dias, tinham obrigação de apresentar.
No mesmo lapso de tempo e sem quaisquer ajudas, eu conseguira entregar o 1.º capítulo, com 46 páginas, do relatório e tinha elaborado 80 peças desenhadas, do conjunto de 246, que iria fazer parte desse relatório.

Alcides não fazia a menor ideia do que me tinha exigido, da vastidão da matéria a relatar!

Apesar deste meu rigoroso cumprimento das ordens que tinha recebido, embora discordando de algumas, o “sem-vergonhista” Alcides, como lhe teria chamado Odorico Paraguaçu da célebre televonela brasileira, teve o arrojo de classificar de benevolente a atitude dos dirigentes para comigo, perante o meu desrespeito permanente por todos os funcionários e chefes da DGGM, numa clara e inequívoca insubordinação às mais elementares regras do funcionalismo.

Provavelmente, Alcides pretenderia referir-se à minha real desobediência às ordens emitidas pelas Comissões de Direcção e Técnica de Planeamento, criadas no SFM, durante os mandatos de Soares Carneiro e Múrias de Queiroz.

De facto, ele citava, no Anexo N.º 9, de que me não foi enviada cópia, documentos reveladores de divergências, num período dominado pelo que eufemísticamente classificou de “vicissitudes”, mas que eram, de facto, acções criminosas.

Por alguma razão, tinham sido demitidos aqueles dirigentes.

Neste Anexo, provavelmente referiria a ameaça de Múrias de Queiroz de proceder para comigo, até às "últimas consequências” (Ver post N.º 105), se não apresentasse relatórios que me exigia, na qualidade de Presidente de uma ilegítima Comissão de Direcção, que subitamente teve que ser dissolvida, em consequência da Resolução de Conselho de Ministros de 15-1-79. (Ver post N.º 126)

Referir-se-ia também à ameaça de Soares Carneiro, de “sansões” (sic) disciplinares, por eu me recusar a cumprir ordens desta ilegal Comissão. (Ver post N.º 105)
Curiosa a referência a decisão tomada de tratar em definitivo da minha situação, de acordo com o que pensava o então Secretário de Estado e o já demitido Soares Carneiro.
Teriam tentado a minha expulsão da Função Pública, como pretendera Múrias de Queiroz, com a sua ameaça de chegar às últimas consequências?

Aludiria ainda, à atitude de Delfim de Carvalho, quando na reunião de 22-12-76, afirmou que declarações produzidas por mim e por Dr. Gaspar, em reunião de trabalho na Universidade de Aveiro, se tivessem sido feitas a respeito de empresas particulares, constituíam motivo para rescisão de contrato”. (Ver post N.º 110)

Tão profunda insubordinação não se concilia com o elogio que Alcides faz à minha “validade como Técnico e ao meu bom trabalho desenvolvido anteriormente à sua nomeação como Director-Geral”.

A enorme “benevolência”, de que terei beneficiado, permitiu, afinal que eu me mantivesse em funções.
É esclarecedor que o mesmo não tenha acontecido com Soares Carneiro e Múrias de Queiroz, que foram afastados dos cargos dirigentes que ocupavam.

Seria de excepcional interesse que Alcides, tendo modesta categoria de carácter administrativo, no GPPEP e sendo totalmente inexperiente em geologia e minas, explicasse como conseguiu ser nomeado Subdirector-Geral, e explicasse também qual a relação com a passividade que demonstrou perante as minhas acusações na reunião de 9-9-83, na Secretaria de Estado, da qual até teve o descaramento de dizer não se lembrar !!!!

É suficientemente esclarecedor que Soares Carneiro tenha recusado o ingresso na DGGM ao Geólogo, Edmundo Fonseca. que tinha desempenhado idêntico cargo em Gabinete de Ministro, e que era detentor de muito melhor currículo.
Edmundo Fonseca, que me fez esta revelação, estava, então, preparando a sua tese de doutoramento na Universidade de Aveiro, com base em matéria por mim sugerida, resultante de estudos do SFM, feitos sob minha orientação, na zona do Sanguinheiro da Faixa Metalífera da Beira Litoral.

O tema da “benevolência” justificaria algum desenvolvimento. Porém, o que já ficou descrito, em vários posts, é suficientemente elucidativo.

Quero, no entanto, registar que nunca esperaria de indivíduos ilegalmente investidos em cargos directivos e altamente comprometidos em actos desonestos, atitudes condescendentes para comigo, nem isso constituía preocupação da minha parte.
Sempre agi de acordo com os princípios de honestidade, lealdade e desejo de bem servir o País, independentemente das consequências que os meus actos pudessem originar, no ambiente deletério da DSGGM.

Estes indivíduos foram tão longe quanto lhes foi possível, tendo porém o cuidado de não ultrapassar limites que suscitassem investigações sérias, que tornassem impossível continuar a ignorar as suas irregularidades.
Entre atitudes de agressividade de que fui alvo, posso citar a proibição de realizar trabalho de campo, constante do “despacho” de Alcides de 7-2-84, o seu insulto ao dizer para “não fazer ajudas de custo”, como se esse fosse o objectivo das minhas deslocações ao campo, a ameaça de processo por incompetência proferida por Daniel.

Alcides encontrou ainda motivo para censura, nas “inconveniências”, que eu teria proferido, as quais tinham sido objecto de denúncia, pelo Eng. Vítor Borralho.
Não se referiu a essas “inconveniências”, durante a reunião de 7-2-84 e foi pena, porque Vítor Borralho teria oportunidade de especificar os prejuízos por mim ocasionados às “vastas e delicadas tarefas a cargo da 1.ª Brigada de Prospecção” e justificar porque abandonara a Brigada, pela qual quisera demonstrar tamanho interesse.

E cúmulo dos cúmulos, até me responsabiliza pelo “trabalho de campo em atraso e pelo apoio a empresas que se não fez”, originado pela sua afrontosa proibição de eu fazer trabalho de campo!!!

Extraordinária a declaração da necessidade de “arrancar” (!!!) urgentemente, com os trabalhos de campo, com base no que já foi produzido, tendo-me proibido de me deslocar ao campo … e de fazer “ajudas de custo”!!!.
Não se tinha preocupado em deixar esses trabalhos entregues aos 4 únicos auxiliares que constituíam o núcleo de Caminha.

Em post futuro, revelarei que, das desastradas intervenções de Alcides, o que resultou não foi o arranque de nova metodologia de acções – de carácter secreto, pois que dela nunca me tinha sido dado conhecimento, mas sim a total extinção da actividade na Região!

Continua …

terça-feira, 7 de junho de 2011

170 – Audiência concedida pelo Ministro Veiga Simão e suas consequências. Continuação 6

Em 27-4-84, entreguei, pessoalmente, ao Ministro Veiga Simão, cópia de documentação que lhe tinha enviado em 26-3-84, comprovativa de factos graves que estavam a ocorrer na DGGM, para cuja correcção solicitava a sua urgente intervenção.
Tive confirmação das minhas suspeitas de que a documentação original não tinha chegado à sua mão.

O Ministro exarou despacho sobre a cópia, pedindo explicações, no próprio dia em que dela tomou conhecimento,

Não me foi comunicado o teor deste despacho.

Fiquei, porém, a saber que a documentação transitou pelo Secretário de Estado, pelo Director-Geral de Minas e pelo Director do Serviço de Fomento Mineiro, e que todos se esquivaram a dar as explicações que lhes competiam, em jeito de “sacudir a água do capote”.

Esse encargo foi parar num Engenheiro que, não tendo funções definidas na DGGM, dispunha de tempo para ocupar com exercícios académicos, repetindo cálculos de reservas que já constavam de relatórios de uma Companhia americana, que actuara na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima, dos quais se tinha abusivamente apropriado.

Como a documentação que eu enviara ao Ministro se referia principalmente a factos respeitantes a esta Região, o Director-Geral da DGGM e o Director do SFM, apressadamente declararam, sem fundamento em quaisquer ordens de serviço anteriores, este Engenheiro, de nome Rui Reynaud, “responsável pelo projecto de Caminha”, que havia sido por mim instituído há cerca de 20 anos e no qual eu vinha trabalhando, com assinalável sucesso!

Rui Reynaud aceitou esse encargo e fez questão de o desempenhar, com inexcedível zelo.
Constituiu-se advogado de defesa do Director-Geral de Minas, do Director do SFM e até da equipa técnica da 1.ª Brigada de Prospecção sediada em Beja, baseando toda a sua argumentação em instruções e informações, que recebera dos seus superiores, sem curar de investigar se eram fidedignas e correspondiam ao que constava de documentação arquivada.

Nos três posts anteriores, analisei a “Informação” que Rui Reynaud apresentou em 17-7-84.
Avalio quão penosa deve ter sido esta demorada gestação de dois meses e meio, de um produto completamente inútil e desfasado da essência dos factos que deviam ser cabalmente explicados.

Mas foi sobre esta “Informação” e não sobre os factos graves denunciados na Documentação que eu enviara ao Ministro – como seria lógico - que tanto o Director do SFM como o Director-Geral de Minas se pronunciaram.

Daniel, apesar de ter sido o principal responsável pelo desencadear das indecorosas atitudes do Director-Geral e de outros funcionários com categorias de dirigentes, por se ter furtado, cobardemente, ao encontro em 2-2-84, para que me havia convocado, com o pretexto de súbita doença, na qual eu ingenuamente até acreditara, manteve-se coerente com a declaração que havia feito de não ter ingressado no SFM para trabalhar.
Exigir-lhe--ia muito esforço mental explicar as trapalhadas em que se foi envolvendo, desde que assumiu o cargo de Director do SFM.

Não justificou porque não corrigiu qualquer das irregularidades herdadas dos seus antecessores, para as quais chamei insistentemente a sua atenção, permitindo que elas continuassem, em total impunidade, tornando-se portanto cúmplice.
Não justificou porque, em vez de se preocupar com o desenvolvimento da indústria mineira nacional, estimulando os estudos sérios que estivessem em curso e criando novos núcleos para investigação de áreas com potencialidades já reconhecidas, continuou a obra de destruição em que se tinham empenhado os seus antecessores.
Pelo seu comportamento negativo, tinha-se tornado mais um problema a adicionar aos muitos com que o SFM já se debatia.
Tudo isto constava da minha exposição ao Ministro, mas Daniel considerou que devia limitar-se ao que consta do curto despacho que, a seguir, novamente reproduzo:
Ao Sr. Director Geral: A informação do Director do Projecto Caminha que engloba o trabalho do Eng.º Rocha Gomes, mostra bem qual a atitude revelada até agora. Os poucos elementos conseguidos revelam uma actividade com mérito, embora sem continuidade, por falta de informação. A dificuldade de integração verifica-se só num sentido confirmando a atitude beligerante do Eng.º Rocha Gomes. O plano de trabalhos ainda não foi apresentado. (a) Fernando Daniel 18-7-84

Como já tive ocasião de registar, é uma descarada mentira a declaração de que o Engenheiro Rui Reynaud tinha sido nomeado Director do Projecto de Caminha. Nunca foi emitida tal Ordem, oralmente ou por escrito, nem eu obviamente a aceitaria, por razões óbvias, já abundantemente expostas.

Não consegui perceber a que elementos pretendia referir-se, que “revelam uma actividade com mérito”.
Como já registei, em posts anteriores, tentei, nos raros encontros, que consegui ter com Daniel, nas instalações de S. Mamede de Infesta e na área onde incidiam os estudos, na Região de Vila Nova de Cerveira - Caminha – Ponte de Lima, informar em que consistiam esses estudos, os sucessos já alcançados e os objectivos em vista com a sua continuidade.
Por outro lado, quando me convocou para a reunião de 2-2-84, fui carregado com pesado volume contendo numerosos documentos respeitantes aos estudos já realizados, o qual nem cheguei a abrir, por Daniel se ter esquivado a esse encontro.
E Reynaud, que passou a colaborar na descarada mentira de ter sido designado “responsável pelo projecto de Caminha”, também não mostrou a mínima de curiosidade em examinar esses documentos!
Nem Daniel nem Reynaud demonstraram ter tido noção exacta do valor do que lhes tinha conseguido mostrar, pelo que a avaliação do mérito da actividade revelada nos “poucos elementos” a que se refere Daniel é totalmente destituída de significado.

Quanto à minha atitude beligerante, só posso dar-lhe razão.
De facto, sempre lutei denodadamente, em defesa do Serviço de Fomento Mineiro.
Era, consequentemente, minha intenção promover a expulsão dos assaltantes, que ilegalmente se tinham apoderado de cargos dirigentes.
Eles não tinham competência para o desempenho desses cargos e estavam, por isso, a impedir a concretização dos objectivos para que o SFM tinha sido instituído.
Dentre esses assaltantes, contavam-se obviamente Alcides, Daniel e Reynaud.

A minha beligerância verificou-se, como Daniel reconhece apenas num sentido, isto é, no sentido de responsabilizar dirigentes corruptos, desonestos e incompetentes.

No sentido contrário, isto é, para com os meus subordinados, sempre promovi o seu aperfeiçoamento, quer ministrando-lhes ensinamentos, quer diligenciando para que estagiassem em instituições onde pudessem melhorar a sua formação profissional.

Já o mesmo não poderá dizer Daniel, que logo no início do seu mandato fez ameaças que justificaram o epíteto de “corta-braços” com que logo foi baptizado.
Gabava-se de ter “carta branca “ de Alcides, para actuar com dureza relativamente aos funcionários que não entrassem no seu esquema. (Ver post N.º 152)
De corta-braços, passaria a “matador”, quando se mostrou disposto a “matar” concessionários que se encontrassem em dificuldade para cumprir a obrigação de manter as concessões em lavra activa. (Ver post N.º 154)
Mostrou, assim, desconhecer o articulado do Decreto-lei de criação do SFM, que previa assistência técnica e financeira, em casos devidamente justificados. Tinha sido com base neste articulado que eu prestara a assistência aos concessionários da região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima, que estava na base das explorações que nelas se mantinham.

Sobre a referência ao Plano de Trabalhos que declara ainda não ter sido apresentado, já fiz comentário na minha análise do depoimento de Reynaud.
Mas, além da exigência de tal Plano ser mais uma das mentiras em que Daniel se mostrou fértil, ocorre-me perguntar para que pretenderia ele um Plano para os trabalhos que queria ver terminadas até ao fim de 1984 (Ver post N.º 153), estando já em meados de Julho desse ano e tratando-se de actividades que decorriam criteriosamente planificadas há cerca de 20 anos.

Continua …

segunda-feira, 6 de junho de 2011

169 – Audiência concedida pelo Ministro Veiga Simão e suas consequências. Continuação 5

O Director-Geral de Minas e o Director do SFM, sentindo-se incapazes de explicar os factos graves que ocorriam na DGGM, por mim revelados, em documentos que, pessoalmente, entregara ao Ministro, em repetição de originais anteriormente enviados, mas que não haviam chegado à sua mão, endossaram ao Engenheiro Rui Reynaud o despacho ministerial que exigia tais explicações, com o argumento falacioso de Reynaud ser o “responsável pelo relançamento do projecto de Caminha”.

Este Engenheiro, que tinha conseguido ser nomeado Director de Serviço, em 1981, na vaga de assaltos aos cargos de chefia criados pelo Decreto N.º 548/77, em atitude subserviente, prestou-se a desempenhar o papel de advogado de defesa, ao dar cumprimento a instruções para referir ordens que eu não teria acatado, embora consciente de que tais ordens nunca tinham sido emitidas, oralmente ou por escrito.
Mas, no seu vergonhoso servilismo, quis mostrar-se ainda mais diligente.

Para agradar aos técnicos da equipa de Beja, resolveu exaltar os seus méritos, apesar de ignorar as circunstâncias em que tinham ocorrido os êxitos da 1.ª Brigada de Prospecção, por não ter consultado a respectiva documentação.

Já mencionei, no post anterior, acções negativas daqueles técnicos.

Vou agora citar outros casos também pouco abonatórios da sua actuação. Dentre estes, destacaram-se os que tiveram a intervenção de Delfim de Carvalho, praticados sob a protecção de seu padrinho Soares Carneiro, durante os 17 anos, em que este ocupou o cargo de Director-Geral.

Delfim de Carvalho apresentou-se como autor da descoberta do que apelidou de “jazigo de cobre do Salgadinho”.
A verdade é que nada tinha contribuído para que se tivesse encontrado mineralização cuprífera, na zona do Salgadinho da região de Cercal do Alentejo.
Estivera encarregado de estudar os testemunhos de sondagem projectada com base em discreta anomalia gravimétrica, localizada no flanco oriental de uma estrutura em doma, que aflorava com rochas vulcânicas.
Esta situação geológica, propícia à ocorrência de jazigos de pirite idênticos aos da tradicional Faixa Piritosa Alentejana, tinha sido definida através de levantamento por mim orientado, na região de Cercal-Odemira, conforme consta de artigo publicado em 1955, no Volume X de “Estudos, Notas e Trabalhos do Serviço de Fomento Mineiro” (Ver post N.º 9).

Delfim de Carvalho, com a sua pouca experiência em observação directa de jazigos minerais, nem se apercebera do interesse dessa mineralização, quando me telefonou, para a sede do SFM, onde me encontrava, a prestar as habituais informações sobre resultados da sondagem, cujos testemunhos estava a estudar.
Dissera-me que havia detectado a presença de calcopirite, em escassa disseminação.
Quando tive a oportunidade de observar directamente esses testemunhos, estimei o teor de cobre em cerca de 2%. Baseava-me em experiência adquirida em mais de uma dezena de anos, no estudo do jazigo cuprífero de Aparis, em Barrancos.
Tomei, então, a decisão de não prosseguir com dispendiosas sondagens, antes da aplicar o método de polarização induzida, que era o procedimento mais indicado para a prospecção de jazigos de sulfuretos disseminados.
Como o SFM ainda não dispunha do equipamento para uso desta técnica, apesar de oportunamente ter sido feita a sua requisição, eu propunha-me insistir na aquisição, considerando a eventualidade de, no Salgadinho, ocorrer um stockwerk suficientemente vasto para justificar exploração económica.
A expressão gravimétrica, só por si, não permitia tirar conclusões neste âmbito.

Mas Delfim de Carvalho, conflitualmente liberto, a título provisório, da minha tutela, ansioso por se creditar com um clamoroso êxito, cuja autoria reivindicava, não podia esperar pela melhor definição do alvo a investigar. Projectou atabalhoadamente numerosas sondagens, precipitando-se a promover a jazigo uma ocorrência, cujo valor industrial não ficou demonstrado.
Trabalho mal orientado, de que deveria ter sido responsabilizado. (Ver post Nº 86).

Reynaud, que tão pressuroso se mostrava a exaltar o empenho dos técnicos da equipa de Beja, na obtenção de grandes sucessos, nem reparara que esta equipa se encontrava em franca desagregação.
Já o anterior Director do SFM, Jorge Gouveia, se referira depreciativamente à sua actividade, comentando, para comigo, que “andavam a inventar trabalho” (Ver post N.º 134).
Na data do depoimento de Reynaud, três elementos que assumiam os principais papéis na orientação dos estudos na 1.ª Brigada de Prospecção, já a tinham abandonado, ou preparavam-se para tomar essa decisão, sem se preocuparem com os prejuízos que iriam ocasionar no cumprimento das “vastas e delicadas tarefas a seu cargo”, isto é, com matéria que fora apresentada como justificação para o traiçoeiro documento, com o qual conseguiram o meu afastamento provisório-definitivo da chefia dessa Brigada.

Delfim de Carvalho havia conquistado o cargo de Subdirector-Geral, tendo em consequência, sido deslocado para Lisboa, para assumir a chefia dos Serviços Geológicos.

Vítor Borralho, através da sua filiação partidária, que declarava de extrema-esquerda (!!), fora nomeado Administrador de “Minas de Aljustrel”, cargo de que viria, porém, a ser exonerado por despacho publicado no Diário da República de 10-9-1980.
Regressara à DGGM e, talvez como prémio do mau desempenho nas Minas de Aljustrel, foi promovido a Director de Serviço, ocupando a vaga que eu tinha recusado, por o ex-Director do SFM, Jorge Gouveia ma ter oferecido, com a condição de eu não realizar trabalho de campo”!!!! (Ver post N.º 139).
Como nunca foi benquisto pelos companheiros da equipa de Beja, apesar de eu reconhecer que, no domínio da prospecção geoquímica, desempenhou de modo muito satisfatório o papel de que o encarreguei, foi colocado em Lisboa, tornando-se mais um dirigente sem funções definidas.

José Goinhas afadigava-se em diligências, também suportadas pela sua filiação partidária, para obter cargo de categoria, pelo menos igual à de Delfim de Carvalho, já que não se considerava suficientemente recompensado com a nomeação de Director de Serviço, que lhe coubera no assalto aos cargos criados pelo Decreto 548/77. Apesar da sua total ignorância em prospecção de petróleos, viria a conseguir nomeação de Director-Geral, do Gabinete para a Prospecção e Pesquisa de Petróleo, quando o cargo ficou vago, por falecimento do Engenheiro que o desempenhava!!! (Ver post N.º 88).

Ainda sobre o depoimento de Reynaud, não quero deixar de assinalar que nada disse acerca das irregularidades mencionadas na documentação que entreguei ao Ministro. Limitou-se a inventar formalismos, que eu não teria respeitado.
Mas reservarei a minha análise a esse respeito para os comentários ao depoimento do Director-Geral.

Antes de terminar a análise do depoimento de Reynaud, quero ainda referir duas das suas curiosas afirmações.
A primeira é a crítica ao meu envio de exposição ao Ministro, que classifica de “não inovadora”.
Será que esperaria de mim uma atitude mais radical, para corresponder às graves ofensas que me tinham sido feitas? Esperaria que eu usasse de violência, para ser verdadeiramente “inovador? Devo dizer que este tipo de acções não se coaduna com o meu feitio pacífico.
A título de curiosidade, revelo que houve quem tivesse vindo ao meu gabinete, transformado em “muro das lamentações” contar ofensas recebidas do Director do SFM - que tinha apoiado, em momentos difíceis - e se propunha exercer vingança, com arma que disse não ter dificuldade em adquirir a cigano que conhecia. Não o levei a sério, mas na dúvida, fiz-lhe ver as trágicas consequências, para ele e para a sua família, se tal acto praticasse.

A segunda é a afirmação de que “todos os dirigentes e técnicos superiores desta D.G. não se vêem ou sentem representados nas atitudes e opiniões de índole destrutiva expressas pelo Sr. Eng.º Rocha Gomes”.
Esta é uma verdade de “La Palice”. Ao enviar a minha exposição ao Ministro, eu pretendia, obviamente destruir o ambiente caótico introduzido na DGGM por esses dirigentes e técnicos, com a respectiva responsabilização e restabelecer a disciplina essencial à consecução dos objectivos do SFM.

Por último, não posso deixar de comentar o epíteto de “figura controversa” com que fui caracterizado e “as atitudes extremas” que eu teria assumido.
Em sua opinião, a honestidade, a lealdade, a frontalidade com que sempre desempenhei as minhas funções, são atitudes questionáveis e a exigência de idênticas atitudes a todos os funcionários, mormente aos que exercem funções de maior responsabilidade, é considerada atitude extrema!
Ocorre-me a expressão apropriada para responder aos seus infelizes comentários: Perdoai-lhe, senhores, que ele não sabe o que diz!

Continua…