domingo, 25 de janeiro de 2015

56 A - Divagações suscitadas por uma amostra de minério de tungsténio - 5.º parte

      

         XXXIII-Ministros insultam técnicos superiores da DGGM, para readmitirem, na função pública, em cargo dirigente, Geólogo fraudulento, ignorante nas matérias em que se afirmava perito.

         A progressiva degradação, que eu observava, no SFM, originada pelo abuso das liberdades conquistadas pela Revolução de 25 de Abril de 1974, causava-me profunda preocupação.
          Numerosos foram, por isso, os meus apelos aos sucessivos Governos e até ao Presidente da República, para que fossem adoptadas as medidas correctivas que se impunham.
         Ingenuamente, acreditava que, a nível governamental, o interesse do País se sobreporia a outros interesses e que Ministro era, obviamente, personagem honesta.
         Estava, porém, profundamente equivocado!
         Houve Governos capazes de pactuar, ostensivamente, com elementos perversos que estavam a destruir o SFM!!!
         Vários Ministros, sem escrúpulos, não tiveram pejo em subscrever despacho, insultando funcionários detentores de valiosíssimo currículo, com abundantes provas de competência técnica e dedicação à causa mineira.
         Com esse aviltante insulto, pretenderam justificar o recrutamento, para alto cargo directivo, de Geólogo ignorante em prospecção mineira, o qual teve a desfaçatez de declarar, no currículo que apresentou para publicação no Diário da República, a autoria de trabalho por outros produzido!!!
         Enorme foi, pois, a minha estupefacção, quando deparei, a páginas 2638 da I Série do Diário da República de 28-8-1984, com a portaria que, a seguir, transcrevo: (a passagem realçada é de minha iniciativa)
           “PRESIDÊNCIA DO CONSELHO DE MINISTROS E MINISTÉRIO DA INDÚSTRIA E ENERGIA" - Portaria N.º 649/84 de 28 de Agosto
 
          A prossecução dos novos objectivos da Direcção – Geral de Geologia e Minas, na sequência da aprovação do Decreto Regulamentar n.º 46/83 de 8 de Junho, não se compadece com soluções de continuidade na gestão de um dos seus serviços operativos – a Direcção de Serviços de Prospecção.          A especificidade de competências a esta cometidas decorrentes do artigo 13.º da lei orgânica exige que para o cargo de director de serviços seja recrutado um técnico de elevado nível e comprovada experiência profissional nos domínios da definição de áreas geologicamente favoráveis à ocorrência de minerais com interesse económico, prospecção e pesquisa de recursos de minérios metálicos e não metálicos, gestão do sector empresarial extractivo, direcção de pessoal e bem assim da função pública.
         Dada a inexistência de indivíduos na função pública com o perfil adequado para exercer o cargo pela via do recrutamento normal previsto pelo artigo 2.º n.º 2 alínea a), do Decreto –lei N.º 191-F/79 de 26 de Junho, e considerando o disposto no n.º 4 do mesmo artigo e diploma e o n.º 3, alínea b) do Decreto Normativo n.º 66/82 de 30 de Abril:
        Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro da Indústria e Energia e pelo Secretário de Estado da Administração Pública, o seguinte:
         1.º É alargada a área de recrutamento para o provimento do lugar de director de Serviços de Prospecção a indivíduo não vinculado à função pública, licenciado em Ciências Geológicas, de elevado nível técnico e comprovada experiência profissional no domínio das competências legalmente cometidas aos serviços.
         2.º O despacho de nomeação deve ser acompanhado, para publicação do currículo do candidato.

         Presidência do Conselho de Ministros e Ministério da Indústria e Energia. 
Assinada em 2 de Agosto de 1984, pelo Ministro da Indústria e Energia, Joaquim Leitão da Rocha Cabral, Secretário de Estado da Energia – O Secretário de Estado da Administração Pública, José Manuel San-Bento de Menezes. 

         Na sequência deste despacho, surgiu, na II Série do Diário da República de 12-9-1984, o documento de que faço parcial transcrição:

         “Secretaria de Estado da Energia Direcção Geral de Geologia e Minas
         Por despacho de 29 de Agosto de 1984, do Secretário de Estado da Energia, foi nomeado, em comissão de serviço, director dos Serviços de Prospecção do quadro da Direcção-Geral de Geologia e Minas, por urgente conveniência de serviço, com efeitos, a partir de 29 de Agosto de 1984 “Vítor Manuel Correia Pereira”   
          Este novo despacho é acompanhado de extenso currículo, apresentado pelo candidato, sem validação por entidade idónea, cujos elementos mais salientes são:
1965 a 1972 – Geólogo do SFM, em cuja qualidade, declara as seguintes actividades:
    a) ter constituído, com os colegas António Ribeiro e Nabais Conde, o grupo de trabalho, para o estudo dos jazigos de scheelite em Portugal;
    b) ter acompanhado permanentemente os Geólogos checos Prof Janecka e Jiri Strnad, durante os meses em que aqueles Geólogos estiveram em Portugal a estudar a Região mineira de volframite e scheelite de Covas, Valdarcas, Cerdeirunha e Lapa Grande (Vila Nova de Cerveira)
    c) ter feito o estudo geológico das Minas de Covas (Vila Nova de Cerveira) para inclusão no Livro-Guia da Excursão N.º 7 do 1.º Congresso Hispano-Luso-Americano de Geologia Económica.

         Sobre o chamado “Grupo dos Scheeliteiros”, o Director-Geral, que o orientou, reconheceu a sua completa ineficácia, conforme já tive ensejo de descrever.
        Quanto ao acompanhamento permanente dos Geólogos checos e aos estudos nas Minas de Covas, é tudo inteiramente falso.
         Com os checos, foi-lhe concedido o privilégio de fazer estágio de aprendizagem, por mim sugerido, com o objectivo de o SFM ir tomando iniciativas no sentido de melhorar a preparação dos seus Geólogos, evitando acções inúteis como foi o caso da lamentável incompetência demonstrada por anterior Geólogo, que tinha sido destacado para a Região.
         Vítor Pereira não se revelou, porém, bom discípulo, pois foram fugazes as suas presenças no campo.
          E, como já referi, fui eu quem lhe forneceu, a seu pedido, o levantamento geológico da Região, elaborado pelos Geólogos checos, para poder fazê-lo figurar na Livro Guia da Excursão do CHILAGE!
         Em 1972, rescindiu o seu contrato com o SFM, passando a dedicar-se à indústria privada, essencialmente no sector de “Não Metálicos”.
         Não deve ter tido sucesso, pois, em 1984, diligenciou acolher-se, de novo, na função pública, tirando partido das relações políticas e comerciais, que tinha adquirido.
         Era óbvio que não se atreveria a orientar trabalhos de Prospecção Mineira pois era ignorante, em tal matéria, como, aliás, acontecia com todos os Geólogos recém-diplomados pela Universidade de Coimbra, pois a disciplina não constava do Curso.
         Mas iria ter nova oportunidade de evidenciar o seu carácter.
         É simplesmente inacreditável como foi possível acontecerem tão aberrantes despachos.

         De facto, simultaneamente com nomeações para cargos directivos instituídos pelo Decreto-lei N.º 548/77, sem a intenção de os nomeados desempenharem as funções correspondentes às suas categorias, continuava em vigor a Orgânica instituída em 1963, pelo então Director do SFM, Múrias de Queiroz.
         Era assim que, afinal, se conseguia manter ainda alguma actividade útil!!

          Segundo essa Orgânica, eu era Chefe do 1.º Serviço, cabendo-me numerosas funções, que concentrei sob a designação de Serviço de Prospecção Mineira do SFM, dando à Prospecção, pela primeira vez, um âmbito vasto, que incluía fases sucessivas, desde a documentação até à definição de reservas minerais.
         No desempenho dessas funções, foi às minhas exclusivas iniciativas que se ficou devendo a introdução, no SFM, das técnicas geológicas, geofísicas e geoquímicas, adequadas aos objectivos em vista.
         Foi através de sistemática e rigorosa aplicação dessas técnicas, que se registaram os maiores êxitos, de todos os tempos, em prospecção mineira, com destaque para o gigantesco jazigo de Neves-Corvo, por cuja descoberta sou o principal responsável, após árdua luta, que se prolongou por 30 anos, durante os quais tive que enfrentar incríveis dificuldades criadas por dirigentes incompetentes e malévolos.
         Além disso, fui também o introdutor de disciplina de Prospecção Mineira, no Curso de Geologia da Faculdade de Ciências do Porto, na qualidade de Professor Convidado, correspondendo a pedido que não podia recusar, apesar da minha escassa disponibilidades de tempo, porquanto as minhas funções no SFM eram realmente absorventes.
         Esta regência iria prolongar-se por 20 anos.
         Pelo sucesso que alcançou, induziu outros estabelecimentos de ensino superior e médio de Porto, Aveiro e Braga a solicitarem também a minha colaboração.
         Ao convite da Faculdade de Engenharia, correspondi, regendo a disciplina, durante dois anos, sem remuneração (não era permitida segunda acumulação), comprometendo-me ainda a prestar colaboração a futuro Engenheiro, que tendo frequentado as minhas aulas, tivesse demonstrado aptidão para se encarregar do ensino da matéria que aprendera.
         Ao Instituto Superior de Engenharia do Porto, facultei aulas de campo, aos seus alunos, na Região de Caminha.
         Extraordinário foi o interesse manifestado por Engenheiros recém-licenciados, em frequentarem as minhas aulas na Faculdade de Ciências do Porto.
         Não se contentaram com um ano. Estiveram presentes, durante dois anos e foram depois bons colaboradores, em aulas de campo, na Região de Caminha, para as quais traziam os seus alunos, na sua nova qualidade de docentes da Universidade de Aveiro.
         À Universidade de Braga, iria, já aposentado, prestar colaboração em Curso de Mestrado.
         Muitas mais referências poderia fazer sobre as minhas actividades em prospecção mineira.
         A realidade era que a DGGM, sempre que pretendia demonstrar, a nível externo, a sua capacidade técnica, era a mim que convocava, para esse efeito.
         Foi assim, por exemplo, que representei Portugal, em reuniões, de um Grupo “ad hoc” constituído para promover a aplicação de métodos modernos de prospecção, no âmbito da OECE (depois evoluída para OCDE).

         Nestas reuniões, realizadas em Paris, em 1961, participaram 18 países e, na sua sequência eu apresentei projecto de prospecção aérea no Alentejo, que teve boa aceitação.
         Foi também assim que fui designado para dar conta de actividades de prospecção a meu cargo em representação da DGGM, proferindo várias palestras, no Laboratório Nacional de Engenharia Civil.
         Vale ainda a pena citar a minha participação nas Jornadas de Engenharia de Moçambique, em 1965, às quais apresentei comunicação sobre recentes êxitos da aplicação de técnicas geofísicas e geoquímicas à prospecção mineira, que foi muito apreciada e foi publicada pela Sociedade de Estudos.

         É, consequentemente, um gravíssimo insulto à minha dignidade profissional o despacho que Rocha Cabral subscreveu e induziu outros Ministros a seguirem-lhe o exemplo.
         Em circunstâncias normais, isto teria justificado procedimento criminal.
         Não era, porém, caso único. Outros crimes foram cometidos impunemente, os quais, sem dúvida, deram a sua contribuição para a crise que o Pais actualmente atravessa.

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