sábado, 31 de outubro de 2009

94 - Scheeliteiros deslumbram Director do SFM

Continuando a desrespeitar a Orgânica instituída em fins de 1963, que se mantinha em vigor, o Director do SFM emitiu, em 4-8-75, a Ordem de Serviço N.º 18-75, do seguinte teor:

“Pelos Geólogos J. M. Santos Oliveira, Luís F. Viegas e J. M. Farinha Ramos foi-me apresentado um projecto de prospecção de scheelites que envolve:
a) – a prospecção de uma vasta área de cerca de 135 km2, situada entre Alfândega de Fé e Mogadouro (prospecção à escala regional);.
b) - prospecção de uma área favorável para scheelite, com cerca de 72 km2 e localizada na vizinhança de Almendra em Figueira de Castelo Rodrigo, (prospecção à escala local);
c) – estudos de prospecção, pesquisa e reconhecimento no jazigo de Cravezes com vista à sua definição, em termos de interesse económico (prospecção à escala local de pormenor).

Considero que este projecto tem o maior interesse não só pelos fins que se pretendem atingir, como pelo modo completo como é apresentado (com prazos de execução, custo, etc...) e ainda porque se preconiza uma execução em equipa que, aliás, se pretende ver alargada a outros elementos que intervenham no processo.
Trata-se assim de um projecto que pode vir a influenciar o futuro modo de trabalhar no Serviço de Fomento Mineiro e por isso se pede a todos os departamentos do Serviço a maior colaboração, mesmo em detrimento de outros trabalhos que sejam de menor importância.
Além dos geólogos atrás referidos, devem, para já, dar a sua colaboração ao projecto:
Prospector Abel Gonçalves Rua
Ajudante de preparador João S. Sampaio Castanheira
Motorista José da Silva Teixeira
Auxiliar de Laboratório António Moreira dos Santos
Auxiliar de Prospecção Agostinho António V. Ribeiro
Motorista José Abreu Antunes
Jornaleiro Joaquim Alves Pinto Cabral
Pessoal eventual a contratar nos locais de trabalho
Dá-se prioridade ao projecto de prospecção de scheelite, mas espera-se o melhor entendimento e espírito de colaboração entre os diferentes departamentos com pessoal nele envolvido, tendo em vista conseguir que as suas tarefas normais decorram com um mínimo de perturbação.
Será com esse mesmo espírito que o Director do Serviço procurará resolver os problemas que forem surgindo.
SERVIÇO DE FOMENTO MINEIRO, em S. Mamede de Infesta, 4 de Agosto de 1975
O ENGENHEIRO DIRECTOR
(N.A. M. Q.
)

Em 10 de Novembro de 1975, realizou-se uma reunião na Sala das Sessões da sede do SFM em S. Mamede de Infesta, convocada pelo Chefe do 2.º Serviço - que tinha a seu cargo os Trabalhos Mineiros e os Laboratórios - para dar a conhecer os “extraordinários” (?!) resultados já conseguidos, até àquela data, no âmbito da prospecção mineira, pela equipa dos Scheeliteiros.
Além de todos os Geólogos dessa equipa, estiveram presentes o Director do SFM, o Chefe do 2.º Serviço e pessoal dos Laboratórios de Mineralogia e de Química.
O Director estava eufórico! Tinha visitado a área em estudo e ficara deslumbrado com a quantidade de scheelite que vira … "até nos muros!"
Aquilo é que era trabalhar em equipa, que se desejaria ver alargada. As senhoras da Química deveriam ir ver! Iria quem quisesse!
O Geólogo Viegas, na sua exposição, deu grande realce ao espírito de equipa. Não era como outros casos, em que havia um sábio que tudo descobria! Ali todos eram importantes ... “até o homem que espetava a estaca!”.

Durante o ano de 1976, por motivo de o Departamento de Mineralogia e Geologia da Faculdade de Ciências do Porto ter sido seriamente afectado pelo incêndio que ocorrera em 20-4-1974, na minha qualidade de Professor Convidado desta Faculdade, eu fora superiormente autorizado a dar aulas de Prospecção Mineira na Sala das Sessões da sede do SFM em S. Mamede de Infesta.
No dia 9 de Julho desse ano, estava eu, desde as 8 horas da manhã, numa aula, quando entram ostensivamente na Sala, sem pedirem licença e sem cumprimentarem, os Geólogos da equipa dos Scheeliteiros, J. M. Santos Oliveira e Luís Francisco Viegas.
Percebi, depois, que tinham ido preparar a Sala para nova exposição sobre as suas actividades, que iriam fazer, da parte da tarde.
Não fui convidado para assistir, mas o Contínuo, Senhor Marcelino Gomes, veio dar-me conhecimento, pelas 14:30h, de que estava a decorrer uma exposição sobre scheelites na Sala das Sessões e eu fui ver.
Estava, então, o Geólogo Farinha Ramos no uso da palavra, encontrando-se exposto um diapositivo com foto de um campo onde apenas se percebia a existência de restolho de seara que tinha sido ceifada.
Este diapositivo manteve-se, com a Sala em semi-obscuridade, durante toda a sessão.
Também usaram da palavra os Geólogos Santos Oliveira e Luís Francisco Viegas.
Na assistência, encontrava-se a maior parte do pessoal do chamado núcleo da Amieira, incluindo funcionários da Secretaria, da Sala de Desenho, das Oficinas, da Cantina, mulheres da limpeza, etc., tudo pessoal que pouco ou nada entendia do que se dizia, até porque o palavreado não foi tornado acessível.
Para demonstração dos sucessos da equipa, uma amostra de rocha com mineralização de scheelite ia passando, de mão em mão, por este pessoal, que obviamente não conseguia detectar a presença do mineral de tungsténio, pois ele só se torna visível a observador não experimentado, usando radiação ultra-violeta de determinado comprimento de onda, em completa escuridão.
Tornou-se patente não só a exiguidade da área investigada, mas também a fraca qualidade dos estudos apresentados, sobretudo no âmbito da geologia. Tinham sido efectuados alguns trabalhos de topografia, amostragens de materiais para análises geoquímicas e sanjas.
Realçou-se a descoberta de mineralização em rochas calcossilicatadas com possanças de mais de 30 m e com teores de 1,4 kg/t a 3,2 kg/t de WO3, mas em pequena extensão.
Admitiram que estes teores não ofereciam grande confiança, por a amostragem ter sido feita por pessoal não especializado!
A finalizar a exposição, houve agradecimentos a todos quantos colaboraram nos trabalhos e, novamente, a exaltação do espírito de equipa, que desejariam servisse de exemplo a outros departamentos do SFM.

Não é necessário ser especialista em prospecção mineira para perceber a ignorância petulante dos Geólogos designados por Scheeliteiros, a inconcebível ignorância e a enorme desconsideração do Director do SFM pelos funcionários diligentes, aos quais o País ficou devendo os reais êxitos que têm justificado a existência do Organismo que lhe continua confiado e sobretudo, o ridículo dos acontecimentos que relatei.

Estes acontecimentos constituíram grave infracção à disciplina que deveria caracterizar um Organismo de Estado, do qual se esperava empenhamento em criação de riqueza, essencial para o desenvolvimento económico do País.
É isso que demonstrarei, a seguir.


Começo por esclarecer que, de acordo com a Orgânica em vigor, a prospecção mineira, incluindo obviamente a Geologia, cuja presença é essencial em todas as suas fases, estava confiada ao 1.º Serviço, sob minha chefia.
Foi esta a razão pela qual foram integrados no 1.º Serviço, os Geólogos Artur Cândido Medeiros, José Lopes da Silva Freire e João Martins da Silva, que tinham ingressado no SFM no início da década de 40 do século passado e os Geólogos Delfim de Carvalho, Vítor Manuel de Jesus Oliveira e José António Carvoeiras Goinhas, ingressados na década de 60.
Esta a razão pela qual também os Geólogos António Augusto Ramos Ribeiro e José Luís Siopa de Almeida Rebelo se consideraram integrados no 1.º Serviço, quando foram contratados pelo SFM, apesar de nunca ter sido emitido documento formalizando a situação.
Os relatórios do 1.º Serviço comprovam esta afirmação.
Todos estes Geólogos aceitaram, com naturalidade, a disciplina do 1.º Serviço, prestando colaboração, em conformidade com as suas capacidades.

Quando, em 1963, o Geólogo J. M. Santos Oliveira ingressou no SFM, eu sugeri ao Director que aproveitasse a presença na Mina de S. Domingos, do prestigiado Professor Roland Delcey, Chefe de Trabalhos no Laboratório de Geologia Aplicada da Faculdade de Ciências de Paris, a realizar estudos avançados na Faixa Piritosa Alentejana, para lhe proporcionar um estágio em trabalhos de campo, já que era notória a deficiente preparação dos Geólogos recém-formados, em tal matéria
O Director concordou e eu, numa das minhas habituais viagens entre a sede do SFM e a área de estudo da 1.ª Brigada de Prospecção, trouxe Santos Oliveira até à Mina de S. Domingos, esperando que ele soubesse aproveitar o estágio que lhe era proporcionado e, possivelmente, viesse a ficar integrado no 1.º Serviço.
As informações que Delcey me deu a seu respeito foram, porém, deveras decepcionantes. Santos Oliveira não mostrara agrado em trabalhar no campo. Parecera-lhe mais interessado em actividades laboratoriais.
Soube que estivera encarregado de proceder a análises com um espectrógrafo que tinha sido adquirido ao abrigo do Plano Marshall, mas não são conhecidos resultados significativos do uso que terá feito deste equipamento, apesar de ter sido necessário pedir ajuda a senhora norueguesa que propositadamente veio para o ensinar. Registo que um Professor da Faculdade de Ciências já anteriormente tinha feito uso do equipamento e até fizera publicar, na Revista do SFM, artigo sobre elementos menores das galenas e blendas portuguesas, com bastante interesse. Certamente ele se prestaria a ministrar conhecimentos mais completos, sem necessidade de intervenção da senhora norueguesa, cuja preparação era apenas de nível prático.
Foi, pois, com grande surpresa que vi o nome deste Geólogo na equipa de Scheeliteiros.
Só encontrei uma explicação: o seu desejo de obter ajudas de custo, em deslocações ao campo, realizadas ou fictícias.
O caso deste funcionário é paradigmático das promoções que ocorreram, no pós-25 de Abril, com base em currículos medíocres, para não dizer negativos.
Sem actividade significativa para os objectivos do SFM, conseguiu chegar a Director do Laboratório de S. Mamede de Infesta e a Investigador Principal.
Há artigos de sua autoria, publicados isoladamente ou em parceria com outros Geólogos, com muito pouco interesse para os objectivos do SFM e que suscitam dúvida quanto ao rigor de observações e análises neles apresentados.
A este Geólogo se ficou devendo a destruição de mais de duas centenas de milhar de amostras de sedimentos de linhas de água e de solos, que haviam sido colhidas, ao longo de muitos anos, na Faixa Metalífera da Beira Litoral, em área superior a 2 000 km2 e que aguardavam oportunidade para serem analisadas para outros elementos, para além das expeditas, obtidas pela ditizona, pelo método de Bloom, para metais pesados, a frio. Isto representou um prejuízo superior a 100 000 contos, na moeda antiga, do qual não foi responsabilizado. Apenas constou que a sua demissão do cargo de Director do Laboratório terá tido essa origem.

Quanto aos outros dois Geólogos, era também óbvia a sua impreparação em prospecção, até porque esta matéria não constava do Curso de Geologia da Universidade de Coimbra, de onde eram originários.
As Universidades do Porto e Aveiro eram, então, as únicas em que tal matéria era ensinada, com o desenvolvimento necessário para a sua aplicação prática. Em Aveiro, a Prospecção estava a cargo de dois Engenheiros que tinham assistido, a seu pedido, às minhas aulas, na Faculdade de Ciências.
Como testemunho da sua incompetência, bastará a afirmação de que a amostragem tinha sido feita por pessoal não especializado! Eles tinham a obrigação de saber que a amostragem é operação fundamental em prospecção e que compete ao Geólogo realizá-la ou supervisioná-la, com rigor.

Era óbvio que de tal equipa, constituída por pessoal impreparado, não era de esperar senão um tremendo fiasco e foi o que realmente aconteceu, como já tive ocasião de referir no post N.º 56.

Antes do aparecimento destes jovens Geólogos, houve duas tentativas de colaboração de Geólogos do 4.º Serviço nos estudos que se encontravam em curso na região de Vila Nova de Cerveira – Caminha - Ponte de Lima.
Ambas falharam totalmente, por esses Geólogos se não conformarem com o rigor e a disciplina característicos das actividades do 1.º Serviço. A estas tentativas me referirei oportunamente, quando descrever factos ocorridos durante a campanha de prospecção naquela região.
Estes e outros Geólogos que ingressaram posteriormente no SFM, procuraram libertar-se da disciplina exigida no 1.º Serviço.
Não tiveram dificuldade em convencer, não só o Director do SFM mas também o Director-Geral, de que tinham capacidade suficiente para agirem fora do controlo do 1.º Serviço. E até conseguiram os rasgados elogios que constam da Ordem de Serviço acima referida.
Não conheço os relatórios finais dos estudos desta equipa, as reservas reveladas e respectivos teores de WO3. Constou-me que até os testemunhos das sondagens realizadas foram abandonados. Não houve o cuidado de os conservar.

A exaltação do “espírito de equipa” que este Director se vangloriava de ter finalmente conseguido instituir, após 36 anos de existência do SFM, é francamente hilariante, para dizer o menos.
A realidade é, porém, totalmente diferente.
Quando foi nomeado Director, uma das suas primeiras atitudes foi destruir a equipa de Trabalhos Mineiros que eu tinha constituído nas Secções de Moura e Barrancos e de Castro Verde da Brigada do Sul. Com a minha substituição na Brigada do Sul por dois Engenheiros que já tinham dado eloquentes provas da sua mediocridade, aconteceu o que era previsível: terminaram os trabalhos mineiros convencionais na Brigada do Sul e, com eles, praticamente tais trabalhos em todo o SFM.
Conforme referi no post N.º 25, não me seria difícil assumir o comando desses trabalhos cumulativamente com as novas funções que me passaram a ser confiadas.
Em 6-1-1975, com a minha demissão da chefia da 1.ª Brigada de Prospecção, continuou a sua obra de destruição das equipas que paciente e determinadamente eu tinha constituído, ao longo de muitos anos.
Por outro lado, ao permitir a constituição de uma equipa de ignorantes arvorados em especialistas de prospecção, fora da disciplina da Orgânica em vigor, estava a incentivar precisamente a destruição do espírito de equipa que devia ser característico do SFM, no seu todo.

Registo, ainda, que a vasta equipa dos Scheeliteiros, constituída por 3 Geólogos, 7 Auxiliares oriundos da sede do SFM e diverso pessoal auxiliar recrutado nos locais de trabalho, conseguia realizar menos trabalho e de muito menor qualidade que a Secção de Caminha por mim dirigida, que dispunha apenas de um Colector e 4 trabalhadores localmente recrutados, sendo certo que eu tinha ainda a meu cargo a Secção de Talhadas também com um Colector e apenas um grupo de trabalhadores localmente recrutados que cabia num jeep.
E, antes da minha demissão da Chefia da 1.ª Brigada de Prospecção, tivera também a orientação e participação efectiva nos trabalhos desta Brigada.
E era absurdo estabelecer qualquer comparação entre os resultados dos Scheliteiros e os do 1.º Serviço
Foi com base nos resultados dos estudos por mim orientados que se instalou na região de Caminha a Companhia americana Union Carbide, com o objectivo de vir a explorar as reservas de minério que já tínhamos evidenciado e a procurar aumentá-las para dar dimensão a uma exploração que justificasse a sua presença no País.
À actividade desta Companhia e à permanente colaboração que lhe prestei, me referirei oportunamentes
Os Scheeliteiros ainda procuraram interessar Union Carbide nas “grandes descobertas” que fizeram, mas a resposta de Union Carbide foi de que, na região de Caminha o teor dos estéreis das Minas de Valdarcas, Fervença e Cerdeirinha que se encontravam em exploração eram superiores ao das ocorrências por eles detectadas.

Frustrados com os resultados da sua actividade na “vasta área de 135 km2 entre Alfândega da Fé e Mogadouro”, os Scheeliteiros fizeram tentativas para usurparem a Secção de Caminha que eu tinha criado e onde sabiam estar a decorrer campanha com aplicação de técnicas geofísicas de que nada percebiam. A essas tentativas e seus resultados me referirei oportunamente.

Quanto à alusão ao sábio que tudo descobria, é óbvio que tentaram menosprezar o papel que desempenhei nas maiores descobertas do SFM, em toda a sua existência, as quais são a razão principal de continuar a existir um Serviço, onde puderam instalar-se.
A este respeito, apenas quero registar que, durante os 15 anos de existência da Brigada de Prospecção Geofísica (1948 a 1963), nenhuma descoberta foi feita.
Durante os 12 anos que decorreram desde que comecei a organizar o 1.º Serviço, foram feitas as importantes descobertas a que fiz referência no posts anteriores, sendo de salientar o jazigo de Neves –Corvo, e outras foram preparadas, que se não concretizaram, devido à obstrução sistemática dos dirigentes principais da DGM.

Por último, não quero deixar de referir a minha grande surpresa com a visita que o Director fez á área em estudo pelos Scheeliteiros. É que ele nunca se interessara em tomar contacto directo com as áreas em estudo pelo 1.º Serviço, tanto no Norte como no Sul do País, durante os 12 anos que decorreram desde a sua nomeação em 1963 até 1975!
Quanto à sua euforia com a abundância de scheelite que via até nos muros, só posso notar o ridículo da situação. É que nem tudo o que luz é ouro!
O que ele via a brilhar com a incidência de luz ultra-violeta era musgo!
Fiquei sem saber se também os Geólogos tinham caído nesse logro ou se apenas quiseram ludibriar o Director.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

93 – As Comissões, os Grupos de Trabalho, os Sindicatos e seus Delegados no SFM

O Director do SFM, que tinha sido investido, em 1963, com carácter transitório, apenas com base no seu alinhamento com o regime ditatorial então vigente (Ver post N.º 25), após a Revolução de Abri de 1974, para tentar manter o cargo, passou a tomar decisões que o creditassem como acérrimo defensor da Democracia.
Já me referi, no post N.º 70, à sua desfaçatez ao invocar o “espírito do Movimento das Forças Armadas”, para justificar flagrante desrespeito das leis vigentes, que estava a ser cometido por altos responsáveis da DGMSG, cuja obrigação principal era fazer cumprir essas leis e não aumentar a indisciplina, que já grassava no SFM.
Sem capacidade para compreender os reais problemas do SFM, resolveu começar a demonstrar a sua verdadeira adesão ao espírito democrático.
Em Outubro de 1974, apresentou para apreciação geral, um documento com o qual pretendia criar, no SFM, um novo órgão a que chamaria “Comissão do Pessoal da Amieira”. Esclareço que a designação de Amieira tem origem na Rua de S. Mamede de Infesta onde se situa a entrada principal das instalações da sede do SFM.

Sobre este documento, de que não fiquei com cópia, enviei-lhe o parecer que, a seguir, transcrevo:

“O Senhor Director do Serviço de Fomento Mineiro distribuiu um documento, através do qual cria a COMISSÃO DO PESSOAL DA AMIEIRA.
Compõem a Comissão 10 pessoas, cada uma das quais deverá representar um grupo de funcionários e (ou) assalariados, variando de 5 a 14 unidades, de modo a ficar abrangida a totalidade dos indivíduos habitualmente presentes nas instalações do Serviço, em S. Mamede de Infesta, para desempenho de tarefas, directa ou indirectamente relacionadas com o fomento da indústria mineira.
Estão excluídos de participar na Comissão os Chefes de Serviço e os Chefes de Divisões com mais de 6 pessoas.
São objectivos da Comissão:
1 – Chamar a atenção do Director para “tudo o que o pessoal julgue não estar bem” e estudar com este, soluções para os casos expostos:
2 – Dar parecer sobre casos expostos pelo Director.

Sobre este assunto, ocorrem-me os seguintes comentários:

a) É de estranhar o súbito interesse do Director do Serviço de Fomento Mineiro em tomar conhecimento daquilo que o pessoal julgue não estar bem e em ter em consideração críticas ou sugestões, que lhe sejam apresentadas.
Posso, na verdade, citar numerosos casos comigo passados, de críticas por vezes bem severas e de sugestões bastante concretas, às quais o Senhor Director não deu qualquer atenção.
Destes casos tenho provas documentais.
Há exemplos bem recentes, alguns já posteriores à distribuição deste documento.
Bastará citar o que se passou com a Ordem de Serviço N.º 613. Foram-me pedidas críticas e sugestões que apresentei. Todavia, a Ordem foi distribuída 20 minutos após a minha entrega destas críticas e sugestões, sem tempo, portanto, para que elas pudessem sequer ter sido lidas.
Qual a garantia para que o procedimento passe a ser diferente?

b) Não é clara a redacção do documento no que respeita aos objectivos a atingir.
Tratando-se de uma Comissão de Pessoal e considerando a sua composição, pode-se ser induzido a supor, que os problemas a tratar se confinam aos directamente relacionados com o pessoal, isto é, admissões, acessos a Quadros de Contratados, valorizações e especializações, promoções, condições de trabalho, etc.
Todavia, a expressão “tudo aquilo que o pessoal julgue não estar bem e possa ser melhorado” é de um âmbito muito mais vasto.
Pretender-se-á que o “núcleo da Amieira” se pronuncie sobre todos os assuntos respeitantes à actividade do Serviço de Fomento Mineiro?
A ser assim, imediatamente pomos em dúvida a representatividade de qualquer Comissão saída desse núcleo, relativamente a todo o Serviço e, portanto, o peso e a utilidade das suas sugestões.
Do núcleo da Amieira, excluidos os Chefes de Serviços e os Chefes de Divisões com mais de 6 pessoas, quais as pessoas que podem considerar-se qualificadas para emitirem pareceres sobre os importantes problemas do Serviço de Fomento Mineiro?

c) Parece-me, pelo menos, inoportuna a criação de mais uma Comissão para resolver problemas que só surgem pelo facto de a Orgânica do Serviço de Fomento Mineiro ser defeituosa na sua estrutura e estar sendo deficientemente posta em prática.
Afigura-se-me que, antes de o Serviço de Fomento Mineiro se debruçar sobre problemas como os que levaram à criação da Comissão da Amieira, deverá procurar uma crítica interna ao modo como estão a ser perseguidos os objectivos que o Serviço de Fomento Mineiro visa atingir.
Daí concluiria, sem dúvida, que muito há a aperfeiçoar.
Uma reorganização geral do Serviço de Fomento Mineiro, com mais equilibrada distribuição de funções e correcto ajustamento das pessoas aos cargos, conforme a sua capacidade demonstrada através de curriculum, é essencial!
Não é de admitir o que actualmente se está passando.
Uma Orgânica em vigor, que o Director é o primeiro a não respeitar!
Uns departamentos muito sobrecarregados e outros mais ou menos inactivos!
Trabalhos no âmbito do 1.º Serviço, sob comando directo do Senhor Director-Geral ou a serem desempenhados pelo 2.º Serviço!
Actividades em trabalhos mineiros, de duvidosa utilidade ou em vias de extinção!
Sondagens em decadência!
Laboratórios com baixa produtividade!
Geólogos sem funções definidas, alguns sem saberem se pertencem ao Serviço de Fomento Mineiro ou aos Serviços Geológicos!
Estudos que deveriam estar em curso, havendo os meios materiais e humanos para que se fizessem e não estão!
Equipamentos de trabalhos mineiros a apodrecerem!
Problemas de viaturas permanentemente sem andamento!
Equipamentos de prospecção que se não adquirem, quando se propõem, sem motivo aparente!
Propostas de promoção que não têm andamento!
Propostas de admissão no Quadro de Contratados a que se não dá andamento!

Quando há todos estes problemas prioritários, porque atacar outros?
Uma vez ordenados estes, talvez aparecessem, na sua verdadeira dimensão, os que agora suscitam a criação da Comissão da Amieira!
É já de reprovar a existência de uma Comissão de Fomento, na Direcção-Geral de Minas, em Lisboa.
Esta Comissão nasceu apenas pela inoperância da Direcção do Serviço.
Uma Direcção de Serviço, verdadeiramente eficiente, representaria este condignamente, nas reuniões que houvesse que fazer ao nível da Direcção-Geral, com a presença de representantes dos outros departamentos da Direcção-Geral.
Constituiu, durante a sua vigência, para muitos funcionários, apenas uma duplicação de esforços, com muito pouco proveito!

d) Não é de aceitar qualquer Comissão de carácter restrito, dentro do Serviço de Fomento Mineiro, por iniciativa do Director.
O Director não deverá esquecer-se que dirige um Serviço de cobertura nacional.
Decisões parciais de sua iniciativa são de condenar.
Já bastam os privilégios de que tem beneficiado o pessoal da Amieira, alguns dos quais totalmente ilegais.
Quem autorizou a conceder os sábados, em semanas alternadas, ao pessoal da Amieira e privar dessa regalia o restante pessoal?
Como se consente que continue esta prática, quando a hora é de trabalho, como acentuou o 1.º Ministro ao sugerir, ainda bem recentemente, um domingo de trabalho e se impõe um aumento geral de produtividade?
Que se tem feito para aumentar a baixa produtividade do pessoal da Amieira?
Como se consentem as perdas de tempo no Bar, dentro das horas de serviço, sem a correspondente compendação fora de horas?

e) Qual o motivo da exclusão dos Chefes de Serviços e de Divisões com mais de 6 pessoas, da Comissão, quando a Orgânica ainda em vigor previa um Conselho Consultivo, com funções idênticas às da Comissão agora criada, constituída principalmente por aqueles funcionários?

Porto, 9 de Outubro de 1974
O Engenheiro Chefe do 1.º Serviço de Fomento Mineiro
(a) Albertino Adélio Rocha Gomes”

O Director do SFM juntou a este documento, um outro que intitulou de “Lista do pessoal eleitor do SFM (Amieira)”.
Desta Lista constavam 104 pessoas, a maioria das quais (62) pertencente a pessoal auxiliar, com poucas habilitações, em grande parte recrutado no Bairro onde residia o Director.
Como nota final, acrescentava-se: “são elegíveis todos os trabalhadores com excepção do Director e Chefes de Serviço”

As minhas investigações no âmbito da prospecção mineira obrigavam-me a frequentes ausências da sede do SFM, em trabalho de campo.
Quando permanecia na sede, a estudar os dados colhidos no campo, pouco me ausentava do meu gabinete. O telefone interno permitia-me os contactos necessários, sobretudo com os Laboratórios, para esclarecimento das requisições de análises que para eles fazia, através do 2.º Serviço.
Não me tinha, pois, apercebido da existência de tantos “indivíduos habitualmente presentes nas instalações da sede do SFM em S, Mamede de Infesta”, sobretudo indivíduos com poucas habilitações.
De facto, parecia-me difícil encarregar de tarefas úteis tantas pessoas, sabendo-se que as actividades no campo, que as poderiam originar, tinham diminuído dramaticamente.
Os Trabalhos Mineiros tinham praticamente terminado com a adjudicação da mina de Aparis.
No Norte, a obstrução permanente do Director, não só não me permitira desenvolver as Secções de Caminha e de Talhadas do 1.º Serviço, a meu cargo, como me impedira de criar outras Secções.
O espírito que presidiu inicialmente á actividade do SFM tinha-se subvertido totalmente.
Quando o SFM foi criado, tinha a sua sede num palacete da Rua de Santos Pousada, ocupando apenas o seu 1.º andar, sendo o r/c ocupado pela Circunscrição Mineira do Norte.
Esta sede manteve-se durante 24 anos, isto é, durante o período de maior actividade no âmbito dos Trabalhos Mineiros de Pesquisa e Reconhecimento de Jazigos Minerais.
Uma das razões principais para a sua transferência para as instalações de S. Mamede de Infesta foi a necessidade de albergar o volumoso material recebido ao abrigo do Plano Marshall (ver Post N.º 15)
Esta transferência coincidiu com mudança de Director do SFM.
O novo Director pareceu ter a preocupação de se tornar um bom samaritano, dando emprego, à custa dos dinheiros do Estado, a indivíduos do Bairro de Paranhos, independentemente de serem ou não necessários, possivelmente com influência de seu irmão, pároco da mesma freguesia.
Assim confiaria ter o apoio de pessoas que lhe deviam estar gratas.
Com a criação desta Comissão da Amieira, de acordo com as premissas nela expostas, confirmaria o apoio de que necessitava, na zona Norte, para manter o cargo.
O apoio do Sul já ele conseguira através da sua “habilidade” com a Ordem de Serviço sobre ajudas de custo.
Em próximos posts, revelarei outras “habilidades” deste Director.

... Continua