sexta-feira, 15 de junho de 2012

201 - Possível enorme jazigo de sulfuretos na região de Montemor-o-Novo

Na sequência do que consta do último parágrafo do post anterior, transcrevo carta que escrevi ao Secretário de Estado da Indústria e Energia:

“Assunto: Um enorme jazigo se sulfuretos complexos em Montemor-o-Novo? Maior que Neves – Corvo?

Em documento que entreguei ao Senhor Ministro da Indústria, em 11 de Fevereiro passado, referi deficiências graves no funcionamento do SERVIÇO DE FOMENTO MINEIRO, a exigirem urgente correcção.

Invoquei a minha qualidade de Investigador Principal e de Professor Universitário Convidado e o meu currículo de quase 45 anos de diversificada actividade profissional, para dar peso às minhas afirmações.

Citei, por exemplo, uma campanha de prospecção mineira empreendida na região de Montemor-o-Novo, que é descrita no artigo de J. Goinhas e L. Martins, publicado a págs.119-149 do Tomo 29 de “ESTUDOS, NOTAS E TRABALHOS DO SERVIÇO DE FOMENTO MINEIRO”.

Deste artigo, consta desenho – de que anexo cópia – apresentando um perfil gravimétrico e um pseudo-perfil de resistividades eléctricas, em correspondência com secção geológica, elaborada com base em dados de superfície e de duas sondagens apoiadas nos resultados geofísicos.

O perfil gravimétrico evidencia anomalia de 2,45 mgal, isto é, uma alteração do campo gravítico normal, que só muito excepcionalmente será de esperar atingir-se, em prospecção mineira. O jazigo de Neves – Corvo, que foi descoberto essencialmente pela aplicação do método gravimétrico, provocou anomalia substancialmente menor!!!!

Valor tão elevado como o que se registou em Montemor-o-Novo, deveria ter provocado forte excitação aos técnicos da equipa a cujo cargo esteve a campanha de prospecção.

A realidade quase inacreditável é que se não procurou explicar tão desmesurada anomalia e, nesta data, ela está amplamente divulgada por esse mundo fora, através da distribuição da Revista.

Em estudo que fiz, utilizando os poucos dados da publicação, não me foi difícil concluir que, para gerar tal anomalia, seria necessária a existência de corpo denso de enormes proporções, que poderá ser jazigo mineral, talvez maior que Neves – Corvo.

Três hipóteses são de considerar:

a) Lapso grosseiro no desenho do perfil, talvez na escala gravimétrica;
b) Levantamento gravimétrico errado, no trabalho de campo ou de gabinete;
c) Anomalia genuína

Há que analisar cuidadosamente todas estas hipóteses

A verificar-se a terceira, impõe-se que se procure explicação cabal para a anomalia, antes que alguém de um país estranho apareça a candidatar-se a um contrato de prospecção e concretize uma invulgar descoberta …um pouco à semelhança do que aconteceu relativamente a NEVES-CORVO.

Este é, porém, apenas um exemplo, embora bem expressivo.

Estou à disposição de V. Ex.ª para outras informações e eventuais sugestões tendentes à desejável correcção do funcionamento do SERVIÇO DE FOMENTO MINEIRO e, consequentemente, a um melhor aproveitamento dos recursos minerais nacionais.

Apresento a V. Ex.ª os melhores cumprimentos.

S. Mamede de Infesta, 27 de Maio de 1988
(a) Albertino Adélio Rocha Gomes

Cópia a S. Ex.ª o Senhor Ministro da Indústria”

A esta carta, deu o Senhor Secretário de Estado, a seguinte resposta:

“Senhor Engenheiro Rocha Gomes:

Agradeço os elementos enviados em carta datada de 27 de Maio de 1988.

Tomei boa nota das informações aí expressas e procedi no sentido do meu Gabinete dar prosseguimento adequado às questões enunciadas.

Com os melhores cumprimentos

(a) Nuno Ribeiro da Silva

Nada, porém, aconteceu!!!

A extraordinária anomalia gravimétrica mantém-se sem explicação, até aos dias de hoje e ninguém com isso se preocupa!!

O pessoal técnico da 1.ª Brigada de Prospecção depressa esqueceu as lições que prodigamente lhes fui ministrando, durante vários anos.

Se há uma anomalia clara, geofísica ou geoquímica, tem que se encontrar uma explicação para ela.

Deviam lembrar-se do caso de Neves – Corvo e do clamoroso erro cometido pelo pessoal técnico da associação luso-francesa, que desvalorizou a importância da anomalia gravimétrica, preferindo valorizar interpretação geológica que se provou estar errada.

Deviam também lembrar-se do caso do jazigo da Estação em Aljustrel e das pressões do Director-Geral para terminar uma sondagem que estava a tornar-se muito dispendiosa e da minha recusa por não ter sido ainda explicada a anomalia que se investigava, apesar de ser de moderada intensidade.

Este artigo é mais um escandaloso exemplo da apropriação do trabalho de outros, para publicação.

Neste caso, nem sequer são citados os chamados “relatórios internos”, em Bibliografia consultada!
Nenhum deste Geólogos foi autor dos trabalhos de prospecção geofísica que apresentou.
Nenhum deles teve participação nas descobertas de ocorrências auríferas, as quais foram de minha exclusiva responsabilidade, muito anteriormente ao seu ingresso no SFM (Ver post N.º 18).
Estudos, feitos em ocorrências de vários outros minérios, constavam do relatório que eu tinha em preparação, quando tive que dedicar todo o meu tempo a organizar um Serviço de Prospecção extensivo a todo o território metropolitano nacional. (Ver também post N.º 18)
O que foi realizado nestas ocorrências consta, porém, dos relatórios anuais do SFM publicados até 1964.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

200 – Novo Plano Mineiro Nacional. Continuação 24, Referência especial à Região de Montemor-o-Novo

A prospecção mineira, no seu conceito lato, inclui todos os estudos, que visem a definição de reservas de recursos minerais, para futura exploração e comercialização.

Seguindo este conceito, que deduzi ter sido adoptado por José Goinhas, no documento sobre a história da "Prospecção Mineira em Portugal", que tenho vindo a analisar, cheguei, nesta análise, à fase final, caracterizada pela execução de trabalhos mineiros desenvolvidos.

Com base nos elementos constantes dos relatórios anuais, publicados até 1964, salientei que a acção das Brigadas do SFM, do Norte e do Centro, desde a criação do Serviço, conduziu, unicamente, à definição de reservas significativas, no jazigo de ferro de Guadramil e a exploração, por empresa privada, no jazigo de chumbo argentífero de Terramonte.

Vou agora referir-me à actividade da Brigada do Sul no mesmo período.

A região de Montemor-o-Novo foi a seleccionada para os primeiros estudos.
As publicações nºs 3 e 15 da série “Relatórios” dão conta dos trabalhos efectuados nas minas de ferro existentes nesse concelho e dos respectivos resultados.

Da Introdução do relatório de 123 páginas e 39 peças desenhadas, subscrito por um Engenheiro, um Geólogo e dois Agentes Técnicos de Engenharia, que foi publicado em 1949, com o N.º 15, destaco as seguintes passagens:

“Com a designação “Minas de Ferro de Montemor-o-Novo”, incluímos o conjunto de minas, situadas neste concelho, constituindo a faixa mineralizada de cerca de 12 quilómetros, que se estende desde a Herdade da Nogueirinha, a sudeste, até à Herdade da Gamela, a noroeste”

“Algumas destas minas foram largamente exploradas, como se verá no decorrer deste relatório, tanto em tempos bastante remotos, como há uma dezena de anos a esta data; outras não apresentam quaisquer trabalhos.
Circunstâncias umas vezes de ordem técnica e outras de ordem económica conduziram estas minas a uma exploração pouco regular e intermitente.
O estado actual dos trabalhos e os estudos realizados levam-nos à desoladora conclusão de que as massas importantes deste jazigo foram extraídas, apenas restando pequenas tonelagens dispersas com minério de qualidade inferior ao extraído.”

Do capítulo “Conclusões” destaco:

“Os autores de alguns relatórios antigos admitem a possibilidade de o jazigo se prolongar em profundidade sob a forma de pirite. Para nós, as condições genéticas do jazigo e as observações feitas em profundidade, principalmente para o grupo sudeste da faixa mineralizada, são suficientes para excluir esta hipótese.”

Não sei o que mais me surpreendeu:
... se, em completo desrespeito por disposições legais em vigor, se ter permitido a manutenção, por empresa privada, de concessões mineiras, nas quais o SFM, após estudos que realizou, ter declarado não existirem concentrações de minério que justifiquem exploração;
... se a escolha, para publicação, de um relatório, com conclusões negativas, que não era obviamente estimulante para novos estudos por empresas mineiras.

O mesmo Director do SFM, o Engenheiro Guimarães dos Santos, viria, poucos anos mais tarde, a manter sem publicação, vários relatórios de minha autoria, nos quais eram apresentados resultados positivos, de muito interesse.
Só por intervenção do Director-Geral, Engenheiro Castro e Solla, quando lhe dei conhecimento desse facto insólito, é que Guimarães dos Santos decidiu publicar alguns dos meus relatórios, seleccionando, porém, para o efeito, os que tinham menos páginas e peças desenhadas e, mantendo os principais em arquivo.
Aconteceu que a publicação de um desses relatórios logo suscitou o interesse de Companhia estrangeira para celebrar contrato com o Estado, visando dar continuidade aos estudos que o SFM não tinha podido completar por não dispor, então, dos equipamentos necessários. (Ver post N.º 3)

A óbvia realidade é que as conclusões a que chegaram os 4 autores da publicação N.º 15 da série “Relatórios”, não podem ser levadas a sério.

Todos aqueles autores eram técnicos recém-formados, até com baixas classificações nos seus cursos, portanto sem experiência profissional e com pouca capacidade para a terem adquirido durante os anos em que participaram nos estudos destas Minas.

De facto, tratando-se de um jazigo com a extensão de 12 km, seria natural formular a hipótese de que também atingisse grande profundidade.

A zona onde o concessionário fez exploração e onde o SFM procedeu principalmente a desobstruções e a amostragens de minério não extraído pelo concessionário, devido à sua inferior qualidade, seria a parte superior de um jazigo de enormes dimensões, que conteria, não apenas magnetite, mas provavelmente também sulfuretos vários.

A parcela conhecida seria o que, em linguagem corrente se exprimiria por “ponta de um iceberg”.

O primeiro Director do SFM, o Engenheiro António Bernardo Ferreira, apercebendo-se desta possibilidade, promoveu que fosse empreendida campanha de prospecção, pelo método magnético, para localizar concentrações de minério ocultas.
A campanha esteve a cargo da Companhia sueca ABEM, mas não conduziu a resultados com interesse.
A abundância de magnetite, à superfície, derivada das explorações, provocava anomalias que mascaravam efeitos provenientes de possíveis concentrações profundas.

Quando, em 1948, passei a dirigir a Brigada do Sul, uma área que, de imediato, mereceu a minha atenção, foi a que passei a denominar de Faixa Magnetítica, onde ocorrem os conhecidos jazigos de Montemor-o-Novo, Alvito, Orada e outros de menor importância.

Alguns anos mais tarde, fui induzido a alterar a designação para “Faixa Magnetítica e Zincífera”, por ter reconhecido que, no mesmo ambiente geológico, ocorriam também mineralizações de sulfuretos, sobretudo de zinco, constituindo horizonte mineralizado idêntico à Faixa Piritosa, situada mais a sul. (Ver posts N.ºs 8, 12 e 19).

Em 1961, foi-me dada uma extraordinária oportunidade de resolver o problema ocasionado pela abundância de magnetite à superfície.

Eu tinha sido nomeado para representar Portugal, em reuniões em Paris, por um Grupo de técnicos de 18 países, constituído “ad hoc”, no âmbito da OCDE, para aplicação de métodos modernos de prospecção
Na sequência destas reuniões, apresentei um ante-projecto de prospecção aérea no Alentejo. (Ver posts N.ºs 4 e 22).

A seguir, transcrevo, o que escrevi, a este respeito no post N.º 22

“O ferro apresenta-se geralmente sob a forma de magnetite. Os seus jazigos situam-se “grosso-modo” numa faixa paralela á Faixa Piritosa, que se alonga desde as imediações de Montemor-o-Novo até à fronteira, perto de Moura.
Não temos elementos que nos permitam ajuizar se esta Faixa continua em Espanha. Haveria interesse em estudar esta questão.
Presentemente há apenas um jazigo de magnetite em exploração.
Para encontrar outros que mereçam exploração, cuja existência se crê possível, têm sido feitos levantamentos magnéticos, à superfície, numa parcela importante da Faixa.
Os resultados já obtidos oferecem um certo interesse.
Todavia, há ainda uma extensa zona a estudar, com problemas difíceis de resolver por este método, com observações no solo, devido a pequenas concentrações de magnetite sem interesse económico que se encontram perto da superfície e que, interpondo-se, podem mascarar a influência de massas importantes que eventualmente se encontrem em profundidade.

Acreditamos que um levantamento aéreo, pelos métodos magnético, electromagnético, gravimétrico e talvez radiométrico (se a Junta de Energia Nuclear nisso revelar interesse) cobrindo a área indicada na carta mineira, deveria ser considerado, a fim de contribuir para uma mais rápida solução dos problemas enunciados.”

Este ante-projecto incluía um extracto da Carta geológica do Sul de Portugal (a Sul do Rio Tejo), à escala de 1:500 000 e um extracto da carta mineira da mesma área, à mesma escala.

Foi tão boa a aceitação do ante-projecto que a OCDE decidiu considerar a sua extensão ao Sul de Espanha.

Entretanto, ocorreram na Direcção-Geral de Minas alguns acontecimentos que vieram alterar a sequência do ante-projecto.

No segundo semestre de 1962, o Engenheiro Luís de Castro e Solla pediu a exoneração do cargo de Director-Geral de Minas (facto a que oportunamente me referirei mais detalhadamente, pelo seu ineditismo), indicando para o substituir o Engenheiro Fernando Soares Carneiro.

O novo Director-Geral, sem me dar qualquer explicação, nomeou, em Maio de 1963, como representante de Portugal no Grupo de Trabalho da OCDE para a prospecção mineira, o Engenheiro que acabara de deixar o cargo de Director do SFM, no qual se mantivera durante 15 anos.

A experiência deste Engenheiro em prospecção mineira era nula.

Isso se reflectiu, em contactos posteriores com representantes da OCDE vindos a Portugal para reuniões tendo em vista a concretização da prospecção aérea no Sul de Portugal e Espanha.

Numa dessas reuniões, que teve lugar em Lisboa, com presença do Director-Geral de Minas, de um seu Adjunto (o cognominado Ajax), dos representantes portugueses da OCDE e do dirigente máximo do Grupo de Trabalho da OCDE, vindo propositadamente de Paris, foi pedida a minha participação, como elemento mais conhecedor do tema, de que fora autor.

Senti-me tão mal impressionado com a falta de empenhamento dos principais representantes da Direcção-Geral de Minas e com as atitudes grosseiras do novo Director-Geral, que logo me apercebi de que o projecto se iria gorar.

E foi o que aconteceu. Não mais ouvi falar dele! “

. Não tendo tido concretização, este projecto havia que prosseguir as investigações, a partir da superfície, nesta Faixa Magnetítica e Zincífera, com aplicação das técnicas geofísicas e geoquímicas, nas quais o Serviço de Prospecção, por mim dirigido, vinha adquirindo larga experiência.

Foi assim que se fizeram as descobertas dos jazigos de Algares de Portel e de Vale de Pães e se confirmou que ocorrências de minérios de ferro, tais como Vale do Vargo e outras dos arredores de Moura eram afinal chapéus de ferro de jazidas de sulfuretos.

Registo que Goinhas não alude, na sua história, a estes importantes factos, esquecendo-se até de citar, na bibliografia, a Comunicação que apresentei nas Jornadas de Engenharia de Moçambique, em 1965, sobre a notável descoberta de Algares de Portel, a qual foi publicada pela Sociedade de Estudos daquela ex-província ultramarina portuguesa.

A prioridade que era dada aos estudos na Faixa Piritosa, perante os espectaculares resultados que vínhamos obtendo, originava progressos mais lentos, na Faixa Magnetítica e Zincífera.

Impunha-se prosseguir, nessa Faixa, sobretudo, com as campanhas de gravimetria.

A 1.ª Brigada de Prospecção estava organizada para esse efeito.

Mas, em Janeiro de 1975, conforme descrevi nos posts N.ºs 81 até 91, os Engenheiros, os Geólogos, os Agentes Técnicos de Engenharia, e outro pessoal contratado, ao qual eu tinha dado formação técnica, ou promovido que fosse especializado na prática dos diversos métodos de prospecção, decidiram solicitar a minha demissão da chefia da 1.ª Brigada de Prospecção, que tinha sido pacientemente por mim organizada, ao longo de muitos anos.
Tomaram esta atitude de prescindir da minha orientação superior, obedecendo a instruções de dirigentes malévolos, que tentavam, a todo o custo, manter-se nos cargos a que tinham ascendido, no regime político anterior à Revolução de Abril de 1974, não por competência, mas por considerações de ordem político-religiosa (Ver post N.º 25)

Nestas circunstâncias, deixei de ter conhecimento do progresso dois estudos na Faixa Magnetítica e Zincífera.

Sabia apenas que, tendo-me acusado de ter ocasionado enormes prejuízos ao País, o Geólogo Delfim de Carvalho, que passara a assumir-se como principal dirigente da Brigada, declarou publicamente que, com a minha demissão da chefia da Brigada, “nada parou, tudo continuou”!!!. (Ver post N.º 101)

Isto induziria a pensar que continuavam os prejuízos, … ou então, se tudo continuava a correr bem, que eles a si próprios se classificavam de traidores.

O facto era que a Brigada estava organizada, com os seus diferentes núcleos, actuando por todo o Alentejo e, até por “inércia de movimento”, teria de manter-se activa, seguindo ou não os planos que eu traçara.

Mas o que chegava ao meu conhecimento não era animador.
A Brigada que eu pacientemente organizara, durante anos, estava a desintegrar-se.
O Geólogo Delfim de Carvalho, apesar do caloroso empenho que quis manifestar pelo progresso da Brigada, logo que pôde, abandonou-a para ocupar a chefia dos Serviços Geológicos.
E o Engenheiro Vítor Borralho, outro dos principais autores do vergonhoso documento que conduziu à minha demissão da chefia da Brigada, conseguiu ser nomeado Administrador de Minas de Aljustrel.
E o próprio Goinhas acabaria por sair para dirigir o Gabinete para a Prospecção e Pesquisa de Petróleo !!!

Já me tinha surpreendido o comentário depreciativo de Jorge Gouveia, quando ocupou o cargo de Director do SFM, ao informar-me de que, no Sul, andavam a inventar trabalho.
Queria significar que faziam cobertura de áreas por técnicas geofísicas, apenas para manter activo o seu excessivo pessoal, de cuja admissão me culpava.
A minha reacção foi, então de que, quando estiveram sob minha chefia, não conseguiam realizar senão uma parcela mínima do que eu projectava. (Ver post N.º 134).

Mas a qualidade que passaram a ter os estudos na 1.ª Brigada de Prospecção ficou bem patente em diversos documentos publicados.

Já me referi ao caso do Salgadinho, que Delfim de Carvalho promoveu a jazigo, colocando-o em paralelo com Neves – Corvo e que não passa, por enquanto, de um bom indício da ocorrência de calcopirite, para cuja descoberta Delfim de Carvalho além de nada ter contribuído, passou a investigar de modo muito incorrecto, com enorme desperdício de dinheiros públicos.

A outros casos semelhantes me referirei oportunamente.

No próximo post, revelarei a decisão que fui compelido a tomar, após a leitura do artigo da autoria dos Geólogos José Goinhas e Luís Martins, publicado em 1986, no Tomo 28 da Revista do SFM, com o titulo:
“Área metalífera de Montemor o Novo. Um exemplo da evolução dos objectivos em prospecção mineira”.

sábado, 9 de junho de 2012

199 - Um novo Plano Mineiro Nacional. Continuação 23

O documento, publicado no Boletim de Minas, com o título “Prospecção Mineira em Portugal. Áreas potenciais para aplicação de projectos”, da autoria do Geólogo José Goinhas, que tenho vindo a analisar, foi produzido com a declarada intenção de contribuir para novo Plano Mineiro Nacional.

O Ministro Veiga Simão exigira que este Plano fosse apresentado no ano de 1984, a fim de combater grave crise, que considerava estar, então, atravessando, a indústria mineira nacional.
Tal Plano tinha sido sugerido pelo Geólogo Alcides Pereira que, na categoria de Director – Geral de Minas, a que pouco tempo antes conseguira ascender, nas circunstâncias que descrevi nos post N.º 112 e 118, pretendia demonstrar o seu forte empenho na dinamização da nossa indústria mineira.
E o Ministro, cuja formação académica não se orientara para temas mineiros e cuja experiência profissional também se não encaminhara nesse sentido, facilmente caiu no logro deste “Chico esperto”.

Das análises a que já procedi, sobressaem duas conclusões principais.
A primeira é que a crise não tinha carácter geral.
Na realidade, as criteriosas investigações sistemáticas, realizadas durante mais de 30 anos, por núcleos do SFM por mim dirigidos - apesar de inacreditáveis dificuldades criadas por dirigentes sem consciência das responsabilidades inerentes aos seus altos cargos (Ver post Nº 14), tinham sido recompensadas com a sensacional descoberta do jazigo de Neves – Corvo, que viria a revelar-se a maior concentração de minério de cobre, zinco, chumbo e estanho da Europa.
Até já se encontravam em curso trabalhos de grande vulto, visando o início da exploração, a grande profundidade.

E, como mostram vários quadros e mapas, inseridos no documento de Goinhas, foram 25 os contratos celebrados, na década de 80, com Empresas privadas, concedendo direitos de prospecção e pesquisa, para minérios variados, abrangendo vastas áreas do País, muitos dos quais se mantinham em vigor em 1984.

O interesse destas Empresas, quase todas estrangeiras, foi suscitado pela inconsciente alienação, em prol de um consórcio luso – francês, em que predominava a presença francesa, do jazigo de Neves-Corvo, cuja descoberta estava praticamente concretizada, através de forte anomalia gravimétrica detectada pelo SFM.

A este respeito, é oportuno transcrever a seguinte passagem do capítulo final do relatório de minha autoria “Prospecção de pirites no Baixo Alentejo”, publicado, em 1955, no Volume X da Revista do SFM, nunca tida na mínima consideração, pelos chamados “técnicos de papel selado” que, no conforto dos seus gabinetes, tomavam decisões sobre matéria a que pareciam alheios:

Todos os estudos a que nos vimos referindo podem e devem, em nosso entender, estar a cargo de técnicos portugueses que hajam, para o efeito, adquirido a necessária especialização, conforme prevê o Decreto-lei de criação do Serviço.
Só aceitamos a intervenção de técnicos de outras nacionalidades, como consultores ou em execução de campanhas de curta duração, principalmente com o propósito de proporcionar instrução a pessoal português.
A favor deste modo de proceder falam, não só a economia como o próprio interesse no assunto, que não poderá esperar-se de outros superior ao dos nacionais.”

De facto, a crise, a que o Ministro aludia, afectava, exclusivamente e de modo alarmante, a DGGM, devido à ocupação dos principais cargos directivos deste Organismo estatal, por técnicos incompetentes e de baixo carácter.
Tal degradação de um Organismo que tinha por obrigação zelar escrupulosamente pela defesa do património mineiro nacional, tornou-se possível, por desregrado uso das liberdades conquistadas, após a Revolução de 25 de Abril de 1974.

No desconhecimento dos termos dos contratos celebrados com as empresas privadas, os quais não foram publicados, permito-me duvidar de terem sido devidamente acautelados os interesses nacionais.
E tenho também muito sérias dúvidas quanto ao correcto acompanhamento, pelos serviços oficiais, da actividade destas empresas, de modo a tirar benefício da sua presença.

A segunda é que José Goinhas, estando incluído naquele grupo de técnicos incompetentes e malévolos, não tinha idoneidade para apresentar uma história credível da prospecção mineira em Portugal, e muito menos, para extrair lições tendentes a evitar repetição dos erros responsáveis pela crise a que o Ministro aludiu.
Não se pode esperar de um incompetente que denuncie os erros e oportunismos que ele e seus parceiros coniventes praticaram!

Goinhas não se preocupou com o diagnóstico da situação que o Ministro classificou de grave.
Limitou-se a descrever, de modo atabalhoado, alguns casos, extraídos da extensa bibliografia que disse ter consultado, mas foram frequentes as suas deturpações e sobretudo inadmissíveis as suas deliberadas omissões.
Procurando dar um ordenamento racional ao tema em análise, tratei já as fases que devem preceder os trabalhos mineiros mais desenvolvidos, com o objectivo de definir reservas.

Os trabalhos simples, sanjas, em ocorrências aflorantes, pequenas galerias e pequenos poços, tinham justificação, nas fases iniciais, para avaliar se os dados, que proporcionavam, teriam mérito suficiente para passar às fases seguintes, destinadas à definição de reservas economicamente exploráveis.

Os trabalhos mineiros tradicionais foram aplicados, quase sistematicamente, desde o início da actividade do SFM.
Eram, inicialmente, de pequena envergadura, mas passaram, em alguns casos, a ter desenvolvimentos que atingiam, na horizontal, extensões de quilómetros e, em profundidade, 150 m, abaixo da superfície.

O SFM começou por prestar contas desta sua actividade, em publicações da série “Relatórios”, que citei no post anterior.
Passou, depois, a usar a Revista “Estudos, Notas e Trabalhos do Serviço de Fomento Mineiro”, para esse fim.
Os relatórios publicados até 1963, são bem elucidativos quanto ao predomínio dos trabalhos mineiros clássicos, sobretudo no Norte do País.
Alterações verificadas em cargos directivos no SFM, no início de 1964, tiveram diversas consequências.
Uma delas foi ter deixado de se publicar o relatório anual da actividade do SFM!

O anterior Director de SFM, o Engenheiro Guimarães dos Santos, tirando partido das qualidades organizativas do Agente Técnico de Engenharia Fernando Macieira encarregava-o de compilar todos os dados para a elaboração desse relatório.
E, pelo que me constava, Fernando Macieira tinha o cuidado de chamar a atenção do Director para comentários e sugestões, que eu inseria nos relatórios dos trabalhos a meu cargo, os quais não eram abonatórios do modo como o Director estava interpretando a sua função, não facilitando, como era seu dever, o cumprimento dos objectivos do SFM.
Estes reparos não iriam, obviamente, constar do texto do relatório para publicação, mas poderão ser consultados nos arquivos oficiais … se não tiverem sido destruídos. Registo que conservo em meu poder, exemplares de todos estes documentos.

Do que foi publicado até 1963, conclui-se que as Brigadas do Norte e do Centro se dispersaram por numerosas ocorrências, em trabalhos, que, de modo geral, tiveram muito reduzida importância, apenas conduzindo, no caso do jazigo de Guadramil, a avaliação de reservas.

Relativamente à actividade destas Brigadas, constam, nesses relatórios, trabalhos nas seguintes minas antigas, inactivas, na quase totalidade:

a) Minas de ferro:
Guadramil e Vila Cova.
b) Minas de ouro:
Vila Meã Vilas Boas, Três Minas, Gralheira, Argeriz, Santa Comba Vales, Poço das Freitas, Tresmundes, Valongo.
c) Sulfuretos de chumbo:
Paradinha, Vale de Campo, Adorigo, Quintanilha, Penabeice, Fontes de Cima, Campo de Víboras, Castelo Branco, Vale da Murta (zona do Braçal), Terramonte (Castelo de Paiva).

Se excluirmos a Faixa Carbonífera do Douro, investigada por sanjas e sondagens, nas circunstâncias que descrevi no post Nº 52, os trabalhos mineiros, efectuados pelas Brigadas do Norte e do Centro do SFM, apenas deram origem a exploração, por empresa privada, no caso da Mina de chumbo argentífero de Terramonte, situada no concelho de Castelo de Paiva.

Não houve capacidade para dar sequência aos numerosos indícios de possíveis jazigos, representados pelas ocorrências que começaram a ser investigadas.
Não havia, nestes núcleos do SFM, preparação para fazer uso das modernas técnicas de prospecção.

Lembro a triste figura que fez o Director Guimarães dos Santos, quando me desloquei, em 1961, à sede do SFM, acompanhado do Professor Robert Woodtly da Universidade de Lausanne, e este se propunha oferecer a colaboração da OCDE no uso destas novas técnicas.
Surpreendentemente, o Director do SFM declarou que no Norte do País, não havia matéria que justificasse a aplicação desses métodos (Ver post Nº 4).
O Colaborador também não prestou ajuda alguma nesta matéria. Duvidava da eficácia dos métodos indirectos.

Houve, todavia, um estranho acontecimento, que me causou grande perplexidade.
Quando estava em curso, na região de Barrancos, sob minha orientação, uma campanha pelo método electromagnético Turam, que já tinha tido grande sucesso na definição do sistema filoniano cuprífero de Aparis, o Director do SFM - Guimarães dos Santos, ordenou que as equipas de campo e de gabinete, por mim constituídas, com pessoal localmente recrutado, se deslocassem à zona Norte, para lá ser aplicado o método.
Recordo que a Brigada de Prospecção Geofísica se tinha revelado incapaz de pôr o equipamento Turam em uso, apesar da total disponibilidade que demonstrei para transmitir a minha experiência no método.
Recordo, também, que o equipamento permaneceu encaixotado, até que eu apresentei proposta para o utilizar, no âmbito da Brigada do Sul (Ver post N.º 13).

Ao ler o relatório respeitante ao ano de 1956, publicado nos fascículos 3 e 4 -do Vol. XII da Revista do SFM, tomei conhecimento de que o método tinha sido aplicado na Mina de Campo de Víboras (Bragança), na qual ocorrem numerosos filões com mineralização de galena e na zona de Castelo Branco (Vimioso e Mogadouro ), com resultados considerados sem interesse.
Permito-me duvidar da correcta aplicação do método, pois não basta usar o pessoal adestrado no trabalho de campo e de gabinete, para o sucesso da técnica.
Seria essencial a criteriosa planificação do trabalho, o controlo da sua execução e a capacidade de interpretar os resultados.
Mas não estivera destacado pessoal habilitado a cumprir estas acções.

Em acentuado contraste com o que se passara no Norte e no Centro do País, no âmbito dos Trabalhos Mineiros, a actividade na Brigada do Sul do SFM, principalmente durante os 15 anos decorridos sob minha orientação e a minha activa participação, foi muito mais intensa, como é claramente evidenciado nos relatórios anuais publicados na Revista do SFM.
Dela resultaram não só várias explorações mineiras, por entidades privadas, com benefício directo para a economia nacional, mas também novos estudos, por entidades privadas, que se interessaram em dar continuidade a programas estabelecidos pelo SFM, através de contratos adequados.

A esses Trabalhos Mineiros, farei mais desenvolvida referência, no próximo post.
Continua …

sábado, 2 de junho de 2012

198 - Um novo Plano Mineiro Nacional. Continuação 22

No seu sentido lato, a prospecção mineira inclui todos os estudos tendentes à definição de reservas de minérios susceptíveis de exploração remuneradora.
Conforme registei, em posts anteriores, embora não seja evidente o conceito que José Goinhas adoptou, no documento intitulado “A prospecção mineira em Portugal”, que tenho vindo a analisar, deduzi, das suas referências, no texto e na bibliografia, que o sentido lato estaria na sua intenção.

O SFM, nos seus primórdios, executou, sobretudo, simples trabalhos mineiros (sanjas; desobstrução de antigas galerias e de antigos poços e seu eventual prolongamento; novas galerias e poços de pequena extensão), para definir reservas.
Nessa fase, publicou relatórios, dando conta, não apenas dos trabalhos, mas também do pessoal técnico e auxiliar, que neles participou e dos diplomas legais directa ou indirectamente relacionados com a sua actividade.

Foram publicados, até 1951, os seguintes relatórios:
1 – Em 1942 – Relatório respeitante aos anos de 1939 a 1941).
2 – Em 1943 - Alguns jazigos do Alentejo (Ferro).
3 – Em 1943 Jazigo de Montemor-o-Novo (Ferro).
4 – Em 1943 - Quadros de estratigrafia portuguesa metropolitana.
5 – Em 1945 - Estudo preliminar de castinas e da localização das oficinas de siderurgia.
6 - Em 1945 – Relatório respeitante aos anos de 1942 e 1943).
7 – Em 1946 - Jazigos de manganés do Alentejo (Mina do Ferragudo e Felipeja)
8 – Em 1946 - Jazigos de manganés do Alentejo (Mina da Serra dos Feitais).
9 – Em 1946 - Jazigos de manganés do Alentejo (Mina de Lagoas do Paço).
10 - Em 1946 - Jazigos de manganés do Alentejo (Mina de Vale do Calvo).
11 – Em 1946 - Jazigo de ferro de Odivelas.
12 – Em 1946 - Jazigos de ferro e manganés do Alentejo (Estudo das minas da Serra da Mina, Toca do Mocho, Serra do Lagar da Bela Vista e Cerro do Pinheiro da Bela Vista).
13 Em 1946 – Jazigos de ferro e manganés de Odemira e Cercal (Mina da Serra das Tulhas).
14 – Em 1948 - Rochas e minérios da região de Bragança – Vinhais).
15 – Em 1949 - Minas de ferro de Montemor – o Novo.
16 – Em 1948 - Catálogo das minas de ferro do continente. Tomo I.
17 – Em 1951 - Região Carbonífera do Moinho da Ordem – Estudo da sondagem entre Vale da Figueira e a Cova dos Sobreiros.
18 – Em 1951 Relatório respeitante aos anos de 1944-46).

A qualidade destas publicações reflectia, na generalidade, a inexperiência dos seus autores, em trabalho de campo.

Alguns professores universitários, que nem sequer estavam isentos de responsabilidades na preparação dos profissionais envolvidos, consideraram graves algumas deficiências dessas publicações e teceram críticas mordazes.
Mas o Engenheiro António Bernardo Ferreira, não se deixando intimidar, teve a ideia de convidar, com confortável remuneração, um desses críticos, o Professor João Manuel Cotelo Neiva, para prestar colaboração ao SFM, e, deste modo, melhorar a qualidade do que se publicava.

Uma das primeiras atitudes deste Colaborador, foi propor a criação da Revista, que iria surgir periodicamente, à qual foi dado o nome de “Estudos, Notas e Trabalhos do Serviço de Fomento Mineiro”.
Nesta Revista, passaram a constar, não só artigos variados, mas também os relatórios da actividade do SFM.
Um dos maiores méritos da Revista foi a estabelecimento de intercâmbio com entidades de diversos países, assim permitindo constituir valiosíssima biblioteca.
Dela fui sempre bom cliente e tive a sorte de não haver muitos interessados na consulta das publicações, que inseriam artigos sobre prospecção mineira; podendo retê-las em meu poder e assim melhorar a minha preparação técnica.

Se Cotelo Neiva teve capacidade para evitar que surgissem publicados os erros mais grosseiros, tais como, ocorrência de enxofre em Miranda do Douro (com base em matéria que alguém descuidadamente por lá abandonara) (ver mapa que acompanha o 1.º Relatório), ou se classificassem dendrites como fósseis (ver Quadros de estratigrafia citados no N.º 4), não impediu que, em matéria de geologia, a maioria dos 18 relatórios, que acima citei, contivesse informação de reduzido interesse ou mesmo errada.
Não impediu também que, na sua maior parte, as descrições dos trabalhos mineiros pouco ou nada acrescentassem ao que já constava dos arquivos da DGMSG.

Cotelo Neiva, aproveitando-se do ascendente que conquistara sobre a maioria do pessoal técnico radicado na zona Norte do SFM (no reino dos cegos, quem tem um olho é rei!), teve até a habilidade de progressivamente, inverter a condição de Colaborador, para que tinha sido convidado.
Grande parte do pessoal técnico do Norte passou a colaborar em estudos em que Cotelo Neiva estava empenhado, mais para alimentar a sua vaidade de produzir continuamente artigos para publicação, do que para atingir o verdadeiro objectivo do SFM, isto é, o inventário dos recursos minerais do Pais.
Lembrou-me a classificação do autor do blogue “A Beira Lethes”, no seu post de 16 de Maio passado, com o título “Os basbaques, os oportunistas e os vaidosos”
Cotelo Neiva já não precisava de demonstrar a sua competência.

Nessa época, ele já era considerado uma autoridade indiscutível.

A publicação N.º 14 – ”Rochas e Minérios da Região de Bragança – Vinhais”, com data de 1948, é um exemplo demonstrativo desta aberrante situação.
Nela estão retratados, em várias estampas, o Engenheiro Soares Carneiro, que viria a ser nomeado Director-Geral, o Engenheiro António Neto e o Agente Técnico de Engenharia, Manuel Fernandes de Pina, ora exibindo o martelo de Geólogo, ora mostrando ou observando afloramentos, no papel de Colectores, que aceitaram desempenhar, quando tanto havia a fazer em matéria de prospecção.

Esta publicação refere-se ao estudo de uma área de cerca de 342 km2 da Região de Bragança - Vinhais.
Nela, Cotelo Neiva menciona grande variedade de rochas eruptivas, desde ácidas a ultra-básicas, algumas com designações, que ele decidiu atribuir (bragançaito, abessedito), rochas sedimentares e metamórficas e numerosas ocorrências de minerais úteis (cromite, magnetite, sulfuretos de ferro e cobre, silicatos niquelíferos e cobaltíferos, óxidos de manganés, asbesto, talco etc.) que impropriamente denomina de jazigos.
Não se nota a preocupação de tornar o texto de leitura fácil e acessível.
Não quis seguir o sábio conselho condensado no acrónimo “Kiss” (keep it small, simple!), preferiu adoptar o acrónimo “Mill” (Make it long, litter!).
De salientar a descoberta de platina, de que apresenta microfotografias.

Refere, em apoio desta sensacional descoberta - que já tinha revelado em dois artigos publicados na Revista do SFM - teores de 2 a 12 gr/T, com média de 6 gr/T, em 10 amostras, que seleccionara e enviara para análise, no Laboratório Químico-Metalúrgico da Fábrica de Munições e Artilharia, Armamento e Viaturas (Braço de Prata) do Ministério da Guerra.
Nas 251 páginas desta publicação, não se encontra orientação alguma, sobre os trabalhos que deveriam seguir-se, para investigar se as ocorrências de minerais úteis, que disse ter detectado, atingiriam dimensões e teores, susceptíveis de exploração económica.

Tão pormenorizadas descrições dos diversos tipos de rochas, pouca ou nenhuma utilidade tiveram para o SFM.
Nem sequer é chamada a atenção para a possível utilidade de algumas delas (serpentinas, por exemplo) para a produção de pedras ornamentais.
Do ponto de vista estrutural, o que consta também nada ajuda e essa seria matéria fundamental para a prospecção.

O Professor não tinha, de facto, preparação em prospecção mineira.
Em conversa informal, numa das minhas ocasionais presenças no Norte, quando eu ainda exercia a minha actividade apenas no Sul do País, permitiu-se até censurar-me, por perder tempo com observações por técnicas geofísicas, aconselhando-me, professoralmente - em atitude que lhe seria usual no Norte - a fazer as minhas investigações por métodos directos, isto é, por sanjas, galerias, poços.
Duvidava da eficácia das técnicas geofísicas e, por isso, tal matéria não constava do Curso de Geologia da Faculdade de Ciências de Coimbra, de que era responsável.

Como tenho acentuado em vários posts, as minhas maiores dificuldades na prospecção mineira, foram sempre no domínio da Geologia.
A colaboração que recebi de Cotelo Neiva, neste âmbito, foi de pouco interesse, praticamente inútil e, nalguns casos, até errada.

É grave aceitarem-se, como fidedignos, sem cuidadosa análise, todos os estudos das sumidades nacionais.

Não tenho as melhores recordações da colaboração de que Cotelo Neiva foi encarregado, relativamente ao estudo de amostras do Sul do País, oportunamente enviadas à Direcção do SFM para exame por entidade competente.

De facto, as suas incorrecções começaram a manifestar-se, quando a 1ª Brigada de Levantamentos Litológicos procedia à Implantação dos afloramentos de rochas vulcânicas, na Faixa Piritosa Sul – Alentejana, em mapas à escala de 1:50 000, como preparação para os levantamentos electromagnéticos que se seguiriam

Denominou, então, como “cloritoxistos com porfiroblastos de calcite” o que, de facto, eram espilitos, isto é, rochas vulcânicas, com a sua estreita correlação com a ocorrência dos jazigos de pirite. (Ver post N.º 8).

Foi aos Geólogos holandeses Mc Gillavry, Van den Boogard e ao Geólogo alemão Gunter Strauss (Ver post N.º179) que se ficou a dever a primeira interpretação séria da estrutura da Faixa Piritosa, classificando devidamente as rochas vulcânicas ocorrentes, entre as quais os espilitos.

Anos mais tarde, o Colaborador viria a classificar como ferrocalcite amostras de dolomites, que eu enviara para estudo, nos Laboratórios da Direcção do SFM.
Foi esta designação que adoptei no relatório “Formações zincíferas da Serra da Preguiça”, que foi publicado na Revista do SFM e originou a vinda da “Compagnie Royale Asturienne des Mines” para dar continuidade aos estudos do SFM, segundo programa por mim delineado (Ver post N.º 3).

Esta Companhia, com a sua experiência em exploração de jazigos de zinco, logo corrigiu a designação, sem necessidade de proceder a estudos laboratoriais.

Mas foi relativamente à Região de Cercal – Odemira, que se registou o procedimento mais estranho do Professor.

Apesar dos antecedentes que mencionei, resolvi aceitar a sugestão do meu colega Fernando Silva, de solicitar a colaboração de Cotelo Neiva, para me auxiliar a interpretar algumas situações geológicas ocorrentes na Região de Cercal – Odemira, que não estavam em conformidade com as teorias então em vigor.

Uma dessas situações verificava-se no Cerro dos Cunqueiros, na Herdade do Castelo (Ver post N.º 17).
Rochas porfíricas, com conspícuos fenocristais, que lá descobri, assentavam em concordância com rochas sedimentares, contrariando a ideia geralmente aceite de que essas rochas, consideradas intrusivas, atravessariam, discordantemente, as rochas sedimentares.
Mostrei-lhe diversas outras situações e fui expondo as minhas ideias sobre os recursos minerais já evidenciados com os numerosos trabalhos de pesquisa e reconhecimento efectuados pelo SFM, durante 14 anos, as quais iriam constar de Relatório que tinha em fase de acabamento.
Proporcionei, ainda, uma segunda visita, após a qual o Professor se comprometeu a fazer o estudo laboratorial de um conjunto de amostras das rochas e dos minérios ocorrentes nas diversas minas da Região e nas áreas envolventes, as quais eu deveria enviar à Direcção do SFM no Porto.

Em conformidade com o que ficou combinado, enviei 160 amostras, em 1953, que foram juntar-se a 12 que tinham sido remetidas em anos anteriores.
Recebi descrições subscritas pelo Professor Cotelo Neiva e pelo Eng.º Limpo de Faria, respeitantes apenas a 6 destas amostras. Estranhei que, na sua maior parte, se aludisse a um estado de alteração, que não se me afigurava real, mas que era apresentado como justificativo de difícil e imperfeito exame.

Tornara-se evidente, a inexperiência do Colaborador, no exame de rochas vulcânicas.

No Relatório, em 4 volumes, que apresentei em 1957, sobre as investigações efectuadas principalmente sob minha responsabilidade, na Região de Cercal – Odemira (Ver post N.º 16), inseri, como Apêndice, a relação de todas as amostras enviadas e o resumo dos estudos que foram efectuados sobre 6 delas.
Estou convicto de que das 172 amostras enviadas, 166 não foram objecto de qualquer exame.

Mas Cotelo Neiva não precisou disso para apresentar à III Assembleia Geral do “Instituto del Hierro y del Acero”, realizada em Madrid, em 1955, comunicação intitulada “Minerais ferro – manganesiens du Portugal” e conseguir a sua publicação, no Volume X de “Estudos, Notas e Trabalhos do Serviço de Fomento Mineiro”.

As duas visitas que lhe proporcionei à Região foram suficientes para descrever os jazigos de ferro e manganés, para apresentar as reservas certas e prováveis do seu conjunto, e para pôr em destaque as potencialidades para sulfuretos de cobre, chumbo e zinco.

Grande foi a minha estupefacção quando deparei com este artigo, no mesmo volume da Revista que contém o relatório “Prospecção de pirites no Baixo Alentejo”, subscrito por mim e pelo Engenheiro Fernando José da Silva.

Não sei que é mais surpreendente: se a ousadia de Cotelo Neiva em publicar artigo sobre matéria respeitante a Região que apenas visitara duas vezes, durante as quais lhe transmiti, oralmente, as conclusões dos meus estudos, que iriam constar do desenvolvido Relatório que tinha já em fase final de elaboração; se a anuência ou convite do Director do SFM, Guimarães dos Santos, desrespeitando ostensivamente os bons princípios de ética profissional.

A referência inicial aos estudos sob minha direcção, sem qualquer alusão aos dados que, oralmente, lhe transmiti, não constituía autorização para os publicar, antes de publicado o meu relatório, que sabia estar em fase de acabamento.

Contrastando com essa atitude, eu tinha convidado Fernando Silva, que nem uma única palavra escrevera no relatório “Prospecção de pirites no Baixo Alentejo” a subscrevê-lo como co-autor, porque tinha sido ele quem dirigira os levantamentos litológicos, que serviram de base às campanhas de prospecção electromagnética.

Quem, actualmente, quiser saber algo sobre os jazigos ferro – manganíferos de Cercal – Odemira, encontrará publicado este artigo de Cotelo Neiva e outra informação copiada do meu relatório de 1957, subscrita por Delfim de Carvalho, no Livro – Guia de Excursão que se realizou, em 1970-71, no âmbito do CHILAGE (Ver post N.º 15)

O meu relatório, não foi deliberadamente, publicado, conforme já referi (Ver posts N.ºs 16 e 17), com o argumento de que seria muito dispendiosa tal publicação, sendo certo que seria em relatórios desta natureza, que o SFM deveria prestar contas ao País da sua actividade.

Aliás, a publicação N.º 15, com data de 1949, sobre as Minas de ferro de Montemor-o-Novo é de grande extensão, embora pouco acrescente ao que já constava do arquivo da DGMSG. Também a publicação N.º 14 sobre a Região de Bragança – Vinhais, embora de escasso interesse mineiro, é um extenso documento.

Não posso deixar sem reparo o facto de Cotelo Neiva considerar que os jazigos de ferro e manganés de Cercal – Odemira possam evoluir, em profundidade, para jazigos de sulfuretos e não se ter lembrado de igual hipótese para o jazigo de Guadramil, no distrito de Bragança, cujo estudo acompanhou.

Mas não ficaram por aqui os estranhos procedimentos de um Colaborador contratado para prestar auxílio em matérias da sua especialidade.
Vou citar outro caso, que deveras me surpreendeu.

Na Mina de cobre de Aparis, do concelho de Barrancos, já se havia chegado a uma fase suficientemente avançada, para se justificar a instalação de uma lavaria, destinada a produzir concentrados com teores que permitissem a sua comercialização e, deste modo, compensar despesas com os desenvolvidos trabalhos de pesquisa e reconhecimento que, decorriam há alguns anos.

O minério era de grande simplicidade, mas era essencial definir correctamente a sua composição para estabelecer o diagrama da lavaria.
Enviei amostras representativas para a Direcção do SFM no Porto, solicitando a utilização dos recursos aí existentes, para caracterizar devidamente o minério de Aparis.

Grande foi a minha surpresa quando recebi ofício do Director, exigindo informações descabidas sobre o jazigo, pois essas informações além de já constarem dos vários relatórios que periodicamente eu enviava, me pareciam desnecessárias. Apesar de ter voltado a fornecer os dados requeridos, o estudo não foi feito.

Compreendi, então, que o Professor Cotelo Neiva, não estando interessado em fazer artigo sobre o Jazigo de cobre de Aparis, idêntico ao que fizera sobre os jazigos de Cercal – Odemira, recusara, pura e simplesmente fazer tal estudo.
Não era a ele, Professor catedrático, que competiria prestar colaboração aos estudos de um simples Engenheiro; era a mim, na qualidade de trabalhador no terreno, que competiria fornecer dados para que o Professor os pudesse utilizar em artigo para publicação.

Seria, mais tarde, o Professor Morais Cerveira, da Faculdade de Engenharia do Porto, a usar idênticas amostras, para elaborar o diagrama da lavaria que viria a ser construída, segundo as suas indicações, as quais o Agente Técnico de Engenharia Oliveira Barros aperfeiçoou consideravelmente.

A ânsia de publicar, para alimentar vaidade, no caso de Cotelo Neiva, ou para fazer currículo, de qualquer maneira, em muitos outros casos, fez escola.
Teve muitos seguidores, que foram enchendo Revistas com artigos de reduzido ou nulo interesse, muitas vezes copiando e deturpando o que outros tinham feito e não tinham publicado, por estarem ocupados a produzir o verdadeiro trabalho.

Como já referi, Cotelo Neiva não prestou a colaboração que seria de esperar, no sentido de aumentar reservas de minérios, que contribuíssem para melhorar a economia nacional.
Não deu orientações para dar a sequência apropriada à fase inicial de prospecção.
Como duvidava da eficácia das técnicas geofísicas e, aparentemente, também desconhecia a potencialidade da mineralometria, não deu conselhos no sentido de serem seguidas, com racionalidade as diferentes fases da prospecção, consagradamente estabelecidas.

Na zona Norte do País, onde a sua colaboração se fazia sentir, apenas sondagens para investigação de bacias carboníferas e trabalhos mineiros clássicos constituíram os meios adoptados para a definição de reservas minerais.

As reservas que realmente foram definidas, na zona Norte do País por trabalhos mineiros clássicos foram insignificantes, conforme revelam os relatórios da actividade do SFM, que foram publicados até 1963 na Revista do SFM.

A partir de 1963, a Revista deixou de publicar o relatório da actividade do SFM.
Tenho, no entanto, conhecimento de que, após essa data, os trabalhos mineiros no Norte declinaram progressivamente, o mesmo vindo até a acontecer no Sul, pouco após o meu afastamento da chefia da Brigada do Sul.
A esta fase de Trabalhos Mineiros irei referir-me no próximo post.

Continua …