sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

112 – Os meus contactos directos na Secretaria de Estado e suas inesperadas consequências

Perante a total passividade do Secretário de Estado, relativamente ás minhas exposições, decidi enviar-lhe em 18-7-77, com aviso de recepção, o ofício que, a seguir, transcrevo:

“Em 19 do mês passado, pelo meu ofício N.º 15/77, levei ao conhecimento de V. Ex.ª factos de extrema gravidade, que estão a passar-se no Serviço de Fomento Mineiro, a coberto da pretensa legalidade de uma Comissão dita de Direcção, eleita pelos trabalhadores, cuja criação foi homologada, com diversas condicionantes, por um antecessor de V. Ex.ª, nas funções de Secretário.
Não tive ainda a honra de obter resposta.
Compreendo que V. Ex.ª, dentre a multiplicidade de problemas para que é chamada a sua atenção, tenha dificuldade em seleccionar e estabelecer prioridades de ataque.
Porém, como funcionário consciente e responsável que me prezo de ser, (não sou um novato; tenho 34 anos de serviço dedicado de que posso exibir currículo de qualidade), sinto que é meu dever chamar a atenção de V. Ex.ª para a urgente necessidade de intervir energicamente neste sector tão importante quão desprezado da economia nacional.
É que novos factos de extrema gravidade estão ocorrendo.
A actual Comissão dita de Direcção - que não consta ter sido homologada por V. Ex.ª, após a cessação, em Março de 1977, do mandato (ilegal) da anterior – agindo em total impunidade, confiada na passividade do Governo nesta matéria, empenha-se em completar a obra de destruição, em que afanosamente se ocupavam os seus antecessores, com abundante delapidação de dinheiros públicos, nesta época dita de austeridade nacional.
V. Ex.ª não pode ignorar, por mais tempo, a situação escandalosa a que se chegou.
Na esperança de que V. Ex.ª disponha de alguns momentos para me receber, deslocar-me-ei, na próxima semana a Lisboa e, se for atendido, exporei, de viva voz, alguns dos principais factos a que me referi e, se me for consentido, farei algumas sugestões.
Não ponho qualquer restrição à presença de outras pessoas ligadas ao sector mineiro. Veria até com satisfação que fosse dada aos principais responsáveis pela degradação a que se chegou, isto é, ao Senhor Director-Geral de Minas e ao Senhor Director do Serviço de Fomento Mineiro, a possibilidade de rebaterem as minhas afirmações.
Não me proponho deslocar-me imediatamente, porque as minhas funções docentes na Universidade do Porto exigem a minha presença nesta cidade, durante a semana em curso.
Apresento a V. Ex.ª os meus melhores cumprimentos
(a) Albertino Adélio Rocha Gomes
Engenheiro de Minas de 1.ª Classe, Chefe do 1.º Serviço de Fomento Mineiro


Eu estava confiante que resposta me seria dada, marcando dia e hora para me apresentar na Secretaria de Estado, a fim de expor, com mais pormenor, as graves irregularidades, que estavam a acontecer, em total impunidade, no Serviço de Fomento Mineiro, reduzindo drasticamente a sua eficácia.
Como essa resposta não surgia, dei cumprimento ao que me tinha proposto fazer e apresentei-me naquela Secretaria de Estado na tarde do dia 25-7-1977, na esperança de que me fosse proporcionada uma audiência.
Não tendo, então, disponibilidade para me receber, o Secretário de Estado tinha já dado instruções ao seu Chefe de Gabinete para que me ouvisse.
Ao Dr. Seixas, que então tinha esse cargo, expus, durante mais de uma hora, a situação deveras crítica por que estava passando o Serviço de Fomento Mineiro, tendo observado a sua total compreensão quanto à necessidade de uma actuação enérgica para acabar com as ilegalidades que estavam a ser cometidas no SFM.
Todavia, sendo a sua formação na área jurídica, não se considerava apto a apreciar as minhas denúncias no que respeitava à deficiente orientação dos estudos com vista à inventariação dos nossos recursos minerais.
Por tal motivo, sugeriu-me que eu fizesse nova exposição ao Assessor do Secretário de Estado para a área de Geologia e Minas, Dr. Alcides Pereira, que então se encontrava ausente, em gozo de férias mas que, em breve, regressaria.
Aceitei a sugestão, no natural convencimento de que fácil seria transmitir, a técnico com formação na área das Minas, os problemas com que se debatia o Serviço de Fomento Mineiro.
Previu-se que a reunião com Dr. Alcides Pereira poderia realizar-se na segunda semana de Agosto, e que nela estariam presentes o Director-Geral de Minas e o Director do SFM, como eu havia sugerido.
Após telefonemas para Alcides Pereira, por indicação do Dr. Seixas, a reunião foi marcada para as 15 horas do dia 10-8-1977, confirmando-se que o Director-Geral e do Director do SFM seriam convocados para nela participarem.
Apresentei-me, nesse dia, com alguma antecipação, sendo logo encaminhado para o gabinete do Dr. Alcides Pereira, onde aguardei a sua comparência.
O Dr. Alcides só deu início à reunião pelas 15h e 30m, porque estivera, noutro gabinete, em conversa com o Director-Geral de Minas e o Director do SFM. Na reunião iria participar, também, o Dr. Luís Lobo, representando o Ministro da Indústria, na qualidade de Chefe do seu Gabinete.
Estranhei estas conversas, que não me pareceram de bom prenúncio. Não me passou, porém, pela cabeça, que algum acordo tivesse sido estabelecido, envolvendo a futura colocação de Alcides Pereira em posição privilegiada no Quadro de Técnicos da Direcção-Geral de Minas, com total desrespeito por todas as hierarquias.
Efectivamente, logo na fase inicial da reunião, estranhei o excessivo à-vontade de ambos aqueles dirigentes, conscientes como deviam estar das graves irregularidades em que muito se envolveram.
Tal como tinha procedido quando da reunião anterior com o Dr. Seixas, comecei por apresentar o meu currículo para dar peso às afirmações que iria fazer.
Eu não era um qualquer funcionário do SFM. Tinha um passado de dedicação, com notabilíssimos êxitos conseguidos com a minha importante contribuição, e sentia-me no direito de exigir que esse meu passado fosse respeitado e não vilipendiado, como estava a acontecer.
Quando comecei a mencionar aqueles êxitos, logo fui interrompido pelo Director-Geral, com uma das suas características grosserias: “Isto é um concurso do “Quem sabe, sabe?” (Naquela época, tinha havido, um concurso, na televisão, com aquele título).
Alcides Pereira não o advertiu, por esta intromissão grosseira e inoportuna, mas mandou-me prosseguir, interpretando eu que considerava útil conhecer esse meu passado.
Descrevi, então, os sucessos em que tive a mais importante participação, desde a descoberta do jazigo Carrasco-Moínho, em Aljustrel, conseguida em resultado dos trabalhos sob minha chefia, na Brigada de Prospecção Eléctrica, aos vários obtidos, também sob minha chefia e activa participação, na Brigada do Sul, (Jazigos ferro-manganíferos de Cercal-Odemira; jazigo de sulfuretos de chumbo, zinco e cobre, com prata associada do Torgal, em Odemira; Jazigos de zinco da Serra da Preguiça), até às descobertas do 1.º Serviço, tais como os jazigos de pirite de Estação e Gavião, em Aljustrel, o jazigo de sulfuretos de Algares de Portel, os jazigos de ferro de Alagada na região de Elvas e de Vale de Pães da região de Cuba – Vidigueira, culminando com a então muito recente descoberta de um enorme jazigo de pirite cuprífera na região de Castro Verde – Almodôvar.
A respeito desta última descoberta, de cuja importância se não tinham ainda apercebido, demonstraram ignorar ou pretenderam mostrar-se ignorantes do meu papel fundamental em tão grande êxito da prospecção metodicamente conduzida, ao longo de dezenas de anos, que levara o Geólogo Leca do BRGM francês a classificar-me como o “Pai do Jazigo”.
O Director do SFM, na sequência de infelizes comentários que já vinha fazendo, saiu-se, então, com mais esta tirada espectacular:

“ Se ele fez tudo isso foi porque eu deixei!”

Mais uma vez me surpreendeu a indiferença com que dois representantes de membros do Governo receberam tão aberrante declaração.
A verdade é que o Director do SFM estava a exprimir apenas a postura que sempre assumiu relativamente aos trabalhos que estiveram a meu cargo.
Mas, para ser mais exacto, deveria ter dito que, se eu fizera tudo quanto tinha afirmado, fora porque ele o não tinha conseguido impedir.
Quando chefiei a Brigada do Sul e ele estava encarregado da aquisição de equipamentos para os trabalhos mineiros, sempre dificultou, como já referi noutro post, a execução destes trabalhos, quer retardando o envio dos materiais requisitados quer não os adquirindo mesmo.
Posso responsabilizá-lo por casos de silicose contraída por mineiros, por continuar a fornecer martelos pneumáticos sem injecção de água, em vez dos martelos com injecção de água que eu tinha requisitado.
Considero-o igualmente responsável pelo atraso de 10 anos no início de trabalhos de prospecção gravimétrica, que levariam às grandes descobertas de jazigos na Faixa Piritosa Alentejana e a outras descobertas no Sul do País.
É ainda responsável pela perda de vários elementos especializados, que adquiriram a sua formação técnica nas Brigadas que chefiei, por não promover que fossem actualizados os fracos salários que estavam auferindo
Ao decidirem abandonar o SFM, esses elementos especializados em várias técnicas, não tiveram dificuldade em encontrar empresas que soubessem aproveitar a sua boa preparação, remunerando-os condignamente.
Uma das suas grandes atitudes destrutivas foi a exclusão da minha chefia do importante sector dos Trabalhos Mineiros do Sul do País, quando fui nomeado Chefe do Serviço de Prospecção.
Aconteceu, como já tive ocasião de referir, que o sector dos Trabalhos Mineiros no SFM foi progressivamente declinando, acabando por se extinguir completamente, assim se perdendo uma experiência acumulada ao longo de muitos anos.
Tudo isto fui historiando, até chegar aos temas que haviam suscitado o meu pedido de audiência.
Descrevi, pormenorizadamente, o caso da minha demissão da chefia da 1.ª Brigada de Prospecção, originado pela minha inflexível recusa em visar boletins itinerários, preenchidos com evidente fraude, aconselhada pelo Director-Geral.
Apresentei, o documento que os 25 funcionários contratados daquela Brigada enviaram ao Director do SFM pedindo a minha demissão da chefia da Brigada, salientando a imediata concordância deste Director, a título provisório, que o tempo se encarregaria de tornar definitivo, sem me ter sido concedida a possibilidade de me defender.
Ainda insatisfeito com estes ataques aos trabalhos a meu cargo, o Director resolveu ir muito mais longe.
Começou por me ameaçar ir até ás últimas consequências (seria a expulsão da Função Pública?) se não apresentasse determinados relatórios exigidos por uma Comissão, constituída com flagrante desrespeito pela hierarquia, violando ostensivamente o disposto em despacho de um membro do Governo.
Foram-me -me prometidas “sansões” (?!) legais, perante a minha recusa em obedecer a ordens emanadas de órgãos ilegais, ofensivas da minha dignidade profissional e desprestigiantes para o SFM.
Estas e outras ordens semelhantes estavam na base das opiniões negativas expressas por alguns Ministros a respeito do SFM.
Informei que, mais recentemente, se chegou ao cúmulo de me ser ordenada a entrega de toda a documentação respeitante à actividade da Secção de Caminha, a um Grupo de Trabalho composto por Geólogos, que já tinham dado evidentes provas da sua incapacidade em matéria de prospecção, quando tentaram encontrar jazigos de scheelite nas regiões de Mogadouro e Vila Nova de Foz Côa, sob a supervisão do Director-Geral.
Exibi, então, os documentos que as duas Secções a meu cargo Caminha e Talhadas) enviaram a todos os departamentos do SFM exprimindo, por unanimidade, reprovação quanto à decisão de me ser retirada a chefia da Secção de Caminha, o que poderia significar que também a Secção de Talhadas viria a ser alvo de idêntica decisão.
Chamei a atenção para o facto de os trabalhadores dessas Secções me considerarem um Chefe exigente, mas que muito apreciavam essa minha atitude, pois contribuía para a sua valorização profissional.
Um desses documentos salientava que, ao perderem a minha chefia, além dum Chefe cuja competência técnica admiravam, perdiam um amigo...
No documento da Secção de Caminha, ficou bem expressa a sua recusa em aceitar outra chefia, enquanto eu não os informasse de dar cumprimento à ordem que me havia sido dada.
Salientei o facto de o Director do SFM não ter tomado relativamente a estes documentos subscritos pela totalidade dos funcionários das duas Secções, a mesma atitude que tomara para com o documento caluniador subscrito apenas por 25 funcionários dentre um conjunto de mais de 100 trabalhadores.
Tanto Alcides Pereira como Luís Lobo ouviam a minha exposição, mas não se manifestavam abertamente a sua concordância quanto à mais que evidente ilegalidade das ordens que me estavam a ser dadas, com ameaças de “sansões” se as não cumprisse.
Apenas notei, no Dr. Luís Lobo gestos com os olhos e com a cabeça, que interpretei como confirmativos dessa ilegalidade, mas não consegui a afirmação clara que tinha o direito de esperar. Não se quis comprometer! Atitude muito frequente, nestas situações!.
Quanto ao caso das ajudas de custo fraudulentas e dos acontecimentos subsequentes, Alcides Pereira quis ficar com a documentação que apresentei para ser objecto de estudo, embora essa documentação já existisse na Secretaria de Estado.
Nem o Director-Geral, nem o Director do SFM apresentaram qualquer argumento a contrariar a minha tese da ilegalidade da Comissão dita de Direcção do SFM.
Também ignoraram completamente as “sansões” legais com que me ameaçaram, nunca a elas se referindo.

Quando passei a enumerar os entraves que o Director-Geral, com a colaboração do Director do SFM estava a colocar aos estudos para um verdadeiro inventário dos nossos recursos minerais, logo se revelou a impreparação de Alcides Pereira em matérias mineiras.
Por exemplo, tendo eu citado a opinião negativista do Director-Geral acerca da importância dos jazigos filonianos, que o levara a criar permanentes dificuldades aos estudos que eu tinha em curso na Faixa Metalífera da Beira Litoral, Alcides observa que eu tenho uma opinião e o Director-Geral tem outra. Ele não sabe decidir quem tem razão.
Chamei-lhe, então, a atenção para o facto de ele estar presente como técnico do qual seria de esperar que soubesse pronunciar-se sobre temas da sua especialidade, tanto mais que se tratava de um caso que não lhe deveria oferecer dúvidas.
Em todo o Mundo, se exploram filões, que muitas vezes encerram reservas superiores às de jazigos estratiformes, com os quais o Director-Geral agora passou a simpatizar mais, modificando até a opinião que anteriormente tinha expresso em documentos publicados.

A reunião prolongou-se por cerca de duas horas, muito tendo ficado por dizer.
Alcides Pereira sugeriu, então, que eu lhe deixasse, os documentos que comigo levava, alguns dos quais eram simples tópicos a desenvolver. Acedi, com a condição de me serem devolvidos, pois alguns deles eram documentos únicos.
Por me ter referido extensamente à acção deletéria dos 25 contratados da 1.ª Brigada de Prospecção, o Director-Geral ainda tentou uma acção pretensamente conciliadora, sugerindo um encontro com esses funcionários. Rejeitei a proposta, declarando que não me sentaria à mesa com traidores, antes de eles terem sido severamente punidos pelas calúnias e insultos que escreveram a meu respeito.

Passados dois meses para além da data da reunião, nenhuma acção correctiva tinha sido introduzida na Direcção-Geral de Minas.
Alcides Pereira passou, porém, a informar seus antigos colegas da Universidade que estavam integrados no SFM, talvez para que chegasse ao meu conhecimento, que a reunião tinha corrido mal para mim, sem explicar as razões.

Aconteceu que, em 10 de Outubro, eu fui convidado pelo Professor Aires de Barros, do Instituto Superior Técnico, para presidir a uma das sessões de um Seminário de Geoquímica que estava a decorrer em Lisboa.
Aproveitei a minha presença em Lisboa para me dirigir à Secretaria de Estado da Indústria e saber do andamento das questões que eu tinha exposto na reunião de Agosto e para solicitar a entrega dos documentos que lá tinha deixado, a título devolutivo.
Tendo visto passar Alcides num corredor do edifício, pedi à sua secretária que o informasse da minha presença e do meu desejo de lha falar, no convencimento de que me receberia, ou me indicaria dia e hora mais conveniente para me ouvir.
A secretária vem, porém, informar-me que Alcides Pereira não me poderia receber, por não ter marcado audiência. Pedi, então, para lhe comunicar que me apresentaria no dia seguinte, esperando que já tivesse ensejo de me receber.
Compareci, de facto, no dia seguinte, pelas 11 horas e grande foi a minha decepção quando a secretária veio comunicar-me que Alcides Pereira não me receberia, com o mesmo argumento de não ter marcado audiência.
Quanto aos documentos, cuja devolução ficara combinada, mandou dizer que já não estavam na sua posse; estavam na Secretaria-geral do Ministério, devendo eu solicitá-los ao Eng.º Albuquerque e Castro.
Tive que voltar à Secretaria de Estado, na parte da tarde, para tentar recuperá-los, mas não tive êxito nessa minha nova diligência. Também o Eng.º Albuquerque e Castro os não tinha!
Com este Engenheiro tive conversa de mais de duas horas sobre os temas que me tinham levado à Secretaria de Estado, depreendendo que ele estaria suficientemente informado acerca das questões que eu tinha exposto. Em sua opinião, tudo se resolveria com a reestruturação que se preparava.
Aproveitei a minha presença para deixar carta a Alcides Pereira pedindo para marcar audiência. Nunca obtive resposta.
Como iam longe os tempos em que havia nobreza de atitudes nos órgãos do Governo”! Da delicadeza do Eng.º Castro e Solla, passou-se à grosseria do novo Director-Geral e à arrogância de um simples Assessor de Ministro, investido nestas funções apenas por ser da confiança de membro do Governo e não por competência técnica.

Em 16 de Outubro, recebo a confirmação de que a Secretaria de Estado nada iria fazer para corrigir a situação caótica em que se encontrava a Direcção-Geral de Minas.
Alcides Pereira, agora já na qualidade de Chefe de Gabinete do Secretário de Estado, envia-me o ofício que, a seguir, transcrevo, com a indicação de ter sido remetida cópia para o Director-Geral de Minas:

“Na sequência da reunião efectuada neste Ministério em 10-8-77, para análise das exposições de V. Ex.ª encarrega-me o Senhor Secretário de Estado da Energia e Minas de comunicar que, dado prever-se para muito breve a reestruturação da D.G.M.S.G., e uma vez que está salvaguardada a escala hierárquica, não se mostra vantajoso, de momento revogar o despacho que homologou as Comissões de Direcção e Técnica de Planeamento.

Mais informo que os documentos entregues relativos a ajudas de custo foram remetidos à Secretaria Geral deste Ministério para apreciação.
Como os melhores cumprimentos
O Chefe de Gabinete
(a) Alcides Pereira”

Mais uma vez se usou o estafado argumento da reestruturação, sempre declarada eminente, nas que não acontecia, para nada fazer e permitir que as irregularidades continuassem em total impunidade.
Curiosa a afirmação sobre a salvaguarda da hierarquia, quando eu havia demonstrado à saciedade que tal se não verificava!
Quanto ao caso das fraudes em ajudas de custo e ao documento abjecto da 1.ª Brigada de Prospecção, era inadmissível que nenhum procedimento disciplinar tivesse sido desencadeado, mas foi o que realmente aconteceu!
Era agora o Governo que assumia declaradamente a sua cumplicidade com a corrupção instalada na Direcção-Geral de Minas.
Ainda cheguei a ponderar agitar estes candentes temas, na Assembleia da República, mas não encontrei deputado que me desse garantia de entender a verdadeira dimensão destes problemas.

Tivesse ou não havido acordo com o Director-Geral, o facto é que Alcides Pereira soube tirar partido das revelações que fiz sobre as fragilidades da Direcção-Geral de Minas.
Aproveitou bem a sua proximidade de membros do Governo, conseguida não por mérito em matéria de Geologia, mas provavelmente por considerações de ordem política.
De facto, o que passei a conhecer do seu currículo não era famoso. Constava que tivera um papel considerado positivo para o País na redacção de cláusulas contratuais com empresas petrolíferas que se mostraram interessadas em prospecção e exploração de petróleos, na então província ultramarina de Angola. Não se lhe conhecia actividade que tivesse desempenhado no âmbito da Geologia. Mais um técnico de papel selado.
Alcides Pereira ter-se-á apresentado perante o Ministro como pessoa capaz de pôr ordem na desorganizada Direcção-Geral de Minas e deste modo, viria a conseguir o cargo de Sub-Director-Geral, estável, em vez do cargo temporário que exercia, na dependência do Ministro que estivesse no poder.
Analisarei, na devida oportunidade a sua acção na Direcção-Geral de Minas, dada a interferência extremamente negativa que teve na minha actividade de prospecção mineira.
Ao dar a conhecer a Alcides Pereira as fragilidades da Direcção-Geral de Minas, eu estava, mais uma vez (Ver parte final do post N.º 91), sem disso me aperceber, a dar a um audacioso oportunista, armas com que, mais tarde, poderia atacar-me.
Alcides Pereira conseguiu chegar a Director-Geral (!!) e, nestas funções, usou de poder discricionário, dando continuidade à obra de destruição do SFM, em que tanto se empenhara o seu antecessor no cargo.
Tornou-se, assim, o grande responsável por mais um período negro na história da Direcção-Geral de Minas, como irei oportunamente descrever.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

111 – A diminuta eficácia das minhas exposições ao Governo para travar a degradação do SFM

Conforme já referi, em posts anteriores, muitas foram as minhas exposições para evitar a destruição do Serviço de Fomento Mineiro, drigidas a membros dos Governos que se foram sucedendo, após a Revolução de 25 de Abril de 1974.

Tentei até a desvinculação do Serviço de Fomento Mineiro da Direcção-Geral de Minas, ao sugerir que lhe fosse reconhecida a importância que, na realidade, tinha para a economia do País, atribuindo-lhe a correspondente posição na hierarquia das instituições do Estado.

A promoção a Instituto Nacional de Investigação dos Recursos Minerais, com autonomia administrativa e financeira, ao nível do Laboratório Nacional de Engenharia Civil, seria a atitude lógica.

Muito raras foram as respostas às minhas exposições.

Destaco a que recebi da Presidente do Conselho de Ministros, Engenheira Maria de Lourdes Pintasilgo, que se mostrou muito interessada em tomar mais directo conhecimento das matérias por mim expostas e a de um Ministro do Planeamento, que pretendia ouvir-me pessoalmente. Nenhum chegou, no entanto, a concretizar os seus propósitos, porque os Governos, em que participavam, foram de curta duração.

Apesar do insucesso destas minhas diligências, reesolvi fazer nova tentativa, no verão de 1977, porque a minha situação estava a tornar-se insustentável.
Em 19-6-77, enderecei ao Secretário de Estado das Minas e da Energia, ofício de 9 páginas dactilografadas a um espaço, acompanhado de 10 documentos anexos, do qual, a seguir, transcrevo algumas passagens:

“Recebi, em 2 do corrente, um “Comunicado de serviço” da Direcção-Geral de Minas e Serviços Geológicos, assinado pelo Director-Geral de Minas e Metalurgia (documento anexo N.º 1), por meio do qual sou ameaçado de “sansões,” (?!) legais se não cumprir, no prazo improrrogável de 30 dias, uma ordem de apresentação de determinados relatórios, que me foi transmitida por ofício de 21-10-76, de uma Comissão dita de Direcção do Serviço de Fomento Mineiro.
Neste documento, sou acusado de gerar perturbação no clima do Serviço com atitudes que tenho assumido, classificadas de rebeldes.
Invoca o Senhor Director-Geral o dever de obediência às ordens dos superiores hierárquicos, preceituado no Estatuto Disciplinar dos Funcionários Públicos, como fundamento legal para a exigência de cumprimento da ordem que me foi dada.
Acontece que a chamada Comissão de Direcção do Serviço de Fomento Mineiro, na sua constituição, no seu regulamento e no seu exercício é um exemplo notório de despudorada violação da hierarquia.”
...
“Se o Serviço de Fomento Mineiro evidenciava já um deficiente funcionamento, quando o seu comando estava confiado a um Director, porque este não possuía o mínimo de qualificações necessárias para o desempenho das funções inerentes ao seu cargo, a verdade é que, quando passou a ser gerido pelos próprios trabalhadores, se registou uma galopante degradação na maioria dos seus departamentos. “
...
“De tal facto se apercebeu Sua Excelência o Senhor Ministro da Indústria e Tecnologia, pois não teve qualquer relutância em se referir ao Fomento Mineiro, perante delegados sindicais que recebeu em 15-4-77, como exemplo de Organismo que, tendo já sido muito importante, presentemente pouco vale.”

“Creio, porém, que a situação é de tal modo escandalosa que impõe urgentemente o inquérito já requerido por Comissão oficialmente designada para detectar as situações anormais de funcionamento de Organismos públicos, antes que alguém se lembre de agitar o assunto na imprensa ou na Assembleia da República.
Na realidade, quando o Governo é frequentemente acusado de inoperância e Sua Excelência o Senhor Presidente da República insistentemente proclama a necessidade de produzirmos mais e melhor e, lapidarmente afirma:
“A esta responsabilidade histórica não podem furtar-se particularmente os quadros e dirigentes das empresas públicas e privadas e da administração estatal.”

“Nesta perspectiva, a competência, o mérito, a criatividade, a descoberta, o risco, são valores a premiar, do mesmo modo que se deve pôr termo à camuflagem da incapacidade, com artifícios partidários e ideológicos ou com proteccionismos injustos e retrógrados”

não deixa de ser surpreendente que, num sector tão importante para o País, como é o dos recursos minerais, não tenham sido tomadas, após 25 de Abril de 1974, quaisquer medidas no sentido de o dinamizar (antes pelo contrário), apesar de o Ministério ter na sua posse elementos que já lhe permitiriam ter agido

“Quantas riquezas estão por aproveitar que poderiam criar novos empregos, canalizar divisas para o País, diminuir a nossa dependência do estrangeiro, apenas pela incapacidade camuflada dos principais dirigentes actuais da Direcção-Geral de Minas !!
A competência, o mérito e a honestidade, nesta Direcção-Geral, não são valores a premiar! São, pelo contrário, motivo para permanente perseguição!”

“Apesar das autênticas sabotagens a que são submetidas as actividades a meu cargo, tenho conseguido com a ajuda de pessoal de nível elementar, mas dotado de entusiasmo e dedicação e de grande capacidade de aprendizagem, resultados de muito interesse, conforme tenho assinalado nos relatórios periódicos que apresento.
Estou, como repetidas vezes tenho declarado inteiramente à disposição para prestar contas dessas actividades, mas com respeito pela hierarquia.

Para terminar, pergunto concretamente a V. Ex.º se, após esta exposição, considera legal a Comissão dita de Direcção do Serviço de Fomento Mineiro e se, consequentemente, são legítimas as ordens que tal Comissão me transmitiu.

Pergunto, também se neste Ministério não se encontra outra recompensa para quase 34 anos de dedicação à causa mineira, com importante participação nos maiores êxitos dos serviços oficiais na matéria (ainda há poucos dias, por indicação da sede do BRGM em França, um Geólogo do Sindicato constituído pela Sociedade Mineira de Santiago, pela Companhia Penarroya e pelo BRGM me telefonou a dar notícia da descoberta de um jazigo de pirite em Almodôvar, felicitando-me pela minha contribuição para este sucesso) senão ameaça de “sansões” legais?”


Também a este ofício não foi dada resposta.

Soube, então, de fonte segura, que o Director-Geral era informado de todas as minhas exposições, através de um elemento feminino da Secretaria de Estado, a quem costumava presentear com belas amostras de minerais que preparava nos seus passatempos.
Soube também que Ministros e Secretários de Estado lhe enviavam essas exposições para sobre elas se pronunciar.
Todavia, o Director-Geral ou dava explicações que convenciam membros do Governo pouco versados em assuntos da indústria mineira ou aguardava a substituição desses membros do Governo, sabendo que isso acontecia com muita frequência.
Constou até que ele já tinha constituído uma pasta com a designação ”Dossiê Rocha Gomes” e que costumava apelidar-me de “maluquinho dos papéis”.

Perante esta situação, só me restava procurar um contacto pessoal com o Secretário de Estado das Minas e da Energia.

Foi o que decidi fazer.

No próximo post relatarei esta minha nova diligência, para evitar a destruição do SFM que se perspectivava, com grande evidência.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

110 – A Comissão Instaladora de um Instituto Geológico e Mineiro

Na parte final do post N.º 101, referi-me à nomeação, pelo Ministro da tutela, de uma Comissão Instaladora de um Instituto Geológico e Mineiro.

Foi mais uma Comissão criada para pôr ordem em Organismo do Estado que devia promover o desenvolvimento da indústria mineira nacional e não estava a cumprir satisfatoriamente essa missão.

Tal como acontecera com anteriores iniciativas, tornou-se facilmente previsível o insucesso desta Comissão, quando foram conhecidos os seus elementos constitutivos.

Em fins de Dezembro de 1976, foi com alguma surpresa que recebi, na sede do SFM, em S. Mamede de Infesta, convocatória para estar presente em reunião plenária, que tinha por objectivo fazer a apresentação da referida Comissão Instaladora.

Na mesa da Assembleia, tiveram assento: Diogo Pinto, Engenheiro designado pelo Ministro como Presidente da Comissão; Múrias de Queiroz, Director do SFM; Rolando Moreira, Engenheiro de Minas que pertencera ao Quadro do SFM e dele se desvinculara, para se dedicar ao ensino e à actividade privada; Magalhães Ramalho, Geólogo dos Serviços Geológicos; um Técnico da Junta de Energia Nuclear e um Professor da Universidade de Braga

Diogo Pinto espraia-se em generalidades sobre o Instituto, sem esclarecer como se havia chegado à composição da Comissão, sem concretizar devidamente os objectivos do Instituto e sem definir quais os funcionários que nele seriam integrados.

Perante estas indefinições, logo que me foi concedida a palavra, perguntei qual o critério que presidiu à nomeação dos elementos constitutivos da Comissão. A resposta que obtive logo denunciou a incúria havida na escolha desses elementos. Diogo Pinto respondeu que o critério usado foi apenas o de “boas vontades”!
Contive-me e não reagi dizendo o que logicamente viria à mente de qualquer pessoa: “De boas vontades está o inferno cheio”. Reservei a minha reacção para documento que enviaria a Diogo Pinto, o qual adiante transcreverei.
É que da Comissão Instaladora também fazia parte Delfim de Carvalho, cuja hostilidade ao Instituto já assinalei e cujo papel na desorganização que estava a acontecer no SFM se tornara demasiado evidente.

Diversos trabalhadores, demonstraram preocupação quanto à selecção dos que iriam integrar o novo Organismo, mas também não obtiveram resposta satisfatória. Tudo estava ainda muito vago!

Falando-se de competências exigidas para a real eficácia deste novo Organismo, eu fiz a observação de que, certamente, se procuraria dotar o Instituto de pessoas altamente competentes e a contratação não se faria, portanto, com base em considerações de ordem política ou outras que nada tivessem a ver com competência profissional.
Diogo Pinto responde afirmativamente mas retira a palavra “altamente”.

Em nova intervenção perguntei se no âmbito do futuro Instituto se incluiriam explorações mineiras e se, por exemplo, a participação do Estado nas Minas de Aljustrel se processaria através desse Instituto. Diogo Pinto respondeu que o Instituto iria até onde se mostrasse conveniente...

Procurei ainda saber qual a política a seguir relativamente a investimentos estrangeiros em Portugal, na indústria mineira. Também não obtive resposta capaz; tudo iria depender da política do Governo, que mostrou desconhecer.

Diogo Pinto, antes da reunião em S. Mamede de Infesta, tinha visitado as instalações desta sede do SFM, acompanhado do Director e de alguns técnicos que por este foram designados.
Eu, que não tinha sido convidado a participar na Comissão, apesar de ter sido minha a primeira proposta de criação do Instituto (que tivera, então, total rejeição), nem sequer fui informado antecipadamente desta visita.
Nela, foi até ignorada a existência do Serviço de Prospecção que eu chefiava, razão pela qual fui impedido de dar a conhecer a actividade realizada e em curso no principal departamento do SFM.

Perante a situação gerada e tendo tomado conhecimento de que Diogo Pinto iria efectuar visita ao outro núcleo importante do SFM, que era a sede da 1.ª Brigada de Prospecção, em Beja, resolvi enviar-lhe, em 28 de Dezembro de 1976, ofício que, a seguir, transcrevo:

“As palavras de V. Ex.ª na reunião do passado dia 22, na sede do Serviço de Fomento Mineiro, se apaziguaram o espírito de algumas pessoas, trouxeram a várias outras as mais sérias preocupações. Conto-me entre estas últimas.

Na realidade, admitiu V. Ex.ª, como entidade independente, nem sequer vinculada ao Ministério da Indústria, que a Comissão Instaladora do Instituto poderia, eventualmente, no termo dos seus trabalhos, chegar à conclusão de que o modo mais eficaz de atacar os problemas com que se debate a indústria mineira nacional seria “não mexer” nas estruturas existentes, isto é, “deixar tudo na mesma”.

Sou um funcionário com 33 anos de serviço, dedicados à causa do “Fomento Mineiro” e recuso-me a aceitar tal hipótese, ainda que remota.

A situação actual é de tal modo degradada, que seria absurdo mantê-la, por muito mais tempo. Isso corresponderia a destruir totalmente as já tão abaladas esperanças dos que estão realmente interessados em participar na construção de um País novo.

Porque assim penso, tenho chamado a atenção dos poderes constituídos para este sector vital da economia do País, quer enviando exposições a Ministros da Economia, da Indústria e do Planeamento de diversos Governos pós-25 de Abril, quer a Organismos criados com o objectivo de corrigir deficiências de funcionamento do aparelho de Estado e injustiças, herdadas ou não do regime anterior.

Com base nestas e noutras exposições que recebeu, a Comissão de Saneamento e Reclassificação de Funcionários do Ministério da Indústria e Tecnologia considerou necessária a instauração de um inquérito à Direcção–Geral de Minas e Serviços Geológicos. Oficiou, nesse sentido a Sua Ex.ª o Senhor Ministro.

Tal inquérito não foi, porém, até hoje efectuado e vai já decorrido perto de um ano que foi pedido. Não se sente que o Governo esteja interessado em sanear um departamento do Estado que se caracteriza pela desorganização e pela falta de eficiência.

Em contrapartida, assiste-se à nomeação, para essa Comissão Instaladora, de um elemento do Serviço de Fomento Mineiro, que é um dos principais responsáveis pela introdução de indisciplina e de germens de desagregação num dos poucos sectores da Direcção-Geral de Minas dotado de uma certa eficácia, onde se conseguira criar o embrião de uma organização capaz de enfrentar os reais problemas de fomento da indústria mineira nacional.

Vai V. Ex.ª, dentro de dias, visitar a 1.ª Brigada de Prospecção do Serviço de Fomento Mineiro.

Completam-se em 24 de Janeiro, dois anos, desde que, a título provisório, fui destituído da chefia dessa Brigada, com fundamento em abjecta exposição subscrita por 25 elementos nela integrados, entre os quais se contava o Geólogo Delfim de Carvalho.

Tal exposição surpreendeu toda a gente que conhecia a Brigada, dentro e fora do Serviço, porquanto eram bem conhecidas as relações de cordialidade que sempre mantive com esses elementos – nalguns casos, durante mais de 30 anos – e as referências elogiosas que eles frequentemente faziam a meu respeito.

A razão principal, senão única, para esse procedimento é também do domínio geral: a minha inflexível recusa em visar boletins itinerários fraudulentos.

O Senhor Ministro da Indústria ou os seus órgãos de apoio dispõem de dados suficientes para apreciação deste e doutros casos que mencionei nas minhas exposições, se estas não tiverem ficado retidas na Secretaria-geral do Ministério…

Não pôde, pois, deixar de me surpreender a escolha de indivíduo implicado em procedimento demonstrativo de baixo carácter, para funções de tamanha responsabilidade.

O Geólogo Delfim de Carvalho que, segundo suponho, chamou agora a si a chefia da 1.ª Brigada de Prospecção, irá provavelmente mostrar a V. Ex.ª como está constituída esta equipa de trabalho, a sua obra passada e a actuação presente.

Julgo, porém, oportuno levar ao conhecimento de V. Ex.ª que tal Brigada foi, por mim, metodicamente organizada, no decurso de cerca de 30 anos, vencendo obstáculos de toda a espécie e que a participação do Geólogo Delfim de Carvalho é de data recente e bastante modesta, sobretudo se a confrontarmos com as excepcionais possibilidades de aperfeiçoamento profissional que lhe têm sido proporcionadas.

Declarou V. Ex.ª que a nomeação dos elementos da Comissão Instaladora obedeceu mais a um critério de “boas vontades” do que de competências.

Como posso eu acreditar na “boa vontade” de indivíduo cujo comportamento tem sido tão suspeito, para dar vida a um Organismo novo, sem os vícios de que enfermam os actualmente existentes, criados com idênticos objectivos?

Sabe V. Ex.ª que, na mesma data em que o Geólogo Delfim de Carvalho me acusava de não participar efectivamente na reestruturação da Direcção-Geral de Minas, quando ele e outros técnicos da 1.ª Brigada de Prospecção se associavam aos Serviços Geológicos para apresentarem um projecto de reestruturação que, com insignificantes alterações, coincidia com o proposto pelo Director-Geral de Minas, eu era o primeiro funcionário da Direcção-geral de Minas a sugerir a criação de um Instituto Geológico e Mineiro? (V. documento anexo N.º 1)

Sabe V. Ex.ª que esta ideia não encontrou então qualquer receptividade e que, cerca de ano e meio depois, o mesmo Geólogo Delfim de Carvalho, em reunião plenária efectuada em S. Mamede de Infesta (V. documento anexo N.º 2), teve o arrojo de me censurar por ter defendido a criação de um Instituto Geológico e Mineiro, num Seminário em Geoquímica realizado em Aveiro, em Janeiro do corrente ano e, numa das suas curiosas intervenções, até declarou que ”nas empresas particulares, afirmações tais como as feitas em Aveiro constituíam motivo para rescisão de contrato”?

Como é possível ignorar estes e outros factos que julgo ocioso descrever, mas que são também do domínio geral e que bem caracterizam a personalidade do Geólogo Delfim de Carvalho?

Das palavras de V. Ex.ª, muitas das pessoas presentes à reunião de 22 do corrente deduziram que, no Instituto, seriam integrados todos os funcionários que, actualmente se dispersam pelo Serviço de Fomento Mineiro, pelos Serviços Geológicos, pelo departamento de Metalurgia e Prospecção da Junta de Energia Nuclear e, provavelmente pela empresa nacionalizada Sociedade Mineira de Santiago.

Embora V. Ex.ª não tenha corrigido tal interpretação, quando um dos trabalhadores presentes exprimia o seu agrado por saber garantidos no Instituto os actuais postos de trabalho do Serviço de Fomento Mineiro, eu suponho que não será exactamente essa a intenção de V. Ex.ª nem do Governo.

Seria, de facto, decepcionante que viesse a fazer-se a integração total.

É que o estado de degradação do Serviço de Fomento Mineiro é consequência lógica da falta de qualidade de muitos dos seus elementos para o desempenho das múltiplas funções exigidas por Organismo tão importante à economia do País.

Esta falta de qualidade é sobretudo notória ao nível de dirigentes.

Integrar no Instituto elementos responsáveis pela degradação do Serviço de Fomento Mineiro, alguns dos quais, segundo consta, até terão declarado, em resposta a recente questionário distribuído pelo GORT, que desejariam permanecer na Direcção-Geral de Minas, parece-me muito perigoso. Será introduzir, à nascença, no Instituto, os germens da sua futura ineficácia, quiçá da sua própria destruição.

Em minha opinião, o inquérito solicitado pela Comissão de Saneamento e Reclassificação de Funcionários do Ministério da Indústria e Tecnologia permitiria obter muitos dados essenciais à escolha dos elementos com qualificações para integração no Instituto.

Com os melhores cumprimentos,
Albertino Adélio Rocha Gomes
Engenheiro de Minas de 1.ª Classe, Chefe do 1.º Serviço de Fomento Mineiro

Este ofício foi acompanhado de 8 documentos comprovativos das afirmações que nele fiz.

Apesar de ter ficado muito desfavoravelmente impressionado na reunião de 22 de Dezembro, o mínimo que eu poderia esperar era que, após os meus esclarecimentos, o Presidente da Comissão Instaladora do Instituto excluísse, de imediato, Delfim de Carvalho da Comissão.

Sendo Diogo Pinto pessoa com qualificações tais, que levaram o Ministro a escolhê-lo para cargo tão relevante para o futuro da indústria mineira nacional, poderia até esperar que ele pressionasse o Governo no sentido de mandar efectuar a sindicância, há longo tempo reclamada, à Direcção-Geral de Minas, para pôr termo às irregularidades que nela continuavam a ser cometidas, em total impunidade.

Mas nada disso aconteceu! Eu não recebi resposta e Delfim de Carvalho foi mantido na Comissão.

Através do Eng.º Rolando Moreira, membro da Comissão, com quem sempre mantive relação cordial, eu ia tomando conhecimento das reuniões em Lisboa e dos fracos progressos conseguidos.

Não foram divulgadas as respectivas actas, tendo eu ficado com sérias dúvidas de que tivessem sido elaboradas.

Em Abril de 1977, foi um delegado sindical que trouxe a notícia de que o Instituto não se concretizaria.
Tinha sido em reunião com representantes do Sindicato da Função Pública, que o Ministro fizera tal revelação, tendo então acrescentado que o Serviço de Fomento Mineiro se encontrava decrépito.

De facto, não mais se ouviu falar da Comissão Instaladora.

E quanto à situação de decrepitude que o Ministro reconheceu existir no SFM, causou-me grande perplexidade o conformismo deste membro do Governo, apesar de ter na sua posse elementos mais que suficientes para poder agir adequadamente, como era seu dever.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

109 – Humildes trabalhadores dão lições de dignidade profissional

Também o pessoal da Secção de Caminha não levou a sério as Ordens de Serviço N.ºs 12/77 e 13/77, a que me referi no post anterior.

Tenho a grande satisfação de aqui registar a atitude do Colector Senhor José Catarino, que me representava na chefia da Secção, quando, em 14-7-77, lhe dei conhecimento, pelo habitual telefonema, à hora do jantar, após o seu regresso dos trabalhos no campo, de terem sido emitidas aquelas estranhas Ordens de Serviço.
Não lhe dando a mínima importância, passara rapidamente ao que importava: é que ele estava radiante, pois nos seus itinerários geológicos, tinha encontrado mais afloramentos de skarn, isto é, da rocha hospedeira da mineralização de tungsténio e tinha pressa em me dar conhecimento desta descoberta.

No dia seguinte, desloquei-me à Secção, na minha viatura particular, por me não ter sido disponibilizada meio de transporte do SFM, apesar de haver funcionários a utilizarem diariamente, no trajecto de casa para o SFM, automóveis do Estado. Isso acontecia, por exemplo, com o Engenheiro Técnico que participava na Comissão dita de Direcção do SFM.
Informei, então, o Senhor Catarino da minha intenção de não dar cumprimento àquelas Ordens, não tendo, portanto entregue ao Geólogo Farinha Ramos qualquer documentação respeitante à Secção.
O Senhor Catarino, de imediato, declarou que só aceitaria nova chefia, quando eu lhe comunicasse que a transferência tinha sido feita.
Mas não ficou por aqui a atitude da Secção.
Por unanimidade, os seus 7 elementos, decidiram em reunião expressamente realizada para analisar a situação gerada por estas Ordens, enviar a todas as Comissões, documento exprimindo o seu repúdio pelas decisões tomadas que consideraram injustas e prejudiciais para o SFM.
Declararam ter plena consciência da utilidade dos estudos em que participavam e da correcta orientação que lhes era dada, a qual estava bem patente nas explorações que Geominas realizava nas Minas de Fervença, Cerdeirinha e Valdarcas, a maior parte das quais se apoiava nos resultados da actividade da Secção.
Terminava este documento – de que não encontro cópia no meu arquivo pessoal, mas que deve constar dos arquivos do SFM, se ainda não tiver sido destruído – exprimindo desalento, se as Ordens viessem a ser concretizadas, pela perda, não apenas de um Chefe, mas de um amigo!

Também o pessoal da Secção de Talhadas, ao tomar conhecimento destas Ordens de Serviço, tomou a iniciativa de reunir para analisar as possíveis consequências para os seus trabalhos, das atitudes destrutivas dos designados novos órgãos directivos do SFM.
Dessa reunião resultou a Acta, que, a seguir transcrevo:

“Aos vinte e sete dias do mês de Julho de mil novecentos e setenta e sete, reuniram na Secção de Talhadas os trabalhadores do Serviço de Fomento Mineiro a fim de apreciarem e se pronunciarem sobre a Ordem de serviço N.º 13/77 da Comissão de Direcção, na qual determina que a Secção de Caminha é colocada na dependência do Grupo de Trabalho do Tungsténio e por essa razão deixa de ficar debaixo da chefia do Senhor Eng.º Rocha Gomes.
A esta reunião e por pedido expresso dos trabalhadores, assistiu o Chefe da Secção, Silvestre Moreira Vilar, e dela fez parte, muito embora pertença ao núcleo da Amieira mas que para o caso deveria figurar na decisão dos trabalhadores.
Dado o significado desta determinação acharam os trabalhadores por bem tomar a devida posição sobre o que insere aquela ordem de serviço, muito embora o assunto não diga verdadeiramente respeito à Secção de Talhadas. No entanto, dada a apreensão e preocupação que lhes causou esta decisão para a qual não encontram qualquer justificação, pensam que, num futuro, até muito próximo poderão ser atingidos, como os seus camaradas de Caminha, nos seus legítimos interesses.
Acham bastante estranho que a Secção de Caminha tenha deixado de ser chefiada e orientada pelo Senhor Eng.º Rocha Gomes, que desde o seu início sempre esteve na sua dependência e, mais estranho lhes parece que tal decisão somente visa a eliminação dos já poucos núcleos de trabalho dependentes do Senhor Eng.º Rocha Gomes, técnico que entendemos muito qualificado. Além disso, no momento presente, entendemos não ser prudente a sua substituição para orientar e chefiar os trabalhos de prospecção que se vêm realizando na Secção de Caminha e na Secção de Talhadas.
Entendem que esta decisão ou outras semelhantes criam um clima de insegurança aos trabalhadores que dependem deste técnico e, nós trabalhadores, apenas temos como divisa continuar o trabalho que vimos realizando com o mesmo entusiasmo e libertos de preocupações que nos possam prejudicar.
Não temos qualquer razão de queixa perante o Senhor Eng.º Rocha Gomes quer no que diz respeito a relações humanas, quer no que se refere a técnico qualificado. Sempre tem procurado incentivar os trabalhadores a produzirem um trabalho honesto e produtivo.
Poderemos dizer que o Senhor Eng.º Rocha Gomes é de facto bastante exigente, mas encaramos essa atitude muito própria de quem procura proteger os seus subordinados através duma valorização profissional que nos impõe.
Os trabalhadores não esquecem que há aproximadamente 5 anos houve a tentativa de acabarem com os trabalhos da Secção de Talhadas e com a própria Secção, mas tal não se deu precisamente porque o Senhor Eng.º Rocha Gomes tomou a necessária defesa e contrariou o que se havia já determinado.
Os trabalhadores de Talhadas, defendendo os seus interesses dentro da maior justiça, repudiam a decisão expressa naquela ordem de serviço, na intenção de que sejam evitadas decisões como esta que só contribuem para afectar a situação dos trabalhadores mais desfavorecidos. Queremos trabalhar da mesma forma como temos vindo a fazer.
Decidiu-se ainda levar este documento ao conhecimento de todos os trabalhadores do Serviço.”

Seguem-se as assinaturas:
Augusto Ramos Patrício
José de Bastos Veiga
Artur Duarte Arede
Pedro de Bastos Veiga
António dos Santos Correia
José da Silva Simões
António Augusto da Corga Nunes
Fernando Manuel Portela Duarte
Silvestre Moreira Vilar

Acerca destas duas exposições, a Acta N.º 25 da Comissão dita de Direcção do SFM, regista, no seu inicio:

“Aos dias 10 de Agosto de 1977, reuniu-se, em Lisboa, a C.D., estando presentes o Eng.º Queirós, Drs. Delfim de Carvalho, Balacó Moreira e Luísa Romão e o Eng.º Técnico Arouca Teixeira.

“ SITUAÇÃO DA SECÇÃO DE CAMINHA
Foram apreciadas duas exposições em que os trabalhadores das Secções de Caminha e de Talhadas manifestam a sua discordância quanto ao determinado nas O.S. 12/77 e 13/77, na parte em que coloca a Secção de Caminha na dependência do G.T. do Tungsténio.
As Ordens de Serviço têm no entanto a sua justificação e oportunamente será esclarecido o assunto em reunião com os trabalhadores.”

A observação que naturalmente ocorre é o contraste entre a rapidez com que o Director aceitou as acusações de 25 elementos da 1.ª Brigada de Prospecção, dentre um total de mais de 100 trabalhadores, (precisamente aqueles que tinham sido afectados pela sua Ordem de Serviço que os prejudicava em ajudas de custo) para me demitir da chefia daquela Brigada e a recusa em aceitar agora o posição em minha defesa assumida, com grande dignidade, pela totalidade dos elementos das duas Secções a meu cargo.
De facto, era de esperar que isto acontecesse, uma vez que os traidores da 1.ª Brigada de Prospecção não tinham sido punidos pelos seus criminosos actos e, pelo contrário, estavam disseminados, como metástases, em todas as Comissões.

Que lições de lealdade, dignidade profissional e consciência cívica deram humildes trabalhadores a indivíduos com cursos superiores e médios, que usavam os cargos em que estavam investidos, não para zelarem pelos interesses do País, para o que eram retribuídos com dinheiros dos nossos impostos, mas para se preocuparem exclusivamente com os seus interesse pessoais, criando constantes obstáculos às actividades produtivas!!!

Em próximos posts, revelarei as persistentes acções intimidatórias exercidas sobre o pessoal da Secção da Caminha, para o levar a aceitar a nova chefia e a nobreza deste pessoal que se manteve firme na sua atitude de fidelidade à minha chefia, enquanto eu não declarasse ter feito a transferência da Secção para o Grupo de Trabalho do Tungsténio.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

108 – A ofensiva contra os trabalhos a meu cargo. Continuação 4

É regra usada por quem joga xadrez, que a melhor defesa dos ataques do adversário consiste em atacá-lo também.
Duvido que a capacidade de concentração do Director do SFM lhe permitisse atingir algum nível neste jogo.
No entanto, ele e o Director-Geral, para se defenderem das acusações constantes de exposições aos sucessivos Governos após a Revolução de Abril de 1974 - correspondendo aos vigorosos apelos desses Governos - aplicaram tal regra, atacando os funcionários que se haviam atrevido a denunciar as suas escandalosas irregularidades, que muito estavam a prejudicar a economia nacional.
Para tal, usaram discricionariamente dos poderes que lhes haviam sido conferidos, no regime político anterior.
Tentaram evitar, a todo o custo, a sindicância requerida, não só por mim, mas também por vários outros funcionários da DGMSG, quando deviam ser eles os primeiros a desejar a sua realização, se estivessem de consciência tranquila, pois “quem não deve, não teme”.
Não seguiram o meu exemplo, ao não me intimidar com as sucessivas ameaças de procedimento disciplinar, cujo efeito foi afinal desacreditar, ainda mais, dirigentes já muito desprestigiados.
Toda a sua energia foi concentrada em esforços para a manutenção dos seus cargos, esquecendo completamente as obrigações que esses elevados cargos lhes impunham de zelar pela boa utilização dos nossos recursos minerais.
Eu constituía, para eles, o principal alvo a abater, até porque não fizera segredo das minhas exposições.
Pouco importava que o meu currículo fosse garantia de uma correcta orientação dos estudos.
De facto, os mais notáveis êxitos do Serviço de Fomento Mineiro, nos 30 anos que então já contava, tinham sido conseguidos através de trabalhos por mim projectados, com a minha activa participação, criando as estruturas adequadas e vencendo obstáculos artificialmente criados por dirigentes incompetentes
Após a Revolução, estes obstáculos tomaram características de declarada ofensiva, que, começou com a minha destituição da chefia da 1.ª Brigada de Prospecção, nas circunstâncias que já descrevi amplamente, as quais envolveram a conivência do pessoal contratado desta Brigada em graves irregularidades puníveis pela lei.
Foi a minha indisponibilidade para pactuar com tais irregularidades que deu origem ao meu afastamento da chefia da Brigada.
As consequências não se fizeram esperar, conforme irei revelar.
Quando, em 16-3-1976, se realizou reunião de uma Comissão ilegal, dita de Direcção do SFM, quiseram aproveitar o facto de eu me ter encarregado de elaborar a respectiva acta, com a finalidade de os ensinar como se faz uma acta, para me instaurarem processo disciplinar.
Todavia, a entidade jurídica do SFM não encontrou matéria que tal justificasse.
Mas a vasta equipa composta de mais de 20 elementos das várias Comissões, capitaneada pelo Director-Geral, com a subserviente participação do Director do SFM, não desanimou e resolveu atacar-me no ponto mais sensível da minha carreira profissional.
Esses ignorantes em prospecção mineira, em vez de procurarem a minha ajuda para os ensinar nesta matéria, como já tinham feito outros Engenheiros e Geólogos, para poderem aventurar-se em estudos em outras zonas, que deles estavam carecidos, resolveram pôr em causa a qualidade dos trabalhos que eu estava dirigindo nas duas Secções ainda a meu cargo (Caminha e Talhadas).
Sem o mínimo conhecimento da minha actividade nas áreas dessas Secções, pois não tinham consultado a imensa documentação por mim apresentada, ou na minha posse, resolveram exigir-me novos relatórios.
O Director do SFM e seus acólitos já tinham mantido atitude obstrucionista ao protelarem, por mais de um ano, sem justificação, a entrega de um equipamento de prospecção electromagnética que eu sabia estar em armazém em Beja, sem utilização. Este equipamento tornara-se necessário para responder a uma solicitação do 4.º Serviço, para detectar a existência de concentrações cauliníferas, na região de Vila da Feira.
Quando, finalmente, me foi entregue, vinha num estado tão miserável que se tornou impossível a sua aplicação. E o responsável por este desmazelo fazia parte de um dos novos órgãos directivos!
Por outro lado, eu continuava a aguardar que me fosse cedido, por um curto período, um dos dois gravímetros que, por minha iniciativa e após uma luta de 10 anos, tinham sido adquiridos (Ver post N.º 14), a fim de fazer um ensaio na região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima, que considerava essencial para confirmar a estrutura geológica que outros métodos ali aplicados estavam a sugerir.
Deste conhecimento, poderia resultar um considerável aumento das potencialidades da região para jazigos de minérios tungstíferos.
Nunca o gravímetro me foi cedido.
Com a resolução destes problemas jamais o Director se preocupou.
Mas achou agora pertinente exigir relatórios de estudos que se entreteve a dificultar.
Como já referi no post anterior, recusei-me a cumprir esta ordem, que além de emitida por órgão ilegalmente constituído, não tinha justificação e era atentatória da minha dignidade profissional.
O Director-Geral, dando sequência a proposta da Comissão dita de Direcção do SFM, com apoio da Comissão Técnica de Planeamento e da maior parte dos elementos da Comissão Coordenadora das Comissões de Trabalhadores do SFM ameaçou-me com “sansões” (sic) legais, caso não desse cumprimento à Ordem que recebi.
Mantive-me inabalável na minha atitude de recusa e nada aconteceu.
Mas, como revelei no post anterior, essa vasta equipa destruidora não desarmou.
Confiante na sua impunidade, perante a inércia do Governo relativamente aos sinais de alarme contidos nas muitas exposições que eu lhe tinha enviado, resolveu intensificar o seu ataque.
Num dos próximos posts, revelarei o conteúdo de algumas dessas exposições.
Em 12 de Julho de 1977, o Director do SFM, que continuava a assinar como Presidente da Comissão de Direcção, emitiu as Ordens de Serviço, que, a seguir transcrevo textualmente:

“ORDEM DE SERVIÇO N.º 12/77

1 – A C.D. na sua reunião de 4/77, apreciou o “Relatório Sobre os Projectos de Trabalhos do SFM para 1977 e seguintes” da C.T.P., que aprovou.

2 – De acordo com o que é proposto no referido relatório nomeiam-se para coordenadores dos Grupos de Trabalho executores os técnicos a seguir indicados:

I – Carta de Recursos Minerais
Dr. António Ribeiro dos S.G.P. (esta nomeação fica dependente da concordância dos S.G.P.)
Para facilitar a ligação com o S.F.M. nomeia-se coordenador adjunto o Dr. Vítor Oliveira.

II – Caracterização dos granitos de Portugal
Dr. José Manuel Santos Oliveira

III – Estanho
Dr. Delfim de Carvalho

IV – Cobre-Chumbo e Zinco
Eng.º Vítor Alvoeiro de Almeida

V – Tungsténio
Dr. João Manuel Farinha Ramos
s
VI – Ouro
Eng.º Orlando Martins Cardoso

VII – Mármores
Eng.º Octávio Rabaçal Martins

VIII – Argilas Especiais
Dr. José Manuel da Conceição Grade

IX - Calcários e Dolomitos
Dr. José Carlos Balacó Moreira

3 – Os coordenadores devem proceder imediatamente ás diligências necessárias, tendo em vista propor as medidas a tomar para que os respectivos G.T. venham a funcionar, em pleno, no mais curto espaço de tempo.

4 – Dado que o G.T. do Tungsténio está já em actividade e que a Secção de Caminha persegue objectivos que se enquadram no campo de actuação daquele grupo de trabalho, resolveu a C.D. que a referida Secção de Caminha fique, para todos os efeitos, dependente do G.T. do Tungsténio, deixando, por consequência, de estar subordinada ao 1.º Serviço a partir da data desta ordem de serviço.

SERVIÇO DE FOMENTO MINEIRO em S. Mamede de Infesta, 12 de Julho de 1977

O PRESIDENTE DA COMISSÃO DE DIRECÇÃO
(a) Norberto Afonso Múrias de Queiroz”

“ORDEM DE SERVIÇO N.º 13/77

1 – Pela O.S. N.º 12/77, foi a Secção de Caminha colocada sob a dependência do G.T. do Tungsténio, deixando de pertencer ao 1.º Serviço.
Em consequência desta resolução deve o Senhor Eng.º Rocha Gomes, de quem dependia a Secção, entregar de imediato, ao referido G.T. rodos os elementos quer técnicos, quer administrativos que tenha em seu poder e digam respeito à Secção.

2 – O Senhor Eng.º Rocha Gomes prestará ao G.T. todos os esclarecimentos que lhe sejam pedidos e deverá ainda elaborar, no prazo de dois meses, um relatório pormenorizado dando conta dos trabalhos efectuados e dos resultados já obtidos.

Todo o material existente na Secção de Caminha e que seja necessário à continuação dos trabalhos em curso ficará sob a responsabilidade do G.T. do Tungsténio devendo proceder-se imediatamente à elaboração dos necessários documentos de transferência.

SERVIÇO DE FOMENTO MINEIRO, em S. Mamede de Infesta, 12 de Julho de 1977

O PRESIDENTE DA COMISSÃO DE DIRECÇÃO
(a) Norberto Afonso Múrias de Queiroz”

Estas ordens não eram, obviamente, para serem tomadas a sério.
Se eu não cumprira ordem do Director-Geral, datada de 1 de Junho de 1977, para entregar, no prazo improrrogável de 30 dias, relatórios respeitantes à actividade nas áreas em estudo, nas duas Secções a meu cargo, apesar das suas ameaças de “sansões” legais, não seria expectável que cumprisse agora ordem originária de nível hierárquico inferior, dando novo prazo, mais dilatado, para apresentação de relatório respeitante à actividade de uma só Secção.
O modo descuidado e atabalhoado como estão estruturadas ambas as Ordens de Serviço é já revelador da qualidade científica dos numerosos elementos constitutivos dos novos órgãos designados de directivos do SFM.
Por um lado, pela Ordem N.º 12/77, a Secção de Caminha, a partir de 12-7-77, deixava de estar subordinada ao 1.º Serviço, ficando, para todos os efeitos, dependente do G.T. do Tungsténio, e pela Ordem N.º 13/77, eu deveria começar, por entregar, de imediato, ao referido G.T. todos os elementos, quer técnicos, quer administrativos que tivesse em meu poder respeitantes à Secção.
Mas, por outro lado, depois de ter entregue todos estes elementos, deveria elaborar, no prazo de dois meses, um relatório pormenorizado dos trabalhos efectuados e dos seus resultados.
Por último, já depois de a Secção de Caminha ter sido desligada do 1.º Serviço, é que deveria proceder-se à transferência do material existente para o G.T. do Tungsténio, elaborando-se, então o respectivo documento de transferência.
Nos próximos posts, relatarei os acontecimentos gerados por estas Ordens.