terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

109 – Humildes trabalhadores dão lições de dignidade profissional

Também o pessoal da Secção de Caminha não levou a sério as Ordens de Serviço N.ºs 12/77 e 13/77, a que me referi no post anterior.

Tenho a grande satisfação de aqui registar a atitude do Colector Senhor José Catarino, que me representava na chefia da Secção, quando, em 14-7-77, lhe dei conhecimento, pelo habitual telefonema, à hora do jantar, após o seu regresso dos trabalhos no campo, de terem sido emitidas aquelas estranhas Ordens de Serviço.
Não lhe dando a mínima importância, passara rapidamente ao que importava: é que ele estava radiante, pois nos seus itinerários geológicos, tinha encontrado mais afloramentos de skarn, isto é, da rocha hospedeira da mineralização de tungsténio e tinha pressa em me dar conhecimento desta descoberta.

No dia seguinte, desloquei-me à Secção, na minha viatura particular, por me não ter sido disponibilizada meio de transporte do SFM, apesar de haver funcionários a utilizarem diariamente, no trajecto de casa para o SFM, automóveis do Estado. Isso acontecia, por exemplo, com o Engenheiro Técnico que participava na Comissão dita de Direcção do SFM.
Informei, então, o Senhor Catarino da minha intenção de não dar cumprimento àquelas Ordens, não tendo, portanto entregue ao Geólogo Farinha Ramos qualquer documentação respeitante à Secção.
O Senhor Catarino, de imediato, declarou que só aceitaria nova chefia, quando eu lhe comunicasse que a transferência tinha sido feita.
Mas não ficou por aqui a atitude da Secção.
Por unanimidade, os seus 7 elementos, decidiram em reunião expressamente realizada para analisar a situação gerada por estas Ordens, enviar a todas as Comissões, documento exprimindo o seu repúdio pelas decisões tomadas que consideraram injustas e prejudiciais para o SFM.
Declararam ter plena consciência da utilidade dos estudos em que participavam e da correcta orientação que lhes era dada, a qual estava bem patente nas explorações que Geominas realizava nas Minas de Fervença, Cerdeirinha e Valdarcas, a maior parte das quais se apoiava nos resultados da actividade da Secção.
Terminava este documento – de que não encontro cópia no meu arquivo pessoal, mas que deve constar dos arquivos do SFM, se ainda não tiver sido destruído – exprimindo desalento, se as Ordens viessem a ser concretizadas, pela perda, não apenas de um Chefe, mas de um amigo!

Também o pessoal da Secção de Talhadas, ao tomar conhecimento destas Ordens de Serviço, tomou a iniciativa de reunir para analisar as possíveis consequências para os seus trabalhos, das atitudes destrutivas dos designados novos órgãos directivos do SFM.
Dessa reunião resultou a Acta, que, a seguir transcrevo:

“Aos vinte e sete dias do mês de Julho de mil novecentos e setenta e sete, reuniram na Secção de Talhadas os trabalhadores do Serviço de Fomento Mineiro a fim de apreciarem e se pronunciarem sobre a Ordem de serviço N.º 13/77 da Comissão de Direcção, na qual determina que a Secção de Caminha é colocada na dependência do Grupo de Trabalho do Tungsténio e por essa razão deixa de ficar debaixo da chefia do Senhor Eng.º Rocha Gomes.
A esta reunião e por pedido expresso dos trabalhadores, assistiu o Chefe da Secção, Silvestre Moreira Vilar, e dela fez parte, muito embora pertença ao núcleo da Amieira mas que para o caso deveria figurar na decisão dos trabalhadores.
Dado o significado desta determinação acharam os trabalhadores por bem tomar a devida posição sobre o que insere aquela ordem de serviço, muito embora o assunto não diga verdadeiramente respeito à Secção de Talhadas. No entanto, dada a apreensão e preocupação que lhes causou esta decisão para a qual não encontram qualquer justificação, pensam que, num futuro, até muito próximo poderão ser atingidos, como os seus camaradas de Caminha, nos seus legítimos interesses.
Acham bastante estranho que a Secção de Caminha tenha deixado de ser chefiada e orientada pelo Senhor Eng.º Rocha Gomes, que desde o seu início sempre esteve na sua dependência e, mais estranho lhes parece que tal decisão somente visa a eliminação dos já poucos núcleos de trabalho dependentes do Senhor Eng.º Rocha Gomes, técnico que entendemos muito qualificado. Além disso, no momento presente, entendemos não ser prudente a sua substituição para orientar e chefiar os trabalhos de prospecção que se vêm realizando na Secção de Caminha e na Secção de Talhadas.
Entendem que esta decisão ou outras semelhantes criam um clima de insegurança aos trabalhadores que dependem deste técnico e, nós trabalhadores, apenas temos como divisa continuar o trabalho que vimos realizando com o mesmo entusiasmo e libertos de preocupações que nos possam prejudicar.
Não temos qualquer razão de queixa perante o Senhor Eng.º Rocha Gomes quer no que diz respeito a relações humanas, quer no que se refere a técnico qualificado. Sempre tem procurado incentivar os trabalhadores a produzirem um trabalho honesto e produtivo.
Poderemos dizer que o Senhor Eng.º Rocha Gomes é de facto bastante exigente, mas encaramos essa atitude muito própria de quem procura proteger os seus subordinados através duma valorização profissional que nos impõe.
Os trabalhadores não esquecem que há aproximadamente 5 anos houve a tentativa de acabarem com os trabalhos da Secção de Talhadas e com a própria Secção, mas tal não se deu precisamente porque o Senhor Eng.º Rocha Gomes tomou a necessária defesa e contrariou o que se havia já determinado.
Os trabalhadores de Talhadas, defendendo os seus interesses dentro da maior justiça, repudiam a decisão expressa naquela ordem de serviço, na intenção de que sejam evitadas decisões como esta que só contribuem para afectar a situação dos trabalhadores mais desfavorecidos. Queremos trabalhar da mesma forma como temos vindo a fazer.
Decidiu-se ainda levar este documento ao conhecimento de todos os trabalhadores do Serviço.”

Seguem-se as assinaturas:
Augusto Ramos Patrício
José de Bastos Veiga
Artur Duarte Arede
Pedro de Bastos Veiga
António dos Santos Correia
José da Silva Simões
António Augusto da Corga Nunes
Fernando Manuel Portela Duarte
Silvestre Moreira Vilar

Acerca destas duas exposições, a Acta N.º 25 da Comissão dita de Direcção do SFM, regista, no seu inicio:

“Aos dias 10 de Agosto de 1977, reuniu-se, em Lisboa, a C.D., estando presentes o Eng.º Queirós, Drs. Delfim de Carvalho, Balacó Moreira e Luísa Romão e o Eng.º Técnico Arouca Teixeira.

“ SITUAÇÃO DA SECÇÃO DE CAMINHA
Foram apreciadas duas exposições em que os trabalhadores das Secções de Caminha e de Talhadas manifestam a sua discordância quanto ao determinado nas O.S. 12/77 e 13/77, na parte em que coloca a Secção de Caminha na dependência do G.T. do Tungsténio.
As Ordens de Serviço têm no entanto a sua justificação e oportunamente será esclarecido o assunto em reunião com os trabalhadores.”

A observação que naturalmente ocorre é o contraste entre a rapidez com que o Director aceitou as acusações de 25 elementos da 1.ª Brigada de Prospecção, dentre um total de mais de 100 trabalhadores, (precisamente aqueles que tinham sido afectados pela sua Ordem de Serviço que os prejudicava em ajudas de custo) para me demitir da chefia daquela Brigada e a recusa em aceitar agora o posição em minha defesa assumida, com grande dignidade, pela totalidade dos elementos das duas Secções a meu cargo.
De facto, era de esperar que isto acontecesse, uma vez que os traidores da 1.ª Brigada de Prospecção não tinham sido punidos pelos seus criminosos actos e, pelo contrário, estavam disseminados, como metástases, em todas as Comissões.

Que lições de lealdade, dignidade profissional e consciência cívica deram humildes trabalhadores a indivíduos com cursos superiores e médios, que usavam os cargos em que estavam investidos, não para zelarem pelos interesses do País, para o que eram retribuídos com dinheiros dos nossos impostos, mas para se preocuparem exclusivamente com os seus interesse pessoais, criando constantes obstáculos às actividades produtivas!!!

Em próximos posts, revelarei as persistentes acções intimidatórias exercidas sobre o pessoal da Secção da Caminha, para o levar a aceitar a nova chefia e a nobreza deste pessoal que se manteve firme na sua atitude de fidelidade à minha chefia, enquanto eu não declarasse ter feito a transferência da Secção para o Grupo de Trabalho do Tungsténio.

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