segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

211 – Reflexões sobre os recursos minerais de Portugal. Continuação 2



Nos dois posts anteriores, demonstrei que as alusões à nossa pobreza em recursos naturais, em recente programa da TV, estavam longe de traduzir à realidade.

De facto, pelo menos, quanto a matérias-primas minerais, além de não sermos pobres; podemos até considerar-nos excepcionalmente ricos!!

Relativamente a outros recursos naturais, não estou habilitado a fazer diagnóstico, com fundamentos de igual mérito.

Mas não me surpreenderia, se alguém bem informado chegasse a conclusões pouco diferentes das que apresentei sobre os recursos minerais.

A este respeito, ocorrem-me exemplos de riquezas, algumas das quais se tornaram bem patentes, durante as minhas actividades mineiras.

Passo a citar:

1 - A água
A água é recurso indispensável, à actividade humana, frequentemente subavaliado.
No entanto, todos sabemos que a sua posse até tem sido o motivo de guerras entre povos.
Portugal, dependendo muito de águas de rios que nascem em Espanha, está sujeito às consequências do uso, que no país vizinho delas possa ser feito, dos contaminantes que nelas possam ser introduzidos (fertilizantes agrícolas, pesticidas, esgotos e resíduos industriais sem prévio tratamento, etc…)
Além das águas de superfície, que podem ser retidas em albufeiras, por pequenas barragens, fáceis de construir, não são despiciendas as nossas reservas em águas subterrâneas.
Quando dirigi, no Sul do País, um departamento do SFM, que se ocupava essencialmente da execução de trabalhos mineiros clássicos (sanjas, poços, galerias), uma das principais dificuldades, que tive de enfrentar, foi originada pela água, que sistematicamente surgia, em relativa abundância, a partir de determinada profundidade.
Não foram raros os casos em que fui compelido a suspender trabalhos dessa natureza, por não dispor de meios para proceder ao seu esgoto.
Esta água, numa região como o Alentejo, normalmente considerada como carecida desse precioso líquido, era, sem dúvida, uma riqueza a aproveitar.
Citei já os jazigos ferro-manganíferos da Região de Cercal – Odemira, que são importantes reservatórios de águas.
Na Mina da Serra do Rosalgar, por exemplo, o caudal, em galeria com origem num poço de reconhecimento do jazigo, ultrapassou 40 m3/hora (Ver post N.º190)
Salientei, também, o caso das Minas da Serra da Preguiça, em Moura, onde o SFM teve que suspender a sua actividade, por não dispor de equipamentos para vencer os caudais encontrados e, onde posteriormente a Compagnie Royale Asturienne dês Mines (CRAM) teve que tomar idêntica atitude, apesar de ter usado meios muito mais poderosos. (Ver post N.º 4)
Esta Companhia chegou a apresentar proposta de colaboração à Junta de Colonização Interna, para aproveitamento de tamanha riqueza, que para ela constituía óbice à futura exploração das reservas evidenciadas.
Não obteve qualquer resposta, segundo me informou o Geólogo Michel Ansart da CRAM e a Companhia não teve alternativa senão abandonar a Região, onde havia realizado trabalhos de elevada qualidade.
Registo ainda, que, pela aplicação de método electromagnético Turam, em numerosas áreas do Alentejo, diversos alinhamentos de anomalias foram, obtidos, provavelmente originados por fracturas com o enchimento impregnado de água, tornada boa condutora por sais que nela se dissolviam.
Cito, por exemplo, o caso da Herdade da Gouveia de Baixo, na região de Montemor-o-Novo, em que água surgiu, perto da superfície, em sanjas abertas para investigação da causa de uma dessas anomalias.
Para este assunto, chamei a atenção, por cartas de Março de 2002, ao Presidente da Comissão Regional do Alentejo e ao Presidente do Instituto Geológico e Mineiro, quando ia ser realizado, em Évora um Congresso dedicado às águas subterrâneas. Não obtive qualquer resposta (Ver também post N.º 4).
Relativamente às águas de superfície, ouso emitir o parecer de que deveria ser dada preferência a pequenas albufeiras, ainda que em grande número, para não inundar e consequentemente inutilizar para a agricultura os terrenos mais férteis, das várzeas das ribeiras, como aconteceu, por exemplo, com o grande lago artificial, de Alqueva, para o qual, agora, parece querer dar-se um destino essencialmente turístico.

2 – A cortiça.
Portugal, se não vier a ser alvo de novos atentados ao seu património vegetal, como o sucedido no caso Portucale, em que mais de 1000 sobreiros foram abatidos, apesar de se tratar de árvore protegida, promovida à categoria de “símbolo nacional”, conseguirá manter-se como o maior produtor mundial de cortiça, matéria-prima muito valorizada com novas aplicações que para ela têm sido encontradas;

3 - Os afamados produtos viti-vinícolas, com realce para o vinho do Porto;

4– O bom azeite. Os olivais na Herdade dos Machados em Moura, impressionavam-me pela sua extensão, quando os observava, em viagens entre Beja, Moura e Barrancos, em cujas áreas dirigia trabalhos mineiros. A reconhecida qualidade do azeite dessa proveniência.

5 – Os produtos horto-frutícolas de excepcional qualidade, que beneficiavam do ameno clima português, os quais as famílias portuguesas consumiam, antes de os hipermercados serem abastecidos com produtos bem calibrados, de boa aparência, oriundos de outros países, mas de qualidade geralmente muito inferior;

6 – Os produtos pecuários, de raças autóctones, de que destaco o porco alentejano, criado ao ar livre, alimentando-se de bolota das azinheiras, se não destruírem totalmente estas árvores que tinham no Alentejo o seu ambiente natural.
O gado autóctone, bovino, ovino e caprino, de características muito apreciadas e o que dele podemos aproveitar.
O gado leiteiro e o leite, em que conseguimos ser excedentários. Os seus derivados, entre os quais os afamados queijos da Serra, de Serpa e vários outros.

7 - A nossa extensa área marítima sobre a qual mantemos jurisdição e onde abundarão espécies piscatórias.
Nunca percebi porque temos de consumir peixe congelado importado, quando temos, mais próximo, abundância de peixe fresco!

8 – O próprio clima ameno português e as extensas praias do território nacional podem enquadrar-se nos nossos recursos naturais.

Estou convicto de que estas e outras potencialidades, se forem bem aproveitadas, diminuirão de modo significativo, a dependência do estrangeiro, que actualmente se verifica.

Numa rápida análise, como a que Veiga Simão foi induzido a fazer (Ver post N.º 155), poderíamos concluir que, também para estes recursos, tem havido pobreza em iniciativas.
Creio, porém, não ser esse o caso.

Como tem sido regra, nos tempos recentes, mesquinhos interesses pessoais, semelhantes aos que mencionei a propósito dos recursos minerais, devem ter-se sobreposto ao interesse nacional, impedindo a concretização de iniciativas que certamente surgiram.

Continua…

1 comentário:

Unknown disse...

É com enorme satisfação que vejo mais este valiosíssimo contributo do Professor Engenheiro Rocha Gomes para a história mineira portuguesa. Infelizmente, o seu exemplo de Homem recto e competente tem sido ignorado pela maioria dos que têm governado este sector tão importante da economia portuguesa. Mas a esperança é a última a morrer...
Deixo-lhe aqui a minha sincera homenagem e gratidão, como seu ex-aluno, que tenho a honra de ser, e como Amigo.
Com um abraço do
Miguel Pessoa