domingo, 27 de dezembro de 2009

102 – O episódio da Acta da reunião de 18-3-1976 na sede do SFM

Conforme referi no post anterior, apenas dois funcionários se manifestaram acerca do conteúdo da Acta, por mim elaborada, da reunião de 18-3-1976.
O primeiro foi o Director do SFM, que apresentou documento datado de 29 de Abril de 1976, com o título:

“POSIÇÃO DA COMISSÃO DE DIRECÇÃO RELATIVAMENTE À DIVULGAÇÃO, PELO ENG,º ROCHA GOMES, DO TEXTO DA ACTA, POR SI ELABORADA, REFERENTE AO PLENÁRIO DOS TRABALHADORES DAS ZONAS NORTE E CENTRO DE 18-3-76”

Neste documento, o Director, que continuou a assinar na qualidade de Presidente da Comissão de Direcção, em vez de agradecer a minha colaboração, permite-se fazer grande censura ao texto que apresentei, declarando que ele “não traduz fielmente o que nela se passou, não dá o mesmo tratamento a todas as intervenções, tem apreciações subjectivas, distorce factos, etc”. Mas não concretiza nenhuma destas afirmações.

Após várias considerações demonstrativas da razão que eu tinha ao acreditar que a ampla e completa divulgação dos acontecimentos ocorridos durante as reuniões não agradaria ao Director, nem aos seus acólitos, o documento termina do seguinte modo:
“Da atitude do Eng.º Rocha Gomes, ao divulgar um texto, ainda não aprovado, em núcleos de trabalhadores não representados nem intervenientes na Assembleia, só se pode concluir a intenção de provocar a divisão desses trabalhadores, e ao mesmo tempo sabotar a actividade da Comissão de Direcção que, embora por eles eleita, diz não reconhecer.”

O outro funcionário foi o Geólogo Luís Francisco Viegas, que tinha ingressado no SFM em Setembro de 1971, e que deixara bem assinalada a sua curta presença, como um dos chamados Scheeliteiros, a cuja ignorância já me referi no post Nº 94.
Este Geólogo apresentou dois documentos.
O primeiro é um documento extenso dirigido às “Comissão de Trabalhadores (núcleo da Amieira), Comissão Coordenadora das Organizações de Trabalhadores e Comissão de Direcção do Serviço de Fomento Mineiro”, que não resisto a reproduzir, integralmente, pela inacreditável sequência que lhe foi dada, bem demonstrativa do ponto a que havia chegado a degradação do SFM. ”.
É o seguinte o seu teor:

“Ponho à vossa consideração, por serem órgãos criados por vontade expressa dos trabalhadores do SFM e por eles livremente eleitos (para mim é de somenos importância que sejam ou não reconhecidos por qualquer membro de qualquer governo) o que a seguir exponho:
Foi-me dado a conhecer um documento, acompanhado por uma nota assinada pelo Engenheiro de Minas Rocha Gomes e a que este chama “Acta”.
Tive grande dificuldade em ler tal documento por duas razões: primeiro por ser extenso e segundo porque em determinado passo começava a rir-me perante tamanha mediocridade tendo que desistir. Depois de diversas tentativas lá consegui chegar ao fim, embora o final fosse um dos nacos mais deliciosos. É que a coisa fazia-me lembrar um cheque sem cobertura.
Em princípio achei que não devia tomar posição, em face de diabruras irreverentes, mas esta decisão foi alterada ao considerar os seguintes aspectos:
1 – Alguns trabalhadores do SFM estão sujeitos a acções de intimidação;
2 – São os trabalhadores da Amieira, que entre todos os trabalhadores do SFM, têm mais problemas, mas só eles os devem resolver;
3 – Estão criados neste momento os órgãos capazes de resolver as questões mais momentosas, independentemente de considerar que quando esses órgãos não funcionam de acordo com os interesses dos trabalhadores em geral, se deve lutar para alterar a sua prática.
4 – As condições neste momento são diferentes das que eram há um ano (avizinha-se a formação de um instituto que era inesperado), as forças movimentam-se para assaltar os lugares de chefia e existe a possibilidade desses lugares serem ocupados por elementos com comportamento fascista na prática diária.
Pois sobre a “Acta”, além das críticas que farei, em parte, noutro texto, aproveito como fundo desta posição, a parte mais engraçada, na minha opinião e também muito importante, que está inserta na pág. 10 e que transcrevo: “esta proposta é sublinhada por palmas do Geólogo Viegas, que logo foi secundado no gesto por um grupo de trabalhadores, entre os quais se destacaram Manuel Neves, José Teixeira, Flávia Gomes e Abel Rua.”
É evidente o que se pretende insinuar e devo dizer que não me importaria de me oferecer para ser considerado o primeiro de um grupo de trabalhadores a bater as citadas palmas, pois já noutra ocasião me ofereci para perfilhar a proposta – embora não a tendo apresentado e até discordado dela – que levou o então Director do Serviço de Fomento Mineiro e Presidente da Comissão de Direcção, obrigando-me à contradição de ter votado contra uma proposta, que devido às circunstâncias acabei por subscrever.
Mas não estou mais disposto a isso.
Ao escrever-se que “se destacaram Manuel Neves, José Teixeira, José Ribeiro, Flávia Gomes e Abel Rua”pergunto: porque é que se destacaram? Porque bateram palmas sem mãos e sem rede ou só sem rede? Ou será que alguém é que destacou os citados senhores e com que intenção?
Foi esta tentativa de aterrorizar trabalhadores que me levou a assumir a posição que expresso.
Das pessoas que menos mal conheço são José Teixeira e Abel Rua. Há uma coisa que sei: são duas pessoas que suam a camisa no seu trabalho, que melhor tenho possibilidade de conhecer, o trabalho de campo.
Qual a razão porque são especialmente focados? Será por colaborarem intimamemte com o geólogo Santos Oliveira, o qual por ser o técnico que hoje nos Laboratórios do SFM talvez seja o que tem mais currículo e prestígio – dentro e fora do SFM – que por não se deixar provocar se torna incómodo?
Ao juntarem o meu nome aos outros suponho que existe uma intenção. Todavia para esclarecer os passos devo dizer que divido a sociedade em classes sociais antagónicas e aos trabalhadores não lhe pergunto a que partido pertencem. Quando estão iludidos por falsos interesses, considero dever ensinar aquilo que julgo mais correcto e não ameaçá-los agredindo-os psicologicamente.
Mas concretamente existe uma afirmação e essa é que tem de ser provada.
Quando rebentaram as citadas palmas suponho que o Sr. Eng.º Rocha Gomes estava sentado e de costas para mim; portanto nenhum dos seus olhos me poderia observar. Também considero que é pouco possível conhecer o som das minhas palmas.
Sempre fui de poucas palmas a não ser no futebol e julgo saber que o Sr. Eng.º Rocha Gomes não vai à bola comigo.
A verdade é que num aplauso de várias pessoas é impossível dizer quem inicia as palmas e há só uma pessoa que pode garantir que não fui eu que as iniciei: eu próprio. Parece-me, portanto, que esta absurda afirmação tem de partir de outro lado, que não do Eng.º Rocha Gomes, possivelmente de indivíduos de mentalidade pidesca e que “observam” para fazer o seu relatório.
A sua verdadeira afirmação, era apenas uma denúncia, o que já é grave; não o sendo, como não é, constitui uma calúnia e pode ser interessante assistir, no tribunal, às tentativas para provar que numa salva de palmas um determinado indivíduo é o primeiro a bater palmas.
Mas o que teria levado o Eng.º Rocha Gomes a escrever estas coisas?
Será que pensa que sou seu inimigo?
Se assim é duas coisas podem ter acontecido: ou se convenceu a si próprio ou o convenceram. No primeiro caso devo dizer que o considero apenas um adversário circunstancial, em plenário, que mal o conheço e o pouco conhecimento que tenho é por conversas que ouvi de pessoas do Serviço. É curioso que as poucas referências elogiosas partiram das pessoas de Beja.
Convém dizer que até tenho um pouco de convergência com o Eng.º Rocha Gomes. Ambos desejamos que se faça um inquérito à Direcção-Geral de Minas e Serviços Geológicos, embora, talvez, por razões diferentes. Por ventura serei mais pessimista não acreditando que no momento em que são readmitidos saneados e libertados os pides, tal medida conduz a resultados palpáveis.
No segundo caso tenho a dizer que não me deixo confundir e que seria miserável, a ser certo, que se instrumentalizasse uma pessoa já tão idosa e neste caso aconselharia o Sr. Eng.º Rocha Gomes a perguntar aos técnicos do Sul, se era eu a pessoa que telefonava para Beja, a dizer: “Aproveitem a ocasião para derrubar o gajo”, além de outras coisas. “O gajo”, claro está, referia-se ao Eng.º Rocha Gomes. Não sou responsável por o Sr. Eng.º Rocha Gomes, em dado momento se ter incompatibilizado com os geólogos Balacó Moreira e Vítor Pereira, Eng.º Técnico Vitorino e dezenas de outros funcionários.
Será que decidiu ser meu inimigo?
Neste caso, podia ficar orgulhoso, se ele realmente fosse importante; mas sinceramente, agora ainda fiquei mais convencido, do que já pensava, da sua insignificância.
No xadrez político, como agora parece ser voga dizer-se na Amieira, considero o Eng.º Rocha Gomes uma peça pouco importante.
Concluindo:
Porque à acção de intimidação se junta a acção de tipo pidesca referida e já anteriormente também constatada num relatório escrito da conversa de dois trabalhadores, tida num comboio, (um especialista da Polícia Judiciária pode identificar o autor pela letra). A falsificação de assinatura em documento, o caciquismo, etc., sendo certo que esconder isto é ser cúmplice.
Requeiro à C.T. do SFM (Amieira), C.C. das Organizações de Trabalhadores e C.D. do SFM um rigoroso inquérito para avaliar da veracidade da afirmação que justificou esta minha exposição e às acusações que atrás formulou (relatório pidesco, assinaturas falsificadas, etc.) e se tomem as medidas necessárias para acabar com este estado de coisas.
Que a minha actividade nas comissões a que pertenço sejam suspensas até à conclusão do inquérito.
Que seja dada divulgação idêntica ao documento do Sr. Eng.º Rocha Gomes solicitando que seja enviada uma relação de despesas várias, inclusivé os selos, para que as possa pagar.

Reservo-me, no entanto, o direito de:
- Considerar o Eng.º Rocha Gomes responsável por calúnia caso outra(s) pessoa(s) no prazo de sete dias não se confessar(em) responsável pela afirmação que deu lugar a esta exposição.
- Caso o inquérito não seja levado a bom termo, o que não acredito possa acontecer, requererei ao MAI e SEEM o mesmo tipo de inquérito.
Processar os responsáveis.
Coimbra, 24 de Maio de 1976
(a) Luís Francisco dos Santos Viegas”

O segundo documento, elaborado em estilo idêntico ao do primeiro, quase se limita a deduzir dados estatísticos sobre as diversas intervenções na reunião e sobre o espaço que lhes é dedicado na Acta.

No post seguinte, revelarei a sequência que teve o pedido de inquérito rigoroso formulado pelo Geólogo Luís Viegas.

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