No final da década de 50 do passado século, acompanhei o Engenheiro Mecânico Alfredo Nobre da Costa, em visita a minas de ferro e manganés na Região de Cercal – Odemira, que estavam em fase final de estudo, sob minha directa orientação.
Nobre da Costa exercia, então, a sua actividade profissional, na Siderurgia Nacional e pretendia conhecer as Minas que iriam fornecer minérios para a laboração do alto-forno.
Apreciei a atitude, e prestei-lhe a informação que iria constar do relatório que estava elaborando, acerca dos estudos realizados pelo SFM, nessa região mineira, durante 14 anos.
Quando foi nomeado Ministro de Indústria e Tecnologia, num dos Governos de Mário Soares, surpreendido com algumas das suas declarações pessimistas quanto à importância dos recursos minerais do País, e com referências depreciativas da actividade do SFM que fizera, perante delegados sindicais, enviei-lhe, em 23-4-1977, a carta cujo conteúdo a seguir transcrevo:
“Tomei ontem conhecimento, em sessão plenária convocada pelos delegados sindicais do núcleo de S. Mamede de Infesta do Serviço de Fomento Mineiro, de que V. Ex.ª, na reunião de 15 do corrente com os delegados sindicais dos departamentos do Ministério da Indústria e Tecnologia, citou o “Fomento Mineiro” como exemplo de Organismo que, tendo já sido muito importante, presentemente pouco vale.
Se, por um lado, me é grato saber que V. Ex.ª tem conhecimento do estado de degradação de Organismo tão essencial à economia do País, não posso, por outro lado, deixar de manifestar o meu desalento por verificar que, estando o Governo consciente dessa anómala situação, nada tenha feito, até agora, no sentido de a remediar.
O Governo, nomeadamente esse Ministério, tem na sua posse informação mais que suficiente para poder já ter agido com a energia que o caso requer.
Numerosas, extensas e muito concretas têm sido as exposições por mim enviadas a entidades com autoridade para intervenção na matéria, na esperança de que este sector abandonado da economia nacional passasse a merecer aos governantes deste País um pouco mais de atenção.
Destaco as que enderecei, em 1-2-75, 30-5-75, 24-9-75, 6-11-75 e 25-3-76, a primeira ao Senhor Ministro da Economia, as restantes ao Senhor Ministro da Indústria e Tecnologia. Se V. Ex.ª, nisso tiver interesse, decerto facilmente as localizará nos arquivos do Ministério.
Aos meus apelos não houve reacções positivas. Pelo contrário, assistiu-se a um reforço da autoridade dos responsáveis pela deterioração galopante do Serviço de Fomento Mineiro.
Como amostra da situação a que se chegou, bastará levar ao conhecimento de V. Ex.ª que, sob o disfarce de luta pela dinamização do Serviço de Fomento Mineiro, se criou, neste Organismo, uma Comissão de Direcção composta pelo Director e por delegados eleitos nos vários núcleos dispersos pelo País.
Qualquer trabalhador, independentemente do seu grau de preparação técnica ou científica, tempo ou qualidade de serviço prestado, poderia ser escolhido para tal Comissão. Excluíram-se, porém, os Chefes de Serviço, “por inerência dos seus cargos” !
Ate hoje, ninguém soube explicar-me o que se pretende significar com a expressão “por inerência dos seus cargos”. Mas os trabalhadores foram levados a votar esta deliberação, como têm sido conduzidos a sancionar muitas outras decisões sobre matérias que não entendem e que, em última análise, e a prazo, redundam em seu prejuízo.
Surpreendentemente, um dos antecessores de V. Ex.ª homologou uma Comissão de Direcção constituída em tais condições!
Devo esclarecer V. Ex.ª que, de acordo com Orgânica interna posta em vigor em 1963, embora a minha categoria real seja de Engenheiro de 1.ª Classe, desempenho, desde aquela data, funções de Chefe de Serviço.
A minha inelegibilidade para a Comissão de Direcção obedeceu ao propósito de remover um dos muito raros obstáculos que o Director do Serviço tem encontrado para travar os seus constantes desvarios.
Não obstante, eu não tenho estado inactivo na denúncia das irregularidades deste incompetente e imaturo dirigente. A minha acção, em tal sentido já deu origem a que a Comissão de Direcção do Serviço de Fomento Mineiro tivesse solicitado ao Senhor Director-Geral de Minas que me fosse instaurado processo disciplinar.
Passaram mais de dois meses sobre este pedido e o processo ainda não foi iniciado, com bastante mágoa minha.
É realmente confortante, após 32 anos de labor constante e dedicado à causa do Fomento Mineiro, e tendo a consciência de algo ter feito para o desenvolvimento da indústria mineira do País, receber como recompensa, um castigo!
A minha presença no Fomento Mineiro está bem assinalada nas pirites do Alentejo, no ferro e manganés de Cercal – Odemira, no zinco de Moura e Portel, no cobre de Aparis, no tungsténio de Caminha – Vila Nova de Cerveira.
V. Ex.ª talvez se recorde de mim, se fizer um pequeno esforço de memória. No final da década de 50, quando eu estava elaborando o relatório final dos estudos que dirigi na região de Cercal – Odemira, acompanhei V. Ex.ª em visita a algumas das minas de ferro e manganés dessa região.
Muito gosto teria em voltar a falar com V. Ex.ª. As palavras depreciativas que proferiu a respeito do Serviço em que estou integrado e no qual sempre tenho exercido as minhas funções, encorajam-me a pedir uma audiência.
Estou certo de que posso ajudar V. Ex.ª a fazer um diagnóstico correcto da situação e a encontrar soluções.
Prontifico-me a deslocar-me a Lisboa, para entrevista, em dia e hora que V. Ex.ª determine, para expor os meus pontos de vista sobre os problemas com que se debate o Fomento Mineiro e para apresentar algumas sugestões relativamente simples, que imediatamente poderão contribuir para o início da sua reabilitação.
Apresento a V. Ex.ª os meus melhores cumprimentos”
Indiferente a este meu apelo, o Ministro Nobre da Costa fez publicar o Decreto-lei n.º 548/77, anunciando nova estrutura do Ministério da Indústria e Tecnologia,
No próximo post, referirei as nefastas consequências deste Decreto, para a indústria mineira nacional
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