sábado, 4 de setembro de 2010

138 – A obstinação do 4.º Director do SFM em destruir o Organismo que lhe foi confiado

Em fins de 1979, eu ainda conseguia manter dois núcleos de actividade em prospecção mineira (Secções de Caminha e de Talhadas), apesar das várias investidas dos “assaltantes” dos novos cargos directivos, para deles se apropriarem e dos constantes obstáculos à minha actuação.

Conforme revelei no meu post n.º 61, a Secção de Talhadas estivera prestes a ser extinta, em Novembro de 1972, porque, na curiosa expressão do Director do SFM de então, “não estava a dar nada”!

Também o Director-Geral declarava, em reuniões da chamada Comissão de Fomento, não ter entusiasmo pela vasta área que eu denominara Faixa Metalífera da Beira Litoral, seguindo a designação do eminente Geólogo Carlos Ribeiro, na sua “Memória sobre o grande filão metalífero que passa ao nascente de Albergaria-a-Velha e Oliveira de Azeméis”, publicada em1861, na qual revela a grande importância desta Região mineira.

Porém, os resultados dos estudos sob minha orientação, os quais eu descrevia, em pormenor, em diversos relatórios e em exposições orais, não só desmentiam aquelas opiniões negativistas, como eram muito apreciados por entidades científicas externas à DGGM.

Por exemplo, o Professor Edmundo Fonseca, do Departamento de Geociências da Universidade de Aveiro, tendo tomado conhecimento das investigações em curso na Faixa Metalífera, convidou-me, em 2 de Junho de 1978, a participar em Seminário Internacional de Geoquímica que a Universidade ia realizar, de 27 a 30 desse mês de Junho.
Seriam também conferentes J. Barbier do BRGM francês, B. Bolviken de Universidade norueguesa, Clifford James e H. Roesler de outras Universidades estrangeiras, Lopes Nunes da Universidade de Braga e Santos Oliveira do SFM
Insistiu, então, que contava com a minha colaboração como do “pão para a boca”, já que pouco esperava da colaboração de Santos Oliveira.
Manifestei-lhe a minha disposição de apresentar sobretudo resultados obtidos na Faixa Metalífera, pela Secção de Talhadas, durante os últimos 10 anos, aplicando técnicas geoquímicas e geofísicas, com ênfase para o método geoquímico, com amostragem de sedimentos de linhas de água.
Salientei os resultados, nas seguintes áreas
Braçal - Cabeço do Telégrafo
Alto da Serra (antiga mina de Vale do Vau).
Bertufo
Boa Aldeia
Cabeço Santo
Sanguinheiro
Bostelim
Agrelo
Boi

Edmundo Fonseca imediatamente deu o seu acordo e logo incluiu o meu nome, como conferente, em prospecto que fez distribuir por entidades possivelmente interessadas, intitulando a comunicação que eu iria apresentar como “Casos concretos de prospecção integrada em Portugal”

Em 30-6-78, ocupei quase toda a manhã com a minha exposição, socorrendo-me de numerosos mapas, que previamente tinha afixado.
Apresentei, também, alguns resultados da actividade na Região de Vila Nova de Cerveira - Caminha – Ponte de Lima.

Senti necessidade de acentuar que as investigações na Faixa Metalífera da Beira Litoral não tinham grande apoio, a nível superior, com os argumentos de que filões não têm interesse e que todo o chumbo e zinco, de que o País necessita, se contem nas pirites alentejanas.

Chamei, por isso, especial atenção para um extenso alinhamento de anomalias geoquímicas de Pb, na área do Cabeço do Telégrafo, situada nas proximidades da antiga Mina do Braçal, para cuja investigação apresentara, em 1974, projecto de sondagens que aguardava ainda aprovação.

Relativamente à actividade na Região de Vila Nova de Cerveira - Ponte de Lima, mostrei os excepcionais resultados de sondagem efectuada na Costa das Vinhas, pela Empresa americana Union Carbide, exclusivamente com base em pronunciadas anomalias magnéticas e geoquímicas de tungsténio, anteriormente detectadas pelos trabalhos do SFM.
A sondagem de Union Carbide fora implantada em local próximo de furo, por mim projectado, com o n.º 69, o qual a Direcção do SFM decidiu não efectuar, para dar preferência à outros furos na Região de Mogadouro, com o fundamento de se tornar imperioso investigar o jazigo (?) de scheelite de Cravezes, a que Geólogos inexperientes davam muita importância, mas que, na realidade, não passava de ocorrência pouco significativa.

Escusado será dizer que Gouveia e a quase totalidade dos 22 (!!) novos Chefes primaram pela ausência neste seminário. Não lhes interessava saber o que realmente se passava nos poucos núcleos do SFM onde havia actividade útil e disciplinada e os ensinamentos que os professores estrangeiros poderiam trazer.
Só me lembro de ter visto o Chefe de Divisão Viegas, que chegou atrasado e o Director de Serviço, Santos Oliveira, que apresentou fraca comunicação sobre prospecção de scheelites.
Dentre as intervenções, após a minha apresentação, destaco as seguintes:
1 - Barbier, surpreendido por se não ter sondado a série de anomalias de Pb no Cabeço do Telégrafo. Expandira-se, depois, com Edmundo Fonseca, usando a expressão: “Aqui há substância!” para contrastar com o que ouvira, no dia anterior a Santos Oliveira.
2 – Viegas, elogiando (!) e aproveitando a oportunidade para perguntar se dados de trabalhos por mim dirigidos em Carviçais (Moncorvo), nos quais estava interessado, lhe poderiam ser cedidos. A minha resposta foi que tais dados pertenciam ao SFM e seriam facultados a quem tivesse o direito de os reclamar.
3 – Luís Gaspar, dos Serviços Geológicos, a manifestar estranheza com a fase incipiente de trabalhos, ainda em curso, apesar de a campanha ter sido iniciada há 10 anos e com o facto de se não ter decidido estudar a Mina do Braçal, após o seu abandono pela Empresa que detivera a concessão. Concordei com as suas objecções, repetindo a minha explicação inicial sobre a falta de apoio, a nível superior, porque o Director-Geral entendia que filões não têm interesse e que todo o Pb e Zn de que o País precisa se contem nas pirites do Alentejo. Salientei, no entanto, as contradições desse dirigente, a tal respeito, em publicações de sua autoria. Quanto à retoma da actividade nas Minas do Braçal, exprimi o parecer de que, para o actual SFM, tal retoma seria muito difícil, senão impossível, uma vez que já tinha sido extinto o sector de Trabalhos Mineiros.

Impressionado com o sucesso da prospecção geoquímica na redescoberta da antiga Mina de chumbo do Sanguinheiro, Edmundo Fonseca manifestou o desejo de fazer a sua tese de doutoramento com base nesta Mina.
A Mina do Sanguinheiro não constava da documentação que eu tinha consultado nos arquivos da Circunscrição Mineira do Norte. Apesar de se situar no distrito de Coimbra, os documentos a seu respeito estavam arquivados na Circunscrição Mineira do Sul. Os trabalhos, desta Mina, totalmente ocultos por densa vegetação, foram encontrados, através dos resultados das análises geoquímicas de Pb.

Tendo obtido a minha concordância, Edmundo Fonseca fez deslocar, à área desta Mina, o orientador da sua tese, Professor H. Martin, de Universidade belga, e o Professor da Universidade de Aveiro, Renato Araújo.
Passou, depois a prestar colaboração, nos trabalhos que ali decorriam.
Uma sonda da Universidade e pessoal que tinha adestrado foram utilizados para colheita de dados sobre a formação mineralizada.

Ao Professor Edmundo Fonseca, facultei também, acesso aos dados de estudos que eu tinha dirigido no Sul do País, na área de Algares de Portel, a fim de ele poder estabelecer o confronto de mineralizações de chumbo e zinco, em diferentes ambientes litológicos.

Jorge Gouveia, com total desprezo por este longo passado do SFM, na Faixa Metalífera da Beira Litoral e sem consideração pelo prejuízo que iria ocasionar à Universidade de Aveiro, na formação dos seus alunos e professores, passou a tomar decisões com vista a extinguir a Secção de Talhadas.

Começou por emitir ordens directas à Secção de Talhadas, para que cerca de 50% do seu pessoal fosse prestar serviço na Secção de Coimbra dirigida pelo Geólogo Viegas.
Esta deslocação de pessoal, apresentada com carácter temporário, foi-me, depois justificada, porque “o sector de Coimbra não tem estruturas à altura dos projectos que lhe estão cometidos, nem é oportuno desenvolvê-las, no momento presente (!!!!!)

Pelo Colector Silvestre Vilar fui informado de que Viegas, dispondo de uma aparelhagem de resistividade eléctrica Askania, de elevada qualidade, herdada dos extintos Serviços de Prospecção de Junta de Energia Nuclear, pretendia efectuara 49 sondagens eléctricas, para investigação de ocorrências de argila.
Soube que tais sondagens não chegaram a ser efectuadas, por terem avariado a aparelhagem, visto ninguém se ter preparado, para seu uso e muito menos para a interpretação dos resultados que viessem a obter.

Apesar deste revés, Jorge Gouveia acabou por dar cumprimento ao seu propósito inicial. Deu ordem para suspender a actividade na Faixa Metalífera da Beira Litoral, passando a utilizar todo o seu pessoal, em trabalhos de duvidosa qualidade e utilidade.

Foi do seguinte teor o ofício que me dirigiu em14-1-1980:

“ Não tendo sido incluído no Programa Min - de Inventário e Valorização dos Recursos Minerais de País” do PIDDAC para 1980, o sub-projecto, relativo à área de Talhadas deverão os respectivos trabalhos ser suspensos”

Continuando a usar os escassos recursos de que dispunha, registei, em relatórios, as arbitrariedades dos dirigentes, que estavam a reduzir a eficácia do SFM, conduzindo à sua previsível extinção.

A seguir, transcrevo algumas passagens do relatório, respeitante à actividade do 1.º Serviço durante o 1.º trimestre de 1980:

“Provavelmente o Director nem terá lido os nossos relatórios trimestrais, nos quais salientamos os excepcionais resultados de prospecção, ainda sem investigação por sondagens, os quais surpreenderam especialistas estrangeiros, que estiveram presentes, na Universidade de Aveiro, em palestra que ali proferimos essencialmente sobre prospecção mineira na Faixa Metalífera da Beira Litoral.
Provavelmente também, o Geólogo Viegas, por si promovido a Chefe de Divisão de Prospecção de Substâncias Metalíferas das Províncias Metalogénicas Setentrionais” terá modificado a opinião elogiosa que pública e espontaneamente exprimiu a respeito do trabalho que apresentamos em Aveiro….
Aliás, tal mudança de opinião não constituiria já caso inédito.
Alem disso, o Director do SFM jamais nos convidou a expor, de viva voz, a actividade em curso na Faixa Metalífera da Beira Litoral, nem tão pouco manifestou o menor interesse em apreciar os trabalhos no campo.
Concluímos que a exclusão da Faixa Metalífera de Beira Litoral, dos programas para 1980 não tem qualquer fundamento.
Consequentemente, a suspensão dos trabalhos nesta Faixa constitui grave erro, que consideramos intencional, apenas com o propósito de retirar ao signatário a possibilidade de concretizar os êxitos que, com persistente labor e entusiasmo, vai preparando.
É tempo de chamar à responsabilidade quem comete deliberadamente tão graves erros, com total desprezo pelos interesses do País.
O ofício do Director do SFM, suspendendo a actividade da Secção de Talhadas, remete-nos para o Programa “Min - Inventário e Valorização dos Recursos Minerais do País “ do PIDDAC para 1980.
….
Não fora a falta de tempo e o desejo de não alongar demasiado este documento, gostaríamos de fazer mais profunda incursão no Programa para 1980.
Trata-se, de facto, de um documento exótico, que quase nos provocaria hilaridade, não fora o que de trágico está nele subjacente.
Na verdade, justificar o atraso ou não cumprimento de programas com argumentos tais como:
“Uma parte do corpo de técnicos licenciados do SFM do SFM foi chamada, no âmbito da reestruturação da DGGM, a desempenhar funções no quadro dirigente. Este facto veio agravar, ainda mais a situação, que já era carente nesses técnicos. Assim só o recrutamento de pessoal, de acordo com o novo quadro orgânico, poderá repor a capacidade de resposta do sector Norte, para levar a cabo as tarefas aqui programadas”. É, pelo menos, um ultraje à inteligência de quem tiver que apreciar o aludido programa.
A nós, não restavam quaisquer dúvidas de que a reestruturação que paulatinamente se tem vindo a processar na Direcção-Geral de Minas só tem tido efeitos nefastos para o País.
Os interesses de alguns oportunistas têm sido satisfeitos, mas os Serviços têm-se degradado, como repetidamente temos denunciado.
No entanto, poderíamos esperar tudo, menos que os responsáveis por esta degradação viessem declará-lo, em documento de tamanha importância.
E não podemos deixar de manifestar a nossa surpresa por não termos notado reacções superiores a tão surpreendentes afirmações
Pelo que nos diz respeito, queremos deixar aqui registado que, desde 1944, sempre temos exercido, efectivamente, dentro do Serviço de Fomento Mineiro, funções de chefia, sem que, por tal facto, tivéssemos recebido qualquer remuneração adicional.
Nunca abdicamos, porém, das funções técnicas e, a atestá-lo, está a obra que podemos apresentar, de que não nos envergonhamos, da qual outros se têm aproveitado e continuam a aproveitar…
Não podemos, por isso, deixar sem reparo que os agora alcandorados a cargos de chefia, quase sempre sem base em competência profissional ou qualquer outra e, em muitos casos, sem efectivamente exercerem o cargo … argumentem agora
que não trabalham, porque já são chefes e os chefes só mandam…
……..

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