terça-feira, 31 de agosto de 2010

137 – O 4.º Director do SFM. Continuação 3

Em 27-7-1979, ao entrar no meu gabinete, nas instalações do SFM em S. Mamede de Infesta, encontrei, na minha secretária, um ofício de Jorge Gouveia, acompanhado de um requerimento de Union Carbide Geotécnica Portuguesa – Assistência Mineira L.da, com despachos do Director Geral de Minas e do Director do SFM, solicitando o meu parecer sobre a prorrogação de contrato daquela Companhia com o Estado Português.

Fiquei naturalmente surpreendido com tais despachos, exarados em total incoerência com sistemáticas atitudes que vinham sendo assumidas para comigo, no sentido de me expulsarem da direcção dos estudos na Região de Vila Nova de Cerveira - Caminha – Ponte de Lima.

A seguir, reproduzo o resumo da minha informação de 68 páginas dactilografadas a um espaço, com data de 28 de Agosto de 1979, que remeti para o Director do SFM:

“Na Região de Vila Nova de Cerveira - Caminha - Ponte de Lima, ocorrem minerais de tungsténio formando concentrações que, por vezes, atingem a superfície.

Tais concentrações deram origem a pequenas explorações mineiras por empresas concessionárias nacionais.

O Serviço de Fomento Mineiro, solicitado a intervir em auxílio de um destes concessionários, além de resolver o problema apresentado, permitindo a sobrevivência da Empresa, concluiu que as potencialidades da Região para jazigos minerais, sobretudo de tungsténio, eram tais que justificavam uma acção sistemática, no sentido de descobrir novas concentrações, aflorantes ou não, quer no interior de áreas concedidas, quer no seu exterior.

Esta acção sistemática, iniciada em 1968, prossegue ainda.

Em 1974, a Empresa americana “Union Carbide Exploration Corporation”, tendo tomado conhecimento dos resultados dos trabalhos do Serviço de Fomento Mineiro, na Região, considerou-os de suficiente interesse, para justificarem um contrato de prospecção, pesquisa e exploração mineiras, com um dos concessionários locais.

Tendo conseguido negociar este contrato, a Empresa americana imediatamente se lançou em campanhas de prospecção e pesquisa, no prosseguimento das iniciadas pelo Serviço de Fomento Mineiro, mas com mais intenso ritmo.

Estendeu, posteriormente, a sua acção à área de outro concessionário e a uma parcela da área cativa para o Estado, mediante contratos que, para o efeito, celebrou.

Dos trabalhos que Union Carbide realizou, desde 1974 até ao presente, sobressaem as sondagens.

A Empresa promoveu a execução de mais de 17 000 metros de furos, a adicionar a um pouco mais de 7 000 metros que o Serviço de Fomento Mineiro antes tinha efectuado.

Avaliamos os seus dispêndios na Região em cerca de 120 000 contos.

Em resultado dos seus trabalhos e dos anteriormente realizados pelo Serviço de Fomento Mineiro, a Empresa tem calculadas reservas que se aproximam bastante do valor mínimo que se propõe atingir, isto é, 1 milhão de toneladas de minério com cerca de 0,8% de WO3.

À cotação actual, admitindo perdas elevadas na sua preparação – da ordem dos 60% - uma tonelada deste minério teria o valor aproximado de 2 000$00.

As reservas já reveladas aproximar-se-iam, portanto, do valor de 2 milhões de contos.

No entanto, Union Carbide considera marginal o projecto em que está envolvida e pretende prosseguir estudos, com vista a torná-lo economicamente viável, quer através do aumento de reservas, quer através de melhor recuperação.

Os seus contratos com os concessionários foram já renegociados; o contrato com o Estado caducou em 20-7-79.

Union Carbide, ao abrigo de uma das cláusulas deste último contrato, requereu a prorrogação da validade para nova área de actuação, que representa cerca de 50% da área inicial.

Sobre este requerimento incidiu despacho do Director-Geral de Geologia e Minas, determinando que o Serviço de Fomento Mineiro se pronuncie sobre o mérito dos trabalhos de Union Carbide, em relação ao contrato.

O Director do Serviço de Fomento Mineiro endossou para nós o cumprimento deste despacho.

Todavia, a nós, que desde 1965 dirigimos os trabalhos do Serviço de Fomento Mineiro na Região, neles participando activamente, não foi fornecida cópia do contrato com o Estado, contrato para cuja redacção também não fora pedida a nossa intervenção.

Além disso, tudo se tem feito para nos afastar da Região, dificultando-nos a apreciação que agora nos é pedido.

Bastará referir que, em Julho de 1977, foi emitida uma Ordem de Serviço demitindo-nos da chefia da Secção de Caminha e ordenando a entrega de toda a documentação respeitante aos estudos que, na Região, temos dirigido, a um grupo de geólogos que se designou por “Grupo de Trabalho do Tungsténio”.

Recusamo-nos a cumprir tal Ordem, por a considerarmos ilegal e prejudicial ao País e, nessa atitude, fomos acompanhados por todos os funcionários da Secção.

Continuamos, pois, a dirigir os estudos, embora com as dificuldades originadas por autênticas sabotagens cometidas pelo Director do Serviço e vários seus colaboradores, “democraticamente” escolhidos, em assembleias de trabalhadores “convenientemente esclarecidos”.


Mantivemo-nos, também, nas suas linhas gerais, ao corrente da actividade de Union Carbide, na Região, tendo estabelecido com esta Companhia uma colaboração de que têm resultado benefícios mútuos.

Na falta do contrato e de relatórios de Union Carbide (só os dois mais recentes nos foram entregues ou passaram a ser enviados), procuramos obter esta documentação, quer na Circunscrição Mineira do Norte, quer na própria Union Carbide.

Consideramo-nos, pois, já suficientemente informados para dar um parecer favorável à prorrogação pedida.

Cremos, no entanto, que deveríamos estar documentados para poder prosseguir os estudos, na hipótese de Union Carbide decidir abandonar a Região, por não considerar o seu projecto economicamente viável.

Chamamos a atenção para a necessidade de um acompanhamento permanente da actividade da Empresa, o qual não poderá fazer-se apenas através de relatórios, mas exigirá a designação de um representante do Estado junto da Empresa, legal e tecnicamente qualificado.

Fazemos considerações várias obre as dificuldades que nos têm sido criadas e sobre o nosso afastamento da Região, que já quase está concretizado, através de incríveis Ordens de Serviço que transferem para técnicos incompetentes as nossas funções e chamamos a atenção para a necessidade de se proceder a uma sindicância à Direcção-Geral de Minas, em especial ao Serviço de Fomento Mineiro, se se quiser obstar à completa destruição deste Organismo de criação de riqueza, essencial ao desenvolvimento económico do País.

Defendemos a promoção do actual Serviço de Fomento Mineiro a Instituto Geológico e Mineiro, dotado de autonomia administrativa e financeira e com mais amplas atribuições, que lhe permitam entrar no campo da exploração de jazigos minerais.

Só um tal Instituto teria condições para dar adequado seguimento aos trabalhos na Região de Vila Nova de Cerveira - Caminha – Ponte de Lima, na hipótese de Union Carbide abandonar a Região.

Julgamos indispensável uma ampla colaboração com estabelecimentos de ensino superior, na formação de técnicos competentes e no seu posterior aproveitamento.

A Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha - Ponte de Lima teria óptimas condições para facilitar a preparação desses técnicos.

Na hipótese de Union Carbide permanecer na Região e passar à fase de exploração – hipótese que nos parece a mais verosímil – concluímos que do contrato com o Estado apenas resultará, se as reservas actuais não forem acrescentadas, uma receita de 16 200 contos, em pouco mais de 13 anos, isto é, uma importância que mal cobrirá as despesas do Serviço de Fomento Mineiro, se é que as cobre.

Concluímos, também, que uma das Empresas locais, que viu as suas concessões valorizadas pelo Serviço de Fomento Mineiro, além de algumas dezenas de milhar de contos que já deve ter recebido, virá a receber ainda, mais cerca de 48 000 contos.

Vê-se, pois, quão irreflectida e irresponsavelmente foi elaborado o contrato com o Estado!

E é caso para perguntar porque sendo nós o técnico que melhor conhece a Região, não fomos chamados a colaborar na redacção do contrato.

Chama-se a atenção para as disposições legais que obrigam os concessionários a compensar o Estado das despesas feitas nas áreas das suas concessões, tidas em com conta as riquezas nelas evidenciadas, em resultado dos trabalhos do Serviço de Fomento Mineiro.”

Comuniquei ao Director do SFM que esta informação fora também enviada, para apreciação, em escalões hierárquicos mais elevados (Primeiro Ministro e Ministro da Indústria).

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