A
Faixa Piritosa Alentejana é a parcela portuguesa de uma extensa província
metalogénica ibérica, mundialmente conhecida pelos seus gigantescos jazigos de
sulfuretos (alguns, com centenas de milhões de toneladas) que, desde remotos
tempos, têm sido explorados, sobretudo para recuperação de cobre e de enxofre.
A
recuperação de enxofre deixou de ser atractiva, quando este elemento passou a obter-se
como subproduto da refinação do petróleo bruto, surgindo, nos mercados, a
preços muito inferiores e em quantidades suficientes para o abastecimento das
indústrias que dele careciam.
Em
compensação, os progressos na produção de concentrados dos vários metais
contidos no minério, tornaram económica a recuperação destes metais, com
destaque para o cobre, o zinco, o chumbo, o ouro, a prata, o índio.
O
primeiro Director do SFM, o Eng.º António Bernardo Ferreira, apercebeu-se da real
importância desta Faixa, e a ela dedicou especial atenção, contando com forte
apoio do Ministro Ferreira Dias.
Eu
fui o Engenheiro do SFM, destacado para dirigir as primeiras investigações na
Faixa, com recurso às mais modernas técnicas de prospecção, então disponíveis
na indústria mineira. Estávamos em 1944.
Tive
a honra de participar no primeiro notável sucesso do SFM: a descoberta da massa
mineralizada de Carraço – Moinho, em Aljustrel,
Outras
descobertas se seguiram, mediante a aplicação das técnicas de prospecção
geofísica, com realce para o método gravimétrico, despertando o interesse de
grandes Companhias mineiras estrangeiras.
Para
tal, muito contribuiu a publicação dos artigos de minha autoria “Prospecção de Pirites no Baixo Alentejo” e “The discovery of a new orebody within the Pyrite Belt of
Portugal by electromagnetic prospecting”. (Ver post N.º 9)
Como
referi no post anterior, Soares Carneiro, na fase inicial do seu mandato de
Director-Geral, não dificultou a minha actividade de Prospecção Mineira.
O
meu inveterado optimismo e a minha incorrigível ingenuidade, fizeram-me
alimentar a ilusão de que as “Considerações finais” do primeiro dos artigos citados
teriam merecido a sua plena concordância.
Assim
sendo, confiei que, em futuras adjudicações, respeitaria a disposição legal que
classifica os recursos minerais como “bens dominiais”, impossibilitando,
portanto, a concessão da sua exploração a entidades estrangeiras.
De
facto, tendo eu preconizado a conveniente especialização de técnicos do SFM,
para que todos os estudos pudessem ficar a cargo de cidadãos portugueses (Ver
post N:º 11), podia garantir ter-se conseguido essa especialização, na 1.ª
Brigada de Prospecção.
Mas
Soares Carneiro estava a assumir-se como real dirigente do Serviço de Fomento
Mineiro (SFM), subalternizando este departamento da DGMSG.
Eu
já não tinha apreciado que, na inauguração das modernas instalações de S.
Mamede de Infesta, as designasse por Laboratórios
da DGMSG, quando na realidade, elas se destinaram à sede do SFM, com os seus Gabinetes Técnicos,
Secretaria, Biblioteca, Salão de Conferências, Salão de Exposição de Minérios e
Rochas de todo o País, Sala de Desenho, Laboratórios, Armazéns, Oficinas, etc.,
representando, portanto, os Laboratórios apenas uma parcela, embora importante
dessas Instalações.
Soares
Carneiro tinha exercido funções no SFM, entre 1942 e 1944, mas não fora
brilhante a sua passagem por este Serviço.
Surpreendeu-me
que se tivesse conformado com o papel de Colector do Colaborador Cotelo Neiva,
em levantamento geológico da Região de Bragança – Vinhais, de reduzido mérito para
os objectivos do SFM. (Ver post N.º 120)
Não
adquiriu a experiência profissional que Bernardo Ferreira ambicionava
proporcionar aos técnicos contratados pelo SFM (Ver post N.º 1), para ousar dirigir
este importantíssimo departamento.
Eu
acabara por perder a esperança de que viesse a cumprir o que me declarara,
quanto ao carácter transitório da nomeação de Múrias como Director do SFM, pois
ia-me apercebendo de que a subserviência deste funcionário, era útil à sua
estratégia.
Soares
Carneiro passara a exigir que fossem submetidos, à sua prévia apreciação, trabalhos
da competência normal do Director do SFM, sem que este fizesse a mínima
objecção.
É
bem elucidativo o exemplo das sondagens
Nenhuma
sondagem poderia ser efectuada sem a sua aprovação, como se ele tivesse preparação técnica para emitir parecer
fundamentado!
Como
não tinha essa preparação, o seu despacho era sempre do mesmo teor: “Nada a opor”, escrito à mão, com péssima
caligrafia, em letras garrafais, ostentando pesporrência!
Nunca
uma palavra de apreço ou estímulo, não só pelo trabalho produzido,
justificativo do projecto, mas também pela esmerada apresentação, com texto e abundantes
peças desenhadas.
Na
sua ânsia de assumir um poder absoluto, não só desautorizou o SFM, como ignorou
a existência do Conselho Superior de Minas, cujas atribuições de consultadoria obrigatória
estavam claramente expressas, no Decreto–lei N.º 18713 de 1930, e em vários
outros diplomas legais.
Foi
ao ponto de instituir, na DGMSG, uma Comissão, que designou por “Comissão de Fomento”, composta
por funcionários superiores dos departamentos da DGMSG (técnicos ou não), com a
finalidade de analisar, periodicamente, os casos surgidos nesses departamentos.
Em
fastidiosas reuniões, foi muitas vezes referida a necessidade de reestruturar a
DGMSG, para aumentar a sua eficácia, mas nada se resolveu.
Na
lei de Minas de 1930 ainda se fizeram pequenas alterações, para tentar corrigir
erros na outorga de concessões mineiras. Mas, em minha opinião, o que se
conseguiu deu jus à velha expressão “pior
a emenda que o soneto”
Foi
o Secretário de Estado, Rogério Martins, oriundo da antiga CUF (Companhia União
Fabril), quem tentou, na sua efémera passagem pelo Governo, alterar a
organização da DGMSG, concebendo um projecto que submeteu à apreciação de todas
as Direcções-Gerais sob a sua tutela (Ver post N.º 69).
A
intenção era louvável, mas a reacção da DGMSG foi, para ele, inesperada.
Em
vez das opiniões individuais que pretendia, o que lhe foi apresentado foi um
parecer colectivo de concordância, quase por unanimidade, apenas com a minha discordância,
expressa em “declaração de voto”, pois eu nunca aceitaria a extinção do SFM, que
Rogério Martins sugeria.
Causou-me
estupefacção a naturalidade com que Soares Carneiro aceitou a saída das
Circunscrições Mineiras do âmbito da DGMS, conforme propôs Rogério Martins.
Tal
conformismo não se conciliava com a ambição de poder que demonstrava ao assumir
abusivamente funções da competência de outros departamentos da DGMSG.
Nas
reuniões da Comissão de Fomento, os temas com alguma utilidade acabavam por
ser, praticamente, os do SFM, pois os restantes tinham um interesse marginal,
que não justificava, nem os dispêndios com as deslocações dos funcionários, nem
a distracção das suas actividades normais.
Nelas,
eu ia dando conta dos resultados que conseguia, mediante a aplicação das variadas
técnicas de prospecção mineira.
Embora
o autoritarismo de Soares Carneiro, nesta fase inicial do seu mandato, não fosse
bom prenúncio sobre o seu futuro comportamento, o facto de não criar embaraços à
minha actividade, induzia-me a considerar positiva a sua atitude relativamente
à prospecção mineira.
Soares
Carneiro iria fazer uso, da informação que adquiria através das minhas
exposições, de um modo muito discutível, relativamente ao respeito pelos
interesses do País.
Isso
irei analisar, no próximo post, para justificar a selecção da Faixa
Piritosa Alentejana como um dos casos mais emblemáticos do “uso do poder, em oposição ao saber” praticado
pelo Director-Geral de Minas Soares Carneiro.
Continua
…
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