quarta-feira, 26 de novembro de 2008

28 – A organização do Serviço de Prospecção Mineira do SFM. - Continuação

A minha nomeação para a chefia do Serviço de Prospecção, a nível nacional, implicou a transferência da minha residência mais frequente, de Beja para o Porto, no final do ano de 1963.

Já então o SFM se encontrava instalado em amplos edifícios que, para o efeito, haviam sido construídos em S. Mamede de Infesta.

No edifício principal, os gabinetes mais espaçosos do piso destinado aos técnicos superiores sem funções laboratoriais, à Secretaria e à Sala de Desenho, estavam já ocupados por pessoal anteriormente residente no Porto.

Tinha-me sido destinado um exíguo gabinete, entre o salão do Director e a Secretaria, onde mal me podia movimentar.

Habituado a ter um grande estirador, onde estendia mapas e neles efectuava os estudos necessários à condução das campanhas de prospecção, estranhei que me tivesse sido destinado tal gabinete, sendo eu o mais categorizado funcionário, a seguir ao Director.

Foi-me explicado que o objectivo era manter-me próximo do Director para facilmente o poder auxiliar na sua missão de dirigente.

Rapidamente, porém, se me tornou difícil realizar o trabalho a que estava habituado.
Não tinha, além disso, condições para receber condignamente os representantes de Empresas portuguesas e estrangeiras que frequentemente me procuravam, interessados em documentar-se sobre áreas com potencialidades para justificarem campanhas de prospecção mineira a que se pretendiam candidatar por contrato com o Estado.
O Director concordou na minha transferência para um gabinete mais amplo, perto da Sala de Desenho, à qual tinha de recorrer amiudadas vezes.

Neste novo gabinete, funcionei como Chefe do Serviço de Prospecção e Chefe da 2.ª Brigada, que ia começar a organizar, seguindo critério idêntico ao utilizado na 1.ª Brigada.

Relativamente à documentação sobre as Minas do Centro e do Norte do País, a organização de um arquivo de rápida consulta apresentou-se-me muito menos fácil do que tinha sido no Sul, por vários motivos.

Em primeiro lugar eram muito mais numerosas as concessões em vigor, abandonadas ou já anuladas.
A febre do volfrâmio, durante a 2.ª Guerra Mundial, tinha dado origem a concessões por todo o lado, sem contar com as ocorrências conhecidas onde tinham sido efectuadas explorações ilegais vulgarmente designadas por “pilhas”

Em segundo lugar, pouco pessoal qualificado me foi disponibilizado para efectuar a pesquisa dos dados úteis contidos nos processos dessas concessões, que a Circunscrição Mineira do Norte me facultava.

Em terceiro lugar, muitos dos dados contidos nos relatórios das empresas privadas e mesmo das entidades oficiais tinham pouco interesse ou eram de rigor duvidoso, depreendendo-se que teriam sido elaborados apenas para cumprir formalidades legais.

Tornou-se evidente a necessidade de criar uma ficha que condensasse os elementos essenciais de cada mina ou simples ocorrência.
Para o efeito, consultei modelos em uso noutros países e consultei entidades que já tivessem enfrentado o problema ou tivessem nível para poder prestar contribuição útil.
A ficha foi criada e alguns milhares de exemplares foram mandados imprimir, em oficina de Beja onde costumavam ser encadernados os relatórios finais ou intercalares das investigações mineiras.

Foi dado início ao preenchimento das fichas, mas não se verificou a continuidade prevista, por carência de pessoal.
As fichas foram, anos mais tarde, aproveitadas principalmente pelo 4.º Serviço, que entretanto havia sido criado para proceder ao inventário das pedreiras, apesar de não terem sido preparadas para esse fim.
Deste novo Serviço foi encarregado um Engenheiro do SFM que regressara da Junta de Energia Nuclear, onde estivera destacado.

Não tendo conseguido constituir uma base de dados, por meio destas fichas, fui ao longo do tempo formando, no meu amplo gabinete, um arquivo com cópias de relatórios ou dados deles extraídos sobre minas situadas em áreas onde planeei executar campanhas de prospecção, pelo conhecimento que ia adquirindo das potencialidades desta zona do País.
Constituí também, um arquivo dos mapas à escala 1:5.000 e a outras escalas, tanto do Norte como do Sul do País.
Com o decorrer do tempo este arquivo foi crescendo, atingindo à data da minha aposentação, largas dezenas de milhar de cartas topográficas, geológicas, geofísicas e geoquímicas.
Segundo informação que recentemente me foi prestada, tive a satisfação de tomar conhecimento de que este espólio tem estado a ser devidamente informatizado, evitando assim a sua perda, que era de recear, perante o facto de os mapas serem, na sua grande maioria, cópias em papel ozalid, susceptíveis de se tornarem imperceptíveis com o seu envelhecimento.

Para a 2.ª Brigada de Prospecção foram inicialmente destacados um Geólogo, dois Agentes Técnicos de Engenharia e um Colector, que pertenciam ao Quadro de funcionários da sede de SFM, quase desde a sua fundação.
Estavam-lhes atribuídas funções relacionadas com o estudo da Bacia Carbonífera do Douro e com a Zona Carbonífera de Ourém.

Em 1964, regressou ao SFM um Geólogo que tinha sido destacado para a Junta de Energia Nuclear, quando da criação deste Organismo.
Foi integrado, logicamente no Serviço de Prospecção mas, considerando que a sua especialização era a cartografia geológica e que o prestigiado Professor da Universidade de Lisboa e acérrimo defensor da Geologia, Dr. Carlos Teixeira, se propunha supervisionar a sua actividade, e dado que o conhecimento geológico do território nacional é basilar para a prospecção, este Geólogo manteve-se sobretudo a prestar colaboração aos Serviços Geológicos de Portugal na região trasmontana, com vista não só à publicação de novas cartas geológicas à escala 1:50.000, mas também a uma nova edição da carta à escala 1:500.000

Em fins de 1964, foi também considerado integrado no Serviço de Prospecção sob minha chefia, o Geólogo Dr. António Ribeiro que, como bolseiro da Fundação Gulbenkian, vinha procedendo a estudos na região trasmontana, integrado na equipa do Geólogo do SFM a que acima me referi, sob a orientação superior do Professor Carlos Teixeira.
Registo que não foi emitida a respectiva Ordem de Serviço, apesar de o facto ter sido realçado no meu relatório do mês de Novembro desse ano. Isso constituiu um primeiro indício da indisciplina que o Director passou a introduzir na Orgânica que ele tinha instituído.
Registo que, apesar desta lacuna, o Dr. António Ribeiro se considerou integrado no Serviço de Prospecção, sempre tendo prestado contas da sua actividade em relatórios mensais, até que a indisciplina introduzida após a Revolução de Abril de 1974, alterou a situação. A essa indisciplina me referirei oportunamente.
Conforme já registei em outro post, recorri ao saber do Dr. António Ribeiro em diversas ocasiões, em outras áreas, sem perturbar os seus estudos em Trás-os-Montes.

Alguns anos depois, outro Geólogo que ingressou no SFM já com tarefa indicada, também se considerou integrado no Serviço de Prospecção que eu chefiava, apesar de a respectiva Ordem de Serviço não ter sido emitida.
Sempre descreveu pormenorizadamente a sua actividade em relatórios mensais que apresentava e que eu anexava ao meu, tal como fazia com todos os relatórios dos diferentes departamentos do 1.º Serviço.

Ele foi prestar colaboração à Empresa Ferrominas, onde decorriam sondagens, segundo projecto do Dr. António Ribeiro, para definição de reservas na área do Cabeço da Mua, que se pretendia explorar para abastecimento da Siderurgia Nacional.

Anos mais tarde, outros Geólogos e Engenheiros de Minas recém-formados, foram ingressando no SFM.
Sem Ordens que os colocassem no Serviço de Prospecção, actuaram sem adequado controlo, vagamente orientados pelo Director-Geral, como foi o caso dos denominados “Scheeliteiros”.

No que respeita aos Agentes Técnicos de Engenharia que ingressaram no Serviço de Prospecção, a situação não foi estimulante.
Não tinham experiência válida em prospecção mineira, mas ambos eram tidos como especializados em trabalhos de topografia.
A realidade provou ser diferente. Trabalho de piquetagem de que encarreguei um deles na região de Caminha, foi tão imperfeito, que veio a ocasionar-me sérios problemas para sua correcção.
Proporcionei-lhe estágio no Sul do País, em Secções da 1.ª Brigada, não só em piquetagem rigorosa, mas também em técnicas geofísicas e geoquímicas.
Lamentavelmente de pouco valeu este estágio, pois estavam bem enraizados vícios antigos, nunca corrigidos, talvez por excessiva benevolência dos dirigentes ou incapacidade destes para detectarem os erros que seguramente cometeram.
A situação, por se ter tornado insustentável, levou-me a denunciá-la ao Director, que decidiu colocá-lo sob sua directa chefia.

O outro Agente Técnico de Engenharia foi útil sobretudo em trabalhos de gabinete.
Fez a consulta aos documentos de carácter técnico sobre Minas concedidas, em vigor ou já anuladas, existentes no arquivo da Circunscrição Mineira do Norte, procedendo à cópia dos que se revelaram com interesse e preenchendo as respectivas fichas.

Prestou também colaboração ao Geólogo que estava encarregado dos estudos na Faixa Carbonífera do Douro, não só em trabalhos de gabinete, mas também em levantamentos topográficos.

Para a 2.ª Brigada de Prospecção, transitou um Colector que pertencia à equipa do Geólogo encarregado dos estudos nas bacias carboníferas.

Este Colector, apesar das suas limitadas habilitações legais (tinha apenas a antiga 4.ª Classe da Instrução Primária) revelou-se um excelente colaborador.

Foi com ele e com outro Colector que transferi da Secção de Évora da 1.ª Brigada de Prospecção para a 2.ª Brigada, que contei para a execução das campanhas de prospecção, às quais me foi possível dar início no Norte do País. A elas e, às vicissitudes por que tiveram que passar, me referirei oportunamente.

A minha presença na sede do SFM, longe de constituir situação favorável ao cumprimento dos objectivos do SFM, tornou mais difícil a concretização desses objectivos.

Perante as dificuldades que encontrei para desenvolver a prospecção no Norte, decidi continuar a concentrar a minha maior atenção nos problemas do Sul, onde a interferência do Director menos se fazia sentir, sempre na esperança de que meios materiais e humanos acabassem por me ser disponibilizados para dar cabal cumprimento aos planos de trabalhos no Norte do País, que anualmente ia apresentando.

Em próximos posts descreverei os êxitos que consegui no Norte, com a preciosa colaboração dos dois Colectores a que dei formação, transformando-os em prospectores competentes, não só em trabalho de campo, mas também nas fases iniciais do respectivo trabalho de gabinete. Eles supriram bem a carência de pessoal com melhor formação académica, que intencionalmente me não foi disponibilizado

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