Informei, no post N.º 21, que em 1964, mercê de uma reestruturação do SFM, originada pela nomeação de novo Director, os trabalhos mineiros no Sul do País deixaram de estar a meu cargo, apesar de eu ter manifestado muito sérias dúvidas sobre a sua correcta sequência, conhecedor como estava, da incompetência, nesta matéria, dos engenheiros aos quais eles iam ser confiados.
Eu tinha em preparação um relatório com descrição pormenorizada dos trabalhos realizados desde 1-1-1959 até 31-12-1963 e com proposta para continuação dos estudos.
Os trabalhos estavam documentados em mais de 150 peças desenhadas, que incluíam plantas dos diversos pisos já instituídos, perfis longitudinais e transversais pelos diversos filões conhecidos e também logs de 50 sondagens, algumas iniciadas a partir do piso 150.
As sondagens demonstravam que as anomalias electromagnéticas detectadas pelo método Turam correspondiam a estruturas filonianas, frequentemente com mineralização de calcopirite, malaquite e até cobre nativo.
Contudo, não tinham sido encontradas concentrações com interesse económico Tal não foi interpretado como significativo de que elas não existam. O facto de terem evidenciado enchimentos filonianos, quase sempre, nos locais das anomalias, foi já considerado factor positivo a ter em conta.
Projectava fazer aplicação do método de polarização induzida, que é o indicado para detectar mineralizações disseminadas, como é o caso dos jazigos filonianos.
Já havia proposto a aquisição da respectiva aparelhagem, aguardando que a Direcção do SFM acabasse por compreender a sua necessidade, não só para este caso de Aparis, mas também para outros, como por exemplo o do Salgadinho na região de Cercal – Odemira, onde também havia sido detectada disseminação de calcopirite numa sondagem.
Para a projectada utilização deste equipamento, estivera em estágio, nas Minas do Louzal, onde actuava a Companhia canadiana MC Phar, o engenheiro que, na 1.ª Brigada de Prospecção, tinha os métodos eléctricos a seu cargo (V: post N.º 27).
Planeava, também, instituir dois novos pisos até ao 210, isto é, até 60 metros abaixo do piso 150, que se encontrava em reconhecimento.
Esperava que, finalmente, fosse autorizada a exploração parcial do jazigo, para se obterem os dados de natureza económica essenciais à sua avaliação.
Pretendia ainda fazer desta Mina uma Mina – Escola, onde engenheiros recém – formados pudessem adquirir a experiência que a Universidade não conseguia proporcionar-lhes.
Além disso, era minha intenção propor que esta Mina fosse utilizada para ensaios de novos equipamentos, à medida que eles fossem surgindo no mercado, para aumentar a eficiência dos trabalhos.
Estas ideias foram oralmente expostas em reuniões da Comissão de Fomento, nas quais participaram representantes de todos os departamentos da DGMSG, encontrando-se algumas delas referidas em relatórios que apresentei na qualidade de Chefe do Serviço de Prospecção do SFM.
Não pude, porém concluir esse terceiro relatório, como já tive ocasião de dizer, porque as necessidades prementes de desenvolver a equipa de prospecção absorveram completamente o meu tempo.
A sua elaboração foi confiada ao Agente Técnico de Engenharia João José de Oliveira Barros, Chefe da Secção de Moura e Barrancos, que orientava localmente os trabalhos. Sendo um excelente colaborador, as suas atribuições limitavam-se à execução das instruções que recebia. O seu relatório, naturalmente iria reflectir estas limitações e foi o que aconteceu.
As minhas dúvidas quanto à desorientação subsequente à entrega que fui forçado a fazer da Secção que tão empenhadamente fui construindo, cedo se transformaram em certezas.
Incapazes de prosseguir no reconhecimento do jazigo, em conformidade com programa que estava em cumprimento, apenas conseguiram dar início à exploração de uma das suas bolsadas.
Saliento que a autorização para passar à exploração me fora antes sempre negada, até com censura pela insistência com que a requeria.
Não se considerando, porém, aptos a tal empreendimento, solicitaram a intervenção de professor do Instituto Superior Técnico, que tinha adquirido experiência de exploração, na Mina da Panasqueira.
Quando da visita do Secretário de Estado do Indústria a esta Mina, em meados de 1965, à qual me referi no post anterior, estavam em curso trabalhos preparatórios para o desmonte da bolsada escolhida.
No documento – guia da visita, redigido, com aprovação do Director – Geral, consta o seguinte: “Todos os estudos efectuados, desde a prospecção até à preparação dos concentrados comerciais, têm oferecido a possibilidade de tomar directamente contacto com todos os sectores da actividade mineira, constituindo uma experiência de incalculável valor para a preparação de técnicos (e outro pessoal) responsáveis pelas futuras tarefas de fomento”.
Em Outubro de 1968, foi com alguma surpresa que tomei conhecimento de que o conjunto de concessões abandonadas, que cobriam o jazigo de Aparis, tinha sido posto a concurso, por portaria publicada no Diário do Governo, com vista à sua exploração.
Não constava, porém, do clausulado, obrigação de os concorrentes prosseguirem o reconhecimento das zonas onde apenas se confirmara a passagem de filões através de uma primeira série de sondagens.
Também fora totalmente abandonada a ideia de aproveitar a “experiência de incalculável valor para a preparação de técnicos (e outro pessoal) responsável pelas futuras tarefas de fomento”.
A realidade é que, com o termo dos trabalhos mineiros do SFM, na mina de Aparis, pela sua transferência para a actividade privada, terminaram quase totalmente os trabalhos mineiros do SFM em todo o Paìs!
Acompanhei, no Norte, os esforços de um Agente Técnico de Engenharia do 2-º Serviço para estudar as Minas de zinco, chumbo e cobre da região de Talhadas no concelho de Águeda. Por falta de apoio eficaz, sobretudo no âmbito da geologia, estes estudos não tiveram êxito.
Nunca percebi porque foi dada preferência ao estudo desta Minas, quando, na sua proximidade, se situavam as Minas de Braçal, Malhada e Coval da Mó, que tinham suspendido a sua laboração, não por carência de minério, mas por baixa temporária de cotação do chumbo e por outras causas que me pareceram estranhas.
Do insucesso em Talhadas resultou também a quase total paralisação dos trabalhos mineiros no Norte, perdendo-se igualmente a experiência que lá se tinha conseguido.
Áreas do Sul que poderiam ter continuado a sua investigação por trabalhos mineiros, tais como Algares de Portel, Preguiças, Vale do Vargo e muitas outras, não foram consideradas para aplicação destas técnicas, assim se perdendo uma experiência que levara décadas a conseguir.
As concessões, objecto do concurso, público foram adjudicadas a uma Empresa criada propositadamente para a exploração de Aparis, da qual eram sócios dois professores catedráticos da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto.
Esta Empresa, denominada “Minerália” passou a explorar as bolsadas ricas evidenciadas pelo SFM, não constando que se tenha interessado pelas zonas mais pobres ou tenha completado o reconhecimento do jazigo.
Em Abri de 1975, vi, no jornal “República”, o anúncio de que a Mina de Aparis ia ser encerrada “por esgotamento total do seu filão”.
Após o encerramento da Mina de Aparis, um dos sócios de Minerália contactou-me, para me informar que a sua exploração revelou a exactidão das conclusões a que tinha chegado o reconhecimento efectuado sob minha orientação e, estando eu já afastado da direcção de trabalhos mineiros, há mais de uma dezena de anos, perguntou-me se tinha estudo de algum outro jazigo, nas mesmas condições, para Minerália se candidatar à sua exploração. Obviamente que não tinha!
Esta foi o triste fim de um estudo em que profundamente me tinha empenhado.
No arquivo do SFM de S. Mamede de Infesta deixei vasta documentação que poderá ainda ser útil, se um renascido SFM vier a surgir, como penso ter plena justificação, mas com a posição hierárquica que lhe compete. Em ocasiões oportunas, tenho defendido a criação de um Instituto de Investigação dos Recursos Minerais, com categoria equivalente à do Laboratório Nacional de Engenharia Civil, dotado de autonomia administrativa e financeira.
segunda-feira, 2 de março de 2009
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6 comentários:
As antigas casas de mineiros, a oficina, diversos armazéns e a lavaria da mina de Aparis servem hoje de base à caroteca do soco sul do LNEG (Laboratório Nacional de Energia e Geologia), instituição herdeira do historial do ex. INETI (Geociências), ex. IGM, ex. SFM e ex. SGP. Aguardando por melhores condições de armazenamento estão parqueadas em Aparis 594 sondagens, correspondentes a cerca de 185km de perfuração (equivalente a um investimento actual de cerca de 18,5M€!). Regularmente, alguns destes furos são seleccionados para estudo e amostragem no âmbito de diversos programas de investigação e de prospecção, realizados pelo LNEG e por empresas. No LNEG, nomeadamente no seu arquivo de Beja, encontram-se correctamente referenciados e arquivados, todos os relatórios técnicos e cartografia geológica, geofísica e geoquímica (esc. 1/5000 e 1/25000) que motivaram a realização destas e de outras sondagens. Sobre a mina de Aparis, e também sobre a quase totalidade das minas do Alentejo e Algarve existe também numerosa documentação técnica, desde o séc. XIX até à actualidade, nomeadamente diversos relatórios do Eng. Rocha Gomes autor deste blog.
João Matos, Geólogo do LNEG
Caro Dr. João Matos
Muito obrigado pelas suas visitas ao meu blogue e pelas informações que me presta.
Quanto à utilização das antigas instalações da Mina de Aparis para armazenamento de testemunhos de sondagens, pode aceitar-se apenas como solução de recurso para um problema que vem já de recuados tempos.
A este respeito, tenciono fazer um próximo post, pois, quando eu ainda chefiava a 1.ª Brigada de Prospecção, esteve o problema encaminhado para solução racional, não só para os testemunhos, mas também para as instalações do SFM em Beja. Foi mais uma imprevista obstrução superior que impediu essa resolução.
Gostava de saber se os terrenos onde se situam as antigas instalações de Aparis foram adquiridas aos seus proprietários, como eu tinha proposto, pois até à data da minha demissão da chefia da 1.ª Brigada de Prospecção, tal tinha sido considerado inviável, pelo Ministério das Finanças.
Caro Eng. Rocha Gomes
Obrigado pelo seu comentário. A recente constituição do LNEG pode contribuir para a resolução deste velho problema. O nosso objectivo é criar um Centro de Estudos Geológicos e Mineiros do Alentejo, com apoio comunitário (QREN), empresas e autarquias. Os contactos institucionais têm vindo a ser feitos e esperamos que, em devido tempo, esta unidade de ID venha a ser uma realidade.
Caro Dr. João Matos:
Apreciei o seu cuidado em preservar o valioso património representado pelos testemunhos das sondagens mineiras que têm sido efectuadas no Sul do País.
À falta de um local apropriado, aproveitou as instalações que, porventura se encontrariam abandonadas na antiga Mina de Aparis.
Será que o terreno em que se situam terá passado para a posse do Estado, por usucapião?
Não era realmente esse o destino para elas previsto, como refiro neste post e no N.º 21.
Formulo sinceros votos por que as suas diligências para a criação de um Centro de Estudos Geológicos e Mineiros no Alentejo sejam coroadas de êxito.
É meu parecer que tal Centro deveria integrar-se num Organismo de âmbito nacional, isto é, num Instituto Nacional de Investigação dos Recursos Minerais, como várias vezes tenho sugerido (V. final deste post).
Tenciono abordar tão importante tema, em futuros posts.
Eng. Rocha Gomes
Em resposta à questão colocada ao Eng. João Matos (LNEG), informo que os terrenos da Mina de Apariz continuam a ser privados, da família Pulido Vasquez. Pelo que sei nunca foi apresentada qualquer proposta.
Cpts.
Jacinto Saramago
Exmo Sr
Engº Albertino Adélio Rocha Gomes
Sou oriundo de Amareleja, mas resido em Tavira, por questões profissionais.
Sempre tive curiosidade por visitar as minas abandonadas de Aparis.
Enquanto residi em Amareleja, sempre que me deslocava a Barrancos, pela EN386, a placa “Mina de Aparis” me “picava” a curiosidade em lá ir, mas nunca tal aconteceu.
Tenho amigos, hoje na casa dos quarenta anos, que em idade de escola primária, ainda frequentaram a escola da mina.
Neste agosto passei uns dias na festa da terra e fui lá, não só com a intenção de visitar e ficar a conhecer, mas também de satisfazer a veia amadora da fotografia.
Visitei apenas a zona residencial, onde se encontram a escola, as habitações e o que suponho terem sido as oficinas.
Está tudo em ruínas, o que não caíu está para cair, existe maquinaria antiga abandonada e encontram-se vários testemunhos de sondagens, armazenados em vários locais da zona, tal como referiu o leitor JMatos e até a céu aberto.
Depois de organizadas, as fotografias irão integrar um projeto fotográfico a apresentar em concurso. O projeto tem como objetivo, entre outros, mostrar a realidade do património abandonado e a região onde se “desenquadra”.
Tenho pesquisado com alguma exaustão, mas a informação sobre o local é escassa.
Li com curiosidade o presente artigo e gostaria de poder usar excertos do mesmo na elaboração da parte escrita do projeto fotográfico, caso obtenha a sua autorização, e citando a respetiva fonte.
Gostaria também de saber se tem conhecimento de outros factos históricos, de relevância, que pudessem ser contributo para elaboração do referido projeto e que, por gentileza, mos relatasse (início da exploração, dimensão da mina, nº de trabalhadores, etc)
Caso esteja me pretenda contactar, queira fazê-lo através do seguinte e-mail
djramalho@gmail.com
Poderei enviar-lhe algumas fotografias do local, caso esteja interessado.
S/outro assunto, agradeço a atenção dispensada,
Melhores cumprimentos
Domingos Ramalho
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