sábado, 15 de agosto de 2009

88 – A minha demissão da chefia da 1.ª Brigada de Prospecção. Continuação 7.

Continuo a responder à primeira pergunta formulada no post 84, caracterizando os autores da exposição que originou a minha demissão, na sua qualidade de técnicos do SFM:

O Geólogo José Antómio Carvoeiras Goinhas
Natural da cidade de Beja, este Geólogo contactou-me, em 1961,quando terminou a sua licenciatura na Faculdade de Ciências de Lisboa, mostrando-se interessado em ingressar na DGMSG.
Acontecia que a Compagnie Royale Asturienne dés Mines (CRAM), que estava cumprindo um contrato de prospecção na região de Moura-Ficalho, na sequência de estudos anteriores do SFM (Ver post N.º 19), com o objectivo de aumentar as reservas de minérios de zinco, de modo a poder iniciar explorações em maior escala, também me havia contactado para que lhe indicasse um Engenheiro de Minas para o seu Quadro de Técnicos.
Informei a CRAM de que Engenheiros de Minas era uma espécie em extinção, perante a escassez de formandos nessa área, nos últimos tempos. Mas poderia indicar-lhe um Geólogo.
A CRAM aceitou a sugestão e eu aconselhei o Dr. José Goinhas a aproveitar a oportunidade que se lhe oferecia para se especializar na prospecção de jazigos de zinco, dada a elevada qualidade que reconhecia aos Geólogos franceses que actuavam na região de Moura-Ficalho.
Informei-o de que proporia o seu ingresso no SFM, para colaborar nos estudos que estavam em curso na Faixa Magnetítica e Zincífera Alentejana, quando tivesse adquirido a especialização desejada.
O Dr. José Goinhas, após 6 anos de permanência na CRAM, em Portugal, em França e no Norte de África, colaborando sobretudo em estudos de jazigos de zinco, contactou-me novamente em 1967, e eu fiz então a proposta de seu ingresso no SFM.
A proposta foi aceite e o Dr. José Goinhas foi admitido no SFM em Julho de 1967.
Encarreguei-o, como lhe tinha prometido, de dar apoio aos estudos que estavam em curso na faixa Magnetítica e Zincífera Alentejana.
Estes estudos incidiam, então, na região de Portel, onde campanhas de prospecção geofísica e geoquímica tinham tido grande sucesso (Ver post N.º44).
Tinham sido efectuadas já muitas sondagens, com resultados bastante animadores e a classificação dos respectivos testemunhos estivera a cargo do Agente Técnico de Engenharia José Coelho da Silva Gameiro.
Embora eu considerasse tal classificação bastante pormenorizada e reveladora de notáveis qualidades de observação, era evidente que estudo realizado por Geólogo especializado em jazigos de zinco deveria conduzir a importantes aperfeiçoamentos. Por isso, encarreguei o Dr. Goinhas de proceder a novos exames dos testemunhos das sondagens já efectuadas, ao mesmo tempo que o encarregava também de fazer os logs dos testemunhos das sondagens que estavam em curso na mesma região e de fazer a interpretação estrutural do jazigo.
A sua actividade não correspondeu, porém, ao que dele esperava, No que respeita às sondagens que tinham sido efectuadas antes do seu ingresso na Brigada, não introduziu quaisquer aperfeiçoamentos. A sua capacidade de trabalho esgotou-se no exame dos testemunhos das sondagens que estavam em curso.
A qualidade dos seus estudos foi satisfatória, mas a produtividade foi, em geral, baixa. Cheguei a perguntar-lhe se a sua capacidade de trabalho se esgotara na CRAM.
Em 1971-72, foi-lhe proporcionada a frequência de um Curso de Economia Mineira, em Universidade de Arizona, nos Estados Unidos, durante o qual tomou conhecimento directo de jazigos do tipo dos “porphyry coppers”.
Enquanto frequentava este Curso, mantive com ele correspondência assídua, salientando que mais importante que a obtenção de graus académicos era a aquisição de conhecimentos orientados para a resolução dos problemas da Brigada que lhe estavam confiados. A seu pedido, forneci-lhe dados circunstanciados, sobretudo acerca da legislação mineira de Portugal, para inserir nos trabalhos do Curso.
Se antes de ir para os Estados Unidos já se mostrara pouco diligente, após o seu regresso, menos diligente se mostrou. Mas, baseado no que lá aprendera, pretendeu assumir a direcção de um projecto de prospecção de “porphyry coppers”, desobedecendo a decisões que haviam sido tomadas nas habituais reuniões que eu tinha com todos os Engenheiros e Geólogos da Brigada.
A esta atitude do Dr. Goinhas, exposta no seu relatório de Julho de 1972, tive que reagir, enviando-lhe, com carácter oficial, o documento que a seguir transcrevo:

“Ao Geólogo Senhor António José Carvoeiras Goinhas:
O relatório mensal destina-se, como é óbvio, a dar conta da actividade durante o mês a que diz respeito, no sector a cargo do técnico que o subscreve.
Interessa sobretudo destacar resultados dessa actividade.
Não se vê utilidade em referir decisões tomadas em reuniões dirigidas pelo Chefe da Brigada, porquanto este está bem consciente das decisões que toma. Não se impede, todavia, que se citem, se o autor do relatório considerar necessário para definir a sua posição perante determinado problema, desde que se respeite escrupulosamente a verdade.
A análise do relatório de V. Ex.ª respeitante ao mês de Julho de 1972 sugere-me os seguintes comentários:
1.º – A actividade que se relata e que se contem totalmente no primeiro parágrafo não satisfaz.
Na presunção de que algo mais haja a mencionar, devolve-se o relatório, para ser completado, se for caso disso.
2.º - O estudo da grande mancha de “pórfiros e rochas afins de região de Beja” e das “rochas graníticas e tonalíticas da região de Évora” há muito tempo figura nos planos de trabalho do 1.º Serviço e até da antiga Brigada do Sul, com vista à descoberta de jazigos do tipo dos “porphyry coppers” ou outros.
Já muito trabalho foi efectuado com essa finalidade, grande parte muito anteriormente à existência de Geólogos no corpo de técnicos da 1.ª Brigada de Prospecção.
Na reunião a que V. Ex.ª alude, o problema das mineralizações associadas a estas grandes manchas de rochas ígneas foi abordado, a fim de definir se haveria bases mais consistentes para nova actuação, já que especialistas estrangeiros conceituados que, por nossa indicação visitaram a área, não manifestaram pareceres encorajantes quanto à existência de jazigos do tipo dos “porphyry coppers”.
Contou-se, evidentemente, com os conhecimentos adquiridos pelos Geólogos da 1,ª Brigada de Prospecção que estiveram em estágio nos Estados Unidos da América do Norte.
Entendeu-se, como sempre se admitira, que o problema é digno de atenção, mas não se lhe atribui carácter prioritário.
O Geólogo Senhor José António Carvoeiras Goinhas ficou encarregado do seguinte:
a) Apoio geológico aos trabalhos de prospecção, pesquisa e reconhecimento, em curso na Faixa Zincífera Alentejana, os quais se destinam essencialmente à inventariação das existências de minérios de zinco e chumbo (com carácter fortemente prioritário).
b) Estudos geológicos de pormenor na zona SE da grande mancha de “pórfiros e rochas afins da região de Beja” e nas manchas de “rochas graníticas e tonalíticas da região de Évora”, que abrangem, entre outras, as minas de cobre de Sobral, Feijoas, Monte do Trigo, e Castelos, nas quais o 1.º Serviço teve já importante actividade em matéria de prospecção. (A estes estudos não foi dado carácter prioritário, sobretudo por se considerar que os da Faixa Zincífera, dado o atraso em que se encontram, seriam já suficientes para absorver inteiramente o tempo de trabalho do Geólogo. Todavia, dado o interesse manifestado pelo Geólogo em actuar em região com estas características, julgou-se de aproveitar esse interesse. Frisou-se, no entanto, bem claramente, que, no momento presente, o assunto se não apresenta com carácter prioritário. Isto não significa que novos dados não possam modificar rapidamente a situação e fazer convergir para estas áreas a maior parte dos esforços da Brigada).

Quanto ao apoio geológico na Faixa Zincífera, espera-se que ele se traduza na produção de cartas geológicas à escala 1:5 000, não só de áreas já prospectadas por alguns métodos geofísicos e geoquímicos, cuja investigação não tem prosseguido por falta de apoio geológico, mas também de áreas ainda não prospectadas, cujas características geológicas (conhecidas através de anteriores levantamentos pouco pormenorizados) nos levam a atribuir-lhes potencialidade para jazigos de zinco e chumbo.
Não se tem, até ao presente, definido quais as cartas a levantar à escala 1:5 000, confiando-se que o Geólogo saberia estabelecer o programa que mais conviria, dentro da orientação superiormente fixada, tendo em vista a mais rápida resolução do problema.
Uma vez, porém, que não se tem apresentado tal programa, este será oportunamente enviado para cumprimento.
Ainda no que respeita à Faixa Zincífera, espera-se:
a) que se faça o estudo pormenorizado das sondagens N.ºs 1 a 25 da área de Algares de Portel, conforme foi, há longo tempo, determinado;
b) que se apresente o relatório dos estudos geológicos e das sondagens efectuadas na região de Vale do Vargo;
c) que se acompanhe a evolução dos estudos que Intermine Limited efectua na área da região de Portel que lhe foi adjudicada para trabalhos de prospecção, pesquisa e exploração de jazigos minerais.

No que respeita às manchas de “pórfiros e rochas afins da região de Beja” e de “rochas graníticas e tonalíticas da região de Évora”, não se esperam levantamentos às escalas de 1:100 000, 1:50 000 ou 1:25 000, que são da competência dos Serviços Geológicos.

Espera-se, sim, que sejam feitos itinerários atravessando toda a área, segundo esquema previamente estabelecido, para definir as zonas realmente potenciais para os jazigos que se procuram. Demarcadas estas zonas, haverá que fazer levantamentos pormenorizados, à escala 1:5 000 ou de menor denominador.

Repete-se que a este programa não foi dado ainda carácter prioritário.

Só se aceita a distracção do tempo do Geólogo para este programa, quando tenham entrado na normalidade os estudos na Faixa Zincífera

Porto, 5 de Agosto de 1972
O Engenheiro Chefe da 1.ª Brigada de Prospecção
(a) Albertino Adélio Rocha Gomes

O Dr. José Goinhas, após ter recebido este documento desfez-se em desculpas e eu dei o incidente por encerrado, mas a realidade é que o relatório sobre a região de Vale de Vargo, interpretativo da estrutura geológica, com base nas numerosas sondagens que ali tinham sido efectuadas, não surgiu até à data da minha demissão da chefia da 1.ª Brigada de Prospecção.
Também não se verificou o aperfeiçoamento esperado no exame dos testemunhos das sondagens N.ºs 1 a 25 da área de Algares de Portel, como lhe tinha sido determinado.
Quando, em 2-12-1974, o Dr. José Goinhas surgiu em S. Mamede de Infesta acompanhado de todos os outros técnicos superiores da 1.ª Brigada de Prospecção, já com o propósito de prestar apoio ao Director-Geral, que ia pôr à discussão a sua proposta de nova organização da DGMSG, estranhei as referências muito elogiosas que fez às minhas intervenções na sessão que ali se realizou.. (Ver post N.º 77)
Poucos dias depois, sentindo a protecção do Director-Geral, resolveu afrontar-me, insistindo na marcação de uma sondagem na área de Viana do Alentejo, em local de que eu discordava totalmente, por se prever que, dada a grande proximidade de outra já executada, nenhuma informação adicional iria trazer. Como referi no post N.º 80, aceitei que a proposta fosse superiormente apresentada, com as assinaturas de todos os Engenheiros e Geólogos que com ele concordavam e com a minha assinatura de discordância.
Mas as atitudes estranhas do Dr. José Goinhas não ficaram por aqui.
Em Seminário de Geoquímica que se realizou na Universidade de Aveiro, em Janeiro de 1976, para o qual fui convidado pelos Drs. Britaldo Rodrigues e Edmundo Fonseca, apresentei-me como Chefe da 2.ª Brigada de Prospecção do SFM e dei a conhecer a actividade que tinha em curso, sobretudo na Faixa Metalífera da Beira Litoral, com grande incidência no distrito de Aveiro.
O Dr. José Goinhas compareceu também e, com grande surpresa minha apresentou-se como representante da 1.ª Brigada de Prospecção, acrescentando que essa Brigada era também uma criação do Senhor Engenheiro Rocha Gomes!
Em primeiro lugar, não compreendi porque, havendo na 1.ª Brigada um Engenheiro encarregado da prospecção geoquímica e, não sendo o Dr. Goinhas especialista em tal matéria, foi ele indicado para representar a Brigada.
Em segundo lugar, a referência elogiosa não se concilia com a acusação de eu ter ocasionado “enorme prejuízo ao Estado pelas deficiências no planeamento, execução e controle das vastas e delicadas tarefas a cargo da 1.ª Brigada de Prospecção”
Por último, quero assinalar que o Dr. José Goinhas chegou a ser indigitado para Director-Geral, quando FSC foi exonerado.
Não foi investido em tal cargo, mas conseguiu ser nomeado Director-Geral do Gabinete para a Prospecção, Pesquisa e Exploração de Petróleos, quando o cargo ficou vago por falecimento do respectivo titular! Além da sua notória impreparação nos complexos problemas da prospecção de petróleos, é surpreendente que se não tenha preocupado com os prejuízos que seriam de prever na 1.ª Brigada com a sua deserção.

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