sexta-feira, 28 de agosto de 2009

89 – A minha demissão da chefia da 1.ª Brigada de Prospecção. Continuação 8

Continuo a responder à primeira pergunta formulada no post 84, caracterizando os autores da exposição que originou a minha demissão, na sua qualidade de técnicos do SFM.


Os Agentes Técnicos de Engenharia

Foram 14 os técnicos desta categoria que exerceram funções, no Sul do País, sob minha chefia, quer na Brigada de Prospecção Eléctrica, (entre 1944 e 1947), quer na Brigada do Sul (entre 1948 e 1964), quer na 1.ª Brigada de Prospecção (entre 1964 e 1975).
Com quase todos, mantive uma excelente relação de trabalho.

Houve apenas a excepção de um, que se revelou desonesto, durante a sua passagem pela Brigada do Sul. Falsificou dados e cometeu outras faltas, justificativas de processo disciplinar que me vi compelido a solicitar que lhe fosse instaurado.
O instrutor que, anos mais tarde, viria a ser Director do SFM, começou por declarar que o problema se resolveria com a não renovação do contrato, se tal indivíduo, não tivesse acabado de completar um ano de serviço.
Porém, no decurso da instrução, foi-se mostrando muito mais moderado, sendo patente a influência do Bispo de Beja e de Agostinho Lourenço, Chefe da PIDE, com os quais o indivíduo se ufanava de ter bom relacionamento.
Apesar disso, perante a gravidade dos factos ocorridos, não foi possível evitar propor superiormente o seu afastamento da Brigada do Sul (única sanção que eu tinha reclamado), com uma pena adicional de suspensão de funções durante 30 dias.
Mas o Secretário de Estado, Magalhães Ramalho, ao apreciar o processo, agravou a pena para 90 dias, com áspera censura à Direcção do SFM, pela tolerância demonstrada nas situações descritas, que afectavam severamente a eficácia do SFM.
Eu próprio fui incluído na censura, por excesso de benevolência, o que muito me surpreendeu, pois sabia ser, geralmente, classificado de rigoroso e exigente.
Este indivíduo, que foi transferido para a Brigada do Norte, ficando a chefiar uma Secção de Trabalhos Mineiros em Chaves, iria cometer aí idênticas faltas. Falsificou amostras de uma mina dita de ouro, em Tresmundes, para prolongar a sua permanência nesta cidade. Foi também, durante a sua chefia - que nunca lhe deveria ter sido confiada, por manifesta impreparação - que ocorreu, na Mina de ouro de “Três Minas”, uma súbita avalanche, em galeria que se encontrava em desobstrução, que ocasionou a morte de alguns operários.

Apesar da deficiente preparação de grande parte dos Agentes Técnicos de Engenharia, eles foram conseguindo adaptar-se bem aos trabalhos de todas as fases da prospecção, de que os encarreguei.
A alguns tive que corrigir enraizados vícios de trabalho, que estavam a prejudicar a qualidade dos estudos, ou mesmo dar instrução.
Posso afirmar que aí começou a minha actividade docente, que viria a oficializar-se de 1970 a 1990, nas Faculdades de Ciências e de Engenharia da Universidade do Porto.
Um dos Agentes Técnicos de Engenharia, que sempre se mostrou grato pelos meus ensinamentos e que coleccionava os cartões oficiosos em que lhe dava instruções de trabalho, costumava, simpaticamente tratar-me por Mestre.

A contribuição destes técnicos que, sem reservas, aceitaram a minha superior orientação, foi importante para os grandes êxitos que descrevi em posts anteriores.
Foram eles, com a colaboração de pessoal recrutado nos locais de trabalho, que estiveram presentes no terreno, a dar cumprimento aos programas que lhes eram apresentados.
A este pessoal auxiliar, tinham sido proporcionados conhecimentos de ordem prática, quer por mim próprio, quer pelos Agentes Técnicos de Engenharia, nas várias técnicas de prospecção.

A participação dos Agentes Técnicos de Engenharia e do pessoal auxiliar, na sua maior parte vinda de meados da década de 40 do século passado, foi muito mais valiosa do que a dos Engenheiros e dos Geólogos, ingressados na 1.ª Brigada de Prospecção apenas em meados da década de 60.

Os Geólogos, contrariando as grandes esperanças que neles depositei, pareceram mais interessados na promoção pessoal do que na perfeita integração na disciplina que vinha da minha chefia da Brigada de Prospecção Eléctrica e da Brigada do Sul.

Metodologias houve, que deixaram de se aplicar, com o ingresso dos técnicos ditos superiores. Por exemplo, não mais ficou a saber-se o custo discriminado dos trabalhos, prática que era rotineira, quando chefiei a Brigada do Sul.

Dos 14 Agentes Técnicos de Engenharia que exerceram funções sob minha chefia, só três estavam integrados na 1.ª Brigada de Prospecção, à data do documento que originou a minha demissão desta Brigada e não eram estes os que tinham adquirido maior qualificação.
Os mais experientes ou permaneceram na Brigada do Sul, ou abandonaram o SFM para obterem melhor remuneração em outros Organismos do Estado ou na indústria privada.
Os que permaneceram na Brigada do Sul foram mal aproveitados, acabando por se adaptar à inércia característica do 2.º Serviço, que culminou com a extinção total dos Trabalhos Mineiros convencionais no SFM (Ver posts N.ºs 21 e 25).


Refiro-me, seguidamente, à actividade dos Agentes Técnicos de Engenharia, que subscreveram o documento que conduziu à minha demissão da chefia da 1.ª Brigada :de Prospecção

1 - José Coelho da Silva Gameiro
Data de 1944 o meu conhecimento deste Agente Técnico de Engenharia, quando ele foi destacado, durante alguns meses, para exercer funções, sob minha chefia, na Brigada de Prospecção Eléctrica (BPE), que então actuava, nas Minas de S. Domingos da Faixa Piritosa Alentejana.
Tinha-se instituído na Brigada do Sul, da qual dependia a BPE, a regra de fazer passar, pela BPE, todos os Agentes Técnicos de Engenharia da Brigada do Sul, para tomarem contacto com uma nova técnica de prospecção e com métodos de trabalho mais exigentes.
Foram-lhe distribuídos trabalhos de fácil execução, dos quais se desempenhou satisfatoriamente.
Voltei a encontrá-lo, em 1948, quando passei a chefiar a Brigada do Sul
Até fim de 1961, chefiou a Secção de Montemor-o-Novo e depois de 1962, manteve a chefia da Secção de Évora.
Nestas Secções, teve oportunidade de colaborar, durante 25 anos (descontado tempo dos anos de 1966 a 1968, em que esteve em comissão de serviço em Angola), em variados trabalhos de prospecção e pesquisa, sob minha orientação, tendo-se desempenhado satisfatoriamente das missões de que esteve encarregado.
De todas as Secções das Brigadas que dirigi, foi na de Montemor-o-Novo que passei mais longos períodos, para realizar tarefas fora do alcance de Gameiro.
Não sendo dos mais competentes, mostrou-se sempre muito esforçado, revelando qualidades de observação, em levantamentos litológicos, na detecção de indícios de mineralizações e na classificação de testemunhos de sondagens, quando não existiam Geólogos na Brigada.
Já me referi à qualidade do seu trabalho nas sondagens de Algares de Portel, que considerei superior à do Geólogo Carvoeiras Goinhas.
Sendo pessoa de trato difícil, sempre mantive com ele as melhores relações de trabalho. Este bom relacionamento era bem conhecido dentro do SFM e, por isso, foi grande a surpresa geral quando se soube que também a sua assinatura constava do documento acusatório.

2 - Alfredo Ferreira
Conheci este Agente Técnico de Engenharia também em meados de 1944, quando foi integrado na Brigada de Prospecção Eléctrica (BPE), que iniciava, sob minha chefia, a actividade na área da Mina de S. Domingos da Faixa Piritosa Alentejana.
Alfredo Ferreira foi, então, encarregado principalmente das observações com o equipamento Turam de prospecção electromagnética, tarefa fácil que cumpriu de modo satisfatório, durante alguns meses.
Voltei a encontrá-lo, quando fui nomeado Chefe da Brigada do Sul. Ele tinha acabado de ser designado Chefe da Secção de Alvito, que tinha a seu cargo investigações por trabalhos mineiros de um jazigo de magnetite. Foi substituir o Agente Técnico Manuel Camarinhas, que tinha sido requisitado pelo Ministério do Ultramar, para missão em Moçambique.
Durante a sua permanência na chefia da Secção de Alvito, que se verificou até 1952, desempenhou satisfatoriamente as tarefas de que foi encarregado.
Em 1959, foi transferido para Almodôvar, para dar colaboração ao Geólogo que chefiava a 2.ª Brigada de Levantamentos Litológicos (2.ªBLL), em novos levantamentos que viessem servir de base às campanhas de prospecção que se projectavam para localizar jazigos de cobre, dos quais se conheciam bom indícios.
O trabalho que realizou foi de mérito nulo, sobretudo por deficiente orientação do Geólogo que dirigia a 2.ª BLL.
Foi posteriormente transferido para a Brigada de Prospecção Geofísica, ficando a chefiar os trabalhos de campo, quando se deu início às campanhas de prospecção magnética, para detecção de jazigos de ferro magnético.
Em 1964, em resultado da reorganização do SFM, foi integrado na 1.ª Brigada de Prospecção, sob minha chefia. Até à data da minha demissão desta Brigada, em Janeiro de 1975, cumpriu com zelo as tarefas de que foi incumbido.
Foi sempre normal o meu relacionamento com este técnico. Um caso ocorrido, quando chefiou a Secção de Alvito, que me levou à instauração de inquérito para avaliar a veracidade de denúncia sobre a utilização de operário pago pelo SFM como seu servente, não afectou significativamente o meu relacionamento, perante as conclusões praticamente negativas desse inquérito, que me pareceu afectado por alguma benevolência

3 - Manuel Virgínio Ferreira Camarinhas
Também este Agente Técnico de Engenharia passou alguns meses na Brigada de Prospecção Eléctrica, sob minha chefia, durante o ano de 1944. O desempenho das tarefas que lhe foram confiadas foi satisfatório.
Voltei a encontrá-lo, em Fevereiro de 1948, quando comecei a exercer, interinamente, as funções de Chefe da Brigada do Sul.
Camarinhas tinha então a seu cargo a Secção de Alvito, onde decorriam, de modo artesanal, trabalhos de pesquisa de magnetites, com base em resultados de prospecção magnética efectuada pela empresa sueca ABEM.
Este tipo de trabalhos não permitia, obviamente, a valorização de um técnico em princípio de carreira.
No entanto, o Ministério do Ultramar, confiante de que Camarinhas já teria experiência de trabalhos de prospecção e pesquisa mineiras, requisitou-o, em Junho de 1948, para uma missão em Moçambique, com o objectivo de contribuir para um melhor aproveitamento das riquezas minerais deste território ultramarino.
Camarinhas, regressou, em meados de 1951, ao SFM, sendo então integrado na 2.ª BLL, para colaborar em levantamentos litológicos na região de Vila Viçosa – Alandroal, preparatórios de campanhas de prospecção geofísica e geoquímica que se projectava empreender, para investigação das existências de minérios de cobre, das quais se conheciam numerosos indícios.
Nem Camarinhas nem o Geólogo seu Chefe mostravam pressa em dar por terminada esta fase inicial da prospecção, com a total condescendência da Direcção do SFM, perante o excessivo prolongamento desta fase.
Quando em 1964, foi criada a 1.ª Brigada de Prospecção, Camarinhas voltou a ficar na minha dependência hierárquica, passando a ficar encarregado de dar apoio no terreno a campanhas de prospecção geofísica e geoquímica.
Não foi fácil a sua integração na 1.ª BP, não só porque tinha perdido qualidades de trabalho durante a sua longa permanência na 2.ª BLL, mas também pela sua inexperiência nas técnicas de prospecção. Houve, então, que transferir de outras Secções da Brigada, pessoal auxiliar já experiente nessas técnicas.
Com o decurso do tempo, Camarinhas foi adquirindo a experiência que lhe faltava, conseguindo tornar a sua Secção altamente eficiente.
O meu relacionamento com Camarinhas foi sempre muito cordial.
A melhor prova do que afirmo, está no texto que, a seguir, transcrevo de um cartão de carácter oficioso, que dele recebi, datado de 20-9-1974, isto é, 3,5 meses antes de ter subscrito o insultuoso documento que levou à Mina demissão da 1ª BP:
“… Quanto ao “resto”, o trabalho apresenta-se dia-a-dia mais desgastante para quem tem a ingrata missão de chefiar, pois o pessoal interpretou a liberdade do 25 de Abril como um “Pai Natal” bem carregado de benesses só com prendas para dar. Esquecem-se que não há saco nenhum tão grande em que se consigam meter tantas prendas.
Em contraste, nós funcionários do SFM estamos em vias de ver reduzidas, ou mesmo desaparecidas, as regalias de que se serviram para captar o pessoal técnico para a Província.
Colaborei e estou completamente de acordo com as sugestões e críticas apresentadas pelo pessoal técnico da 1.ª B. Prospecção.
Esperemos que, ao fim e ao cabo, acabemos por ser compreendidos.
Não quero terminar sem manifestar a esperança que o bom senso acabe por vencer este período tão tempestuoso.
Aproveito para o felicitar pelo casamento de um dos seus filhos a que junto os melhores votos de muitas felicidades.
Um abraço de muita amizade do
M. Camarinhas”.

As sugestões e críticas referidas nesse cartão oficioso são as que constam do documento subscrito pelo Engenheiro José Augusto Marques Bengala, em nome da Brigada, no qual se declara que a cumprir-se o teor da Ordem de Serviço sobre ajudas de custo, que foi posta em vigor, os funcionários veriam os seus proventos mensais reduzidos de 30% (Ver parte final do post N.º. 73), facto que não se verificou, por procedimentos fraudulentos cometidas pelos contratados da 1.ª BP, a conselho do Director-Geral.

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