quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

106 – A ofensiva contra os trabalhos a meu cargo. Continuação 2

Antes de analisar o caso do processo disciplinar que me foi “prometido” e a sua sequência, é de grande oportunidade, neste momento, destacar, dentre as muitas mensagens que dirigi à Comissão Coordenadora da Comissões de Trabalhadores do SFM, a que lhe enderecei em 9-10-76. Nesta mensagem, que consta de documento de 15 páginas dactilografadas a um espaço, faço 94 perguntas altamente comprometedoras para o Director-Geral, o Director do SFM e seus subservientes acólitos.
Estas perguntas estão distribuídas por três grupos: 1 - Orgânica do Serviço; 2 - Aspectos contabilísticos e financeiros; 3 - Aspectos técnicos, legais, administrativos, etc.
A Comissão, nos termos estatutários, tinha obrigação de procurar respostas, se realmente estivesse interessada em lutar pela eficácia do SFM e pela defesa dos interesses dos trabalhadores.
Todo o documento era de grande actualidade e importância. Dele transcrevo, a seguir, apenas como amostragem, algumas passagens:

São de recentes discursos do Senhor Presidente da República as afirmações seguintes:
“ Cidadãos conscientes não podem pactuar com qualquer sabotagem económica, mesmo que se disfarce sob a aparência da defesa de interesses dos trabalhadores; cidadãos conscientes não podem permitir a ineficácia e o desmazelo dos serviços públicos; cidadãos conscientes não podem pactuar com a impunidade do crime; cidadãos conscientes não podem ficar calados perante a corrupção e a incompetência.
Neste momento que o Pais atravessa, se alguém não encontrar à sua volta, no local de habitação ou de trabalho, nada que deva melhorar, ou não é consciente ou não é português.
É preciso que fique claro que se não se puser termo à desagregação dos serviços públicos, à sua instrumentalização por organizações políticas, à corrupção que se manifesta em total impunidade, à incompetência que se tem generalizado a todos os níveis, à existência de instituições de que ninguém conhece utilidade, ou qualquer contributo – se não se puser termo a estas situações, sublinho – seremos responsáveis por ter posto em causa um dos alicerces em que assenta a sociedade democrática.
Reconstruir o Estado, fechando o que é inútil, concentrando os recursos disponíveis, criando unidades com técnicos capazes, simplificando processos e modernizando métodos, melhorando as condições de trabalho e de remuneração – eis um programa que não pode deixar indiferente quantos devotam à função pública a sua capacidade de servir o País”.

Porque me sinto cidadão consciente e não posso ficar indiferente nem calado perante a ineficácia do Serviço de Fomento Mineiro, as sabotagens económicas, a corrupção e a incompetência que se vêm generalizando em total impunidade, a muitos níveis; porque me parece que há muito a corrigir, fechando o que é inútil, criando unidades com técnicos capazes, simplificando processos e modernizando métodos, melhorando as condições de trabalho e de remuneração; venho chamar a vossa atenção para o cumprimento do vosso dever de “controlar a gestão” do Serviço de Fomento Mineiro,
sem vos deixardes perturbar por atitudes intimidativas, venham elas donde vierem.
A realidade é que a indústria mineira nacional está agonizante e até um membro do Governo, em data bem recente, veio publicamente afirmar que “nas indústrias extractivas, estamos a andar para trás”.
Enquanto isto acontece, no departamento do Estado, que há 36 anos foi criado para revitalizar o sector, efectuam-se dispendiosas reuniões, onde se tratam essencialmente temas secundários, tais como emissões de ridículas Ordens de Serviço sobre designações dos responsáveis pelas chefias dos departamentos, assuntos de carácter burocrático, questões correntes de administração; e, quando se abordam os reais problemas de fomento mineiro, as decisões, são, de modo geral, desastrosas, face à incompetência generalizada a que aludiu o Senhor Presidente da República.
...

Há, concretamente, algumas questões que desejo apresentar, solicitando que essa Comissão procure, se entender útil, obter as respectivas respostas:

1.3 – Porque se excluíram os Chefes de Serviço da possibilidade de serem eleitos para a Comissão de Direcção? Que se pretende significar por “inerência dos seus cargos?
Porque, não podendo ser eleito para a mesma Comissão, “por inerência do seu cargo”, o Director do Serviço aparece nela como Presidente?
1.4 - Qual o mérito de uma Comissão de Direcção, cujos membros são eleitos através de votação, na qual têm direito a voto, em plena igualdade, técnicos qualificados, com provas dadas em dezenas de anos de actividade e trabalhadores analfabetos ou semi-analfabetos recentemente admitidos?
1.5 – Que mérito terá a Comissão de Planeamento escolhida por uma Comissão de Direcção, de cujo mérito se duvida?

1.21 – Quem controla a actividade da 1.ª Brigada de Prospecção? Tem o Director do Serviço competência técnica para apreciar se está a fazer-se correctamente a aplicação dos métodos geológicos, geofísicos e geoquímicos à prospecção mineira?

2.3 – Onde podem consultar-se os Livros de Contabilidade da grande empresa que é (ou deveria ser) o Serviço de Fomento Mineiro, de modo a ter-se uma informação actualizada da situação financeira e a poderem fiscalizar-se as despesas feitas?
Onde estão os documentos que permitam avaliar quanto custa uma análise geoquímica de tungsténio, uma análise geoquímica de cobre, chumbo ou zinco, por absorção atómica, uma análise geoquímica dos mesmos elementos pelo clássico método da ditizona, os custos das diversas análises por métodos químicos, espectrográficos, por raios X, etc?
Como se pode saber o custo médio actual do ponto de prospecção por cada um dos métodos geofísicos que o Serviço de Fomento Mineiro está a aplicar?
Se ainda se fazem trabalhos mineiros, quanto custa, actualmente, em média, o metro de galeria e o metro de poço, em condições normais, excluídas as operações de esgoto?

2.5 – Quais os reflexos da actual (des)organização do Serviço nos dispêndios que se efectuam e na sua funcionalidade?
2.6 – Quanto têm custado ao País, em horas de trabalho, despesas de deslocação e ajudas de custo, as diversas Comissões existentes? Qual o aumento de produtividade conseguido?

2.11 – Quem controla as actividades dos funcionários que dão lugar a ajudas de custo, despesas de deslocação e subsídios de campo e quem verifica a veracidade do preenchimento dos boletins itinerários da maioria dos funcionários?

3.2 – Quais os resultados da actividade do Serviço que, durante anos, decorreu sob orientação do Senhor Director-Geral de Minas, nas regiões de Tarouca, Freixo de Numão e Lagoaça? Onde podem consultar-se os relatórios finais dos estudos empreendidos nessas regiões? Quantas minas estão em laboração com base nesta actividade do Serviço?
3.3 – Pela Ordem de Serviço n.º 18/75, foi criado um Grupo de prospecção de scheelites, composto por 3 geólogos, um prospector, um auxiliar de prospecção, um ajudante de preparador, um ajudante de laboratório, dois motoristas, um jornaleiro e diverso pessoal eventual a contratar nos locais de trabalho.

Passou um ano.
…Tenho conhecimento, através de acta divulgada, de que foi entregue um projecto de sondagens para continuação do estudo do chamado “jazigo de Cravezes”.
A este respeito, ocorre-me perguntar:
3.3.1 – Qual a preparação técnica em prospecção mineira dos geólogos integrados na equipa mencionada na Ordem de Serviço N.º 18/75? Onde adquiriram essa preparação?
3.3.2 – Quais os estudos feitos nas vastas áreas referidas nas alíneas a) e b) da Ordem de Serviço N.º 18/75? A que resultados têm conduzido?
3.3.3 – Onde podem consultar-se os projectos de prospecção, relatórios de trabalhos e projectos de sondagens que têm sido apresentados?
3.3.4 – Onde podem consultar-se os pareceres dos técnicos que sobre tais documentos se manifestaram?
3.3.5 – Foram cumpridos os prazos de execução e os custos previstos? Podem consultar-se os mapas comparativos da previsão com a execução?
3.3.6 – Que métodos têm sido aplicados, além dos levantamentos geológicos e geoquímicos na área de Cravezes? Foi ensaiada a aplicação de métodos geofísicos?
3.3.7 – Qual a confiança que merece uma amostragem que se declarou ter sido feita por pessoal não especializado? Porque não prepararam os geólogos pessoal especializado em amostragem, de modo a não ser necessário protegerem-se com tal declaração, na qual está implícito admitirem que essa importante operação resultou defeituosa?

3.4 – Quais as conclusões de ordem prática a que chegou o geólogo Santos Oliveira com as investigações a que, durante anos, se dedicou, sobre a presença de estanho nas micas?
Quais os reflexos destas conclusões na prospecção de minérios de estanho no nosso País?
3.5 – Quais os resultados práticos das campanhas de prospecção de antimónio que, durante anos, decorreram na faixa antimonífera e aurífera do Douro? Onde podem consultar-se os respectivos relatórios, excluído o que foi publicado no CHILAGE?
3.6 – Onde podem consultar-se os relatórios das investigações a que o Serviço procedeu nas Minas de ouro de Valongo?

3.11 – Onde pode consultar-se o relatório final dos estudos realizados pelo 2.º Serviço, durante cerca de una dezena de anos, nas Minas de cobre, chumbo e zinco de Talhadas?
3.12 – Porque se decidiu fazer o estudo do jazigo de Talhadas e não se preferiu dar apoio às Minas do Braçal, quando estas se encontravam ainda em laboração, evitando que a sua actividade viesse a paralisar completamente e até a respectiva concessão viesse a ser revogada?
3.13 – Que justifica que se tivesse revogado esta antiga concessão mineira e permitido o desmantelamento das oficinas de metalurgia de chumbo que nelas existiam desde longa data e ainda em época bem recente estiveram em laboração?

3.16 – Porque não tem o Director do Serviço de Fomento Mineiro facilitado o desenvolvimento do 1.º Serviço, de modo a possibilitar estudos programados em outras regiões do Norte do País, entre as quais avulta a das Minas de ouro de Jales?

3.24 – Porque deixou de se publicar em “Estudos, Notas e Trabalhos do Serviço de Fomento Mineiro” o relatório anual dos trabalhos efectuados pelo Serviço, com discriminação completa dos seus custos?
Será que, após a saída parta Lisboa do Eng.º Técnico F. Macieira, ninguém ficou apto a compilar os elementos necessários à elaboração deste importante documento de avaliação da actividade do Serviço?


3.30 – Quem controla, oficialmente, a actividade da Companhia americana Union Carbide Exploration Corporation, em prospecção de minérios de tungsténio, nas Minas de Covas da região de Caminha, de modo a garantir-se que os resultados dos seus trabalhos fiquem completamente documentados e possam ser posteriormente utilizados, sobretudo se a Companhia concluir que a área não tem suficiente interesse para se justificar a fixação no País como empresa exploradora?
3.31 - Quem controla oficialmente a actovidade da Companhia canadiana Noranda, em prospecção de cobre, níquel e outros metais, nas zonas de rochas básicas e ultra-básicas de Bragança e Vinhais?
Foram entregues todos os documentos respeitantes à actividade que a Noranda desenvolve nessas áreas?
Quem está procedendo aos respectivos estudos, para avaliar se se justifica retomar a investigação das zonas em causa?
3.32 – Quem controlou ou acompanhou, devidamente credenciado, a actividade de outras Companhias ou Organizações, que têm feito trabalhos de prospecção em Portugal, nomeadamente Anglo-American em prospecção de minérios de ouro, B.R.G.M. em colheita de elementos para eventual campanha de prospecção de scheelite?
Existem no Serviço de Fomento Mineiro todos os relatórios respeitantes aos estudos a que estas entidades têm procedido?

3.40 – Quem controla o arquivo técnico do Serviço? Como se explica que relatórios importantes tenham desaparecido deste arquivo e outros nem sequer lá tenham dado entrada?

3.44 – Em que disposição legal se fundamenta o Director do Serviço para mobilizar diariamente uma viatura e o respectivo motorista. para as deslocações entre a sua residência e o Serviço, sendo certo que o autocarro do Serviço de Fomento Mineiro lhe passa à porta e o seu horário coincide , em geral, com o dos restantes funcionários que utilizam o autocarro?
3.45 – Porque surgem sistematicamente nas instalações do SFM em S. Mamede de Infesta, funcionários técnicos em viaturas do Estado? Qual o trabalho que justifica tal utilização dessas viaturas? Porque não são entregues nas oficinas, quando não estão em serviço oficial?

3.48 – Como se justifica que viaturas adquiridas para trabalhos de fomento mineiro sejam destacadas para serviços em Lisboa, que nada têm a ver com tais trabalhos? Tem o Senhor Director-Geral direito a viaturas privativas, para uso em serviço e fora dele? Foram as viaturas que utiliza adquiridas para esse fim? Porque não fez uso desse direito o Director-Geral anterior? Porque andavam ou talvez andem ainda as viaturas ao seu serviço sem placa “Estado”?

De tudo o que ficou exposrto – adfirmações que fiz, dúvidas que formulei, esclarecimentos que pedi –e de algo mais que se me não afigura agora necessário apresentar - fácil é inferir quão urgente é a sindicância que oportunamente pedi fosse instaurada à Direcção-Geral de Minas, com especial imcidência no Serviço de Fomento Mineiro.

Porque, como já declarei, estou pouco esperançado que o Governo queira mandar proceder ao inquérito pedido pela Comissão de Saneamento e Reclassificação do MIT, fico confiante que essa Comissão, no uso dos poderes que a Constituição lhe confere, procure pelos meios ao seu alcance, combater as sabotagens económicas, a corrupção e a incompetência que se manifestam em total impunidade, a degradação completa a que se vai chegando; em suma, procure, sem tibiezas, levar o Serviço de Fomento Mineiro a ser um Organismo estatal renovado, dinâmico, capaz de resolver eficazmente e em tempo oportuno, os importantes problemas nacionais que motivaram a sua criação.”

Deste ofício enviei cópia ao Director-Geral


A Comissão Coordenadora, nos 8 meses que teve para dar resposta a esta e a outras mensagems que lhe enviei, manteve-se numa total passividade.
Quando o Director-Geral teve a ousadia de se apresemtar na reunião de 20 de Maio de 1977 desta Comissão, a solicitar o seu acordo relativamente ao processo disciplinar que a Comissão dita de Dfirecção do SFM pretendia me fosse instaurado, o mínimo que eu podia esperar era que o Director-Geral tivesse sido confrontado com as perguntas contidas nas minhas mensagens, em especial com aquela de que acima transcrevi algumas passagens.
Deveria ter-lhe sido concedida oportunidade de se defender das muitas acusações de que tinha sido alvo
A Comissão Coordenadora não teve, porèm, tal coragem,
No entanto, o Director-Geral não foi tão bem sucedido como esperava.
O que se passou nessa reunião, nunca chegou a saber-se, pois as actas, como muitas vezes denunciei, não traduziam fielmente os acontecimentos ocorridos.
A sua elaboração era confiada a pessoa(s) incompetente(s) e suspeitas e o que se divulgava não era subscrito por todos os intervenientes na Mesa que presidia às reuniões, podendo alguns deles recusar-se a assumir as responsabilidades do que constava dessas actas..
Na acta de 20-5-77, refere-se o que se caracterizou de “no essencial”.
E esta matéria “essencial” é já bem elucidativa do que se terá passado no que fora tido como “não essencial”.
Ainda houve, na Comissão Coordenadora, quem percebesse que mais uma monsruosa injustiça estava a preparar-se.
No próximo post analisarei as posições assumidas pelas diferentes Comissões e pelo Director-Geral e a sequência da ofensiva contra os trabalhos a meu cargo.

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