segunda-feira, 5 de setembro de 2011

185 - Nova discussão sobre Plano Mineiro Nacional. Continuação 9


Prossigo na análise do documento “Prospecção Mineira em Portugal. Áreas potenciais de aplicação de projectos”, produzido pelo Geólogo José Goinhas, com o intuito de contribuir para a elaboração de um “Plano Mineiro Nacional”, cuja apresentação tinha sido anunciada para 1984, pelo IX Governo Constitucional.

Ainda relativamente à descoberta do jazigo de Neves – Corvo, é deveras surpreendente o insignificante relevo que José Goinhas dá ao papel do SFM neste acontecimento, que iria tornar o País o maior produtor europeu de minério de cobre.

Apesar de manifestar o propósito de ajudar a resolver os graves problemas com que se debatia a nossa indústria mineira, não procurou aprofundar como se chegou àquela notabilíssima descoberta, para daí extrair directivas, para obter êxitos semelhantes.

Se tivesse feito cuidadosa análise e não estivesse comprometido com acções negativas, que estiveram na base da decadência dos “serviços oficiais”, oportunamente criados pelo Decreto-lei N.º 29725 de 1939, teria usado o “direito à indignação”, institucionalizado por Mário Soares, e manifestado profunda revolta pela despudorada apropriação da descoberta, pelos técnicos franceses.

É inegável que a Associação, em que participaram técnicos franceses, teve o mérito da mandar implantar, no máximo da anomalia gravinétrica detectada pelo SFM, a sondagem que revelou a existência do jazigo.

Mas se formos a interpretar os factos, à maneira francesa, então o real descobridor foi o operário que manobrava a sonda, quando surgiram testemunhos com o minério!

Os antecedentes de 30 anos de persistente e disciplinada preparação, até a descoberta se tornar iminente, só faltando sondar a anomalia definida pelo SFM, foram sorrateiramente ocultados!!

A acreditar nas afirmações de Delfim de Carvalho (Ver posts Nºs 37 e 41), sou até levado a pensar que terá sido ainda a minha conversa com Xavier Leca, em Aveiro, que levou este Geólogo a continuar a sondagem, na qual já não depositava esperança alguma, quando a Associação, desanimada com os seus insucessos, já se preparava para rescindir o contrato com o Estado!

De facto, na conversa em Aveiro, eu voltei a acentuar, com veemência, a importância da anomalia gravimétrica, afirmando-lhe ser para essa zona que eu faria incidir os trabalhos, se a 1.ª Brigada de Prospecção ainda estivesse a meu cargo!

Mas Goinhas não ficou indignado, nem revoltado com o facto de Jean Audibert, Presidente do BRGM ter publicado notícia, atribuindo a descoberta aos prospectores deste Organismo estatal francês, sem a mínima alusão, ao papel fundamental do SFM, e desconsiderando até os técnicos portugueses integrados na Associação.

Também não se mostrou indignado por saber que, estando a descoberta iminente, quando a Associação conseguiu apoderar-se da zona onde o jazigo ocorre, afinal o que aconteceu foi o protelamento do êxito, com forte responsabilidade do Geólogo francês Xavier Leca.

E terá considerado justificável que Xavier Leca, apesar de me ter cognominado pai do jazigo, tenha sido distinguido com condecoração, pelo Governo francês, em cerimónia solene realizada em Portugal, com presença das autoridades portuguesas, entre as quais se destacou o Director-Geral de Minas.

Se justiça fosse feita, Leca em vez de condecorado, deveria ter sido responsabilizado por não ter valorizado uma invulgar anomalia gravimétrica, para a qual não tivera o elementar cuidado de procurar explicação!

Impressiona a preocupação de José Goinhas em evitar mencionar o Serviço de Fomento Mineiro, quando se refere às descobertas, preferindo citar os “serviços oficiais” ou a Direcção-Geral de Geologia e Minas, que era, então dirigida por um Geólogo, apesar de saber ter sido nulo ou mesmo negativo o contributo do Director-Geral.

Tal preocupação tem implícita a atitude de um aguerrido grupo de jovens e presunçosos Geólogos, no qual ele se incluía, que em vez de se preparar para fazer a Geologia de qualidade, que deles se esperava, e que era essencial para o correcto cumprimento dos programas de prospecção mineira, se ocupava sobretudo numa luta pouco dignificante pela conquista dos cargos directivos da DGMSG, tradicionalmente ocupados por Engenheiros de Minas.

Deveras lamentei o apoio que o Geólogo António Ribeiro, detentor de valioso currículo, adquirido em real trabalho de campo, o que constituía honrosa excepção, deu a esse grupo que, na realidade, se mostrara incapaz de seguir o seu exemplo, acabando por desprestigiar a Geologia, cuja importância insistentemente exaltava, como se isso fosse necessário!!!

A Geologia sempre tinha sido um elo fraco na dinâmica do SFM e o que de melhor se fez, no âmbito dos levantamentos, no Sul do País, não ficou a dever-se a Geólogos dos “serviços oficiais”, como tenho assinalado, frequentemente.

A triste realidade, foi que o SFM teve a infelicidade de recrutar, para a zona Sul do País, Geólogos, que não tinham preparação mineira e não demonstraram significativo empenho em melhorar os estudos feitos anteriormente ao seu ingresso.

A grave lacuna inicial, que se fez sentir, nesta matéria, foi resolvida por mim próprio e por pessoal que instruí, dentro das minhas possibilidades.

Quando me foi proporcionada a oportunidade, passei até a melhorar a preparação de futuros Geólogos, encarregando-me de reger cadeiras de Prospecção Mineira, no departamento de Geologia da Faculdade de Ciências do Porto e tive a satisfação de saber que os Geólogos formados por essa Faculdade eram preferidos pelas empresas privadas que realizavam trabalhos de prospecção, no País.

Na sua renhida luta pela conquista dos cargos directivos, os Geólogos tiveram pleno sucesso, mas o resultado foi a enorme decadência a que chegou a DGGM, sobretudo no seu SFM.

Eu aceitaria, com naturalidade, que Geólogos ocupassem lugares cimeiros, na DGMSG, desde que tivessem competência para deles se desempenharem cabalmente, até porque reconhecia, no caso do SFM, serem pouco qualificados os Engenheiros de Minas do seu Quadro.

Aliás, as minhas melhores relações sempre foram com Geólogos que se dedicavam honestamente a estudos laboratoriais, ou exerciam funções em Universidades ou Empresas privadas.
Ainda hoje é com eles e com meus ex-alunos que tenho o prazer de confraternizar, com alguma regularidade.

Uma das explicações para o reduzido realce que Goinhas dá ao papel do SFM na descoberta de Neves – Corvo, encontrar-se-á no facto de ele não ter participado em qualquer das fases que conduziram a tão importante sucesso.
Mas tendo estado presente nas reuniões periódicas, que decorriam sob minha direcção, na sede da 1.ª Brigada de Prospecção em Beja, onde todos os problemas, originados pelos trabalhos em curso, eram analisados abertamente, tinha obrigação de conhecer bem a metodologia que conduziu à descoberta.

Goinhas, se tivesse estado atento às verdadeiras lições que eu prodigalizava, nessas reuniões, com a ilusão de que poderia transformar os técnicos nelas presentes, em verdadeiros especialistas, teria percebido que a prospecção mineira se faz por fases, disciplinadamente e obedecendo a critérios científicos.

Teria, portanto concluído, que quando a investigação da área de 4000 km2 passou a ficar a cargo da Associação constituída pela Sociedade Mineira de Santiago, o BRGM francês e a Sociedade Mineira e Metalúrgica de Penarroya Portuguesa L.da, aquela disciplina deixou de ser respeitada, com a inevitável consequência de ser consideravelmente protelada a descoberta, que estava iminente.

Goinhas nem sequer se mostrou desgostoso com a total passividade do pessoal da 1.ª Brigada de Prospecção que esteve envolvido nos trabalhos que conduziram à descoberta.

Mas a principal explicação para a sua atitude está na premente necessidade de ocultar que tinham sido as minhas "deficiências no planeamento, execução e controle das vastas e delicadas tarefas a cargo da 1.ª Brigada de Prospecção", causadoras de "enorme prejuízo ao Estado" durante 30 anos, conforme documento que subscreveu (Ver post N.º 83), que estiveram na base dessa descoberta.

O facto de, durante o quinquénio que Goinhas escolheu para amostragem do que era a “Prospecção Mineira em Portugal”, não ter acontecido êxito algum, demonstra que não foi extraída a lição de Neves – Corvo.

A disciplina que vigorava na 1.ª Brigada de Prospecção tinha sido severamente desrespeitada.

Um elucidativo exemplo é o comportamento do Geólogo Delfim de Carvalho, que se assumiu como principal dirigente desta Brigada, quando conseguiu afastar-me da sua chefia.

Na ânsia de apresentar êxitos, demonstrativos de que a minha orientação superior se tinha tornado desnecessária e até prejudicial, não hesitou em despender avultadas verbas do erário público em sondagens profundas, na zona do Salgadinho da Região de Cercal – Odemira, sem base científica, para se arvorar em descobridor de jazigo que teve a ousadia de comparar a Neves – Corvo.

Não foram publicadas reservas, nem teores médios desta ocorrência, para cuja descoberta ele nada tinha contribuído (Ver post N.º 86), mas é óbvio que a promoção a jazigo é atitude desonesta, confiante na ignorância de dirigentes que tinham obrigação de ter adequada preparação nestas matérias, impedindo tais desvarios.

É também digno de registo o total insucesso das mais de 20 Empresas privadas, na sua maior parte estrangeiras, que tinham adquirido direitos de prospecção em parcelas do território nacional.
Tinha curiosidade em saber quais os técnicos do SFM - se é que foi designado algum - encarregados de acompanhar os estudos destas Empresas e quais as suas diligências para deles resultar real benefício para o País.

Como já tive ocasião de salientar, nem sempre as actividades destas Empresas é disciplinada, em grande parte por motivo dos curtos prazos concedidos para as investigações.
Quando fui o representante do Estado junto de uma importante Companhia canadiana, tive um papel muito activo, na orientação dos seus estudos e deveras lamentei que nem sempre os meus conselhos tivessem sido tidos na devida consideração. Desse facto resultou, entre outros erros, a perda de Neves – Corvo (Ver post N.º 37)!

Continua…

Sem comentários: