segunda-feira, 30 de março de 2009

57 – A vaca, a gasolina e os corredores dos edifícios do SFM

Houve quem passando perto do edifício principal do SFM estranhasse a presença frequente de um funcionário à janela absorvido em contemplação da paisagem exterior.
Maior estranheza manifestou quando soube que esse funcionário era …o Director.

Estava o Director, numa dessas atitudes contemplativas, quando entra no seu gabinete o Agente Técnico de Engenharia ABDC e lhe expõe uma situação delicada que tinha herdado. Tratava-se de um caso de silicose diagnosticada a um operário da sua equipa que transitara de uma extinta Secção do SFM.

O Director, concentrado como estava na sua contemplação, pouca atenção dava à exposição de ABDC. Em dado momento, a demonstrar o seu apurado espírito de observação, declara: “Aquela vaca passa aqui, todos os dias à mesma hora”. Esta atitude só não deixou ABDC perplexo, porque já se habituara a observações do género!

Em outra ocasião, expunha ABDC um caso a resolver e o Director mantinha-se bastante alheio à matéria em causa, tão absorvido se encontrava a observar a extensa fila de automóveis que aguardava a vez para encher os seus depósitos de gasolina, em posto de abastecimento situado na Via Norte, em período de grande carência deste combustível. Aparentemente encantado, exclamou, com veemência: “Acabou-se a gasolina!”. Por esta não esperava ABDC, conforme me declarou, desabafando comigo, como era seu hábito.

Outro caso que bem define o Director que tive que suportar durante 15 anos passou-se comigo.
O Director entra no meu gabinete para pedir que lhe ceda um dos dois Agentes Técnicos afectados, no Norte, ao Serviço de Prospecção sob minha chefia, para dar apoio em matéria de topografia a outro departamento do SFM.
Estranhei o pedido, pois sempre considerei fundamental que em todos os departamentos técnicos existisse pessoal habilitado a fazer topografia. No Alentejo, eu tinha preparado muitos funcionários, vários deles apenas com a 4.ª classe de Instrução Primária a desempenhar-se, não só dos trabalhos de campo, como do cálculo das cadernetas e da implantação dos resultados em mapas finais. Só não ensinei cálculos de triangulações, por envolverem uso, em larga escala, de funções trigonométricas.
Nas minhas funções docentes na Faculdade de Ciências do Porto, cheguei até a proporcionar instrução nesta matéria a vários Geólogos do SFM, em trabalhos, tanto no campo como no gabinete, para não ficarem na dependência do trabalho de Agentes Técnicos de Engenharia, cuja qualidade era, por vezes, discutível.
Dado que para as imensas tarefas a resolver no Norte do País, além de Geólogos envolvidos em cartografia para os Serviços Geológicos e em estudos de testemunhos de sondagens, apenas dispunha de dois Agentes Técnicos de Engenharia de modesta qualidade, reagi dizendo que o técnico no qual se mostrara interessado, tinha trabalho distribuído que o absorvia completamente.
Reagiu prontamente o Director: “Eu vejo-o sempre a passear pelos corredores!” Surpreendido, disse apenas: “Eu não sabia disso, porque não frequento assiduamente esses corredores!”

Outros casos irei revelar, a propósito de variados temas, que contribuem para bem definir um Director que conseguiu permanecer no cargo durante década e meia!

Sem comentários: