terça-feira, 23 de novembro de 2010

149 – Atitudes de Jorge Gouveia perante a rescisão de Union Carbide de todos os seus contratos de prospecção mineira. Continuação

No relatório da actividade do Serviço de Prospecção Mineira, respeitante ao 1.º trimestre de 1980, que enviei ao Director do SFM, Jorge Gouveia, fiz referência a factos demonstrativos da obstrução aos trabalhos a meu cargo e à negligência quanto à utilização de dinheiros públicos e à conservação de valiosos elementos de estudo.

A adicionar ao que revelei no post anterior, a seguir transcrevo, o que escrevi, relativamente a mais alguns desses lamentáveis factos:

4 – Incúria no tratamento de valioso material de sondagens alienado por Union Carbide, a favor da Direcção-Geral de Minas

Três meses e meio passaram sobre a data do ofício que endereçamos, em 5-12-79, ao Director do Serviço, acerca dos testemunhos que Union Carbide pretendia alienar a favor da Direcção-Geral de Minas, até que o funcionário representante do Director no núcleo de S. Mamede de Infesta, para “assuntos de rotina” se decidisse a cumprir a ordem que recebera de promover o transporte desse material para as instalações de S. Mamede de Infesta.
Argumentou-se que o problema não fora resolvido em Dezembro de 1979, aproveitando transporte gratuito oferecido por Union Carbide, porque nós estivéramos ausentes.
No entanto, os transportes foram iniciados com total desrespeito pelas recomendações a que aludimos no número anterior.
Não se procurou identificar os testemunhos, antes de os retirar do local onde se encontravam metodicamente acondicionados.
Não houve o elementar cuidado de levar caixas para substituir as que apresentassem indícios de má conservação.
Não se estabeleceu qualquer plano para as cargas e descargas.
Não se aproveitou a nossa sugestão de utilizar pessoal da Secção de Caminha para as cargas em Covas, tendo-se preferido deslocar, de S. Mamede de Infesta ou de mais longe ainda, diversos funcionários (talvez 4 ou 5), em percursos superiores a 200 km, durante vários dias, com uso de duas viaturas (1 jeep para pessoal; um pequeno camião para os testemunhos)!!
Afinal, uma vez mais se comprova que as dificuldades de meios de transporte e de combustíveis só existem, em certos casos!
Em S. Mamede de Infesta, empilharam-se as caixas, ao ar livre, junto a um muro, de modo muito pouco cuidadoso, tendo algumas já caído, e prevendo-se que a outras, em breve aconteça o mesmo. Há já testemunhos dispersos pelo terreno, sendo duvidoso que se possa reconstituir a sua origem.
Receamos que grande parte do material transportado esteja já inaproveitável, constituindo pouco mais que lixo.
Não nos tendo sido facultada a documentação entregue por Union Carbide, obviamente nos poderia ser interdito ou revestir-se-ia de um reduzido interesse, o exame dos testemunhos.
Este é mais um assunto para o qual chamamos a atenção superior. O País não pode mais permitir que tão inconscientemente se destruam valiosos documentos de estudo, que custaram muitos milhares de contos a produzir.

5 – Hostilidade perante uma oferta de colaboração do Departamento de Mineralogia e Geologia da Faculdade de Ciências do Porto, em estudos de testemunhos de sondagens efectuadas na região de Caminha.
O Departamento de Mineralogia e Geologia da Faculdade de Ciências do Porto, teve conhecimento de Union Carbide ter abandonado a sua actividade de prospecção mineira na região de Caminha, e de ter alienado, a favor da Direcção-Geral de Minas, os testemunhos das numerosas sondagens, cuja execução promoveu.
Consciente do valor deste material, para investigações de carácter científico, endereçou, em 20 de Fevereiro, ao Director-Geral de Minas, ofício oferecendo colaboração, em tais investigações.
O Assistente do Departamento, Licenciado João Manuel Domingues Coelho, que já em 1977 havia efectuado, na região de Caminha, um estágio de fim de curso, mostra-se interessado em realizar, sob directa orientação do Professor Montenegro de Andrade, novos estudos, na mesma região, socorrendo-se dos testemunhos das sondagens e de mais elementos que porventura lhe pudessem ser facultados.
Tais estudos seriam aproveitados para a preparação da sua tese de doutoramento e seriam, obviamente, comunicados à Direcção-Geral de Minas.
Dos contactos que temos tido com o Professor Montenegro de Andrade e com o Dr. João Coelho, no Departamento de Mineralogia e Geologia, onde também exercemos funções docentes, temo-nos apercebido da lamentável hostilidade com que a oferta foi acolhida.
Alegando que a região não tem interesse económico, face à deserção, primeiro do grupo checo, agora da Companhia americana, e empregando outra frágil argumentação, sem abertamente negar autorização para fazer uso do material, tem-se inventado toda a série de obstáculos para protelar o consentimento real, dando uma imagem exterior péssima do funcionamento interno do Serviço de Fomento Mineiro.
No final do trimestre, ainda o Dr. João Coelho era mantido na incerteza de poder fazer a sua tese com base na região de Caminha, ou se teria de escolher outro tema.
De salientar o contraste com a atitude de Union Carbide, aquando do estágio, a que nos referimos.
Não só todos os elementos de estudos lhe foram abertamente facultados, como lhe foi prestada conveniente assistência. E tratava-se de empresa privada que até poderia ter interesse em não dar a conhecer todos os seus resultados.
Vários logs de sondagens cuja consulta é, presentemente dificultada, foram elaborados pelo Dr. João Coelho.
Agora é um Organismo oficial, cuja missão deveria ser fomentar o desenvolvimento da indústria mineira nacional, a criar obstáculos a estudos científico de outro organismo oficial, cujas repercussões de natureza económica são, de momento, impossíveis de prever, mas que podem ser muito importantes.

9 – Obstrução à sequência normal dos trabalhos de prospecção do 1.º Serviço. Consequente protelamento na concretização de previsíveis descobertas de jazigos minerais.
Os levantamentos geológicos, geofísicos e geoquímicos, por mais bem conduzidos que sejam, raramente poderão, por si sós, levar à descoberta de concentrações minerais susceptíveis de exploração rendível, mormente em países com tradição mineira.
Em campanhas de prospecção criteriosamente orientadas, tais levantamentos serão constantemente seguidos de sondagens e outros trabalhos de investigação directa, tais como sanjas, galerias, poços, etc.
Durante cerca de 8 anos, a Secção de Caminha, pôde contar com o apoio de uma sonda pata investigar os resultados da aplicação das técnicas referidas.
Tornou-se, assim, possível chegar às descobertas que permitiram, não só prolongar a vida da mina de tungsténio de Valdarcas e reabrir à exploração as minas igualmente de tungsténio de Cerdeirinha e Fervença, mas também encorajar a importante Companhia americana Union Carbide Exploration Corporation a firmar contratos de prospecção e pesquisa mineira, na região de Vila Nova de Cerveira - Caminha – Ponte de Lima.
Em Setembro de 1976, decidiu o Director do Serviço, então em funções, eng.º Múrias de Queiroz, sem qualquer fundamento válido, apenas com os propósitos destrutivos constantemente por nós referidos em relatórios e outros documentos, retirar a sonda da região de Caminha.
Os trabalhos de prospecção continuaram, naturalmente a produzir resultados que justificam sondagens.
No entanto, a sonda não mais regressou à região de Caminha, persistindo até ao presente, a obstrução superior, nesta matéria, não obstante o eng.º Múrias de Queiroz ter já sido substituído no cargo de Director, há cerca de um ano.
No que respeita aos trabalhos de prospecção na Faixa Metalífera da Beira Litoral, que decorreram a cargo da Secção de Talhadas, sem interrupção, desde 1968 até que foram suspensos em Janeiro de 1980, há, também, a registar, com mágoa, que se mantêm sem investigação por sondagens, resultados de excepcional interesse.
Já oportunamente nos referimos ao “pouco entusiasmo” que o Director-Geral, eng.º Soares Carneiro manifestou pela Faixa, para justificar a falta de andamento ao projecto de sondagens para a região do Braçal, que apresentamos em 1974.
A leitura do Programa para 1980 revela-nos, por exemplo já um facto muito estranho.
Uma sonda do Serviço foi utilizada, durante bastante tempo, para efectuar três furos longos, com um comprimento global superior a 1500 metros, dentro de área concedida a poderosa Companhia estrangeira.
Não nos parece normal que se prejudique a actividade própria do Serviço, para beneficiar uma Companhia estrangeira, cuja capacidade técnica e financeira é mundialmente reconhecida.
A Companhia seria, certamente, a principal interessada em investigar as possibilidades mineiras, dentro das suas concessões, se considerasse justificável o correspondente esforço financeiro.
É para nós incompreensível que se executem trabalhos de prospecção visando a descoberta de jazigos minerais, e se trave deliberadamente a sequência de estudos, sobretudo quando há resultados que permitem prever êxitos.
Quem estará interessado na não concretização de êxitos?
Será este o modo mais eficaz de fomentar o desenvolvimento da indústria mineira nacional?

Pelo que vinha denunciando e provavelmente por muitas outras razões, tornara-se demasiado escandaloso manter Jorge Gouveia, por mais tempo, na direcção do SFM.
Em meados de 1983, constou que, por pressões externas à DGGM, Gouveia tinha sido compelido a aposentar-se.
Foi o que realmente veio a acontecer. Mais um caso, em que um funcionário não foi responsabilizado por indesculpáveis erros que cometeu, com grave prejuízo para a economia nacional.
À designação do 5.º Director do SFM será objecto do post seguinte.

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