terça-feira, 2 de novembro de 2010

145 - Reunião com representante do Ministério da Reforma Administrativa

Em princípios de Fevereiro de 1982, fui convocado para participar em reunião com Dr.ª Graça Cristina, para análise de situações de injustiça, que tinham chegado ao conhecimento do Ministério da Reforma Administrativa, quanto a classificação de funcionários nas categorias correspondentes às funções que desempenhavam.

Pretendia-se introduzir as correcções que se impunham.

Tinham sido, também convocados o pessoal da Secção de Caminha, o Engenheiro Adalberto de Carvalho e os trabalhadores que deste Engenheiro dependiam.

Surpreendeu-me que a Dr. Graça tivesse, na sua agenda, apenas a análise de casos respeitantes a pessoal que, pela sua posição na hierarquia dos Serviços, pouca influência poderia ter na sua produtividade.

Mas era uma realidade que, se tinha havido flagrantes injustiças, durante a vigência do regime político de Salazar – Caetano, as soluções adoptadas, após a Revolução de 25 de Abril de 1974 vieram agravar a situação.
Antes, o pessoal auxiliar era, na sua maior parte, assalariado e era recrutado localmente, sendo dispensado quando deixava de ser necessário.
Algum deste pessoal, apesar das suas poucas habilitações escolares, demonstrava capacidades para desempenhar tarefas que, normalmente, eram confiadas a técnicos com cursos médios e até superiores.
Acontecia que, em numerosos casos, os estudos se prolongavam por anos e este pessoal permanecia na situação legal, com que tinha ingressado, isto é, praticamente sem direitos.
A agravar a situação, havia uma tabela de salários, imposta pelos Serviços de Contabilidade, que dificultava justa remuneração a esses trabalhadores, que iam progredindo na sua formação profissional.
O problema já não era só do trabalhador, que mercê da formação adquirida, não tinha dificuldade em encontrar trabalho fora da instituição que lhe dera essa formação.
O problema era do próprio Serviço, que, frequentemente se via desfalcado dos seus melhores elementos, com prejuízo da eficácia das suas investigações.
Insistentemente, abordei este tema, quer em documentos, quer em exposições orais, em reuniões da Comissão de Fomento, sem que lhe fosse dada solução.
Até para serem autorizados insignificantes aumentos salariais, dentro da tabela em vigor, surgiam dificuldades internas!

Após a Revolução, os dirigentes que se mostravam tão severos na justa retribuição do trabalho dos assalariados, tornaram-se magnânimos.
Desconhecendo as realidades no terreno, onde não eram vistos, cederam às reivindicações das Comissões instituídas com base nas liberdades trazidas pela Revolução e, promoveram todos os assalariados à situação de contratados, atribuindo-lhes categorias, sem directa relação com o trabalho que executavam.
Muitos dos assalariados tinham currículo justificativo de promoção.
Mas a generalização demonstrou grande imprudência. Nem todos reuniam, as condições mínimas para que tal se justificasse.
Isto veio originar considerável aumento de despesa e, contrariamente ao que seria de esperar, resultou em significativa quebra de produtividade.
Perante esta nova situação, cheguei a ser incriminado por ter admitido demasiados assalariados sobretudo para a 1ª Brigada de Prospecção!
Só faltou atribuírem-me culpas por ter instruído este pessoal nos métodos de prospecção que permitiram a sua decisiva contribuição para os maiores êxitos do SFM, em toda a sua existência.

Isto que descrevi, era a consequência lógica da indisciplina que passara a reinar no SFM.
Os dirigentes, para não perderem os cargos que iam conseguindo manter, apesar da Revolução, iam fazendo cedências, sem reflectirem nas suas consequências.

Nas minhas diversas intervenções, manifestei o receio de que, com a Agenda que trazia Dr. Cristina, não viesse a conseguir-se qualquer progresso, na eficácia do SFM.

Era bem conhecido o mau funcionamento dos serviços públicos, em geral. Disso se faziam eco, os jornais.

Se o Ministério da Reforma Administrativa pretendia, de facto, reformar, deveria, em minha opinião, começar muito por cima. Doutro modo, corria-se o risco de esta reunião ser inútil.

Eu já tinha escrito, em relatórios, que “O fraco dirigente tornará fraca a forte gene”, parafraseando Camões, nos Lusíadas.

Dirigentes competentes saberiam classificar devidamente os seus funcionários.

Lembrei proposta antiga que fizera, no sentido de atribuir aos funcionários as categorias correspondentes às funções que eles realmente desempenham, sem as fazer depender das habilitações escolares com que tinham ingressado no SFM, como vinha acontecendo.

Esta proposta, na sua essência, assemelhava-se ao programa “Novas oportunidades” que o Governo recentemente aprovou.

Passei, depois a fazer a história do Fomento Mineiro, acentuando que sempre exerci funções de chefia, nunca tendo recebido a remuneração correspondente a tais funções.
Isso não me impediu de trabalhar com dedicação e obter assinaláveis êxitos.
Estes êxitos eram apresentados ao Governo como justificativos da existência do SFM, precisamente por aqueles que, ocupando cargos directivos apropriadamente remunerados, só dificultavam a minha actividade.

Nesses recuados tempos ainda foi possível realizar importantes trabalhos, em todas as fases da indústria mineira. A título de exemplo, citei os trabalhos mineiros da Mina da Aparis, onde se abriram quilómetros de galerias, em diversos pisos, até uma profundidade de 150 metros. Tudo isso acabou!

Referi as várias Resoluções de Conselhos de Ministros, chamando a atenção para a imperiosa necessidade de fazer o provimento dos cargos directivos por técnicos de competência comprovada e para o total desrespeito que se verificou no preenchimento dos lugares de chefia, quando estes foram criados pelo Decreto-lei n.º 548/77.

Para preenchimento destes cargos, verificou-se um verdadeiro assalto, sem preocupação em analisar os currículos dos seus candidatos.
A grande maioria dos novos chefes não tinha funções definidas, nem pessoal para chefiar, mas tinha a remuneração que pretendia!
Estamos hoje a sentir as nefastas consequências destes assaltos.

A actividade do SFM decresceu acentuadamente, restando, no terreno, pouco mais do que os trabalhos da 1.ª Brigada de Prospecção por mim criada no Alentejo mas retirada da minha real chefia, através de criminoso processo e os trabalhos que, com grande dificuldade, eu continuava a dirigir, na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha - Ponte de Lima.

Informei que o actual Director do SFM, na sua ânsia destrutiva, chegou a oferecer-me cargo de Director de Serviço, porém com a condição de não realizar trabalho de campo!
Rejeitei, obviamente esta proposta, pois me recusava a aumentar o número de engenheiros de papel selado.

Referi, a este propósito a anedota que consta de Plano de Trabalhos, da autoria do actual Director do SFM, enviado ao Governo, sem que tivesse originado a sua imediata demissão.

Diz-se, nesse documento, que eu poderia exibir, que a promoção de determinados funcionários a cargos de chefia fez diminuir o número de unidades de trabalho, pelo que se tornava necessária a admissão de mais pessoal.
No seu conceito, quem é chefe manda, não trabalha!

Prestei informação sobre as minhas numerosas exposições a membros do Governo, acerca da necessidade urgente de sindicância à DGMSG, com especial incidência no SFM, lamentando que delas não tivesse resultado qualquer acção correctiva.
Os dirigentes persistiam, em total impunidade, a fazer obstrução a quem desejava realizar trabalho útil.

“Será que desta reunião vai resultar alguma acção mais eficaz?”, perguntei eu.

Já no final da reunião, em reforço das minhas afirmações anteriores, um elemento da Secção de Caminha, que se sentia lesado por não lhe ter sido atribuída a categoria de prospector, sendo certo que prospecção, nos seus variados métodos, era o que efectivamente fazia, há mais de uma dezena de anos, chamou vigorosamente, a atenção de Dr.ª Graça, para o facto de ajudantes do Engenheiro Adalberto de Carvalho, que andam, no campo, simulando pesquisar ouro, não fazendo, de facto, verdadeira prospecção, terem essa categoria, pela qual auferem melhor remuneração.

Não chegou ao meu conhecimento Acta que tenha sido feita desta reunião. Também não me apercebi de qualquer aperfeiçoamento no SFM, dela resultante.
Mais uma decepção, a juntar a muitas outras, que, todavia, não iria fazer-me desistir de lutar pela revitalização do SFM, transformando-o num Instituto de Investigação dos Recursos Minerais do País, com independência da DGGM.

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