O SFM, pouco tempo após a sua criação, iniciou estudos na Região de Cercal – Odemira, onde tinham sido outorgadas numerosas concessões para exploração de minérios de ferro e manganés. As poucas concessões ainda em vigor encontravam-se com lavra suspensa.
O SFM considerou importante conhecer as reservas destes minérios, que não estavam bem definidas, pois elas eram essenciais para a metalurgia do ferro que se projectava instalar no País.
Os trabalhos de pesquisa e reconhecimento foram iniciados em 1942 e prolongaram-se até Agosto de 1956, tendo estado a cargo da Secção de Cercal do Alentejo da Brigada do Sul (BS).
Decorreram, como já disse em post anterior, com meios semi-artesanais, até ao início da década de 50 do século passado.
Uma das maiores dificuldades foi originada pelo elevado caudal de água, que era necessário esgotar, quando tinha que se ultrapassar o nível hidrostático.
Só quando se receberam grupos electrogéneos e electrobombas, ao abrigo do Plano Marshall, se considerou possível o prolongamento de poços para investigação de níveis mais profundos e eventual contacto com o minério primário, pois não havia dúvidas de que os óxidos de ferro e manganés ocorrentes acima do nível hidrostático tinham resultado da alteração de um minério primário que, com maior probabilidade, seria composto de carbonatos de ferro e de manganés visto terem sido encontradas pseudomorfoses destes minerais.
Todavia, mesmo com ao auxílio de bombas eléctricas capazes de esgotar 80 m3/hora, tornou-se impraticável o reconhecimento dos jazigos às cotas indicadas para definir reservas certas confortáveis e para tomar contacto directo com o minério primário.
Foi por isso decidido prosseguir a investigação por meio de sondagens aproveitando a circunstância de o SFM ter já adquirido valiosa experiência nesta técnica, mercê da dedicação de alguns Agentes Técnicos de Engenharia.
Não foi, porém, possível dar completo cumprimento aos projectos que apresentei, porque o SFM não dispunha ainda de sondas capazes de atingir as profundidades previstas e também porque o Director do SFM passara a exercer enorme pressão para que fosse encerrada a Secção, sendo certo que muito havia ainda a investigar, perante as novas potencialidades reveladas através dos levantamentos geológicos que estavam em curso, sob minha directa orientação e participação.
Em 1956, o Director do SFM que já tinha “transigido” em deixar concluir o levantamento das rochas vulcânicas então abrangidas pela designação geral de rochas porfíricas, fez nova transigência, permitindo que fosse concluída uma primeira fase de trabalhos mineiros de pesquisa e reconhecimento num pequeno jazigo de cobre, chumbo, zinco e prata, por mim descoberto, com afloramentos na Ribeira do Torgal, afluente do Rio Mira.
Quando decorriam estes trabalhos, encontrava-se a preparar a sua tese doutoramento sobre a geologia da região de Odemira, o Geólogo Klein sob a supervisão do Professor da Universidade de Amesterdão, Mac Gillavry.
A ambos proporcionei informações sobre afloramentos de variadas rochas ígneas e visitas aos trabalhos subterrâneos da Mina do Torgal.
Com o Professor Gillavry estabeleci um acordo, no sentido de a tese de Klein não ser publicada antes da publicação do Relatório que tinha em avançada fase de elaboração, sobre os jazigos ferro-manganíferos da Região de Cercal – Odemira.
Fiz referência a este acordo num Relatório Mensal e obtive do Director uma reacção inesperada: "Não sabia quando e se o Relatório seria publicado".
Perante esta reacção, logo escrevi ao Professor Mac Gillavry desligando-o do compromisso que havia assumido para comigo. A tese de Klein pôde assim ser publicada e constituiu, como se esperava, mais uma valiosa contribuição de Geólogos holandeses para o conhecimento da geologia do Alentejo.
Dos estudos realizados pelo SFM, na sua maior parte da minha inteira responsabilidade, resultou o Relatório com 305 páginas dactilografadas, que apresentei em 1957, sob o título
Jazigos ferro-manganíferos de Cercal – Odemira,
preparado para publicação, como era habitual acontecer na série “Relatórios do Serviço de Fomento Mineiro”.
Dele constam os seguintes capítulos
A – Introdução - Páginas 1 e 2
B - Região Mineira de Cercal – Odemira ( Situação e vias de acesso; História; Topografia; Geologia; Generalidades sobre os jazigos; O minério) - Páginas 3 a 30
C – Os jazigos. As Minas - Páginas 31 a 247
D – Despesas - Paginas 248 a 250
E - Considerações sobre o problema do ferro do Sul do País. - Páginas 251 a 254
F – Resumo e Conclusões - Páginas 255 a 265
G – Summary and conclusions - Páginas 266 a 273
H – Obras consultadas - Páginas 274 a 289
I - Apêndice. Relação de amostras da zona mineira de Cercal - Odemira enviadas para análise microscópica ou paleontológica - Páginas 290 a 305
Do relatório, além do texto, constam 86 peças desenhadas e 45 fotografias.
Todos os trabalhos efectuados estão pormenorizadamente descritos, com apoio das peças desenhadas.
As despesas com eles efectuadas estão também mencionadas, com todo o detalhe, em “mapas de avanços e despesas” durante o período em que decorreram sob minha direcção.
A elaboração destes mapas tornara-se essencial para saber o custo exacto dos trabalhos e poder fazer orçamentos, com a certeza de serem cumpridos, como, de facto aconteceu.
Saliento a minha importante contribuição para o conhecimento da geologia da Região.
Logo na minha primeira visita à Mina da Serra Comprida em princípios de 1948, após prévia consulta à documentação disponível, me apercebi da flagrante semelhança das rochas que ali ocorriam com as da Faixa Piritosa, bem minhas conhecidas.
Não dei, então, muita importância a esta observação, pois tinha presente o que constava em relatórios da Brigada do Sul, onde acabava de ingressar, nos quais estavam assinalados apenas xistos cinzentos e xistos castanhos.
Conhecia-se, é certo, um estudo do Geólogo alemão Heinrich Quiring que assinalava a existência de rochas ígneas, mas tal estudo, com alguma razão, tinha sido fortemente criticado pelo prestigiado Professor de Geologia Carríngton da Costa e a informação que me chegava era de ridicularização do Geólogo alemão, que tirara conclusões apressadas de observações feitas em reduzido tempo.
Aconteceu, porém, que durante as visitas que ia fazendo a todas as 129 minas que constam deste Relatório, para planificação de futuros trabalhos de pesquisa, deparei na Mina de Cerro dos Cunqueiros, na Herdade do Castelo, com afloramentos de pórfiros evidentes com grandes fenocristais!
Em novas visitas, foi-se confirmando a existência abundante destas rochas, transitando gradualmente para rochas xistentas, concordantes com elas.
Decidi, então, promover o levantamento integral destas rochas ígneas, preparando para o efeito, um elemento do pessoal assalariado que já tinha dado provas da sua capacidade, desde que o recrutara, em 1944, na Mina de S. Domingos.
Foi assim que se fez o levantamento geológico, em cartas à escala 1:5000, de uma área de 399 km2, abrangendo a quase totalidade das minas referidas neste Relatório.
Não se atingiu a Mina de Cerro do Rocio em Aljezur, que não tem afinidades com as restantes minas.
No Relatório, apresento estes levantamentos reduzidos à escala 1:25000, sobre base topográfica dos Serviços Cartográficos do Exército.
Para me certificar do rigor dos estudos que estavam em curso, promovi que o Colaborador do SFM, Professor J. M. Cotelo Neiva visitasse, por duas vezes, a Região, proporcionando-lhe a observação directa dos locais mais representativos e dos locais onde tinha maiores dúvidas.
Tive então ocasião de expressar as minhas ideias sobre a geologia da Região, sobre a génese dos jazigos conhecidos e sobre as potencialidades que considerava terem sido reveladas para a ocorrência de jazigos de pirite idênticos aos da tradicional Faixa Piritosa.
Combinou-se o envio de amostras para exame microscópico no Laboratório do Porto, ainda localizado no palacete da Rua de Santos Pousada, para maior segurança nos estudos.
Todavia, a quase totalidade destas amostras não foi objecto de estudo, como refiro no Apêndice do Relatório e nas visitas o apoio foi nulo. Algumas amostras estavam mesmo incorrectamente classificadas, por demonstrada inexperiência no exame de rochas vulcânicas. A este facto me refiro na página 8 do Relatório
A hipótese de ocorrência de concentrações de sulfuretos maciços obteve considerável apoio com a descoberta, de minha autoria, do jazigo de sulfuretos de chumbo, zinco e cobre do Torgal, a que farei referencia no próximo post.
Para investigação desta hipótese ainda foi realizado um levantamento pelo método electromagnético Turam numa área abrangendo a Mina do Torgal, e a Mina dos Pendões, onde também ocorrem mineralizações cupríferas.
Todos estes trabalhos decorreram no âmbito da Brigada do Sul.
Mais tarde, após a reestruturação do SFM realizada em fins de 1963, novos estudos foram realizados. A eles me referirei, quando considerar oportuno.
Em resultado dos estudos da Brigada do Sul do SFM na Região de Cercal – Odemira, as Minas mais importantes entraram em exploração, abastecendo de um minério de ferro rico em manganés a Siderurgia Nacional, que entretanto foi instalada no Seixal.
O Relatório a que me tenho referido jamais foi publicado, assim se quebrando a regra em vigor de se publicarem na série de “Relatórios” os estudos de Minas ou Regiões que tivessem atingido fase avançada de investigação, como tinha sido, por exemplo, o caso das Minas de ferro de Montemor-o-Novo.
Mas o Colaborador do SfM, Professor J. M. Cotelo Neiva preencheu esta lacuna, fazendo publicar no Volume X de “Estudos, Notas e Trabalhos do Serviço de Fomento Mineiro” uma comunicação que apresentou à III Assembleia Geral do “Instituto del Hierro y del Acero” em 1955, intitulada
“Minerais ferro manganesiens du Portugal”, na qual além de expor as ideias que lhe transmiti, durante as duas únicas visitas que fez à Região, apresenta estudos de sua autoria sobre amostras de minérios secundários ocorrentes acima do nível hidrostático e do minério primário encontrado em sondagens.
Lamentavelmente "esqueceu-se" de referir a informação que lhe transmiti durante as duas únicas visitas que fez à Região!!
Não deixa de ser curioso ter até apresentado valores de reservas minerais, ainda que de modo muito incorrecto (não se misturam reservas certas com prováveis e possíveis!), quando eu ainda estava procedendo ao seu cálculo.
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