domingo, 26 de outubro de 2008

21 – O jazigo de cobre de Aparis

Foi em reconhecimento deste jazigo que se realizaram os mais importantes trabalhos mineiros do SFM, durante a sua existência de mais de 50 anos.

Estes trabalhos foram iniciados, por minha iniciativa em Fevereiro de 1953 e mantiveram-se sob minha orientação durante uma dezena de anos,

Em Maio de 1956, apresentei, em co-autoria com os Agentes Técnicos de Engenharia, João José de Oliveira Barros e Carlos de Araújo, um primeiro relatório, descrevendo os trabalhos realizados até 31-12-1955.

Dele constam 13 peças desenhadas ilustrando, com pormenor, o conhecimento adquirido sobre o jazigo, justificativo da continuação do estudo e as despesas discriminadas pelas diversas operações necessárias para sua execução.

Neste relatório, que foi submetido, como muitos outros, a apreciação do Conselho Superior de Minas, além de propor a continuação do reconhecimento, perante os bons resultados que estavam a ser obtidos, propus também a exploração, preparação mecânica e venda de uma parte do minério que fosse revelado, sem contudo comprometer a futura explorabilidade do jazigo.

Esta exploração era considerada essencial para obtenção dos dados económicos indispensáveis à correcta avaliação do jazigo.

Salientava que a instalação de uma oficina de preparação mecânica do minério bruto se tornava premente, não só para beneficiação das 16.700 toneladas com cerca que 2% de Cu deixadas em escombreiras por anteriores exploradores, mas também para concentração do minério que estava a ser extraído dos trabalhos de reconhecimento.

Excedia, obviamente, as minhas atribuições o projecto desta oficina.

Tinha sido para poder projectar criteriosamente oficinas desta natureza que se recebera, através do Plano Marshall, material de laboratório e variados equipamentos para ensaios em oficina a instalar com carácter semi-industrial.
Todavia, estes equipamentos mantinham-se encaixotados, tal como tinham vindo dos Estados Unidos, por se não ter ainda encontrado local para os colocar em uso.

O Conselho Superior de Minas deu parecer negativo sobre a minha proposta de exploração parcial do jazigo, assim dificultando uma avaliação em bases sólidas, quando fosse considerado oportuna a abertura de concurso para adjudicação da exploração mineira.

Os estudos prosseguiram, dentro dos condicionalismos existentes e, em 13 de Maio de 1956, submeti a apreciação superior um segundo relatório, respeitante à actividade desenvolvida no período de 1-1-1956 até 31-12-1958.

Deste segundo relatório constam 32 peças desenhadas elucidativas dos resultados da actividade desenvolvida:
- plantas topográficas dos diversos pisos e entrepisos até ao nível de 120 metros abaixo da superfície, com representação dos vários filões que constituem o sistema filoniano de Aparis, com indicação das possanças e teores de cobre, metro a metro;
- perfis longitudinais e transversais dos filões;
- perfis longitudinais esquemáticos dos filões com indicação das possanças reduzidas em calcopirite.

Dado seu interesse, transcrevo excertos do Resumo deste relatório:

“Desde o início do estudo do jazigo de Aparis, foram abertas, em virgem, 24 sanjas, 4.655,8 metros de galerias, 166,9 metros de poços e 199,7 metros de chaminés; foram recuperados 1.987,0 metros de galerias, 552,8 metros de poços e 140,3 metros de chaminés; foram feitos levantamentos electromagnéticos cobrindo áreas num total de 18,5 km2, com 23.084 pontos observados.”
…..
“Do conjunto filoniano que constitui o jazigo de Aparis, estão descobertos 7 filões com o rumo sensivelmente Norte-Sul, formando, algumas vezes, bifurcações fechadas e 3 com orientação quase perpendicular.
Dos primeiros, é de destacar o filão Saramago, já reconhecido numa extensão de 1.000 metros e que segundo resultados da prospecção electromagnética, terá um comprimento superior a 5.000 metros Os outros têm extensões reveladas entre 40 e 125 metros, prevendo-se, para um deles, um desenvolvimento superior a 1.500 metros.
Admite-se a possibilidade de virem a encontrar-se outros ramos filonianos, principalmente com base em indicações dos levantamentos geofísicos ainda não investigadas.”

“Estão revelados 18 “ore-shoots”, além de vários outros núcleos de mineralização de mais baixo teor”.

“As reservas computam-se em
55.590 T com 2,84% de Cu certas
9.810T com 2,82% de Cu prováveis
1. 000.000 T possíveis,
havendo ainda a considerar 31.300 T existentes em depósito, no exterior, com um teor de Cu que se presume próximo de 2%”,

“As despesas desde o início dos trabalhos atingem 7.130 contos”

“Propõe-se uma intensificação do ritmo de actividade, considerando que, à cadência actual, mais de 30 anos serão necessários para a investigação do jazigo, em toda a sua extensão, até uma profundidade média de 90 metros”

“Considerando que o reconhecimento vai exigir um dispêndio superior a 40 milhares de contos, propõe-se uma lavra parcial do jazigo, sem contudo, comprometer a sua explorabilidade.
Julga-se essencial esta lavra, não só para compensar, no todo ou em parte, as despesas, através da venda do minério, que parece assegurada, mas também para obtenção de elementos económicos indispensáveis à correcta avaliação do jazigo.
Insiste-se na premente necessidade de se instalar a oficina de preparação do minério.
Refere-se também a indispensabilidade de adequado equipamento para enfrentar os problemas que se apresentam e da resolução do problema de abastecimento de energia eléctrica através da rede geral do País.

Alvitra-se a aquisição ou expropriação da faixa de terrenos onde se situam as instalações das minas, por razões várias, entre as quais são de destacar a conveniência de formar uma pequena mata, fonte futura de abastecimento de madeiras, e a vantagem de distribuir terras de cultivo ao pessoal operário, melhorando as suas condições de vida.”

Este segundo relatório foi também submetido à apreciação do Conselho Superior de Minas, que deu parecer negativo relativamente à exploração parcial do jazigo. Todavia, o despacho ministerial que se lhe seguiu, ponderava que tal exploração era de considerar.

Nenhum destes dois relatórios foi publicado, como seria de esperar, não só porque essa era a norma instituída na primitiva organização do SFM, mas também porque Aparis poderia servir de exemplo a estudos em outras áreas, não só para o SFM, mas também para empresas privadas.

Os trabalhos prosseguiram, ainda sob minha orientação, até finais de 1963.
Eu tinha, então, em fase final de elaboração um terceiro relatório, contando já com mais de uma centena de peças desenhadas, ilustrando com todo o pormenor os trabalhos realizados e os resultados obtidos.

Nele se descreviam:
- as sondagens ao longo de toda a extensão do jazigo e também a partir de trabalhos interiores, seus resultados (logs e perfis transversais);
- o aumento considerável dos trabalhos subterrâneos, atingindo o nível de 150 metros abaixo da superfície;
- a instalação da oficina de preparação do minério e as deficiências resultantes de um errado conceito de economia que levou ao aproveitamento de maquinaria usada em outras minas, inadequada ao caso de Aparis, com as consequentes perdas;
- a instalação de um ramal de alta tensão para abastecimento de energia eléctrica;
- a construção de dois postos de transformação;
- a construção de mais de 40 casas para o pessoal operário;
- a construção de uma escola com residência anexa para a professora;
- a construção de uma casa para o pessoal técnico, quando se tornava necessária a sua presença prolongada na mina, etc., etc.

Tencionava confirmar a proposta de abertura de novos pisos abaixo do piso 150, aguardando a aprovação de um projecto de instalação de esgoto a partir do Poço S. Francisco e o consequente fornecimento dos equipamentos com características devidamente calculadas, que eu havia apresentado.

Estava também previsto apresentar, como proposta, a sugestão que repetidas vezes fiz, oralmente, de aproveitar a Mina de Aparis como Mina escola, complementando a formação dos novos Engenheiros de Minas a admitir pelo SFM e também para ensaios de novos equipamentos que fossem surgindo no mercado.
Assim se preencheria uma grave lacuna que eu observara na formação dos jovens Engenheiros que eram destacados para a Brigada do Sul.
Na realidade eu até já tinha feito estagiar, em trabalhos de topografia, na região de Barrancos, sob minha orientação, durante uma semana, dois Engenheiros que haviam sido destacados na Brigada, com muito escassos conhecimentos nesta matéria.

Todavia, uma reestruturação da Direcção-Geral de Minas atribuiu-me novas e absorventes funções, retirando-me, bem contra minha vontade, tudo o que dizia respeito a Trabalhos Mineiros.

Na nova estrutura do SFM, os Trabalhos Mineiros foram confiados a Engenheiros sem experiência alguma nesta matéria, ficando na total dependência da competência de Agentes Técnicos de Engenharia, três dos quais tinham adquirido essa competência, actuando durante mais de uma dezena de anos, sob minha orientação.

Da apresentação desse terceiro relatório, foi encarregado o Agente Técnico de Engenharia João José de Oliveira Barros

Sem deixar de reconhecer o mérito deste excelente colaborador, devo referir que tal relatório esteve longe de traduzir a importância do que estava em causa.

Em próximo post, descreverei a sequência dos acontecimentos, que culminaram com o abandono do estudo da área.

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