quinta-feira, 7 de julho de 2011

176 – Nova discussão sobre Plano Mineiro Nacional

No post N.º 79, referi tentativas governamentais, no sentido de disciplinar as actividades da indústria mineira, para aproveitar, de modo racional, os recursos conhecidos ou ainda a revelar, em benefício da economia nacional.

Porém, todas fracassaram, por desprezarem um factor fundamental para o sucesso de qualquer empreendimento: a competência profissional.

Alcides Pereira, apesar da sua inexperiência e do seu desconhecimento dos verdadeiros problemas com que se debatia a indústria mineira nacional, aceitou considerar fulcrais os temas, em que se envolvera o seu antecessor.

Já vimos, no post anterior, que quase ia conseguindo fazer aprovar, na Assembleia da República, uma nova Lei de Minas que, em vez de melhorar a situação da indústria mineira, só a iria prejudicar.
O comentário do Professor Catedrático Alberto Cerveira, perante a minha critica de tal Lei ter sido feita sobre o joelho, traduz bem a generalizada displicência das entidades responsáveis pela governação do País.
Nada percebendo do assunto, Alcides Pereira aproveitava-se da ignorância do Governo e dos deputados em matérias mineiras, para fazer aprovar coisas destas! –disse o Professor Cerveira.

Mas o Chico-esperto não ficou por aqui!

Conseguiu que fosse publicada, no Diário da República de 30-11-83, a Resolução do Conselho de Ministros N.º 54/83, com preâmbulo eivado de lugares comuns e com descuidada redacção, que encarregava o Ministro da Industria e Energia de apresentar, durante o ano de 1984, o Plano Mineiro Nacional, tendo em consideração as deficiências estruturais do sector.
Nesta Resolução, era também determinado que se procurasse a “colaboração de todas as entidades intervenientes, de forma a serem definidos objectivos que contribuíssem para o desenvolvimento acelerado do reconhecimento dos recursos minerais e do seu mais eficiente aproveitamento”.

No magno encontro realizado em 16-12-83, que descrevi no post N.º 155, o Ministro e o Secretário de Estado realçaram a importância deste documento.

Em jornal do Porto, vi notícia de ter sido publicado, em 28-2-84, despacho do Ministro da Indústria e Energia, criando uma Comissão Consultiva e um Grupo Executivo, para preparar o Plano Mineiro Nacional, sendo convidadas a nomear representantes, várias entidades, entre as quais se incluía a Ordem dos Engenheiros.

Em 5-4-84, o tema do Plano Mineiro Nacional foi posto em discussão, na Delegação do Norte da Ordem dos Engenheiros.
Mais uma vez, senti obrigação de participar, para defesa do Serviço de Fomento Mineiro.
à reunião começou com apresentação do tema pelo Professor da Faculdade de Engenharia, Simões Cortês, seguindo-se no uso da palavra os Engenheiros Torres Lopes e Nascimento da Fonseca.
Foram distribuídas cópias da Resolução do Conselho de Ministros de Novembro de 1983.
Nascimento da Fonseca, que representava a Circunscrição Mineira do Norte, fez algumas afirmações que me surpreenderam.
Na linha de Soares Carneiro, disse, por exemplo, que “já são conhecidas as zonas onde temos minérios de tungsténio e outras matérias-primas” e “estamos em crise e não sabemos que fazer aos minérios”.
Quando é dada a palavra aos presentes à sessão, eu faço uma série longa de intervenções,
Comecei por chamar a atenção para as disposições do Decreto-lei N.º 29 725, que impõe, no seu artigo 4.º, a existência de um Plano Mineiro.
Declaro que muito se fez já, em cumprimento desse Plano. Poderia ter-se feito mais, é certo, mas não foi por falta de Plano que tal não aconteceu.
Refiro depois o despacho de Torres Campos de 1975, os 22 Grupos de Trabalho, e várias Comissões, de que nada resultou. Um “mons parturiens”.
Agora é, de novo, o Plano agitado. É cíclico! Em 1994, decerto o problema vem novamente.
Esquece-se o passado e aí reside o erro.
Um Plano nunca é final.
Há constantes ajustamentos, mas há que seguir a metodologia correcta.
A consulta à documentação é a primeira fase. E isso não se tem feito.
Não estou de acordo com a posição pessimista de Nascimento.
Sabemos que há zonas potenciais, mas não temos certezas sobre o que nelas se contem. Há que procurar cientificamente. Há que criar gente competente. As Universidades terão que colaborar na sua preparação.
E há que pôr depois os técnicos a trabalhar, em técnica, não em papéis, fazendo-os burocratas.
As tarefas são complexas. Somos dependentes em cobre, zinco, chumbo. Iremos deixar de ser através de Neves-Corvo, mas poucos sabem que atrás de Neves-Corvo, há um trabalho de 30 anos.
São actividades a longo prazo, a 10, 20, 30 … 50 anos a que nenhum País pode furtar-se e agora verifica-se que através da Lei de Minas, se pretende subalternizar o papel dos serviços oficiais, quando o contrário é que devia acontecer.
Há uma flagrante contradição entre o Plano que se pretende dinâmico e a nova Lei de Minas que quer transferir para as empreses privadas a maior parte do esforço.
Não são as Companhias, mesmo as estrangeiras, que nos vêm resolver os problemas. E deixemo-nos de ilusões. Elas não vêm correr os riscos para que nós colhamos os benefícios.
Mas se Neves-Corvo nos bastará, isso não significa que o resto se deva abandonar, até para um desenvolvimento regional equilibrado. E cito o caso da Suécia, que a par dos grandes jazigos, explora jazigos pequenos e pobres, iguais a alguns que nós mantemos debaixo da terra.
Refiro o Instituto Geológico e Mineiro, como inevitável, mas critico os que querem um Organismo a nascer de cima com muitos chefes, muitos departamentos, muita gente a mandar e pouca a fazer. Quem sabe faz, quem não sabe manda!
Critico a pobreza documental de muitos Organismos oficiais e que nada esteja consignado na lei a tal respeito.
Digo que o papel do Estado é indispensável, porque ele é o detentor de toda a riqueza mineira, tendo os concessionários apenas o direito de explorar. Mas devem explorar bem. O Estado deve estar sempre presente como dono e não deixar malbaratar essa riqueza.
Presente, mais ajudando que fiscalizando. Ajuda técnica e ajuda financeira Há meios que os concessionários não podem criar. Alguém terá que suprir isso.

Tudo isto está previsto numa lei de Minas do tempo dito fascista.
Falando da metalurgia, referi a paralisação e revogação das Minas do Braçal (de onde saía chumbo metálico), apenas por baixa ocasional da cotação do chumbo.
O Estado deveria ter tomado medidas que evitassem o encerramento desta promissora mina. As reservas calculadas eram escassas, é certo, mas essa era a regra nas minas em exploração, por deficiente orientação técnica.
Haveria que adoptar nessa Mina os procedimentos que tinham sido usados em Aparis, em Barrancos, onde se definiram previamente reservas suficientes, para que o jazigo pudesse ser criteriosamente explorado.
Todos pareceram admirados com estas revelações.

Além desta contribuição, prestei também colaboração, no cumprimento das minhas funções docentes na Faculdade de Ciências do Porto.
A ela me referirei no próximo post.

Como era facilmente previsível, tendo em consideração o que acontecera com anteriores decisões ministeriais, que não tinham tido em consideração o mérito das personalidades encarregadas de constituir os diferentes grupos de trabalho, o Plano não surgiu em 1984, como tinha determinado o Conselho de Ministros.

Também não surgiu até 6-11-85, isto é, até à data em que o IX Governo Constitucional, presidido por Mário Soares, terminou o seu mandato.

Era de esperar que ao País fosse cabalmente explicado tão grande atraso na apresentação de um Plano que se tinha repetidamente anunciado como documento fundamental para o “relançamento da indústria mineira” em Portugal.

O Ministro Veiga Simão confiou excessivamente na capacidade do Secretário de Estado da Energia e do Director-Geral de Geologia e Minas, apesar de ter dados que lhe aconselhariam prudência, em tal matéria.

De facto, o comportamento de ambos estes personagens, no caso do processo burocrático suscitado pela audiência que o Ministro me concedera, não deixava dúvidas sobre o seu carácter e sobre a sua capacidade técnica.

O Director-Geral de Minas, que tão rigoroso se mostrara comigo, ao exigir a apresentação, com urgência, de relatório circunstanciado de actividades por mim desenvolvidas, afinal estava a exceder escandalosamente prazos a que se comprometera, para entregar documento não de actividade própria, mas baseado em actividades de outros.

E o Secretário de Estado da Energia, cuja existência se não tinha notado, senão no magno encontro de 6-12-83, no qual realçara a importância do Plano Mineiro Nacional, faz publicar no Diário da República de 13-11-85, em jeito de despedida, o seu despacho N.º 29/85 de 30-10-85, que me deixou estupefacto.

Mais uma vez, a incompetência foi premiada!

O Secretário de Estado nem se dera conta de que o Director-Geral de Minas desrespeitava, ostensivamente, despacho do Ministro que mandava aproveitar a minha capacidade técnica, no cumprimento dos planos superiormente aprovados.
E também não reparara que, afinal havia Planos, que o Ministro conhecia, por terem sido aprovados por ele-próprio ou por Conselho de Ministros em que participou.
Eu não fui designado para participar em qualquer dos Grupos de Trabalho, à semelhança do que já tinha acontecido em 1975, quando o Ministro Torres Campo emitiu despacho com o título “Para a dinamização da Indústria Extractiva”, cujos resultados nulos estão descritos no post N.º 79.
As minhas reflexões, sobre o propagandeado Plano Mineiro Nacional, foram externas ao Organismo onde estava desenvolvendo a minha actividade profissional, já então longa de 40 anos, com consciência do meu valioso currículo.

É do seguinte teor, esse despacho:

“Não tendo sido possível completar na vigência do IX Governo Constitucional os trabalhos do Plano Mineiro Nacional, foi contudo realizado um trabalho notável de sistematização e tratamento de informação que merece ser realçado.
As 16 monografias cobrindo todas as substâncias minerais, as 6 monografias sobre os grandes projectos mineiros e o estudo do perfil da indústria extractiva servem de base ao Plano Mineiro Nacional.
Os estudos sobre a evolução previsional da procura de matérias-primas da indústria transformadora sobre o abastecimento da indústria transformadora com substâncias minerais e sobre a exportação de substâncias minerais portuguesas, permitem enquadrar os estudos subsequentes: áreas potenciais de aplicação dos projectos de prospecção e critérios de desenvolvimento de exploração mineira.
Para todo este trabalho contribuiu de uma forma decisiva o empenhamento e dinamismo de todos os técnicos da Direcção-Geral de Geologia e Minas e em particular do director-geral.
São também de realçar as contribuições que os restantes membros da Comissão Executiva e do Grupo Consultivo têm dado aos trabalhos, o que aqui se agradece.
Estão assim lançados e em bom ritmo os trabalhos que permitirão a curto prazo ter as conclusões e propostas do Plano Mineiro Nacional, sistematizando o relançamento da indústria extractiva em Portugal que se tem vindo a realizar.”

Todavia, tão propagandeado Plano não chegou a ser apresentado. Foi caindo no esquecimento, tal como acontecera nas anteriores tentativas.

Dos numerosos documentos citados no despacho do Secretário de Estado, fiquei apenas a conhecer três, que foram publicados no Boletim de Minas
Farei a sua análise, em próximo post.

Continua …

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