domingo, 12 de julho de 2009

79 – As movimentações para a reestruturação da Direcção-Geral de Minas. Continuação 2

Sem relação com as reuniões a que me referi nos posts anteriores, surgiu, com data de 4 de Dezembro, o despacho do Secretário de Estado da Indústria e da Energia, José de Melo Torres Campos, intitulado “Para a dinamização da Indústria Extractiva”, que, a seguir, transcrevo:

“Os recursos minerais devem constituir uma base sólida em que assente o desenvolvimento da indústria portuguesa, que interessa acelerar neste momento como motor que constitui da economia nacional
Tem sido muitas vezes afirmado ter Portugal muito escassas possibilidades no campo das indústrias extractivas.
No entanto, importantes sectores da indústria apoiam-se já no aproveitamento das nossas substâncias minerais. A verdade porém é que a maioria dos aproveitamentos mineiros não tem tido um grau de exploração compatível com as suas reservas e os produtos a que dão origem não vêm sendo convenientemente transformados, relegando-se o nosso País para a posição de exportador de matérias-primas pouco valorizadas, como é típico de economias subdesenvolvidas e sujeitas à exploração pelos países industrializados e pelas grandes companhias multinacionais.
É outra verdade que grande parte das concessões existentes não têm reservas conhecidas, nem têm dado origem a explorações continuadas e rentáveis. Mesmo alguns jazigos de maior potencial estão insuficientemente reconhecidos, o que dificulta o lançamento de empreendimentos mineiros e industriais em escala compatível.
No campo das rochas ornamentais e outros minerais não metálicos, não sujeitos ao regime de concessibilidade, tem-se assistido a uma autêntica delapidação das largas potencialidades existentes, proliferando explorações de dimensão irrisória, sem a conveniente orientação técnica e sem que o Estado disponha de adequados meios legais de intervenção em defesa do património nacional e da situação dos trabalhadores e até do próprio interesse de empresários e proprietários do solo.
Em contrapartida, no entanto, no contexto europeu, o País é rico em diversas e importantes substâncias minerais, metálicas e não metálicas, rochas industriais e ornamentais. Bastaria lembrar, entre outros, os jazigos de pirites, que constituem reservas apreciáveis de cobre, zinco, enxofre, ferro e chumbo, para além de outros subprodutos, as volframites e cassiterites insuficientemente conhecidas mas com perspectivas animadoras, os minérios de ferro de Moncorvo, praticamente inexplorados, o sal-gema, os sienitos nefelínicos, possível fonte de alumínio, os minérios de urânio, o quartzo e feldspatos, as rochas ornamentais (mármores, granitos, etc.), as rochas industriais onde podemos realçar as lousas, os calcários e dolomites, as argilas especiais e de construção e as areias, em especial as brancas cauliníferas. Isto para não falar do petróleo bruto e gás natural, cuja prospecção sistemática só agora se iniciou e das próprias águas mineromedicinais e de mesa, cujo consumo se vem generalizando.
A exploração mineira, mormente nos casos de maior valor potencial, não pode ser deixada ao livre jogo dos interesses privados.
A consideração do lucro como critério único de exploração leva muitas vezes a uma lavra ambiciosa, em que apenas se aproveitam os teores elevados, inutilizando parte importante dos jazigos, ou pelo contrário, a que se deixem adormecidas reservas importantes, à espera de melhores dias que nunca vêm, ou de acordo com a política de reservas à escala internacional das grandes companhias mineiras.
Cabe ao Estado uma enorme responsabilidade na condução da política mineira naciona,. quer pela intervenção directa na exploração dos recursos mais relevantes, quer no enquadramento de toda a actividade do sector, definindo e fiscalizando as condições de trabalho das restantes minas e pedreiras.

Por outro lado, torna-se necessário que o desenvolvimento mineiro dê origem à reorganização e expansão das indústrias que aproveitam as matérias-primas de origem mineral, permitindo o maior grau possível de valorização dos nossos recursos dentro das fronteiras do País e dando-nos condições para enfrentar com segurança a competição nos mercados internacionais, no momento em que se torna urgente melhorara a nossa balança comercial.
Indústrias que abrangem a siderurgia e os cimentos, a química pesada e os adubos, as mais diversas metalurgias de metais não ferrosos, a cerâmica e o vidro, a construção e a produção de energia.

É pois chegado o momento de dar um novo e decisivo impulso à indústria mineira.

Nestes termos, em continuação de trabalhos anteriores e sem prejuízo das iniciativas e acções em curso ou a promover em prazo mais curto, é cometida à Direcção-Geral de Minas e Serviços Geológicos, a apresentação, no prazo de três meses, de um Programa de Aproveitamento dos Recursos Minerais do País, que deverá incluir os seguintes pontos:
1 - Propostas de medidas que alterem o enquadramento legal da actividade do sector e que permitam o seu saneamento retirando concessões cuja inactividade não tenha justificação e disciplinando a exploração das diversas minas e pedreiras;
2 - Selecção e avaliação quantificada do conjunto de projectos de investimento com maiores potencialidades, visando a criação ou a expansão de actividades mineiras, que possam ser directamente executadas ou promovidas pelo sector público em futuro próximo;
3 - - Definição de um programa de prospecção e inventariação de reservas, a executar segundo critérios de prioridade em função do valor económico potencial de recursos e zonas e intensificação do plano de cartografia geológica do País, tendo em atenção o referido programa de prospecções e as necessidades decorrentes do ordenamento urbano e industrial do território.”

Em 14-1-1975, o Secretário de Estado da Indústria e da Energia deu posse a 19 dos 22 Grupos de Trabalho que o Director-Geral tinha constituído para a elaboração do Programa de Aproveitamento dos Recursos Minerais.
Do discurso que proferiu, nesse acto, destaco as seguintes passagens:

“Iniciam hoje a sua actividade os 19 Grupos de trabalho constituídos no âmbito do Programa de Aproveitamento dos Recursos Minerais desencadeado pela Secretaria de Estado da Indústria e Energia. Isto significa que perto de uma centena de técnicos deste e doutros departamentos do Estado, e também, nalguns casos, representantes das empresas e os sindicatos vão proceder ao estudo em profundidade dos problemas mais significativos da actividade mineira nacional.
….
De tudo o que precede, resulta evidente que terá que vir a caber ao Estado a condução efectiva do melhor aproveitamento dos mais importantes dos nossos minérios. Nos casos do carvão, urânio, pirites, volfrâmio, ferro e sienitos, está proposto que o Estado assuma a condução efectiva da exploração dos jazigos mais importantes, através da maioria do capital social das respectivas empresas.

Neste conjunto, em que recordei apenas as medidas mais significativas, todo o esquema de desenvolvimento mineiro assume naturalmente um muito particular relevo, não só pela já anunciada tomada de posição maioritária pelo Estado em algumas minas (já em vias de concretização nos casos de Aljustrel e do Pejão), mas também no estudo sistemático e globalizado das nossas reservas e potencialidades de desenvolvimentos industriais integrados. Julgo ser este o momento adequado para preconizar a constituição de uma empresa pública de investigação mineira que permita a realização dos estudos e projectos susceptíveis de concretização valorizando, da melhor forma, os recursos, a técnica e a mão-de-obra portuguesa.”


Neste despacho, há completa concordância com as ideias que eu apresentei, em diversos documentos, publicados ou não, desde a década de 50 do século passado
Todavia, não foi solicitada a minha participação em qualquer dos Grupos de Trabalho.
O Director-Geral, que ia conseguindo manter-se no cargo, apesar da contestação de que foi alvo, logo após a Revolução, mercê de cedências e promessas que ia fazendo a funcionários mais interessados na sua situação pessoal do que na real eficácia da Direcção-Geral de Minas, não tendo logrado conquistar o meu apoio, resolveu ignorar-me.
Mas não deixava de apresentar os espectaculares êxitos obtidos sob minha directa intervenção (os maiores em toda a existência do Serviço de Fomento Mineiro) como credencial para demonstrar a potencialidade mineira do País, em cujo aproveitamento agora pretendia mostrar-se mais empenhado

No Diário da República de 6 de Março de 1976, é publicado um despacho conjunto dos Ministérios da s Finanças, da Indústria e Tecnologia e da Educação e da Investigação Científica criando um Grupo de Coordenação para o Aproveitamento dos Recursos Mineiros Nacionais, com o objectivo de dar sequência aos estudos apresentados pelos 22 Grupos de Trabalho, constituídos no âmbito da Direcção-Geral de Minas e Serviços Geológicos,
Este Grupo de Coordenação tinha a seguinte composição:
Membros fixos:
O Director-Geral de Minas e Serviços Geológicos, que presidirá;
Um representante da Direcção-Geral de Minas e Serviços Geológicos;
Um representante da Secretaria de Estado do Ensino Superior e Investigação Científica;
Um representante da Secretaria de Estado dos Investimentos Públicos
Um representante do Laboratório de Física e Engenharia Nucleares da Junta de Energia Nuclear.
Membros flutuantes:
Os relatores dos Grupos de Trabalho já referidos, quando se discutirem os projectos por eles apresentados

Todas estas tentativas de reestruturação enfermaram do mesmo vício: a manutenção em cargos directivos de pessoas sem as qualificações exigíveis para tais cargos.

Em 1980 foi finalmente dada por finda a permanência do Engenheiro F.S.C. no cargo de Director-Geral.
O Engenheiro N.A.M.Q., sentindo-se incapaz de conter a indisciplina que tinha instituído no SFM, pediu a exoneração, sendo aposentado com a categoria de Inspector Superior da Direcção-Geral dos Serviços de Prospecção da Junta de Energia Nuclear.
Além desta curiosíssima nomeação, anoto que, quando ela ocorreu, já os Serviços de Prospecção da Junta de Energia Nuclear tinham sido extintos!

Com as mudanças de Governos, as reestruturações foram caindo no esquecimento e, anos mais tarde, surge nova tentativa de valorização da nossa indústria mineira, com o anúncio de um “Plano Mineiro Nacional”, já com novos dirigentes na Direcção-Geral de Minas.

A esta nova fase da vida da Direcção-Geral de Minas, que lamentavelmente se revelou ainda mais decepcionante, conduzindo à extinção do Serviço de Fomento Mineiro, me referirei oportunamente.

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