sexta-feira, 12 de agosto de 2011

183 - Nova discussão sobre Plano Mineiro Nacional. Continuação 7


Continuo a analisar a grotesca versão da história da “Prospecção Mineira em Portugal” apresentada pelo Geólogo José Goinhas, com a qual pretendia contribuir para um ambicioso “Plano Mineiro Nacional” anunciado pelo IX Governo Constitucional.

Ainda a respeito do tema 5, sobre a aplicação de técnicas geofísicas e geoquímicas à prospecção mineira, impõe-se completo esclarecimento das circunstâncias em que ocorreu a descoberta do jazigo de Neves – Corvo.

Goinhas, referindo-se a esta descoberta, começa por apresentá-la como exemplo da “complementaridade de esforços, no domínio da prospecção mineira, entre os serviços oficiais e as empresas”, mas acaba por considerá-la um êxito conseguido em 1977, pela Associação, que se constituíra, em 1972, entre a Sociedade Mineira de Santiago e as instituições francesas, “Bureau de Recherches Géologiques et Minières” e “Société Minière et Métalurgique de Penarroya”.

Algumas das circunstâncias, em que a descoberta ocorreu, estão descritas nos posts N.º 37 a 43.

Agora, quero chamar a atenção para a flagrante semelhança dos acontecimentos que culminaram com as descobertas dos jazigos de Gavião e Neves – Corvo, a qual não é assinalada pelo “historiador”.

Se Goinhas não fosse personagem ingrato e traiçoeiro, teria concluído, ao chegar a este ponto da sua narrativa, que o Plano Mineiro anunciado pelo Governo, além de injustificado, representava grave desconsideração pelos técnicos do SFM, aos quais o País ficou devendo um notabilíssimo sucesso científico, que causou admiração, nas instâncias mineiras nacionais e internacionais.

Goinhas que, por minha proposta, conseguira ingressar no SFM, tinha funções bem definidas, enquadradas em Planos de Trabalhos, anualmente submetidos, a apreciação do Governo, que sempre tinham merecido aprovação.

Se, naquela época, se notava declínio na indústria mineira nacional, Goinhas ao fazer a sua investigação histórica, teria obviamente que chegar à conclusão de que tamanho declínio não tinha origem na falta de Plano, pois, com os Planos normais do SFM, se tinha obtido uma das maiores descobertas, de todos os tempos, na nossa indústria mineira.

Goinhas, que tinha começado por restringir a sua história ao quinquénio 1980-84, acabou por dar maior relevo aos progressos em períodos anteriores, para atenuar a apreciação negativa originada pelos insucessos naquele quinquénio.

Mas não aprofundou as investigações sobre as causas de tais progressos, para não ter que reconhecer as suas grandes responsabilidades no declínio nos períodos seguintes, que levara o Governo a tentar combatê-lo, através de novo Plano.

As suas curtas referências a Neves – Corvo só como puro eufemismo podem ser interpretadas.

De facto, a “complementaridade de esforços” entre os “serviços oficiais” e as empresas privadas é uma ultrajante maneira de desvalorizar o “esforço” de um serviço oficial que tinha nome e se chamava SERVIÇO DE FOMENTO MINEIRO.

Da parte das empresas privadas, não só não houve “esforço”, pois a descoberta estava praticamente concretizada pelo SFM, como houve muito deficiente continuidade do real “esforço” do SFM, com o consequente atraso de 5 anos (!) na descoberta.

A ser verdade o que o “cronista” Delfim de Carvalho descreve, no seu artigo publicado pela “Economic Geology”, terá sido até por um golpe de sorte que a Associação encontrou o jazigo!!!

De facto, conforme ficou registado no meu post N.º 41, escreveu Delfim de Carvalho:
“On the evening before the mineralisation was encountered, the geologist at the drill site, in despair, nearly decided to terminate the drill hole”.

E, no comentário que enviei para a “Economic Geology”, que não chegou a ser publicado, escrevi eu:

“From the history narrated by Delfim de Carvalho, one could thus arrive at the conclusion that the discovery of Neves – Corvo deposit was accidental, and that if the Association had not achieved it, the deposit would still remain untouched”

A adjudicação de vasta área à Associação a que acima me referi, para prospecção mineira, na qual veio a ser encontrado o jazigo de Neves – Corvo, resultou de factos ainda mais graves do que aqueles que descrevi, relativamente à descoberta do jazigo do Gavião.

Naquela área, de cerca de 4 000 km2, que abrangia as grandes manchas de rochas vulcânicas de Castro Verde – Almodôvar, anteriormente evidenciadas pelos levantamentos geológicos do SFM (Ver post N.º 7), a Companhia canadiana “Mining Explorations (International)” (MEI) tinha realizado, por contrato com o Estado, celebrado em 1966, diversos trabalhos, visando a descoberta de jazigos de pirites complexas.

MEI privilegiava a investigação por sondagens, com base nos seus estudos geológicos e em alguma gravimetria.
Muitas vezes aconselhei a Companhia, a fazer mais amplo uso da gravimetria, antes de passar à execução de sondagens (Ver post N.º 32).
Chamei, por exemplo, a atenção para a escassa aplicação desta promissora técnica, naquela vasta mancha de rochas vulcânicas de Castro Verde – Panoias, que tem uma extensão superior a 30 km e uma largura que atinge 10 km.
A Companhia não se mostrou, porém, sensível aos meus conselhos e lamentavelmente, deixou terminar, em 1971, o prazo de validade do contrato, sem ter conseguido qualquer êxito.

No post N.º 33, revelei que, após MEI ter abandonado a área que lhe esteve adjudicada, o Serviço de Prospecção do SFM, sob minha direcção, deu início a prospecção gravimétrica de uma parcela de cerca de 100 km2, abrangendo a Mina do Cerro do Algaré e outras ocorrências cupríferas que tinham originado pequenas explorações mineiras, em épocas passadas.

Quando esta campanha se encontrava em curso e já estava revelada grande parte da anomalia que viria a dar origem à descoberta do jazigo de Neves – Corvo, fui novamente surpreendido pela celebração de contrato adjudicando a totalidade da área anteriormente atribuída a MEI, à Associação a que acima me referi.

De facto, afigurou-se-me muito estranho que, dispondo a Sociedade Mineira de Santiago de duas áreas, uma das quais já com os jazigos de Estação e Gavião a exigirem trabalhos para definição de reservas, a Sociedade pretendesse aumentar a sua área de estudo.
Também muito estranho me parecia que fosse procurar colaboração de entidades estrangeiras, para a realização de estudos perfeitamente ao alcance dos seus técnicos e dos técnicos do SFM, aos quais habitualmente recorria, quando pretendia a aplicação de métodos geofísicos, com realce para a gravimetria, aproveitando a grande experiência que o SFM tinha já adquirido em tal matéria.

Neste caso, o Director-Geral, que costumava ridicularizar os “vectores” com que eu me entretinha, nem esperou pela completa definição da anomalia que estava a evidenciar-se vigorosamente, na zona que eu já tinha assinalado no meu relatório “Prospecção de pirites no Baixo Alentejo”, publicado em 1955, como parecendo constituir uma região cuprífera digna de atenção. (Ver post N.º 11).

Uma vez que o SFM já se tinha desenvolvido na aplicação de variadas técnicas de prospecção, considerava muito insensato continuar a entregar a estrangeiros as nossas riquezas minerais.

Estranhava que o Director-Geral não desse a mínima atenção às minhas recomendações na publicação do SFM a que acima fiz referência, as quais julgo oportuno aqui reproduzir:

“Somos de opinião que o prosseguimento da campanha de prospecção de pirites, para ter a eficácia pretendida, deverá contar com a cooperação efectiva de especialistas em geologia aplicada e prospecção geofísica, integrados na equipa de estudo”

“Todos os estudos a que nos vimos referindo podem e devem, em nosso entender, estar a cargo de técnicos portugueses que hajam, para o efeito, adquirido a necessária especialização, conforme prevê o Decreto-lei de criação do Serviço”.

“A favor deste modo de proceder falam, não só a economia como o próprio interesse no assunto, que não poderá esperar-se de outros superior ao dos nacionais”

Conforme escrevi no post N.º 124, vinham à minha memória os versos de Camões, na última estância do Canto X dos Lusíadas, dirigindo-se ao Rei, a quem dedicava o poema:

“Fazei, Senhor, que nunca os admirados
Alemães, Galos, Ítalos e Ingleses
Possam dizer que são para mandados
Mais que para mandar os Portugueses”


Pareceu-me, pois, muito estranha a precipitação na entrega desta enorme parcela a uma Associação com forte participação de entidades estrangeiras.

A orientação da minha actividade sempre teve em vista respeitar os preceitos consignados nas disposições do Decreto-lei de criação do SFM.

Os técnicos portugueses deveriam, pois, vir progressivamente a encarregar-se, não apenas da prospecção, mas também da exploração dos novos jazigos que viessem a ser revelados e dos procedimentos para o aproveitamento integral dos seus minérios.

A Escola de Aparis seria o local apropriado para a preparação desses técnicos. (Ver post N.º 124)

Continua…

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