quarta-feira, 22 de abril de 2009

62 – A atitude do SFM perante o encerramento das Minas de chumbo do Braçal.

Em 1959, quando exercia s funções de Chefe da Brigada do Sul do SFM, que tinha a seu cargo as investigações, por trabalhos mineiros convencionais, das existências de jazigos minerais na região do País a Sul do Rio Tejo, foi com grande surpresa e algum desalento que soube do encerramento das Minas de chumbo do Braçal, as quais tinha conhecido em 1946, nas circunstâncias que referi no post N.º 59.

Afigurava-se-me que o SFM, em cumprimento dos objectivos para que tinha sido instituído, deveria ter evitado que viesse a acontecer a situação trágica que se verificou. Mas reconhecia que, no Norte do País, apesar de lá se situar a sua sede, o SFM, nos seus 20 anos de existência, não tinha conseguido criar estruturas idênticas às que vigoravam no Sul, que lhe permitissem tomar a seu cargo tal empreendimento.

Em 1-7-1974, já na minha qualidade de Chefe do Serviço de Prospecção do SFM, cujo âmbito se estendia a todo o território metropolitano nacional, recebi do Director do SFM um documento manuscrito, sem indicação de ter sido registado na Secretaria, como seria normal, do seguinte teor:

Ao 1.º Serviço:
Numa exposição dirigida ao Presidente da Câmara Municipal de Sever do Vouga e pelo Governo Civil de Aveiro remetido a Sua Ex.ª o Ministro da Coordenação Económica escreve-se (referindo-se ao encerramento das minas do Braçal):
“A firma proprietária, sem o auxílio oficial, não tinha rendibilidade na sua exploração. O Fomento Mineiro actuou no nosso concelho, nas Minas das Talhadas sem resultado.
Segundo os estudos dos mesmos Serviços e a confirmação do actual responsável Técnico das Minas do Braçal, o filão de Minérios de Chumbo é dos mais ricos do País ou mesmo da Europa.”
O 1.º Serviço deverá informar, com urgência:
1) Quais os trabalhos de prospecção realizados na área do Braçal.
2) Resultados obtidos.
3) Trabalhos em curso noutras áreas da região e resultados até agora obtidos.”


A minha primeira reacção a esta ordem foi a seguinte, com data de 2-7-1974:

“Ex.mo Senhor Engenheiro Director do Serviço de Fomento Mineiro:
Cita V. Ex.ª uma exposição, que alguém dirigiu ao Senhor Presidente da Câmara Municipal de Sever do Vouga, chamando a atenção para as potencialidades minerais da região de Braçal – Talhadas.
Refere que esta exposição transitou, através do Governador Civil de Aveiro, até Sua Ex.ª o Ministro da Coordenação Económica.
Não menciona V. Ex.ª os departamentos pelos quais passou, seguidamente, a exposição, nem os despachos que sobre ela incidiram.
Se foram respeitadas as normas correntes, é de crer que ela se encontre nas mãos de V. Ex.ª, após passagem pelo Secretário de Estado da Indústria e da Energia e Director-Geral de Minas.
A ser assim, uma vez mais um documento, que vinha seguindo as vias normais, com o objectivo de atingir o departamento competente para prestar informação sobre o assunto nele versado, é retido nas mãos de V. Ex.ª.
Em casos anteriores, V. Ex.ª, quando não se considerou apto a dar cumprimento aos despachos superiores, mandou preparar xerocópias dos documentos recebidos e sobre elas exarou os seus despachos, para que as minhas informações não acompanhassem os documentos originais e não ultrapassassem, portanto, o âmbito do Serviço de Fomento Mineiro ou da Direcção-Geral de Minas.
De tais informações, aproveitou V. Ex.ª aquilo que, segundo o seu critério pessoal, lhe pareceu de interesse.
Manifestei, por diversas vezes a V. Ex.ª o meu desacordo relativamente a esse procedimento que não considerei regular e, em 12-3-1974, solicitei que ele fosse objecto de apreciação por entidade jurídica competente.
Até à data, não me foi comunicado o parecer dessa entidade jurídica e ignoro até se ela chegou a ser consultada.
No caso presente, também V. Ex.ª se não considerou apto a dar cumprimento a despachos superiores.
Porém, em vez de enviar o documento original para informação, como seria normal, limitou-se a transcrever duas frases da exposição nele contida e a formular algumas perguntas sobre a actividade do 1.º Serviço na região de Braçal – Talhadas, determinando que as respostas fossem dadas com urgência.
Causa estranheza que, apresentando o 1.º Serviço, com regularidade, os seus relatórios trimestrais e anuais e tendo ainda na reunião de 24 de Abril passado, da Comissão de Fomento, feito exposição circunstanciada sobre a actividade desse Serviço no País e dos resultados que vem obtendo, a Direcção do Serviço de Fomento Mineiro se não encontre apta a prestar as informações que lhe foram solicitadas.
Devo lembrar ainda que, em 31-12-1972, apresentei um relatório subordinado ao título “Região de Braçal – Talhadas. Sua potencialidade mineira”, em satisfação de um despacho de V, Ex.ª exarado sobre um ofício do Dr. Vale Guimarães, então Governador Civil de Aveiro, no qual era posta em dúvida a utilidade dos trabalhos que, naquela região, decorriam a cargo do 1.º Serviço.
V. Ex.ª certamente estará recordado de que ordenou até a paragem desses trabalhos, para cumprimento de instruções que me disse ter recebido do Senhor Director-Geral de Minas.
O carácter singular desta ordem levou-me a solicitar a V. Ex.ª a sua confirmação por escrito e, como este pedido não foi atendido, tenho aguardado o despacho de V. Ex.ª sobre o meu relatório e, entretanto, os trabalhos têm prosseguido.
O teor do documento que estou analisando, leva-me a supor que V. Ex.ª ainda não teve oportunidade de ler tal relatório.
Porque a exposição a que se refere esse documento levanta, de novo, um tema de grande importância, que não tem sido devidamente avaliado em sectores da Direcção-Geral de Minas estranhos ao 1.º Serviço, afigura-se-me que a minha informação a seu respeito deve chegar, na íntegra, ao conhecimento de Sua Ex.ª, o Senhor Ministro da Coordenação Económica."


Em 10-7-1974, o Director do SFM escreveu, na sequência desta minha informação sobre o seu documento manuscrito, o seguinte:
“Não se ignora, como é evidente, a existência de relatórios trimestrais e anuais, nem tão pouco o que tem por título “Região de Braçal – Talhadas. Sua potencialidade mineira”. No entanto, pretendem-se agora informações muito concretas e sucintas sobre os pontos que se indicaram atrás.
O Engenheiro Chefe do 1.º Serviço de Fomento Mineiro é a pessoa que considero indicada para prestar a informação pedida. Insisto em que seja dada.
Para elaborar a informação em referência, não tem o Engenheiro Chefe do 1.º Serviço necessidade de consultar a “exposição” do Senhor Joel de Macedo Marques e por isso esta lhe não foi enviada. Não se vê, no entanto, qualquer inconveniente em que dela tome conhecimento. Junta-se.
Os outros assuntos abordados pelo Engenheiro Chefe do 1.º Serviço serão oportunamente levados ao conhecimento do Senhor Director-Geral de Minas que sobre eles tomará a decisão que julgar conveniente.”

Recebi, na mesma data, os seguintes documentos:
a) Carta do Presidente da Câmara de Sever do Vouga sobre notícia publicada no jornal “Diário de Lisboa” acerca do encerramento das Minas do Braçal.
b) Carta do Governo Civil de Aveiro, sobre o mesmo assunto
c) Fotocópia de artigo publicado no “Diário de Lisboa” de 15-12-1959, com o título seguinte: “O encerramento das minas de chumbo do Braçal cria um grave problema para a região de Sever do Vouga”.

No próximo post, farei a transcrição destes três documentos.

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