sexta-feira, 11 de março de 2011

160 – Director-Geral de Minas desrespeita seu compromisso de colaboração com as Universidades

Quando, em 1970, o Professor Miguel Montenegro de Andrade me convidou para reger a disciplina de Prospecção Geológica, Geofísica e Geoquímica, que passou a ser incluída no Curso de Geologia da Faculdade de Ciências do Porto, eu não me sentia motivado a aceitar tão honroso convite, porque a actividade como Chefe do Serviço de Prospecção do SFM já preenchia todo o meu tempo.

Além disso, estava convencido de que o Director-Geral de Minas não autorizaria tal acumulação de funções, pois tinha recusado, pouco tempo antes, idêntica acumulação ao Agente Técnico de Engenharia Raul da Silva Dionísio, quando este se propunha ensinar matéria da sua especialidade, em Escola Técnica de Montemor-o-Novo.

Todavia, Soares Carneiro, não só concedeu a autorização solicitada pelo Departamento de Mineralogia e Geologia da Faculdade de Ciências do Porto, como deu todas as facilidades para eu poder bem desempenhar o cargo.

Por exemplo, quando contactado sobre horários de aulas, enviou, ao Director da Faculdade, o ofício N.º 824 de 6-5-1970, do seguinte teor:

Respondendo à solicitação de V. Ex.ª, tenho a honra de informar que o trabalho do Engenheiro de Minas de 1ª Classe do Serviço de Fomento Mineiro, desta Direcção-Geral, Albertino Adélio Rocha Gomes, pela natureza da sua especialização, não requer a exigência de um horário rígido, sendo portanto sempre possível conciliar a sua actividade no Serviço de Fomento Mineiro com as exigências do horário que lhe venha a ser fixado para a regência da cadeira de Prospecção Geológica, Geofísica e Geoquímica.
Apresento a V. Ex.ª os meus cumprimentos.
A bem da Nação
O Director-Geral
(a) Fernando Soares Carneiro”

Perante estas facilidades, eu não tinha o direito de recusar a colaboração pedida, até porque o Professor Montenegro me declarou que, no caso de eu não aceitar o convite, os alunos ficariam privados do ensino das matérias de prospecção mineira.

Eu estava longe de imaginar o sucesso que iria conseguir, nas minhas funções docentes!

Para esse sucesso, muito contribuíram os meus primeiros alunos.
Eram apenas quatro e rapidamente se comportaram como bons companheiros de trabalho, tal o entusiasmo com que participaram nas aulas.

Isto deu-me muito ânimo e, em anos seguintes, o ambiente saudável de 1970-71, teve continuidade, embora menos exuberantemente, quando aumentou muito o número de alunos, com introdução de elementos recusados em cursos da sua preferência, devido à introdução do “numerus clausus”.

Os alunos apreciavam a ligação do ensino teórico à aplicação directa no terreno, dos métodos que lhes descrevia, tirando partido dos trabalhos do SFM que eu dirigia, no Norte e no Sul do País.
Lembro-me, por exemplo, da expressiva admiração de um aluno, quando eu ia começar a explicar o cálculo da massa, em toneladas, de um jazigo mineral através da sua assinatura gravimétrica.
As descobertas que revelava de novos jazigos minerais, davam-lhes a certeza da grande utilidade da cadeira, para a sua vida prática.

Além disso, a fuga da cidade para o ar puro do campo, o exercício físico proporcionado pelos percursos ao longo dos perfis em estudo e o facto de saberem que o seu trabalho seria aproveitado, eram outros factores a despertar o seu interesse.
Era agradável notar a satisfação deles, quando no campo, usando os aparelhos que lhes disponibilizava, após prévia instrução no seu manejo, observavam variações dos parâmetros que mediam, a assinalar causa perturbadora dos valores normais, que poderia corresponder a concentração dos minerais úteis que se procuravam, no ambiente geológico antecipadamente definido como favorável a essa concentração.

Dava-me também grande satisfação tomar conhecimento de que os Geólogos licenciados pela Universidade do Porto eram preferidos pelas Empresas que cumpriam contratos de prospecção mineira com o Estado, pois a Prospecção Mineira não constava dos cursos de Geologia e de Engenharia de Minas das outras Universidades do País.

Já me referi, em posts anteriores, ao facto de Engenheiros recém-formados terem mostrado interesse em frequentarem as aulas que eu ministrava na Faculdade de Ciências do Porto, pois sentiam essa grave lacuna na sua licenciatura.

Referi-me também, aos convites da Universidade de Aveiro e do Instituto Superior de Engenharia do Porto.

O apreço pelo meu desempenho levou até o Professor Montenegro a emitir o parecer de que eu deveria ser equiparado a catedrático e não à categoria de professor auxiliar com que estava contratado.
Idêntico parecer emitiu relativamente ao Dr. Orlando da Cruz Gaspar, Geólogo do SFM, que também estava prestando boa colaboração à Universidade, porém na área de Mineralogia, em que adquirira especialização, em Universidade alemã, sob a orientação do eminente Professor Ramdohr.
A sugestão não teve, porém, aceitação, por nenhum de nós ter, então, grau de doutor.

Quando Soares Carneiro foi afastado das funções de Director-Geral, nem me passou pela cabeça que o novo detentor do cargo pudesse alterar a boa colaboração existente entre a DGGM e as Universidades.

O novo Director-Geral, Alcides Pereira, até pareceu empenhado em seguir a orientação do seu antecessor, em tal matéria.
De facto, em intervenção que fez, em 15-2-1980, numa das sessões de Congresso de Geoquímica, para cuja presidência fora convidado, recomendou que as Universidades produzissem bons técnicos, prometendo, para esse efeito, toda a colaboração do Organismo que lhe estava confiado (Ver post N.º 140).

Apesar de Alcides já ter evidenciado malévolo carácter, nos contactos que eu com ele tivera, nunca esperaria que se atrevesse a tomar atitudes que também o desacreditassem, fora do âmbito da DGGM.

Tão confiante estava, que até pedi, com a maior naturalidade, a Daniel, em 28-10-83, que me avisasse, quando pretendesse ir comigo ao campo, para não ter que alterar os meus programas.
Informei, então, que costumava fazer trabalho de campo às terças e sextas-feiras, se as condições meteorológicas o permitissem e que às quintas, de manhã, dava aulas de Prospecção, na Faculdade de Ciências (Ver post N.º 140).
Às quintas, não queria faltar, pois a boa preparação dos alunos era até de interesse para o SFM. Não podia transferir aulas, porque juntava alunos dos Cursos de Geologia e de Engenharia.
Às sextas, iam, muitas vezes, dois docentes da Universidade de Aveiro, que eu ajudava e que até poderiam ingressar no SFM, se lhes fosse garantido que comigo trabalhariam. (Ver post N.º 154)

Suponho que Alcides terá sido informado, por Daniel, das minhas aulas aos alunos de duas Faculdades (Ciências e Engenharia) e Alcides terá considerado que eu seria remunerado por ambas. Na realidade, como já acentuei, eu nunca fui remunerado pelas aulas a alunos de Engenharia, as quais até me originaram despesas (Ver, por exemplo, post N.º 141).

Por tudo quanto acabo de relatar e era do conhecimento geral, foi grande a perplexidade da Reitoria da Universidade do Porto e do Departamento de Mineralogia e Geologia da Faculdade de Ciências, quando tomaram conhecimento de ofício de Alcides Pereira, com data de 15-2-84, com uma série de perguntas a respeito de um dos seus mais categorizados funcionários, fazendo suspeitar ilegalidades nas minhas funções docentes e nos horários praticados.

Na resposta que a Reitoria deu, com todos os elementos justificativos da legalidade das minhas funções e com referências ao bom desempenho e à premente necessidade da minha colaboração, foi, por sugestão minha, alterado para os sábados o dia de aulas, para evitar que possíveis dificuldades pudessem ser apresentadas, não obstante a autorização de Soares Carneiro nunca ter sido revogada.
Com esta alteração, alguns alunos foram prejudicados, pois tinham actividades desportivas, nesse dia, e, ou faltavam às aulas ou a essas actividades.
Mas a realidade era que, mesmo aos sábados tinha a sala cheia e eu não marcava faltas. Ninguém era obrigado a estar presente. O seu saber seria avaliado nos exames.

Outro prejuízo originado pela suspensão da minha actividade no campo, foi a maior dificuldade nas aulas práticas no campo, nas quais costumava aproveitar a participação dos alunos, nos trabalhos em curso. Também se impossibilitava continuar a colaboração com a Universidade de Aveiro, que era muito apreciada por professores e alunos desta Universidade.

Assim Alcides faltava, despudoradamente, ao seu compromisso público de dar toda a colaboração às Universidade para que produzissem bons técnicos.

Não resisto a comentar mais esta atitude do “Chico-esperto” Alcides.
De modestíssimo funcionário, com atribuições meramente administrativas num “Gabinete para a Prospecção, Pesquisa e Exploração de Petróleo”, cuja instituição se não justificava, uma vez que nem prospectava, nem pesquisava, nem explorava petróleo (!) (Ver post N.º 118), apesar do seu magríssimo currículo, ultrapassando as disposições legais que impunham competência para o exercício de cargos de chefia, conseguiu chegar a Director-Geral de Minas.
Alcides que assim chegara, na mais flagrante das ilegalidades ao mais alto cargo na DGGM e que, para ser nomeado, tivera que se recorrer á esfarrapada justificação de “urgente conveniência de serviço”, mostrava-se agora diligente em saber se a minha nomeação para funções docentes na Universidade estava devidamente legalizada.
Ao contrário da sua nomeação, a minha baseava-se em análise curricular e estava consolidada por renovações anuais e até por louvor publicado em Diário da República; não em “conveniência urgente de serviço”, conveniência mais dele do que da DGGM!
Mais uma vez se comprovava o velho ditado: “Se queres ver o vilão, põe-lhe a varinha na mão!”

Mas nem Alcides nem a DGGM saíram prestigiados desta indelicada intromissão na Universidade do Porto.
Era evidente que eu não estaria a exercer funções docentes na Universidade, “clandestinamente”, isto é, sem as devidas autorizações legais.
Não se aceitava que Alcides não tivesse consultado o meu processo individual ou me não tivesse contactado directamente, antes de tomar a decisão de se dirigir à Reitoria da Universidade.
No meu processo individual, deveria ter ficado arquivada toda a informação que Alcides pretendia, a não ser que os serviços burocráticos da DGGM estivessem desorganizados.
E se este último caso se verificasse, a Alcides competia promover a devida correcção, até porque era em matéria burocrática que teria adquirido formação, já que em geologia e minas se tinha revelado uma nulidade absoluta.
Tudo isto não abonava em favor de um Organismo que já estava muito desacreditado exteriormente, pelas informações que muitos dos seus elementos,
iam prestando e pela falta de resultados.

De notar que este ofício foi recebido apenas 13 dias após a Ordem de Serviço que me proibia de realizar trabalho de campo!
Sintomático era também o facto de, em simultaneidade com este ofício de Alcides ao Reitor da Universidade do Porto, o Director do SFM, Fernando Daniel, me tenha ameaçado com “processo por incompetência, com efeito nas minhas funções docentes”, por atraso na entrega de um relatório anual.
Esta fanfarronada, como muitas outras a que Daniel me habituara, não era obviamente para levar a sério.
Tratava-se, de mais uma investida dos intrusos, Alcides, Daniel e Reynaud, que sem passado no SFM, se tinham apoderado deste Organismo, que deveria criar riqueza, mas que eles iam progressivamente destruindo, com insensatas resoluções.

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