segunda-feira, 23 de maio de 2011

167 - Audiência concedida pelo Ministro Veiga Simão e suas consequências. Continuação 3

Os inesperados factos ocorridos, durante a minha presença em Lisboa, nos dias 6 e 7 de Fevereiro de 1984, suscitaram-me suspeitas sobre as reais intenções de Daniel, quando me convocou para comparecer “com papéis”, para “conversar sobre o projecto de Caminha”.
Na minha boa-fé, tinha ido carregado com volumoso embrulho contendo documentos, com peso de alguns quilos, que nem cheguei a abrir, apesar de ter passado grande parte do dia 7 de Fevereiro na companhia de Reynaud, que agora, para justificar as suas aleivosias, na informação que lhe foi pedida, ousava assumir-se como meu superior hierárquico.
Daniel, que já se esquivara à planeada “conversa sobre o projecto de Caminha”, através de uma conveniente “doença súbita”, esquivava-se também a prestar declarações sobre o seu comportamento para comigo, encarregando Reynaud das explicações que a ele competiam, na qualidade de meu imediato superior hierárquico.
Reynaud, que me tinha declarado ignorar a convocatória de Daniel, não demonstrara o mínimo interesse em analisar os documentos que eu trouxera, apesar de ter passado muito tempo em conversa sobre temas alheios ao projecto de Caminha.
De facto, ele estava consciente de que eu não tinha sido colocado na sua dependência hierárquica e nem se atrevera a invocar tal qualidade, que eu obviamente teria rejeitado, pois se tinha estabelecido, na reunião de 9-9-83, a minha subordinação directa a Daniel. O post N.º 150 é bem elucidativo nesta matéria.
Isso consta, aliás, do documento subscrito pelo Director-Geral, que adiante comentarei.
Daniel mente, descaradamente, quando afirma que Reynaud era responsável pelo relançamento do “Projecto de Caminha” onde eu vinha trabalhando.
E Reynaud, apesar das suas atitudes cordiais para comigo, em 7 de Fevereiro e da reprovação que manifestou relativamente à Ordem de Serviço emitida por Alcides, aceitou, sem o mínimo escrúpulo, assumir-se, na exposição que apresentou, como meu superior hierárquico e como advogado de defesa do Director do SFM e do Director-Geral, usando argumentos que estes lhe recomendaram, que distorcem, com a maior desfaçatez, a verdade dos factos ocorridos.
Além disso, este “genial” Reynaud, permitia-se fazer, relativamente a minha personalidade, juízos pouco lisonjeiros, que facilmente poderia ter evitado, se tivesse consultado, sem ideias preconcebidas, o meu processo individual e imensos documentos do arquivo do SFM, bem esclarecedores do meu fundamental papel neste Organismo e do excepcional relacionamento que tive com todo o pessoal que comigo colaborou.
No meu processo individual, teria encontrado documento da autoria do primeiro Director do SFM caracterizando-me como excelente condutor de homens e a confirmação, em 1949, desta característica, pelo segundo Director, em proposta para a minha promoção à categoria máxima então possível, na classe dos Engenheiros.
Teria, também encontrado a explicação para o mau relacionamento que passou a verificar-se com funcionários que, no mau uso das liberdades instituídas pela Revolução de Abril de 1974, subscreveram documento traiçoeiro, com o qual conseguiram a minha demissão da chefia da 1.ª Brigada de Prospecção, que tinha sido uma criação minha.
Libertos da minha chefia, puderam usar práticas fraudulentas aconselhadas pelo Director-Geral e pelo Director do SFM, com as quais eu não transigira, apesar das fortes pressões a que fora submetido por este conjunto de funcionários pouco escrupulosos. A esta matéria já me referi exaustivamente em posts anteriores.
Poderia ainda concluir que, com tal cumplicidade e com outras cedências inadmissíveis, o Director-Geral e o Director do SFM, que tinham sido nomeados, no regime de Salazar-Caetano, apenas por considerações de ordem política e compadrio, conquistaram o apoio de trabalhadores, aos quais anteriormente tinham negado insignificantes aumentos salariais e passagem à classe de contratados, mantendo muitos deles como assalariados, durante dezenas de anos. Com cedências que se traduziram em enorme perda de eficácia na concretização dos objectivos do SFM, conseguiram aguentar-se ainda durante alguns anos, nos cargos que ocupavam.
Mas o inevitável tinha que acontecer. A comissão de serviço de Soares Carneiro, no cargo de Director-Geral foi dada por finda em 1980 e Múrias de Queiroz, Director do SFM, não esperou que o demitissem. Abandonou o cargo, que já se lhe tinha tornado insustentável, tantos eram os erros cometidos, mas teve a habilidade de conseguir ser nomeado Inspector Superior de Organismo já extinto!

Desconheço o currículo de Reynaud, que o alcandorou a Director de Serviço no SFM. Sei que fez parte do bando de assaltantes aos cargos dirigentes criados pelo famigerado Decreto N.º 548/77, em circunstâncias que mereceram reprovação de dois Conselhos de Ministros.
Também nunca percebi que funções reais lhe foram atribuídas no SFM.
Daniel dizia-me que ele era o “homem da Indústria Extractiva” e agora apresentava-o como “Chefe do Serviço de Minas e Pedreiras”. Nessa qualidade, estaria a examinar dados sobre concessões mineiras, salientando o caso das concessões da região de Vila Nova de Cerveira – Caminha - Ponte de Lima, onde eu vinha trabalhando, há 20 anos.
A realidade é que, Reynaud, tal como a maioria dos outros recentemente nomeados dirigentes, não tinha “efectivamente” funções definidas.
A outorga de concessões e o acompanhamento e fiscalização da actividade nelas decorrente era da competência das Circunscrições Mineiras, que tinham saído do âmbito da DDGM, por decisão do Secretário de Estado Rogério Martins, a que Soares Carneiro incrivelmente, não se opôs (Ver post N.º 69). Ficaram integradas em Delegações Regionais do Ministério da tutela.
Portanto, o departamento de “Minas e Pedreiras” que lhe estava atribuído, era, na prática, completamente inútil.
Mas Reynaud, tendo tomado conhecimento de que Union Carbide, quando rescindiu os seus contratos com o Estado e com os concessionários, entregara, na DGGM, documentos da sua actividade, logo viu, no seu aproveitamento, uma excelente oportunidade para mostrar a razão da existência do seu departamento.
Eu estranhava que me estivessem a ocultar, durante longo tempo, esses documentos que Union Carbide tinha entregue, não porque a tal fosse obrigada, por cláusulas dos seus contratos, mas porque eu insistia, nos meus frequentes contactos com os seus dirigentes, para que me deixassem toda a documentação, nela se incluindo os testemunhos das sondagens, na hipótese de não decidirem passar à fase de exploração mineira.
Mas esses dirigentes de Union Carbide, ao entregarem a documentação na DGGM, quando apresentaram as suas despedidas, seguiram o procedimento que seria normal, se normal fosse o ambiente na DGGM.
Estavam certamente convencidos de que tudo seria para mim encaminhado.
Se eu presumisse que tal não iria acontecer, ter-lhes-ia solicitado uma cópia extra e, não tenho dúvidas de que seria atendido, pois sempre lhes prestei toda a colaboração que me era possível.
A Companhia, tão interessada esteve sempre nessa colaboração, que até chegou a requerer a minha designação como representante do Estado junto dela, à semelhança do procedimento adoptado em áreas do Sul do País, sobretudo ma Faixa Piritosa Alentejana. Mas a este requerimento nunca foi dada resposta! (Ver post N.º 144)
Eu também tinha escrúpulos em dar a conhecer problemas internos desprestigiantes para o Organismo em que exercia a minha principal actividade.

Era, portanto, Reynaud que astuciosamente se apoderara da documentação, para a “estudar metodicamente”, na expressão de Daniel, o que significaria que estava a demorar com ela longo tempo, mas … “da montanha, nem um rato saia”.

O meu primeiro contacto com este astucioso personagem foi no dia 6-12-83, quando ele acompanhou Daniel, na visita que eu lhes proporcionei à Região Mineira de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima, para mostrar resultados do programa por mim estabelecido, o qual vinha cumprindo há cerca de 20 anos.
Salientava o facto de as explorações que ali se mantinham e também a actividades das Companhias estrangeiras Union Carbide e Cominco se basearem exclusivamente nesses resultados.
Manifestava o meu amplo repúdio pelos obstáculos que me estavam a ser criados para dar continuidade a esse programa, entre os quais citava a sonegação dos documentos de Union Carbide e o criminoso desleixo no tratamento dos testemunhos das sondagens desta Companhia.
Durante a visita, Reynaud manteve-se calado.
Já no Porto, disse não ter perdido palavra do que eu expusera, o que o levava a considerar-me um D. Quixote.
Chamando-lhe a atenção, não apenas para os êxitos reais que tinha acabado de mostrar a ambos (Daniel e a ele), mas para muitos outros que constam do meu currículo, explicou saber disso tudo, mas que apenas quisera acentuar que a minha luta era demasiado idealista e não compensatória!!!
O segundo contacto foi no dia 7 de Fevereiro, em ambiente cordial, conforme acima descrevi.

Este extraordinário personagem não precisou de mais contactos para se sentir apto a definir o meu carácter e para tudo ficar a saber sobre “repetidas ordens orais” de Alcides e Daniel intimando-me a apresentar relatórios e planos de trabalho, às quais eu não tinha dado cumprimento!!!.
Salienta que os novos dirigentes surgidos em 1981, manifestaram a maior tolerância e benevolência para comigo.
Tudo teriam tentado para eu me “enquadrar” nas “novas estruturas”, visando dignificar a minha actividade pessoal que, na sua abalizada opinião, se encontrava “um tanto secundarizada”!!!
Assim invertiam, com o maior atrevimento, os papéis que deveriam ser desempenhados, nas actividades do SFM.

Quando em 1981, surgiram estes pseudo-dirigentes, que tinham conseguido tomar de assalto cargos de chefia criados pelo Decreto N.º 548/77, sem a mínima preparação para o seu desempenho, já eu vinha exercendo, efectivamente e não simbolicamente como eles, funções de chefia desde 1944, isto é, durante 37 anos (!!), mantinha a qualidade de Chefe do 1.º Serviço do SFM, tendo a meu cargo a prospecção mineira em todo o território continental português.
A minha nomeação para estas funções resultara de Orgânica instituída em 1963, que se mantinha em vigor, havendo porém núcleos aguardando clarificação jurídica isenta, como era o caso da 1.ªBrigada, com sede em Beja, que, a título provisório, tinha deixado de me estar subordinada.
Ordens emitidas por uma Comissão dita de Direcção, apoiada numa Comissão Coordenadora de Comissões de Trabalhadores convenientemente manipulados, que tentaram destruir a disciplina daquela Orgânica, foram reprovadas por Resoluções de Conselhos de Ministros.
O actual Director-Geral, ao referir-se, na exposição, que mais adiante comentarei, a esse período, em que eu fui o alvo preferencial para todos os ataques dos que se mantinham no poder, por insistir em fazer trabalho útil, chama vicissitudes às criminosas irregularidades que impunemente se praticavam e classifica de “provisórios” os cargos directivos que surgiram e que eu me atrevera a contestar, com isso sofrendo ameaças de “sansões” (sic) disciplinares (Ver post N.º 105).
Enquanto insistia na necessidade de me serem entregues os documentos de Union Carbide, pois o programa de prospecção que eu vinha dirigindo na Região não podia ignorar a valiosa contribuição desta Companhia, é agora Reynaud a afirmar que me foram pedidos reiteradamente relatórios da minha actividade e toda a documentação que eu tinha produzido ao longo dos 20 anos, na Região.
Afirma também que me foi pedido o Plano de Trabalhos e que eu não cumpri esta ordem.
São curiosíssimas estas afirmações.
Em primeiro lugar, nunca Reynaud se me dirigiu a exigir qualquer documento, nem tinha autoridade para o fazer, visto não ser meu superior hierárquico.
Em segundo lugar, quanto a relatórios, apenas Daniel me exigiu a entrega do respeitante à actividade no ano de 1983 e essa exigência até foi feita com ameaça de “processo por incompetência, com efeitos nas minhas funções docentes na Universidade”! Ele havia descoberto que tal relatório estava em falta, há 2 meses e meio!! (Ver post N.º 158).
O problema quanto a relatórios não era de carências mas de abundância, pois era costume queixarem-se da sua extensão e da falta de tempo para os lerem.
Foi com base nesse argumento que me entregaram um modelo simplificado de relatório para eu o passar a preencher, mensalmente, com indicação dos dados que pretendiam, mas a realidade era que eu não me limitava a apresentar esses dados. Acrescentava sempre comentários sobre as dificuldades que enfrentava para a execução dos trabalhos, na esperança de que os dirigentes as tivessem em consideração. Porém isso nunca acontecia.

Em segundo lugar ocorre-me perguntar para que quereriam eles os dados, respeitantes aos trabalhos que eu vinha dirigindo, neles participando activamente, se Alcides e Daniel (como revelarei mais adiante) me declararam nada perceberem do que eu fazia e Reynaud ter-se comportado de modo a denunciar o mesmo.
A situação era idêntica à gerada quando Farinha Ramos, na tal estrutura que Alcides classificou de “provisória” (!), foi ao meu gabinete pedir toda a documentação de Caminha (Ver post N.º 114)

O falso e mentiroso Reynaud tem o desplante de aludir ainda a “várias insistências, inclusive do D.G., sobre a apresentação de um programa de trabalhos para a área de Caminha para 1984, no sentido de concertar o desenvolvimento e tentar a integração das diversas concessões, reveladas de todo infrutíferas”.
Tal exigência nunca me foi feita, nem tinha justificação, porque os Planos de Trabalhos do SFM, devidamente orçamentados, anualmente submetidos a apreciação superior, com vista à obtenção das verbas necessárias à sua execução, eram quase totalmente preenchido com projectos por mim apresentados.
Era óbvio que os trabalhos que eu vinha dirigindo na Região de Vila Nova de Cerveira – Caminha – Ponte de Lima, há cerca de 20 anos, obedeciam a planos bem fundamentados, como comprovavam os êxitos conseguidos, que estavam na base das explorações efectuadas e do interesse de Companhias estrangeiras em lhes dar continuidade.

O único contacto que tive com Alcides, após a sua nomeação como Director-Geral foi em 9-9-83 e, nessa data apenas se tratou do que descrevi no post N.º 150.
Quanto a Daniel, exceptuando a sua ridícula “lição de prospecção mineira” (Ver post N.º 153) não mais se falou em planos de trabalho.
As reuniões comigo, que ele sistematicamente adiava, tinham apenas por objectivo fazer-lhe perceber em que consistia o programa que estava em cumprimento.
Ele, sem realmente ter percebido o que eu lhe explicava, por falta de preparação técnica, até arrogantemente manifestara o propósito de terminar em 1984, os trabalhos na Região (Ver post N.º 153) e agora aparece Alcides a pretender “implantar”, na mesma Região “o embrião de uma nova política mineira, valorizando os trabalhos da DGGM e redefinindo as estruturas empresariais aí existentes”, por considerar a área particularmente favorável (Ver post N.º 165).

Continua …

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